São mães/pais que gratificam a simbiose-dependência e atacam os desejos,
impulsos e comportamentos autónomos e autonomizantes da criança. (...) É,
vemo-lo, uma verdadeira cultura de colonização dos filhos; uma fábrica de gente casta, obediente, humilde e pobre. Mas que se revolta. Não fora essa a sua falta básica: a de um amor materno/paterno de qualidade indiscutível, que o tivesse verdadeiramente preenchido. Um afecto incondicional, que não dependesse dos seus atributos ou desempenhos; cuja única condição fosse a de existir e ser filho (necessitado e digno, pois, de um amor total, para além da satisfação narcísica que eventualmente não desse a seus pais). Mas amor esse que só um pai ou uma mãe pode e sabe dar. Que nenhuma mulher ou homem irá oferecer numa relação conjugal; que nenhum amigo, camarada, mestre ou discípulo preencherá. Que só quem ama como mãe ou pai pode fornecer; ou quem possa entender essa falta essencial - alguém muito empático que a sorte lhe possa trazer. O filho é, então, uma espécie de prótese, instrumento ou adorno do pai. Só é valorizado enquanto tal, quando e como desempenha essa função. Função tão essencial para o pai que será maciçamente desprezado se não a executar. A mãe ou o pai narcisista (…) São sanguessugas ou vampiros, provocando uma depleção ou esvaziamento narcísico das crianças. A contrariedade é permanente e as explosões de irritação frequentes; o aborrecimento, o pão nosso de todos os dias. De quando em vez apaixonado no exercício de uma das pulsões (de ligação infantil ou de exploração emancipadora), cedo vem o tédio e esmorece - foi chão que deu uvas mas já não dá - ou rapidamente se amedronta e desiste - é areia de mais para a sua camioneta. Facilmente responsabiliza os outros pelo seu insucesso e ressente- se se não o apoiam nos seus insensatos empreendimentos. Mas fica muito envergonhado quando as coisas lhe correm mal, agravando a sua inibição; e com ela, a frustração e consequente raiva acrescida. O paradigma da psicopatologia já não é o das doenças heredoconstitucionais, mas o da patologia infecto-contagiosa: há agentes patogénicos outras pessoas - e contágios - a identificação. A capacidade de empatia do psicoterapeuta é o seu melhor instrumento de análise; paciência, impavidez e tolerância à espera, o que lhe permitirá uma contratransferência serena, não intrusiva e promotora de desenvolvimento; o amor à verdade, o que sempre o deverá conduzir. A ansiedade explicativa e o furor interpretativo são indicadores de ignorância, imperícia e vício de técnica. Mas a inércia, inibição ou incapacidade de resposta não serão menos gravosas. Um ponto de vista de psicologismo radical, desprezando qualquer possibilidade de tratamento médico - mesmo que complementar da psicoterapia - é, em face dos actuais conhecimentos de neurofisiologia, neuroquímica e patologia do sistema nervoso central, uma atitude não científica e profundamente ideológica. A condição borderline exige um trabalho terapêutico persistente e longo, sereno e consequente. Não é tarefa para aprendizes de feiticeiro («psicoterapeutas de aviário» - isto é, feitos à pressa e à pressão) nem para psiquiatras precipitados e desejosos de soluções rápidas com tendência à passagem ao acto, como os próprios pacientes. A condição borderline exige um trabalho terapêutico persistente e longo, sereno e consequente. Não é tarefa para aprendizes de feiticeiro («psicoterapeutas de aviário» - isto é, feitos à pressa e à pressão) nem para psiquiatras precipitados e desejosos de soluções rápidas com tendência à passagem ao acto, como os próprios pacientes.