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GLOSSÁRIO

DE
SERVIÇO DE ENTREGAS DA
KIKI
魔女の宅急便

MIRAI FANSUB
Glossário de Serviço de
Entregas da Kiki

Textos:
LEVEIN
HASEO
A obra
Majo no Takkyuubin ou Kiki’s Delivery Service é baseado no honô­
nimo livro de Eiko Kadono com ilustrações de Akiko Hayashi, publicado
em 1985. A adaptação para filme, lançada em 1989, surgiu como um pro­
jeto de novatos do Studio Ghibli, mas logo foi assumido pelo aclamado
Hayao Miyazaki, não satisfeito com o seu andamento.
Internacionalmente, o filme foi distribuído pela Disney, que, embora
fiel a maior parte do enredo, tratou de torná-lo mais atraente para o pú­
blico infantil, inserindo falas e trilhas sonoras inexistentes no original.
Lançado em 1998, conta com Kirsten Dunst na voz de Kiki, e foi dedica­
do a Phil Hartman, voz de Jiji, que faleceu logo após a dublagem. A edi­
ção brasileira foi feita com base nesta, e ficou restrita a raras exibições
na TV fechada.
Eiko Kadono
Nasceu em 1 de Janeiro de 1935, e for­
mou-se em literatura inglesa na Universidade
de Waseda. Iniciou sua carreira com o livro
“Brazil and my friend Luizinho”, inspirado
em um menino que adorava samba que ela
conheceu em sua estadia no Brasil durante
os anos 60.
Além de Majo no Takkyuubin, publicou
diversos livros e séries de livros infantis. Eiko segurando o último volume de
Majo no Takkyuubin, em 2009.
Diferenças entre o livro e
o filme
O livro consiste em histórias curtas e fechadas sobre as pessoas
que Kiki conhece em seu serviço de entregas. Miyazaki tenta dar line­
aridade a essas histórias adicionando conflitos inexistentes no original,
transfe­r indo o foco para amadurecimento, rompendo com o ideal de in­
dependência apresentado no livro.
Kiki perde seus poderes, ponto em que passa a desenvolver-se sem
o seu “outro eu” – o gato Jiji. Segue-se então a cone­
xão que ela desenvolve com a cidade e seus habitan­
tes representado com o acidente do dirigível.
Tais mudanças foram desaprovadas pela autora,
e quase impediram que o projeto saísse do papel. Ela
foi finalmente convencida ao visitar o estúdio.
Após o lançamento do filme, foram lançados
outros cinco livros que dão continuidade ao primeiro.
A série foi finalizada em 2009 com Kiki preparando
seus filhos gêmeos para saírem de casa. Capa do livro original.
Contexto
Majo no Takkyuubin se passa em uma Europa alternativa durante os
anos 50, onde a Segunda Guerra jamais ocorreu.
Miyazaki afirma que Koriko ­– a cidade que Kiki escolhe para viver –
é uma mistura de Lisboa, Estocolmo, Nápoles e São Francisco, onde um
lado parece ser banhado pelo Mar Báltico e o outro pelo Mediterrâneo.
Para compor a cidade, foram filmados mais de 80 rolos de filmes nas
cidades de Estocolmo, e de Visby, na ilha de Gotlândia na Suécia.
Miyazaki esteve na Suécia logo após ter deixado a Toei Animation
e ido para a A Pro nos anos 70 para a produção de uma série baseada
em Píppi Meialonga - cuja produção não foi autorizada pela autora. Foi
o primeiro país estrangeiro que ele visitou, e Visby parece lhe ter sido
marc­ante.

A torre do relógio de Storkyrkan,


catedral da cidade velha de Esto­
colmo, Gamla Stan; serviu de ins­
piração para a torre de relógio do
filme.
Origem do nome
Takkyuubin é como a empresa de transportes Yamato apelidou seu
serviço de entregas em domicílio. Seu logotipo, inclusive, é uma gata
preta carregando seu filhote. Embora o uso do termo sem autorização no
livro não tenha agradado a empresa a princípio, a produção do filme foi
patrocinada por ela, e o sucesso contribuiu para sua popularidade.

Logotipo da Yamato
Sinos nas árvores
No livro é explicado que Kiki costumava se distrair e perder altitude
durante o voo, chegando a se acidentar em um poste. Os sinos foram uma
forma que sua mãe encontrou para evitar que acontecesse novamente.
Uma das exigências de Eiko Kadono para a produção do filme foi que os
sinos tocassem quando ela partisse.
Fala do Jiji
Na história original, um bruxo e seu gato preto crescem juntos desde
a infância, e podem se entender devido à intensa relação que se estabe­
lece entre eles – e não por causa da magia propriamente dita.
O amadurecimento de Jiji e Kiki como indivíduos separados é que
faz com que eles não possam mais se comunicar e isso não deve distan­
ciá-los, mas sim uni-los de uma maneira diferente.
Costumes dos bruxos
No livro é explicado que, um bruxo por cidade, assim como a parti­
da aos 13 anos, foram medidas para formar bruxos o mais cedo possível,
propagando sua cultura a mais lugares, e evitando que fossem extintos.
O mundo visível e o mundo invisível
Por Eiko Kadono, autora do livro Majo no Takkyuubin

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Sobre minha infância, vivida em uma área antiga de Tóquio há sessen­


ta anos, lembro-me de que o mundo visível e o invisível eram muito inter­
ligados. Acredito que isso acontecia devido à casa em que morávamos.
A casa tradicional japonesa é construída sobre estruturas colunares.
Os espaços entre as colunas são preenchidos com paredes sólidas ou
movíveis, de modo que, se assim desejarem os moradores, pode haver
muitos espaços abertos por toda a casa. Desta forma, a construção não
é feita para garantir aos moradores uma fortaleza resistente contra os
perigos externos, mas sim para que os moradores possam estar sempre
em contato com a natureza presente nos arredores.
Os moradores estabelecem, de fato, uma intensa relação entre a na­
tureza e seus espíritos com poderes ocultos. Todos os ruídos provenientes
do lado de fora da casa também fazem parte da vida que há dentro dela.
Talvez seja por isso que tanto a nossa língua quanto nossa literatura são
muito ricas em onomatopéias que expressam os sons e as impressões que
captamos do meio ambiente.
E como eu passeava livremente entre as paisagens naturais e a hu­
manidade de minha casa, passei a refletir profundamente sobre essa in­
tensa ligação entre o mundo invisível – místico –, e o visível – real. Até
hoje os espíritos da natureza e daqueles que já partiram fazem parte de
minha rotina e pensamentos, acredito eu.
Ao meio-dia, por exemplo, observamos os rituais do que chamamos
de Obon, uma comemoração da visita dos espíritos ancestrais da família
em nossa casa que acontece durante o sétimo mês do ano. Ao pôr-do-
sol do primeiro dos três dias de duração do Obon, a família se reúne e
acende uma espécie de sinal de fogo para os espíritos. Conta-se que eles
estão acostumados a viajar sobre fumaça e cinzas; nesta data eles pas­
sam do mundo invisível para o visível.
Em minha casa, costumávamos abrir
todas as janelas e portas para receber
bem os espíritos que porventura com­
pareciam. Melhor que o Papai Noel, que
entra ape­nas por meio de chaminés nas
casas, nossos espíritos conhecidos po­
dem entrar por quase qualquer lugar!
Minha mãe faleceu quando eu
tinha apenas quatro anos de idade, e
desde então passei a pensar apenas em
seu espírito quando chegava a época do
Obon. Meu pai, juntando firmemente as
mãos e virando-se em direção ao fogo
que acendíamos, murmurava suas pre­
ces: “Sejam bem vindos, queridos an­
cestrais. O piso de casa está mais alto este ano, tomem cuidado para não
tropeçar quando entrarem”. Ou “Nós reformamos um pouco a casa, por
favor não se percam”. Ouvindo atentamente meu pai, como a pequena
criança que eu era, sempre me convencia de que minha mãe estava nova­
mente conosco no Obon – embora não pudesse vê-la.
Por causa dessa antiga maneira de construir as casas, com numero­
sas aberturas, o “mundo invisível” estava sempre dentro, ligado aos mo­
radores. Os dois mundos coexistiam lado a lado, com uma boa convivên­
cia.
O avanço da ciência e a modernização têm mudado e adaptado nos­
sas vidas em muitos aspectos. No entanto, todo este progresso afetou não
apenas o nosso mundo, como também os outros – as distâncias entre eles
aumentaram. Pessoas que viveram nos tempos anteriores à moder­nização
acreditavam que havia certamente uma linha contínua que ligava nosso
mundo a outro oculto. O interesse das pessoas, entretanto, começou a se
fixar apenas no mundo que podemos ver com nossos próprios o­lhos. Va­
lorizam-se mais as respostas objetivas, as coisas quantificáveis, a produ­
tividade e eficiência.
Será que poderemos seguir agindo e pensando dessa forma? Foi o
próprio fato de termos conservado estes dois mundos em mente que nos
tornou diferentes de outros animais!
Uma das histórias que escrevi é sobre uma bruxinha de treze anos
de idade que representa a ponte entre os dois mundos. A obra se chama
Majo no Takkyuubin. Kiki vive neste mundo moderno, e o único aparato
de bruxaria que consegue usar é sua vassoura voadora. Apesar desta
limitação, a garota tem o papel importante de mostrar às pessoas que
ainda há e pode haver mistério e magia neste mundo.
Usando o voo como a especialidade mágica que possui, ela começa
um serviço de entregas, transportando não apenas o que podemos ver,
como também o que não podemos. Em outras palavras, Kiki é uma inter­
mediária entre os mundos visível e invisível.
Sendo sincera, sinto-me um pouco desconfortável ao falar sobre dois
mundos distintos usando as palavras “visível” e “invisível”. Os dois são,
afinal, inseparáveis, confundem-se entre si – justamente como os sentia
quando era apenas uma pequena garota durante o período do Obon.
Imagine uma criancinha curiosa refletindo sobre uma flor ou uma
pedra: uma única flor compreende o mundo visível e o invisível juntos – é
todo o mistério que a vida pode trazer! Assim como uma pequena pe­
dra carrega consigo toda a história de seu surgimento: o desconhecido é
parte da magia.
Como um proces­
so natural do que se diz
“amadurecimento”, a cri­
ança aprende a discernir
a diferença entre os dois
mundos. Gradualmente,
perdemos nossa capaci­
dade de identificar o invi­
sível, mas todo o mistério
da criação continua exis­
tindo em tudo.
Kiki carrega consigo pacotes com diversos tipos de encomendas
de uma pessoa a outra, e neste processo consegue perceber a riqueza
do mundo das coisas invisíveis. Esta história é sobre o crescimento da
personagem por meio de tais experiências. O que Kiki descobre – ou
redescobre – é que ambos os mundos
são indispensáveis para nossas vidas.
Juntos, eles orientam nossa imagi­
nação e aumentam nosso respeito e
admi­ração pelos outros seres e pes­
soas. As próprias histórias, como a de
Kiki, nunca poderiam ter surgido sem
que houvesse esta harmonia entre os
mundos visível e invisível.
No próximo ano, a história de Kiki
e de seu serviço de entregas será pu­
blicado em inglês e italiano. Espero que
muitos de vocês possam ter a chance
de lê-la.
A literatura infantil não é capaz
de transformar o mundo de uma hora a
outra, mas eu acredito que nela encon­
tra-se o poder da mudança. As histórias
infantis não podem ser tocadas e influenciadas por ideologias. Seu papel
é reviver o mistério, atiçar a curiosidade, a criatividade saudável, e apoiar
as experiências que surgem com a vida e que são diferentes para cada um
de nós.
Expectativas e o espírito das jovens
japonesas contemporâneas
Por Hayao Miyazaki, roteirista, diretor e produtor.
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A história original de Majo no Takkyuubin é um


bom livro da literatura infantil que discorre sobre a
distância entre a dependência e a independência, a
qual se faz presente nos desejos das atuais garotas
japonesas.
Os personagens de histórias infantis, depois de
enfrentarem dificuldades, conquistavam sua inde­
pendência financeira ao mesmo tempo em que ama­
dureciam. Mas na sociedade contemporânea, onde
qualquer um pode ganhar dinheiro pulando de bico para bico, isso não
pode ser mais visto em conjunto. A pobreza pode ser tanto financeira,
quanto espiritual.
Enquanto deixar a segurança de casa não traz vantagens, e viver
com estranhos limita-se a ir a uma loja de conveniência, a busca pelo
sentimento de independência por meio da descober­t a de seus talentos e
a expressão de suas ideias tornaram-se mais dificil do que nunca.
Em uma época em que as habilidades de uma bruxa não vão muito
além das de uma menina nor­
mal, a heroína de 13 anos, Kiki,
destaca-se apenas por saber
voar. Sua tarefa é viver por um
ano em uma cidade desconhe­
cida, exercitando seus talentos,
e sendo reconhecida pelas pes­
soas como uma bruxa de ver­
dade.
É como alguém tentando ser desenhista vindo viver so­zinho em
Tóquio. Estima-se que mais de 300 mil jovens tenham essa ambição. É
uma profissão que deixou de ser incomum, por sua facilidade em começar
e estabelecer-se. Uma caracte­r ística da vida moderna é que a partir do
momento em que você satisfaz suas necessidades da vida diária, começa
o problema de conseguir se auto-realizar. Kiki é protegida pela velha –
apesar de bem cuidada – vassoura de sua mãe, carrega o rádio que ga­
nhou de seu pai, e é tão íntima do gato preto que ele chega a fazer parte
dela, mas seu coração oscila entre solidão e carência por afeto humano. A
vida de Kiki é um reflexo de tantas jovens japonesas que mesmo amadas
e apoiadas financeiramente por suas famílias, buscam sua independencia
no brilho da cidade com pouca determinação e compreensão.
No original, o círculo de amizades crescia à medida em que ela re­
solvia os problemas com seu bom coração. Algumas mudanças foram ne­
cessárias ao transformar isso em
filme. O desenvolver de seus talen­
tos sem dúvidas é encantador, mas
a realidade de se ter uma garota na
cidade grande não é tão simples.
Um dos grandes problemas é não
se sentirem apoiadas ao tentar que­
brar as barreiras da independência.
Achamos, portanto, que devería­
mos dar maior atenção a isso no filme, criando um ambiente mais real­
ista em que Kiki passa por dificuldades e sente-se sozinha.
Ao concebermos Kiki, tínhamos a imagem dela sobrevoando uma
cidade grande à noite, com as luzes brilhando, mas nenhuma para aco‑­
lhê-la. Apesar de voar lhe trazer liberdade, ela está só e aflita. Nossa
heroína identifica-se com a capaci­dade de voar. Os poucos desenhos so­
bre bruxas colocavam tal condição como uma realização de um sonho,
tornando-as ídolos sem dificuldades. Para a bruxa de Majo no Takkyuubin,
não é tão conveniente. Seus poderes não a tornam especial.
Planejamos um final feliz.
Kiki sobrevoa a cidade sentin­
do-se feliz por ter criado laços
com as pessoas abaixo, e por
poder ser ela mesma. Espera­
mos que o filme não deixe isso
em aber­to, e de fato convença
de que é um final feliz.
Espero que os jovens se­
jam influenciados por esse
sentimento solidário, inclusive
as meninas que vivem no mundo a­t ual, que quando ainda esbanjam to­
talmente a alegria da idade, estão ao mesmo tempo livres e dependentes.
Todos já fomos jovens, e temos companheiros de equipe passando por
isso. De toda forma, o filme pode ser visto apenas como entretenimento,
e mesmo assim sinto que irá cativar os espectadores.
Fontes e referências
The art of Kiki’s Delivery Service

Página oficial de Eiko Kadono – http://kiki-jiji.com/hoge/

GhibliWiki – http://www.nausicaa.net

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