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Sumario déste nimero pitario deste numero FPITORIAL: Expediefo Cientifiea ao Sudoeste do Estado da Bahia — Eng.° CHRISTOVAM LEITE DE CASTRO (pig. 345). COMENTARIO: Os Dados Morfol6gicos Preliminares — Prof. DELGADO DE CARVALHO (phg. 347). #RANSCRIGOES: Consideragées preliminares sdbre a G8nese e a Distribuicso dos Solos do Estado de Sio-Paulo — LUIS FLORES DE MORAIS REGO (pag. 351). — A Evolugio dos ‘Transportes no Brasil para a Aviagio — PIERRE DEFFONTAINES (p4g. 370). RESENHA E OPINIOES: Caracteristicas do relévo nordestino (regifo litordnea) (p4g. 377). — A evolugko industrial dos Estados-Unidos (pig. 301). — Questées demogriticas francesas (Ag. 398). — As zomas de pesca no Estado da Bahia (pig. 405). — A planta atormentada da cidade (pég. 409). — Demografia brasileira (pég. 410) — Nova chmara zenital para determi- nar Pontos sobre o mapa (pag. 411). — Reservas mundias de energia hldrdullea. (pag. 412) — A pororoca (pég. 414). — Adjunto ou mutirio (pig. 415). CONTRIBUICAO AO ENSINO: Clima do Brasil — Prof. FABIO DE MACEDO SOARES GUIMARAES (pag. 417). TERTOLIAS GEOGRAFICAS SEMANAIS: Centésima oltava tertilla, reallzada em 4 de malo de 1945 (phe. 434). — Centésima nona tertiita, reallzada em 11 de maio de 1945 (bog. 444). — Centéstma décima tertilla, reallzada em 15 de malo de 1945 (pég. 448). — Centésina décima Drimelra tertilla, realizada em 22 de mato de 1945 (pag. 451). NOTICIARIO: CAPITAL FEDERAL — Presidéncia da Republica (pég. 454). — Instituto Brasileiro Ge Geografia ¢ Estatistica (pég. 454). — Conselho Nacional de Geogratia (pig. 455). — Minis férlo da Agricultura (pig. 459). — Ministérlo da Aerondutica (pég. 450), — Ministérlo da Bducaso © Sade (pég. 459). — Ministério da Guerra (pAg. 460). — Minlstério da Justica © Nesécios Interlores (pg. 460). —- Ministérlo do Trabalho, IndGstria e Comérclo (pig. 461). — Ministério das Relagdes Exteriores (pig. 461). — Prefeltura do Distrito Federal (pag. 462). INSTITUIGOES PARTICULARES — Consetho Federal de Engenharia e Arquitetura (pig. 462), ~ Clube de Engenharia (pég. 462). — Clube Militar (pég. 463). — Comité Democratice Afro-Brasileiro (pAg. 463). — Instituto Histérico © Geogritico Brasileiro (pés. 4€3). — Instituto Oceanogréfico Brasileiro (pag. 464). — Liceu Literérlo Portugués (pég. 464). — Sociedade de Geogratia do Rio-de-Janciro (pg. 464). — CERTAMES — Conferéncla das Classes Produtorag (pég. 465). — UNIDADES FEDERADAS — Bahia (pég. 475). — Espirito. Santo (pég. 476). — Minas-Gerais (pAg. 476). — Rio-de-Janelro (pAg. 477). — Santa-Catarina (4g. 477). — Sho-Paulo (pég. 477). — MUNICIPIOS — Goldnia (pig, 478), — Sfo-Paulo ‘pag. 478). — EXTERIOR — Inglaterra (pég. 478). & Bikes z ad i igi BIBINOGRAPIA-*REGISTOS _E. COMENTARIOS BIBLIOGRAFICOS — Livros (pig. 480). — Te nssgeitce erection hte Ge mrs teen ee eee aes eer een ee ea LEIS E RESOLLCOES: LEGISLACAO FEDERAL — Ementério dos decretos-lels publicados no més de maio de 1945 (pig. 490). — dntegra da legislagio de interésse geogrifico — Decretos~ eis (pg, 495). — Decretos (pig. 501). — Atos diversos (pig. 502). — LEGISLAGAO ESTA- DUAL, — Integra dos decretos, decretos-lels ¢ demais atos de interésse geogritico — Amazonas (pag. 504). — Mato-Grosso (phg. 504), — Minas-Gerais (pig. 505). — Park (pég. 505). — Sergipe (pig. 510), — LEGISLAGAO MUNICIPAL — fntegra dos decretos, decretos-lels ¢ demais atos ce interésse geogritico — Belém (Paré) (pég. 511). — RESOLUQOES DO INSTI- PUTO BRASILPTRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA — Conselho Naclonal de Geogratia _— DIRFTORIO CENTRAL — integra das Resolugdes ns. 185 e 186 (pig. 512). — DIRETORIOS REGIONAIS — Rio-de-Janeiro — integra das Resolugées de ns. 31 a 40 (PAs. 513). Boletim Geografico Ano III | JUNHO, 1945 | Ne 27 Editorial Expedigdo Cientifica ao Sudoeste do Estado da Bahia Com a Resolucéo n° 188, de 18 de abril de 1945, decidiu o Diretério < Central do Conselho que se incluisse no programa dos trabalhos de campo de 1945 a expedicao de levantamentos ao sudoeste baiano. A expedicéo tem os seguintes objetivos: 0 levantamento de coordenadas feogriticas de pontos escolhidos, a determinacéo da declinag&o magnética dos mesmos pontos, 0 levantamento preciso dos caminhamentos dos roteitos eo seu nivelamento barométrico, 0 reconhecimento das regides marginais, 0 estudo geolégico, geomortolégico e de interpretacdo geogratica da zona, a tira- gem de fotogratias documentais, o desenho duma carta da regiao. H& no empreendimento trés aspectos interessantes, a merecerem consi- deracao neste breve comentario: o da continuidade, o da cooperacao interadmi- nistrativa e o do tipo da expedicao. Com efeito, digno de realce 6 0 fato da expedigéo de 1945 ser a conti- nuac&o das expedicées levadas a efeito nos trés anos anteriores: em 1942, quando se levantou a regido da divisa entre os Estados de Goiés e Bahia; em 1943, em que se estudou a zona do Jalapao, nas cercanias das lindes entre os Estados de Goiés, Bahia, Piaui e Maranhéo; em 1944, pela qual se conheceu bem a zona oeste baiana entre o divisor de aguas Sao-Francisco- Tocantins, a oeste, o divisor rio Grande-rio Préto, ao norte, 0 rio Sao Fran- cisco, a leste, e a bacia do rio Corrente, com o seu formador mais setentrional, © tio Guaré, ao sul. Essa cadeia de emprésas anuais, que agora entra no seu quarto ciclo de producao, 6 exemplo de continuidade objetiva, é demonstragéo do éxito do esférco pertinaz a servico duma obra planificada, 6 prova da possibilidade da realizacdo de planos agigantados apesar dos recursos limitados, é entim vitéria do espirito e do engenho humano a vencer o proprio tempo, de si tao corrosivo 4 continuidade do estérgo de natureza coletiva, como éste. A enobrecer e engrandecer ésse esférgo continuado, hd a assinalar a particularidade interessante das sucessivas campanhas anuais se terem reali- zado em regime de cooperacao interadministrativa, pela conjugacéo dos es- forgos do govérno do Estado da Bahia e do Conselho Nacional de Geografia. 346 BOLETIM GEOGRAFICO Essa cooperagéo exemplifica as maravilhas a finalidade mesma do Con- setho, criado para articular as atividades geogréticas, do pais, em proveito do melhor conhecimento do territério patrio; além disso, a cooperacao oferece exemplo dignificante de cultura, compreenséo e patriotismo, mormente em pais novo como 0 nosso, em que os recursos incipientes devem ser aproveitados bem, sem duplicagdes custosas ou desperdicios lamentéveis, ao contrario, quanto possivel racional e racionadamente. Em tal pensamento se encontra também inspirado 0 tipo escolhido para a expedicao, 0 qual, segundo se verifica facilmente, é mui satisfatério e adequado. © trabalho geografico do Brasil, em face da imensidao do territério a levantar e da exigiiidade dos recursos disponiveis, deve preferentemente ser executado segundo processos de levantamento de custo baixo e de execugao répida, dentro de um grau minimo de preciséo da medida que atenda as nossas necessidades técnicas. Essa linha média em que se ajustem da melhor maneira as condicionantes antagonicas do levantamento do territério — de um lado, 0 rigor da operacao, e doutro lado o seu custo e o tempo da sua execugdo — hhé-de ser a permanente preocupacao dos responsaveis, administradores e diri- gentes dos servicos geogréticos brasileiros, no patriético objetivo de aplicar os recursos com o rendimento méximo, dentro da precipua finalidade da maior utilidade dos empreendimentos. O tipo da expedicéo do sudoeste baiano é, nesse particular digno de consideracdéo. Basta que se balanceiem os resultados da expedicéo de 1944, os quais assim se podem resumir: em 5 meses, foram levantados 56 000 qui- Jémetros quadrados, ao preco de cérca de Cr$ 4,00 por quilémetro quadrado, compreendendo a determinacao das coordenadas geograticas de mais de 40 Jocalidades, a declinagao magnética de 10 locais, a altitude de 537 pontos, o Jevantamento e o nivelamento preciso de 4900 quilémetros, resultando, de tudo uma carta da regiéo na escala de 1:250 000, com curvas de nivel espa- gadas de 50 em 50 metros. ‘A organizacéo da campanha de 1945, planificada nos mesmos moldes, beneficia-se da experiéncia do estérco anterior, o que permite prever resultados melhores, seja na quantidade, seja na qualidade da producao. CurIstovaM LEITE DE CASTRO Secretério Geral do Consetho Nacional de Geografia Comentario Os Dados Morfolégicos Preliminares* Prof. DELGapo DE CaRVALHO Membro do Diretério Central do Conselho ‘Nacional de Geogratia Uma cousa que muito me impressiona, na convetsa didria é a insisténcia iniclal, quando € entabolada, em referéncia a temperatura, A chuva ou a umidade. A discussio do tempo assume a importancia de um assunto de Estado, quando o interlocutor é sdito britanico... Mas mesmo entre nacionais, discuti- mos calor e frio, sol e chuva até ocorrer ao espirito de um dos presenies algu- ma cousa de pratico, de mais sensacional, que envolva responsabilidades maiore: Sim, porque uma das caracteristicas da conversa anddina sdbre tempo é de nao acarretar responsabilidades: todo mundo fala do tempo e ninguém faz nada para modifica-lo, Este género de discusses me lembra muito as que se travam entre nés a Tespeito de ensino de geografia. Todo mundo tem boas idéias, todos deploram Qs atrasos e os métodos inadequados, como se féssem chuvas, trovoadas ou inun- dag6es, mas, terminada a palestra, cada um trata de seus afazeres e nada do que fol pregado é jamais aplicado. Os nossos geégrafos quando falam de meto- dologia geografica julgam que estao discutindo tempo e. que, em conseqiiéncia hada se pede fazer para altera-lo. Geograficamente continuam ao sol ou & chuva, com paciéncia ¢ resignacao. Entretanto, se nada pode ser tentado em relacao a0 tempo, o mesmo nao se d4 em relacdo a geografia. Multos me responderéo que uma andorinha nao faz verdo, que os mé- todos tradicionais estao muito profundamente arraigados, que alteracdes impor- tam em mudan¢as no proprio corpo docente, esforeos individuais, estudos novos, dccumentacao dispendiosa, as vézes e que, na realidade o que pedem os progra. mas € que constitui norma e pontos obrigatérios. Em suma, quando é sugerida uma inovagdo metodolégica, ela é recebida com flores, mas é, na pratica, posta de lado, como sendo puramente motivo de ornamentacio. % muito possivel, € mesmo provavel que haja um fundo filosdfico, no as- Pecto conservador em materia de ensino geografico. A independéncia do professor, ha interpretagao do programa, nao é completa, infelizmente... ou felizmente, também, pois a mesma navalha pode servit para barbear, fazer ponta de lapis € cortar 0 dedo. Vejam bem, prezados colegas, que nao estou aqui fazendo uma classificagao: sio exemplos, apenas. © meu objetivo € falar hoje nfo nos diferentes meios & nossa disposi¢io Para controlar o tempo, mas nos que se oferecem a nos para melhorar prati- camente 0 nosso ensino, as nossas aulas, o nosso trabalho diario. Principiarei por uma pratica que resulta de experiéncia pessoal. Refiro-me 0 papel que cabem aos dados morfoldgicos preliminares. Quando eu acrescen- to & expresséo dados morfolégicos o adjetivo preliminares, eu sei que vou en- frentar criticas, mas eu tratarei de justificar 0 qualificativo. Antes de tudo, meus colegas, uma répida inspecao dos programas de geo- grafia. Que vemos nos, entre outras coisas? A auséncia absoluta de verbos. Nos programas, em regra, nao ha verbos. Bles tém isso de comum com os cardapios € com as receitas.médicas. Nao tém verbos “Erosio fluvial — regime dos rios, com exemplos brasileiros” diz o programa da 1. série, “Descrigéo sumaria de cada continente de acérdo com as regides naturals” diz o da 2.8 série: “Formacao das cidades” diz o da 3.* e assim por diante. Palestra pronunciada no Curso de Geografia dado pelo autor, ao microfone da na Universidade do Ar, 48 BOLETIM GEOGRAFICO Ora, semelhantes locueées, ou frases incompletas, constituem verdadeiros - titulos. Podem ser titulos de dissertagées sobre o assunto, titulos de livros ou de sonetos. Varia o critério com o propésito em vista ou a inspiracéo. “Formago Ge cidades” dizia eu, ha pouco: vejo perfeitamente um soneto a éste respeito, mais ainda, um poema. E quantos poemas épicos classicos nao cantaram fun- dagdes de cidades! : ‘Mas nfo tratamos aqui de poesia, Mencionei apenas a forma sob a qual se ex- primem os imperativos do programa. Um simples estudo de cada uma destas Jocugdes mostra que nelas se acham implicitamente incluidas muitas proposi- goes Telativas ao assunto. Cabe exatamente ao professor analisar 0 pensamento expresso no programa em estilo telegrafico. Ha pois um plano preliminar, talvez guiado pelo manual adotado, que docente e discentes devem ter em vista. Nao Se trata mais, na realidade, de determinar os objetivos da unidade de trabalho nem 08 processos a utilizar, mas de estabelecer as fases sucessivas do estudo. Ora, h4 em geografia fisica, como ali4s em geografia humana, um certo ntimero’de critérios fundamentais que podem variar um pouco de um ponto para outro, mas conservar o seu valor significativo em cada um déstes ramos da geografia. Creio que meu pensamento precisa ser elucidado, s6 mesmo com exemplos passara a ser mais claro. Tomemos a geografia fisica, como caso a examinar. A idéla que procuret expressar fol a seguinte: em todos os pontos de geografia fisica, existe uma se~ qiéncia légica de assuntos correlatos que precisam ser sucessivamente encarados, examinados e estudados. Quer trate o ponto de relévo, de litoral, de rios, de ve- getacio ou de clima, o processo sera, se néo 0 mesmo, pelo menos andlogo e igualmente necessdrio. Nestas condigées, julgo oportuno recomendar a meus colegas da geografia uma especial atencao para os dados morfoldgicos preliminares. Quase todos os autores estrangeiros estéo de acérdo sdbre a necessidade de semelhantes dados, nem todos, entretanto, os julgam “preliminares”. Meu amigo e colega, Preston James, por exemplo, publicou um compéndio de geografia geral e regional, em que os dados morfoldgicos vém no fim, em apéndices. O objetivo déste método é de 56 generalizar quando a atengao e o interésse do educando tiverem sido suficiente- mente despertados por descrigées vividas de grandes regiées humanas em que solo, clima, vegetagao, constituem 0 quadro. O nosso atual programa nao prevé esta inversdo dos assuntos, os nossos compéndios nao os apresentam déste modo @ 0 nosso corpo docente sé se tem arriscado em tent-lo no ensino elementar. O processo néo deixa de ser interessante, mas constitui tamanha inovacao entre nés, que eu ndo encontraria bases suficientes para recomenda-lo. A sua discussao, entretanto, seria das mais proveitosas, sob o ponto de vista metodoldgico. Por conseguinte, repito, os dados morfologicos seriam de preferéncla prelt- minares. Devem, a meu ver, preceder todos os capitulos principais da fisiografia. © capitulo das “Aguas correntes”, vulgarmente chamado de hidrografia, & Jégicamente constituido de duas partes essenciais: 1° uma morfologia — 2° ‘uma nomenclatura descritiva, Devera assim ser se éste capitulo pertence a um curso da geografia fisica ou a um curso de geografia do Brasil. Examinemos o caso de uma geografia do Brasil. A introducéo morfologica & indispensavel. O conhecimento que os alunos tém sobre vertentes, bacias, clas- Sificacdo de rios e ciclo vital constituem a base. Mas éstes dados deverao ser, desta vez, encarados sob o ponto de vista da geografia patria. 1. A primeira aplicacéo dever4 pois ser uma explicacio das origens das dguas fluviais entre nos, de chuvas e de neves andinas, uma resenha climatolo- gica para explicar a distribuicao no decorrer do ano, um estudo dos centros de persdo. 2, Em seguida, uma idéia sobre os tipos de rios perenes ou temporarios, de planaito ou de planicie. Uma sumérla distribuicao das quedas e da energia hi- drulica, comparadas as cachoeiras mais importantes. 3. Em tercetro lugar, penetra-se na morfologia prépriamente dita que ¢ a caracterizacéo das formas fluviais. Os estudos sucessivos, com aplicagdes no Brasil, deverao ser: a formacdo de cafitons, como nos afluentes paranaenses do rio Parana — as formagées lacustres, com uma discriminagao da génese dos 48 BOLETIM GEOGRAFICO Ora, semelhantes locug6es, ou frases incompletas, constituem verdadeiros - titulos. Podem ser titulos de dissertacées sbre o assunto, titulos de livros ou de sonetos. Varia o critério com o propésito em vista ou a inspiragao. “Formacao de cidades” dizia eu, ha pouco: vejo perfeitamente um soneto a éste respeito, mais ainda, um poema. E quantos poemas épicos classicos nao cantaram fun- dagées de cidades! : Mas no tratamos aqui de poesia. Mencionei apenas a forma sob a qual se ex- primem os imperativos do programa. Um simples estudo de cada uma destas Jocugdes mostra que nelas se acham implicitamente incluidas muitas proposi- gGes relativas ao assunto. Cabe exatamente ao professor analisar 0 pensamento expresso no programa em estilo telegrafico. H4 pois um plano preliminar, talvez guiado pelo manual adotado, que docente e discentes devem ter em vista. Nao se trata mais, na realidade, de determinar os objetivos da unidade de trabalho nem 08 processos a utilizar, mas de estabelecer as. fases sucessivas do estudo. Ora, h4 em geografia fisica, como alias em geografia humana, um certo néimero’de critérios fundamentais que podem variar um pouco de um ponto para outro, mas gonservar o seu valor significativo em cada um déstes ramos Ga geografia. Creio que meu pensamento precisa ser elucidado, s6 mesmo com exemplos passara a ser mais claro. ‘Tomemos a geografia fisica, como caso a examinar. A idéia que procurel expressar foi a seguinte: em todos os pontos de geografia fisica, existe uma se~ qiiéneia légica de assuntos correlatos que precisam ser sucessivamente encarados, examinados e estudados. Quer trate o ponto de relévo, de litoral, de rios, de ve- getacdo ou de clima, o processo sera, se néo o mesmo, pelo menos andlogo € igualmente necessério. Nestas condigées, julgo oportuno recomendar a meus colegas da geografla uma especial atencdo para os dados morfolégicos preliminares. Quase todos os autores estrangeiros estéo de acérdo sobre a necessidade de semelhantes dados, nem todos, entretanto, os julgam “preliminares”. Meu amigo e colega, Preston James, por exemplo, publicou um compéndio de geografia geral e regional, em que os dados morfoldgicos vém no fim, em apéndices. O objetivo déste método é de 56 generalizar quando a atengao e o interésse do educando tiverem sido suficiente- mente despertados por descrigées vividas de grandes regides humanas_em que solo, clima, vegetagao, constituem o quadro. O nosso atual programa nao prevé esta Inversdo dos assuntos, os nossos compéndios nao os apresentam déste modo e 0 nosso corpo docente sé se tem arriscado em tentd-lo no ensino elementar. O proceso néo deixa de ser interessante, mas constitui tamanha inovacao entre nés, que eu ndo encontraria bases suficientes para recomenda-lo, A sua discussio, entretanto, seria das mais proveitosas, sob o ponto de vista metodoldgico. Por conseguinte, repito, os dados morfoldgicos seriam de preferéncla preli- minares, Devem, a meu ver, preceder todos os capitulos principais da fisiografia. © capitulo das “aguas correntes”, vulgarmente chamado de hidrogratia, & Jogicamente constituido de duas partes essenciais: 1.° uma morfologia — 2.° ‘uma nomenclatura descritiva. Devera assim ser se éste capitulo pertence a um curso da geografia fisica ou a um curso de geografia do Brasil. Examinemos 0 caso de uma geografia do Brasil. A introdugdo morfologica indispensavel. O conhecimento que os alunos tém sdbre vertentes, bacias, clas- Sificacdo de rios e ciclo vital constituem a base. Mas éstes dados deverao ser, desta vez, encarados sob o ponto de vista da geografia patria. 1. A primeira aplicacdo devera pols ser uma explicacéo das origens das guas fluviais entre nés, de chuvas e de neves andinas, uma resenha climatolo- gica para explicar a distribuicio no decorrer do ano, um estudo dos centros de perso. 2, Em seguida, uma idéia sdbre os tipos de rios perenes ou tempordrios, de planaito ou de planicie. Uma suméria distribuicgdo das quedas e da energia hi- draulica, comparadas 4s cachoeiras mais importantes. 3. Em terceiro lugar, penetra-se na morfologia propriamente dita que é a caracterizagéo das formas fluviais. Os estudos sucessivos, com aplicagdes no Brasil, deverdo ser: a formacdo de cafions, como nos afluentes paranaenses do rio Parana — as formagées lacustres, com uma discriminagao da génese dos COMENTARIO 349 Jagos amazénicos a formacdo de deltas e correspondente discussio para os casos do Amazonas e do Parnafba, 4. Em quarto lugar, uma classificagdo das bacias fluviais, segundo a Area, a extenséo comparavel, ete, Estes quatro pontos, de desigual extensio, constituem a bem dizer, uma ana- lise de geografia comparada em que entraram todos os elementos constitutivos e cada rio apareceu, por sua vez, quando era examinado 0 seu caso. Feito éste estudo, 0 professor poderé ter a certeza de que os rios do Brasil, j4 adquitiram, no espirito de seus alunos, uma fisionomia propria, uma personalidade, baseada em feigdes distintas que foram salientadas — sao éstes os dados morfolégicos que precedem a nomenclatura e permitem tornar a descrigao subseqiiente, o complemento da primeira parte. Trata-se, pois, nesta segunda parte nfo mais da anélise das formas mas da sintese geral. Ai ent&o podem ser, sem receio, enumerados e descritos os rios brasileiros, Por bacias. Em cada um dos casos, seguir-se-4 uma seqiiéncia também: descricdo do rio tronco, declive, velocidade, aspecto geral, com alguns dados estatisticos tal- vez: estudo de certos fenémenos peculiares (pororoca, repiquetes ou outros) um rapido estudo da foz e, por fim, a enumeracdo (e nao a lista) de seus principais afluentes, com uma palavra caracteristica sobre cada um déles. Ai convém uma grande diserecdo de informacées quantitativas e muito critério na escolha dos detalhes, a fim de nao sobrecarregar a memoria e de interessar 0 espirito. £ indispensavel que cada bacia seja apresentada com feicdes suas, incon- fundiveis, como se se tratasse de familias com historia distinta, profissoes ¢ des- tinos préprios. Esta sintese, parte importantissima do trabalho de exposigao e memoriza- ¢80, a meu ver, sd € possivel, depois de uma cuidadosa analise dos eleméntos formadores do quadro — isto’ é — dos dados morfologicos preliminares. Um estudo morfoldgico das formas de relévo, que possuimos em nosso pais, deve preceder a classificagio dos nossos sistemas montanhosos e a nomenclatura de nossas serras. Do mesmo modo antes de descrever 0 nosso litoral, precisamos reunir os dados morfoldgicos relativos as formas litoraneas que possuimos: bar- reiras, recifes, dunas, costas altas, etc. A mesma coisa em relacdo aos climas: as formas, ai, sdo as influéncias que modificam os fatéres climatolégicos. Sio, em suma, éstes critérios fundamentais, aos quais eu fazia alusio, e que podem variar de um ponto para o outro, mas conservam o seu valor significati- Vo seja em hidrografia, seja em climatologia, seja em relévo ou em estudo de costas. & preciso, é indispensavel uma apresentacao preliminar das formas que Possuimos em cada uma destas categorias — é a geografia comparada, dentro do proprio pais. A integragao vem depois, e s6 se torna elogiiente quando forem lan- gadas as bases morfoldgicas que Ihe servem de explicagao. A meu ver, obrigar alunos a reter nomes préprios de rios, de _montanhas ou de baias e cabos sem dar-lhes, ao mesmo tempo um valor ‘morfologico ex- Plicativo, é voltar ao método antigo da geografia decorada que, além de inex- Pressiva, torna a disciplina odiosa aos educandos e compromete sériamente a idoneidade dos educadores. Reter de meméria simplesmente pelo prazer de re- ter, preferivel sera memorizar a lista telefoniga, entrando assim no dominio das colsas praticas. Na Europa também, houve uma longa era de decoracio em geografia, Lem- bro-me do tempo dos colarinhos altos e dos punhos engomados... Num dia de Prova, as provas eram entao “imparciais”, um colega aflito percorria as lavan- Gerias do bairro para onde tinham afluido todos os rios da Africa em vista do exame... estavam todos nos seus punhos em letrinhas mitidas e a sua me- moéria estava assim sendo enxaguada nos tanques da lavadeira, Era éste 0 bom tempo da escola e da cola! E o pobre candidato enquanto a ciéncia déle estava corando ao sol, s6 se lembrava do Nilo, cujas enchentes o tinham impressiona- do. De todos os rios da Africa, s6 retinha, portanto, o que tinha levado a seu espirito uma feigao morfolégica. Por que tinha éste professor se limitado a enumerar nomes de rios africanos talvez uns vinte ou trinta, quando alguns rios importantes, bem apresenta- Gos teriam sido suficientes ? Por que nao revelara que o rio Niger, nascido nas 350 BOLETIM GEOGRAFICO vizinhangas da costa descrevia um grande arco pelo deserto onde, em vez de erescer e prosperar como em regra fazem os rios, empobrecia e definhava, para vir a ser acudido na sua parte inferior e na foz pelas chuvas equatoriais? Por- que deixara de denunciar a existéncia das belas quedas de Vitéria, como carac- teristicas do rio Zambeze? Por que hesitara em atribuir ao Congo, tipico rio equatorial de planalto, o segundo lugar entre os rios do Globo, depois do Ama- zonas? Por que recuara diante da indiscrecao de insinuar que o rio Orange um depauperado, de génio dificil, torrencial as vézes, outras quase séco, e que escapa do planalto sul semi-drido, por mais de cem quedas? Por que julgara di- famacao referir-se aos rios fésseis da Africa do Norte, & histéria curiosa do rio ‘Shebeli, no Benadir ? Por que enfim, deixava éste professor de lembrar as feicdes morfolégicas dos rios africanos que, pelas analogias que apresentam, os tor- nam membros de uma interessante familia hidrografica ? & que no tempo dos colarinhos altos e dos punhos engomados, havia muito professor de geografia, esforcado mas desprevenido, havia muito compéndio deficiente. A aversdo 4’geografia eu também a senti entio, até ser aluno de um padre dominicano que muito tinha viajado a Africa e me revelou ser a geografia uma coisa viva. Quando novos alunos eram promovidos para. turmas que ensi- nava, éle desconfiava especialmente dos que tinham tido boas notas em geo- grafia; muitas vézes considerava-os como casos perdidos, mas esforcava-se, na medida do possivel, a dissuadi-los de persistir na triunfante mnemotécnica que exibiam a téda hora. A um consulente que o procurava, queixando-se de sua péssima memoria para nomes geograficos, o excelente padre de Mussy dizia com téda sinceridade — “Esta bem certo, meu filho, de ter esquecido tudo? Abso- lutamente tudo? Bem, agora vamos estudar geografia”! BAF 0 Serviso Central de Documentacio Geosrifies. do, Consetho Nacional de, Geoeratia, complete, compreendendo Biblioteca, Mapoteca, Fototeca e Arquivo Corografico, destinando- se éste & guards de documentos como sejam inéditos e artigos de Jornais. Envle ao Conselho qualquer documento que possuir sbbre o territério brasileiro. Transcrigdes Consideracdes Preliminares sObre a Génese e a Distribuicdo dos Solos do Estado de Sao Paulo* Transcrito da revista Geografia, Luis Fores Dg Morats Réco ano I, n° 1, 1935 — So-Paulo Seria ocioso encarecer a importancia do conhecimento da natureza dos solos para a industria agricola. Nao é absolutamente possivel a pratica dos métodos racionais da lavoura sem o conhecimento perfeito das propriedades dos solos, para escolha adequada dos processos de amanho e uso de corretivos apropriados. © estudo dos solos em si é um ramo importante da técnica agronémica, li- gado estreitamente a quimica agricola. Foge 4 seara do autor. Em Sao Paulo encontra-se 0 mais adiantado centro désses estudos no Bra- sil: o Instituto Agronémico de Campinas, onde vém sendo realizadas andlises detalhadas de solos. Iniciado pelo eminente Dr. Dafert, tem agora como diretor © Dr. Teodureto de Camargo, sem favor uma das maiores autoridades brasilei- ras em quimica agricola. Nao € possivel silenciar os importantissimos trabalhos do Dr. Mario Saraiva, diretor do Instituto de Quimica, outro mestre na matéria, infelizmente ainda nao publicados. O objetivo do presente trabalho nao é o estudo dos solos em si, mas apenas expor algumas nogdes sdbre os processos que geraram os solos de Sio Paulo, tentando discriminar as grandes categorias de solos e dar idéia de sua dis- tribuigdo geogratica. Sob 0 ponto de vista geografico, o estudo da distribuicdo dos solos oferece interésse todo particular. Com efeito, os solos juntamente com o clima sdo os fatéres da vegetacio primitiva, a vestimenta como dizem os naturais, um dos atributos essenciais das feigdes fisiograficas. E, sob o ponto de vista da geografia humana, os solos con- dicionam a economia agricola, base da vida do homem. Por isso, a distribuigdo dos solos obedece ou antes é um dos determinantes da divis’o natural, nao sé puramente fisiografica, mas com influéncia poderosa s6- bre as regides naturais na plenitude de sua acepcio, atingindo também as po- pulagdes, sua economia, costumes e organizacao social. © conhecimento geografico de um pais implica o estudo pelo menos perfunc- ae dos solos, uma das causas responsaveis pela diversidade das felgdes geo- graficas. eee N&o 6 necessirio definir o que se entende por solo ou, precisando, solo ardvel: a zona superior incoerente da crosta da terra, suceptivel de ser revolvida nos trabalhos aratorios na qual se desenvolve a maior parte das raizes dos vegetais. Abaixo, segue-se o subsolo ainda, incoerente mas sé eventualmente atravessado pelas raizes. O subsolo passa a rocha alterada ainda coerente, anexa & rocha fresca que constitul o substractum. 352 BOLETIM GEOGRAFICO ESBOGO MOSTRANDO GROSSEIRAMENTE AS DIVISOES E SUB-DIVISOES FISIOGRAFICAS DE SAO PAULO Os materiais constituintes do solo e do subsolo podem derivar da desagre- gacéo da rocha in situ ou de rochas distantes, sujeltos neste ultimo caso os de- tritos ao transporte devido a diversos agentes. Esboga-se a primeira divisdo dos solos, em autéctonos e alotéctonos. Nos pri meiros incluem-se os solos produzidos pela alteracao local das rochas com a eli- minagao de materiais, solos residuais, e os solos formados por agentes organicos no mesmo local, cumuldsicos. Nos segundos ha a considerar diversas modalidades conforme o agente de transporte: a gravidade, solos coluviais; agua com diversas yariantes, solos aluviais; finalmente vento e gélo, os solos edlicos e glaciais. Resume-se a classificacio geral dos solos no quadro seguinte: residuais autéctonos { cumulésicos Solos coluviais aluviais edlicos glaciais No Brasil nao hé solos glaciais visto ndo ter existido glaciago moderna. Nao @ impossivel que certos solos do nordeste da Republica tenham origem eélica. Em Sao Paulo, porém, todos os solos sio autéctonos ou aluviais. Em um solo ha a considerar diversos aspectos, a saber: 1 — composicéo granulométrica ou textura; 2 — estrutura; 3 — permeabilidade; 4 — acidez; 5 — composicio quimica bruta; 6 — péso especifico aparente; 7 — disposi¢ao topogratica; 8 — rocha matriz. | alotéctonos ! TRANSCRICOES 350 Muitos désses aspectos ligam-se intimamente porém nao de maneira com- pleta, de sorte que, cada um imprime ao solo determinadas propriedades con- cernentes ao comportamento em relacio aos fenémenos complexos que cons- tituem a nutrigao das plantas pelas raizes. Considerar os minerais dos solos como argila, calcdreo e elementos das ro- chas em estado detritico importa em aproximacao muito grosseira, Na realidade, nos processos de alteracdo das rochas formam-se compostos peculiares, silicatos e Oxidos, minerais pouco conhecidos, que desempenham papel relevante nos fenémenos evolutivos do solo e também na nutricao das plantas. Sao corpos de peduena estabilidade, que se transformam com facilidade ao sabor das condi- ‘goes gerais do equilibrio fisico-quimico do meio. Grupam-se preliminarmente os solos em provincias correspondentes a re- .gides com a mesma constituicéo geolégica e os mesmos caracteres topograficos, nas quais so idénticos os processos produtores dos solos. Distinguem-se dentro de cada provincia pedolégica as séries e os tipos dé solos. As séries incluem solos tendo a mesma origem, quer em relaco @ rocha matriz quer em relacéo ao processo, submetidos & mesma drenagem, em regides de relévo comparavel. Os tipos si0 as espécies, térmos das séries de textura definida. ‘A variacio da textura provém em grande parte das modalidades dos pro- - cessos de alteracao e de transporte. © processo de formacéio do solo importa na desintegracdo das rochas pelas agées processadas na superficie de contacto da litosfera com a atmosfera, cha- madas genéricamente intemperismo, e na eventual movimentacdo dos detritos produzidos para serem depositados alhures. (Os primeiros fendmenos chamam-se de decomposi¢do das rochas. Processam~ se mercé de acdes fisicas, quimicas e biolégicas, atuando tédas em conjunto. ‘A rocha perde a coesdo e seus elementos sio transformados quimicamente. ‘As ages fisicas e biologics tendem a desagregar a rocha, facilitando grande- mente as ages quimicas que contribuem para o mesmo fim. Os agentes causadores do movimento contribuem também para a desinte- gracdo nos fenomenos denominados de corrasio ao passo que a aco quimica das uas o nome de corrosao. Os fatéres que influenciam a geragio dos solos sio: 1 — Natureza da rocha produtora dos detritos; 2 — Processos de alteracdo dessa rocha; 3 — No caso dos solos alotéctonos, o processo de transporte dos detritos para formar 0 solo. Conforme as modalidades désses fatores, variam os solos dentro-da gama a mais extensa. Posteriormente, a vegetagao, se bem que conseqiiéncia, em agao Teflexa, é capaz, por suas modificagées de fazer variar os solos. © processo de alteracdo é condicionado pela topografia que influi sobre a cireulacéo das aguas e pelo clima que rege os agentes atmosféricos. Os proces- sos de traysporte dependem da topografia e do clima. "Sao complexos os processos de formagao dos solos dependentes de causas milltiplas, em muitos casos de dificil exegese. # claro qué, a mesma rocha pode dar origem a solos diferentes, conforme o clima, a topografia e a drenagem. Pequenas variacdes na textura e na estrutura da rocha, que ndo merecem discernimento em mapa geolégico, tém influéncia sensivel sobre os solos gerados. Nos solos eluviais, a influéncia da rocha matriz é precipua: os elementos componentes dependem estritamente da rocha que Ihes da origem e do res- ectivo processo de alteragio; ésses solos evoluem com o processo de alteragao da rocha. 384 BOLETIM GEOGRAFICO As vicissitudes sofridas pelos detritos, transformagées complexas e longas, fazem que os solos alotéctonos dependam mais da natureza dos transportes e das modificagdes processadas em seu decorrer que da rocha matriz: Intervém poste- riormente transformagoes dos materiais depois de depositados, devidas ainda a agentes atmosféricos, andlogas aos processos de diagénesis, chamados maturacao. A influéncia climatica faz-se sentir de maneira decisiva nos climas tropicais pela maior intensidade dos fendmenos de decomposicéo das rochas e pelas modalidades que oferecem. A intensidade dos fendmenos de alteracao nesses climas é fato encarecido por todos os observadores. ‘Uma das causas primordiais parece ser a variacio brusca e diuturna da temperatura que produz fendas, pelas quais atuam com maior facilidade os gentes atmostéricos. : Contribuem também certas particularidades das 4guas dos climas tropicais, mais Acidas e de acdo corrosiva mais enérgica, A variacdo de temperatura no seio das rochas causa a bem conhecida de- composicéo esferoidal, a exfoliacdo. Nos climas tropicais, o manto de rochas decompostas em geral é mais pro- fundo que nos climas temperados, fato que se reflete de maneira notavel nas propriedades dos solos. © primeiro estédio de decomposigao das rochas importa nos seguintes fe- némenos quimicos: @ — hidratacio dos silicatos b — eliminaco dos dilcalis ¢ — oxidagio: dos éxidos. Os silicatos de aluminio transformam-se em argilas contendo certa propor- go de éxido de fetro. Ao mesmo tempo, os minerais mudam de volume e, posteriormente, pas- sam ao estado coloidal, fenémenos que provocam a desintegracao da rocha. De maneira sumaria, o resultado de alteracéo pode ser dito constituido de argila e de quartzo, a argila inicialmente micro-cristalina passando depois a eoloidal. Este € o primeiro estddio do processo de alteracio. Pelo favor das condicées climaticas tropicais, 0 processo de alteragio das rochas pode ser mais adiantado com a laterizacdo peculiar a ésses climas. Consiste essencialmente na desagregacdo quimica do nicleo caulinico para | gerar silica, aluminio e éxido de ferro um estado coloidal. © 6xido de ferro forma crostas de limonito, nem sempre observadas. So complexas as causas dos fenémenos de laterizacio. Discordam as opi- nides. Possivelmente diversos fatéres se juntam para produzi-los. Parece indis- pensavel a presenca de certa propor¢ao de dxidos de ferro e manganés. Entre- tanto, outras condigées sfio necessarias. Nao cabe aqui uma andlise das causas désse fenémeno notavel. Os 6xidos formados em estado coloidal em uma zona inferior na qual a silica € lixiviada, concrecionam-se em uma zona superior. Muitos autores sugerem a intervencéo de micro-organismos pafa produzir as lateritas: sua proliferacdo seria condicionada pelo clima tropical. Campbell resume da seguinte maneira as condigdes que facilitam o desen- volvimento das lateritas: @ — estagdes alternadamente sécas e timidas bastante nitidas. b — vegetacdo luxuriante; ¢ — temperatura tropical; d — nivel hidrostatico variavel, nado muito distante da superficie; € — Inclinagéo moderada do terreno. TRANSCRICOES 359 Algumas dessas condicées so de cardter bastante local, e o que explica a laterizagdo nao ser generalizada em vastas regides. Nem sempre a laterizacdo 6 completa. Na maioria dos casos, mesmo pro- dutos do primeiro estddio de alteragao coexistem com os produtos de alteracio lateritica: as lateritas em geral sdo misturas de argilas e de dxidos produtos da laterizagao. Se 0 processo gerador das lateritas ainda é pouto conhecido, menos ainda se conhece sobre a constituigéo intima dos solos conseqiientes e sObre os fe- némenos de nutricio das plantas nesses solos, com certeza diferentes dos andlo- gos no caso de solos de alteracdo caulinica. Reside ai o grande problema da pedo- logia tropical. ‘Tendo em vista os propessos geomorfogenéticos, os solos de Sio Paulo devem ser incluidos em uma Unica provincia pedoldgica, alias extensiva a quase todo o sul do Brasil, onde domina uma feicdo topografica, 0 Planalto Meridional, sec- ao do grande Planalto Brasileiro. Apenas, ndo fora sua limitada extensio, con- viria excluir a faixa litoranea. Os processos gedmorfogenéticos consistem na dissecagio désse planalto, pondo a nu as formacoes sucessivas que 0 compéem. Os solos sio principalmente de erosfo, isto é eluviais derivados dessas di- versas formacées. As formagées que constituem 0 Planalto em Sao Paulo séo bem conhecidas: um embasamento composto de formagées perturbadas e metamérficas, umas granitizadas, granitos e gnaisses; outras constituindo a série de Sao Roque, mi- cachistos, filitos, quartzitos e caledreos, associados a granitos e a eruptivas basicas: cobrindo ésse embasamento diversas formagdes que se sedimentaram desde o eodoviniano até o plioceno, em fendmenos separados por fases de ativa desnudacdo, a saber: a — Depésitos quaternarios; b — Camadas tercidrias de Séo-Paulo, do Planalto Ocidental e do vale do Paraiba; © — Camadas cretaceas de Bauru, arenitos de cimento e calcareo; d — Sistema de Santa-Catarina compreendendo as seguintes séries: 1 — Série de Sao Bento, arenitos e lengdis de eruptivas; 2 — Série Passa Dois, folhelhos e caleéreos; 3 — Série Itararé-Tubarao. e — Ajyrenito devoniano das Furnas, representado escassamente em pe- quena 4rea entre Itararé e Faxina. Grosso modo, as condicées climaticas em So Paulo podem ser consideradas sensivelmente uniformes, se bem que variem de acérdo com a latitude, com a al- titude e outros fatéres. Em geral, podem ser ditas ainda tropicais e sub-tropicais; executa-se a limitada area da Mantiqueira e talvez pequenas dreas de menor importancia do Planalto Oriental. As precipitagdes so em geral.abundantes, mais notaveis ao longo das es- carpas pela condensagao do vapor dos aliseos As estagées séca e timida sao bastante distintas, salvo na escarpa litoranea. Essas condigdes climaticas permitem o desenvolvimento dos processos de laterizacao. ‘Muitos dos solos cluviais da provincia parece que se podem incluir na gran- de categoria dos soles vermelhos, devido mesmo a influéncia climatica ja apon- tada e & abundancia de xido de ferro nas rochas matrizes. S40 solos lateriticos. Todavia, releva notar, nem todos os solos o sao, a formacao da laterita depen- dendo de outros fatéres além do clima. Anexam-se aos solos eluviais solos aluviais de distribuicéo local, formados pelos detritos dos primeiros movimentos pelas aguas e depositados pelo favor da topografia; desenvolvem-se & margem dos cursos d’4gua mais importantes em suas planicies de aluvido. 356 BOLETIM GEOGRAFICO Até agora nao tém sido feitos estudos sistematicos s6bre a classificacdo dos solos de Sao Paulo e sdbre a distribuicao dos diferentes tipos. Sendo os solos em sua maioria eluviais, sua taxionomia liga-se As rochas ma- trizes muito estritamente. Os fenémenos pedolégicos sao estreitamente conexos as formagées geologicas expostas. Posto que as formagées geoldgicas do Estado jé sejam conhecidas de ma- neira bastante satisfatéria em suas linhas gerais, o estudo dos processos de de- composi¢ao das rochas ainda deixa muito a desejar. Em particular, no caso importante das eruptivas da série de Sio Bento faltam ainda idéias precisas sobre os processos de transformacao das rochas, que pare- cem oferecer diversas modalidades. Dos trabalhos do Instituto Agronémico de Campinas tém resultado contri- buico analitica sObre os solos de Sao Paulo de grande valor. Para os fins colimados neste trabalho, 0 gnaisse e a distribuic&o dos solos, depara-se o inconveniente de nem sempre serem precisadas as condigées topo- graficas e genéticas dos solos analisados. Apenas as informagées sobre a locali- gac&o permitem discernir a formacdo de que se originaram. Atendendo aos aspectos geomorfogenéticos mas importantes o autor tem cogitado de uma diviséo do territorio do Estado de Sao Paulo em regides fisiogra- ficas nas quais os agentes erosivos produziram relevos diversos devidos ao grau de adiantamento do proceso e as formagoes erodidas, SECGAO ESQUEMATICA GENERALIZADA NO EST. DE SPAULO DE SE a NW PLANALTO OCIDENTAL PLANALTO ORIENTAL 1 QUATERNARIO. FLUVIAL 7 ARENITO DE soTUCATU 2 MaRINHO 7” PIRAMBOIA 3 TERGIARIO DE 8.PAULO ‘9 SERIE PASsa-poIs 4=* 0 PLANALTO OCIDENTAL | 10- * ITARARE-TUBARAO S- ARENTO. DE BAURU 1= ROGHAS CRISTALOFILIANAS DA SERIE DE S.ROGUE 6- ERUPTIVAS DA SERIE DE S.BENTO | 12- " — GRANITIZADAS, GRANITO E GHalS © Planalto Meridional eleva-se sobre a costa deixando estreita faixa lito- ranea limitada por uma escarpa. Segue-se para oeste o degrau ondulado, que pode ser chamado o Planalto Oriental entalhado por dois vales que constituem duas regides naturais, um correndo para o norte, o vale do Paraiba, outro desa- guando no oceano mais diretamente, o do Ribeita de Iguape; um tributario do Ultimo desempenha papel homologo ao do primeiro. No litoral e nos vales ha a distinguir as planicies e as encostas. No Planalto Oriental separa-se a zona de matas, de granitos e rochas me- tamérficas, e a zona de campos, ambas sujeitas a divisoes de acérdo com as formagées geoldgicas e a topogratia. © critério altimétrico divide outra regiéo natural, a Mantiqueira, TRANSCRIGOES 337 A escarpa bem conhecida traca o limite de outro degrau, o Planalto Ocidental, formado pela série de Sdo Bento, capeada localmente pelo cretaceo de Bauru e elas camadas modernas que podem ser consideradas terciarias. A escarpa e 0 topo, formado éste pelas eruptivas, pelos arenitos de Botucatu ou recoberto pelas camadas cretaceas e terciarias, constituem as sub-divisoes do Planalto Octdental. ‘Anexam-se as planicies dos grandes rios cobertas pela mata ciliar. ‘A divisdo pode ser resumida no seguinte quadro: I — Litoral a — Planicie litoranea setentrional b — Planicie litoranea meridional ¢ — Encostas II — Vale do Paraiba a — Encostas b — Planicie axial III — Vale do Ribeira a — Encostas formadas principalmente de calcéreos b — Encostas de granitos e rochas metamérficas ¢ — Planicies axiais IV — Mata do Planalto Oriental a -- Regides de rochas granitizadas b — Regides de rochas metamérficas nao granitizadas V — Mantiqueira, elevagdo média acima de 950 metros ‘VI — Campos de baixo da Serra — Campos de Piratininga b — Campos agrestes ¢ — Campos cerrados d — Campos da raiz da Serra ‘VII — Planalto Ocidental a — Escarpa b — Terra roxa ¢ — Campos de cima da Serra d — Matas de espigio e — Matas ciliares. A vista da escassez de elementos ndo 6 possivel em absoluto tentar distin- guir séries de solos e ainda menos tipos. © mais que parece possivel atualmente ¢ mencionar as feigdes mais gerais dos solos que ocorrem nas diferentes sub-divisoes fisiograficas. Em cada uma encontram-se conjuntos de solos eluviais ligados estreitamente as formagées regionals, cujas modalidades de alteracao processam-se de acérdo com o relévo, em alguns casos oferecendo peculiaridades consegiientes a fend- menos climaticos. Sdmente em alguns casos é dado indicar as principais variacdes dos solos eluviais provenientes da mesma rocha alterado em condigées diferentes. A classificagao dos solos aluviais, assunto de natureza estritamente pedol6- gica, permanece ainda mais embriondria que @ dos solos eluviais, para os quais ha sempre o critério da rocha matriz. Certos solos aluviais anexam-se aos solos eluyiais de cada um dos grupos, oriundos de determinadas formacdes. Passam ésses solos aos das grandes plani- cies aluviais, incluidos em diviséio 4 parte. Para facilidade da descrigdo, seré adotado um agrupamento misto: os solos. eluviais em alguns casos agrupados conforme as rochas matrizes e em outros conforme as regides naturais; os solos aluviais mais desenvolvidos englobados no fim em um grupo com algumas divisdes. 338 . BOLETIM GEOGRAFICO Procurou-se usar as denominagées vulgares das terras, empregadas cons- tantemente pelos agricultores, Surgem algumas dificuldades, talvez devidas ao emprégo improprio dessas denominagées. © professor Dafert com raz&o aponta o fato das denominacées massapé e salmourdo serem empregadas para os solos os mais diversos. Essas palavras por suas etimologias exprimem conceitos texturais no sentido pedoldgico: a pri- meira indica solos compostos quase exclusivamente de argila.e a segunda solos argilosos com cascalho ou areia grossa. Os exemplos contrarios apresentados pelo professor Dafert derivam naturalmente de generalizages dos coletores de amostras. Essas denominagées aplicam-se mais aos solos eluviais dos granitos e dos gnaisses, se bem que usadas também para solos das eruptivas da série de Sao Bento aos quais, entretanto, cabe a denominacao terra rora, correlata ao pro- cesso ‘adiantado de laterizacao. Certas denominagées aplicadas a solos nao indicam determinados géneros pedolégicos mas tipos de vegetacdo natural, extensivos a diversos solos; 6 0 que se da com a catanduva. A — Solos eluviais dos granitos e dos gnaisses A diversificag&io dos solos desta categoria é correlata & natureza das rochas matrizes e as condigdes topograficas e climaticas. Entre as rochas matrizes ha a distinguir diversos tipos, para os fins colimados earacterizados pela granulagéo e pela proporcdo de elementos ferro-magnesi- anos e de quartzo. A orientacao da mica parece no ter grande influéncia sobre a natureza do solo: solos de gnaisse e de granito diferem pouco, a nao ser devido a diferengas entre a granulacdo e a maior ou menor proporcao de biotita. A variedade déstes solos,é grande. Diferenciam-se, pelo desenvolvimento do processe de laterizagéo, pela super-oxidacdo do ferro dos silicatos, pela ri- queza originéria em quartzo e por diversos outros fatéres, em categorias, pe- euliares a certas regides. Os solos dessas rochas contém todos boa proporcdo de argila. : Subordinam-se os solos das, rochas nefelinicas, dos anfibolitivos e rochas congéneres. 1 — Solos de rochas granitizadas das vertentes litoréneas. A formaciio exposta ¢ 0 andar inferior do complexo arqueano, essencialmente gnaisses granitéides e granitos ricos em elementos ferro-magnesianos. Mercé da umidade mais ou menos constante do clima, parece que o processo de laterizaco nao teve lugar de maneira acentuada. Os solos eluviais sio em geral argilosos, genéricamente massapés. Podem ser vermelhos ou amarelos mas possivelmente todos se incluem na categoria dos solos vermethos. A presenga do himus da lugar a solos pretos, massapés pretos. 2— Solos de rochas granitizadas das vertentes do vale do Paraiba. As rochas so gnaisses arqueanos, granitéides do andar inferior e fitados do andar superior, todos rochas ricas em biotita. Bsse motivo e mais as condi- Ges climaticas fazem que os solos sejam em geral lateriticos, massapés verme- Thos, mais ou menos arenosos. Devido as condiedes de drenagem ou ao empobrecimento local em biotita, produzem-se massapés amarelos e brancos. 3 — Solos de granitos e gnaisses do Planalto Oriental. Essas rochas. oferecem na regio grande variedade quer em relacéo & tex- ture quer em relagio ao contetido em biotita. Dio orlgem a solos muito variados. Os tipos de granito de granulagdo grossa, relativamente pobres em biotita, nos terrenos ingremes podem dar solos claros bastante arenosos devido A elimi- TRANSCRICOES 359 nacdo da argila. Séo terras brancas ou cinzentas argilo-arenosas que nao devem ser confundidas com 0 massapé branco propriamente dito, terra argilosa pobre em ferro, Na mesma ordem de fendmenos, produzem-se solos ricos em cascalho de quartzo, salmourdo, sempre nas elevagées. ~@uando favordveis As condigées de drenagem e presente boa proporedo de elementos ferro-magnesianos tém-se massapés vermethos. Nas mesmas condigées, rochas pobres em biotita produzem massapés amarelos e brancos. . : © aumento da proporgaio de himus dé lugar ao massapé préto. © quadro inclui composigées fisicas centesimais de alguns solos déste grupo segundo o Dr. Uchoa Cavalcante: PROCEDENCIA | Designagdo | Cascalto | — Arsia Caleéreo | Mat. Vol. ‘Massapé préto..... 253 34,35 33,35 7782 22,03 ‘Massapé arenoso.. 1529 44,53 31,62 0,181 837 : > 291 70,09 20,08 0.173 675, : 7. = 734 14 5247 | vestigiog 13,05 : 6,22 32,10 52,48 > 1400 : oe 27,70 4980 17,86 9,180 448 7 : : 580 | | 5174 36,67 0,240 555 . >I 476 51,09 37,95 0,303 5,90 oo Nao € possivel preeisar as rochas matrizes com téda verossimilhanca gnais- ses ou granitos, As texturas resultantes nao concordam absolutamente com as classificacées, fato notado pelo Dr. Dafert. Parece que a explicacdo esté no emprégo inade quado das denominagées. Os contetidos em calcareo, principalmente o do solo de Atibaia, com veros- similhanga de granito, causam certa estranheza. 4 — Solos de granitos das vertentes do vale do Ribeira de Iguape. Os fenémenos em relacdo & alteracdo séo essencialmente os mesmos que has vertentes litoraneas. Os solos podem diferir em alguns casos por serem as rochas granitos de textura grossa e mais pobres em biotita. Nao hé absolutamente dados sObre ésses solos, com certeza intermedarios entre os da vertente maritima e certos solos do Planalte Oriental. 5 — Solos da Mantiqueira, As rochas que af afloram, salvo fenémenos locals, so granitizadas, incluidas no complexo arqueano. A regio é definida pela altitude superior a 950 metros. Os solos siio em geral de céres claras, pouco conhecidos, cobertos de uma ve- getacdo natural de campos e de araucérias. # plausivel admitir a influéncia decisiva de mutagSo do clima. Parece que so pouco enérgicos os fendmenos de laterizacao. Ocorrem na regido rochas nefeiinicas, algumas ricas em elementos ferro- Magneslanos, eujo processo de alteragdo nesse clima também dé lugar a solos raNcos. 6 —. Solos das rochas nefelinicas do Planalto Oriental e no Ribetra de Iguape. Nas limitadas areas de ocorréncia dessas rochas, Ipanema, Jacupiranga, etc. verifica-se alteragio muito profunda, dando solos vermelhos nos quais Parecem ser intensos os fenémenos de laterizagéo. 360 BOLETIM GEOGRAFICO 1 — Solos dos anfibolitos e rochas congéneres. Os anfibolitos sio rochas cristalinas presumivelmente oriundas do meta- morfismo profundo dos caleareos. Seu teor em ferro é muito elevado. ’ ‘Mereé do clima e das condicées topograficas, séo relativamente pronunciados ‘os fenémenos de laterizacio. Os solos sao vermelhos, profundamente lateriticos, anélogos as terras rozas, talvez os massapés rozos. Ocorrem ésses solos em manchas no Planalto Oriental, como em Talpas (base do Jaragua), Pirapora, base da serra do Séo Francisco, ete. Outras rochas cristalinas basicas incluidas no arqueano e na série de Si0 Roque produzem solos analogos. B — Solos das serras de rochas cristalofilianas nio granitizadas A formacdo regional é a fase chistosa da série de Sio Roque, filitos e mi- cachistos ricos em elementos ferro-magnesianos. Os solos so lateriticos, formados com eliminacao de silica, de cér vermelha carregada, contendo com freqiiéncia concregées de limonito e de dxido de mangani Nao tém sido feitos estudos da composicio mineral6gica désses solos como Ge todos os outros; com verossimilhanga contém, a par do dxido de ferro, certa proporcdo de alumina livre. ‘Um dos seus caracteres é a impermeabilidade. Ocorrem nas seguintes areas: entre a Sao Paulo Railway de Taipas e Jun- diai e o Tieté; em uma faixa que se estende desde o Tieté até a altura de Soro- gabaj na sone pré-devoniana do sul do Estado; e no alto vale do Ribeira de iguape. eee © — Solos eluviais dos calcdreos metamérficos antigos e de rochas anexas Ha.a distinguir os solos dos caledreos da série de Séo Roque ou do andar su- perior do arqueano em regides de topografia bastante evoluida posto que aciden- tada e solos de dreas extensas de calcareos da série de Sao Roque na bacia do Ribeira de Iguape com topografia carstica. 1 — Solos dos calcdreos da série de Séo Roque e do andar superior do arqueano : Os ealedreos do Planalto Oriental e no vale do Paratba séo térmos subor- dinados do andar superior do arqueano e da série de Sao Roque, expostos, mercé de estruturas complexas, em dreas limitadas. ‘Sua alteracdéo gera” solos vermelhos de argila residual que, acidentalmente, podem conter areia e cascalho proveniente do quartzo da rocha. S40 capazes de reter fortemente matéria ‘mica dando solos pretos. Contém certa propor¢io de carbonatos. © desenvolvimento désses solos é muito local. Os solos de caleéreos arqueanos ocorrem no vale do Paraiba nas fraldas da serra da Mantiqueira, na serra do Quebra Cangalha e no municipio de Bananal. Observam-se solos dé calcdreos da série de SAo Roque em reas limitadas do Planalto Oriental como no vale do rio Juqueri e na raiz da serra de SAo Francisco. 2— Solos de calcdreos do Ribeira de Iguape Afloram nessa regiao extensivamente calcdreos da série de Sig Roque, em um relévo do qual sio fatéres importantes fendmenos carsticos. : Escasseiam dados sObre os solos eluviais produzidus, constituidos maiormen- te de argila residual juntamente com caleéreo remanescente. TRANSCRIQOES 3a. Hé trés fatéres que devem tornar ésses solos diversos dos congéneres do Planalt a — est&dio menos avangado de evoluc&o topogréfica apresentando ainda fenémenos cérsticos; b — dreas de exposicio mais extensas abrangendo topografias mais va- riadas; ¢ —clima de precipitacdes mais abundantes; Pésto que ésses solos possam ser vermelhos, em geral sio escuros, ricos em himus. D — Solos dos campos do Planalto Oriental 1 — Solos eluviais dos campos de Pirutininga. As camadas tercidrias de Sao-Paulo ocorrem nos arredores da capital do Estado; argilas e areias de deposicdo sub-aérea, de céres vivas e variadas. Os solos resultantes de sua eluviacdo séo argilo-arenosos, dominando um ou outro material conforme a composicao dos Sedimentos matrizes e as condicdes topograficas. Em geral tém a cér vermelha. 2 — Solos dos campos agrestes do Planalto Oriental. Incluem-se nesta sub-diviséo topografica terras de relévo pouco ondulado cortadas por vales que se iniciam com desmoronamentos, vogorocas. ‘A formacéo regional é a série inferior do sistema de Santa-Catarina, a série Ttararé—Tubaréo, complexo de rochas de natureza variada, folhelhos, arenitos e conglomeratos de diversas origens, glacial, sub-glacial, e aquosa. ‘Anexa-se a area reduzida ocupada pelo arenito devoniano das Furnas entre Itararé e Faxina. ‘A distribuicdo désse aspecto fisiografico obedece a uma faixa iniciada a0 sul entre Itararé e Fartura, e que vai terminar na divisa de Minas nos arre- dores de Monte-Santo. ‘Os solos em sua maioria sio vermelhos, oferecem grande diversidade de textura. Os mais argilosos, de cér yermelha com tonalidade particular, sio conhecidos pela denominacio sangue de tatu, aliés empregada também ‘para solos argilo-arenosos de cardter coluvial formados de material orlundo das erupturas e do arenito de Botucatu. : ‘Ha também solos arenosos com reduzida proporgdo de argila. Pelo favor da drenagem antiga distribuem-se solos himicos, possivelmente em parte aluviais, cobertos pela vegetagio dos capdes. Ocorre nesta regio o aspecto vegetativo denominado catanduva, vegetacio mais densa que o campo pésto que menos que a mata. Essa denominacao nao é restrita a um tipo de solo. No caso exprime o melhoramento local do solo dos campos. ‘As andlises fisicas centesimais seguintes, devidas ao Dr. Uchoa Cavalcante, d&o uma idéia da variagao da textura dos Solos em aprégo: ee LOCALIDADE Caseatho | Artila rela | Caletroo | Mat. Vol. 00 39,34 52,35 277 5,64 00 43,40 53,69 | vestigios 291 00 85,77 29,08 > 15,21 00 6043 30,06 > gat 00 1291 83,12 > 397 00 2017 7264 > . 00 60,90, i |! > 21,83 90 18,90 65,78 > 15,32 362, BOLETIM GEOGRAFICO 3 — Solos da regido dos campos cerrados. A faixa de campos agrestes de bairo da Serra segue-se para oeste regio disposta segundo outra faixa mais irregular, que é necessdrio distinguir pelos seguintes motivos: a —mudanca da topografia que se torna mais acidentada, com uma linha de cuestas bastante desgastada, se bem que ainda patente em numerosas localidades. b — mudanca da vegetacéo natural que, dos campos agrestes passa para 0s cerrados, em que sao abundantes as leguminosas; ¢ — mudanca da formacao geologica que agora é a série Passa-Dois, cons- tituida de folhelhos ¢ caledreos, com leitos e concregées de silex; d — mudangas dos solos. . Os solos sio em sua grande maioria argilosos, contendo com freqiiéncia calcdreo, Sio chamados genéricamente massapés. Escasselam as areias, po- dendo existir cascalhos provenientes do silex néo desintegrado completamente. 4 cér é em geral vermelha, localmente amarela ou preta, a ultima devida ao hémus. 4 — Solos dos campos da raiz da Serra ‘Ao longo da base da escarpa que delimita o Planalto Ocidental, estende-se faixa de terras arenosas derivadas das camadas de arenitos da série de Sdo- Bento colocados sob os lengdis efusivos mais baixos, arenitos que recebem a denominacao Pirambdia. Os processos geradores so principalmente eluviais. Os solos regionais so essencialmente arenosos posto que contenham certa proporcao de argila. Sua textura parece apta a conservar certa proporgdo de elementos ferti- lizantes. Ha razdes para crer que éstes solos sejam diferentes dos provenientes de eluviagao dos arenitos do alto do Planalto. © autor colheu uma amostra da fazenda Santo Antonio, Charqueada, muni- cipio de Piracicaba. : Os resultados centesimais das andlises (Lab. Serv. Geolégico e Mineralégico do Brasil) séo: . Andlise fisica: Cascalho . .. 0,00 Cascalho fino 1,30 Areia grossa . 87,40 Areia fina Ps Os - 0,024 S 0, total 0,016 Na Cl 0,016 N total . 0,015 NO,. 2... : vestigios Acidez em CaCO. 0,022 Perda a0 fogo ... 2,420 TRANSCRIGOES 363 E — Solos da escarpa do Planalto Ocidental e da terra roxa As duas regies oferecem solos semelhantes. A descri¢io em conjunto tem as vantagens da brevidade e de fazer ressaltar 0s contrastes. BenDerivam 0s solos principalmente da alteracéo das eruptivas da série de So ento. As variagGes so causadas pelas modalidades da rocha matriz e pelos proces- sos de alteracdo. Junto deparam-se solos arenosos, de cardter misto, na formacéo dos quais intervém fendmenos dé coluviagao com a adicao de material proveniente dos are- nitos de Botucatu. Os solos oriundos da eluviacdo das eruptivas recebem o nome de terras rozas, devido & cor vermelha de tom especial, pirpura. As eruptivas da série de Sio Bento, se bem que t6das estreitamente ligadas, geradas em uma mesma fase, incliem gama bastante dilatada de rochas que se distinguem principalmente pela textura ligada, € claro, 4 maneira de ocorrer. Salvo processos de transformago causados por solugdes magmaticas depois da consolidagao, a composicio mineraldgica dessas rochas ¢ bastante constante: dois elementos principais: um plagioclsio bastante basico, da ordem da byownita e um piroxénio, eustatito-augito. Varia a textura de acérdo com as condicées de consolidacio: tipos ofiticos que se apresentam nos dykes e nos lencéis intrusivos, didbases, tipos hipo-cris- talinos porfiriticos nos derrames efusivos, basditicos. Ao lado dessas rochas originais, isto é que nao sofreram mutagdes aprecié- vels desde a primeira consolidacao, ha tipos provenientes da ado de aguas mag- miticas sdbre as rochas consolidadas inicialmente: meldfiros, quando essa ado se resume & criagéo de amigdalas com minerais secundarios, espilitos quando a transformagao dos elementos atinge a massa de rocha que toma a textura miaro- litica. © processo de alteracio das eruptivas, devido alta percentagem de ferro, a0 clima e s condigdes topograficas mais comuns, importa em intensiva lateri- zagao. As terras rozas propriamente ditas contém pequena percentagem de quartzo. Todavia, incluem material grosso, texturalmente chamado areia de cascalho, constituido principalmente de conerecées de limonito. Exeptuam-se, € claro, os solos mistos ferras rozas arenosas. As terras roras desprovidas de cascalho e com pequeno teor em material arenoso (no sentido textural) tém sua composicéo fisica centesimal, segundo Uchoa Cavalcante, dentro dos seguintes limites: Argila Areia . Materia organica . Caledreo . .. Denominam-se ésses solos terras roras apuradas. A terra roza rica em concre¢des de lmonito, com alto teor de areia e de cas- calho recebe a denominagao de encarocada. ‘Um exemplo de terra roza intermediaria entre a apurada e a encarocada 6 0 solo observado pelo autor nos arredores da cidade de Jat. Sua composigao cen- tesimal 6 (Lab. Servigo Geolégico e Mineralégico do Brasil Andlise fisica: Cascalho . 0,0 Cascalho fi 08 Areia grossa 26,9 Areia fina . 22,2 46,1 ae BOLETIM GEOGRAFICO Andlise quimica: Al Os 25,4500 Fe: Os 25,0400 MnO 0,1100 cao 0,0800 MgO 0,0180 K, 0 0,1100 Na. O 0,1300 S10, 35,0200 TiO. 2,8800 P.O, | 0,120 8 O, total 0,0290 Na, SO . 0,0000 Na Cl 0,0084 N total 0,1830 NO. 0,0016 Acidez em Ca CO; . 0,0130 Perda ao fogo ... A composigio fisica de uma terra roza de Sdo Manuel é (Instituto Agro- némico) : Argila . 65,90 Arela 9,34 Matérias volatels 34,86 uma terra roza apurada composta essencialmente de argila. Nao é possivel mencionar numerosas anilises de terras-rozas que déem uma idéia de sua diversidade. . A terra rora arenosa deve ser considerada um solo misto oriundo de ma- teriais provenientes de eluviacdo das eruptivas e dos arenitos de Botucatu, a mistura tendo lugar na proximidade imediata dos afloramentos, devida a fe- némenos de coluviacdo e de transporte pela agua. ‘Uma amostra de solo de terra roa arenosa obtida pelo autor na estrada de Torrinha a Jai tem a seguinte composicéo centesimal (Lab. do Serv. Geol. € Min. do Brasil): Andlise fisica: Cascalho fino . 0,30 Areia grossa 73,60 Arela fina 3,40 Argila . 21,00 Humus 1,30 Umidade . 091 Andlise quimica: Al: Or . Fe, Os . MnO . cao TRANSCRIQOES 365 Nao é ainda conhecido em seus detalhes o processo pelo qual as eruptivas se alteram para produzir as terras rozas. Sabe-se porém que, inclui uma fase de caulinizagéo e outra de laterizacio. Preliminarmente, porém, a rocha sofre transformagao na qual seus elementos se hidratam e perdem icalis, transfor- mados em epidoto e outros minerais.comuns as rochas resultantes de transfor- macées metamorficas. ‘Depois dessa fase, pronuncia-se a desintegracio da rocha com a caulini- zagéo; em seguida intervém os fenémenos da laterizacéo com lixiviagao de si- lica em major escala, acompanhados de uma fase na qual se formam concre- goes de limonito, ‘No processo de alteraciio da rocha para o solo ha eliminacao de silica, de cal, de magnésia e de dlcalis. Aumentam os teores em alumina e em ferro que s¢ peroxida, Infelizmente, néo dispde o autor de andlises de uma eruptiva ¢ do solo cor- respondente. Apenas a titulos de informacao segue-se a composi¢ao centesimal de um basaitito de Jabuticabal (Lab. Serv. Geol. Min. do Brasil): Al O. . 1132 Fe: O. | 671 Fe O 11,00 MnO. 0,11 Cao 850 MgO. 7,56 Ba O vestigios Nao 2,91 K,0 166 SiO; 48,48 TiO, 4,00 co 0,00 PO. 045 ci 0.28 K ail N&o & possivel dizer os minerais que na realidade constituem a terra roza, Seré conveniente citar o estudo realizado pelo Dr. Cabral de Vasconcelos sObre uma terra roza de Piracicaba. Observa-se a predominancia de areia gros- 8a nos 60 centimetros superiores. A arela tem um minimo no subsolo para erescer depois, O humus decresce naturalmente de maneira rapida de cima para baixo. O calcdreo, ausente na parte superior, existe em pequena proporgao nas camadas inferiores. O quadro seguinte de decomposicées fisicas centesimais mostra as variagées: PROFUNDIDADE EM CENTIMETROS ‘* Rxcluidas as matérias hémicas. 86 iltimamente comecaram a ser estudados os fendmenos pelos quais se op! ae nutrigéo das plantas na terra roxa, que explicam o valor agricola dessa: ras. Destaca-se o magnifico trabalho do Dr. Teodureto de Camargo. # possivel que, desempenhe papel de destaque o manganés cuja proporgdo nas terras rozas, 6 maior que na generalidade dos solos. 306 BOLETIM GEOGRAFICO Como se depreende do esposto, faltam ainda os dados necessirios para a classificag&o das terras rozas. Pésto de parte o solo misto que é a terra roza are- nosa, talvez seja possivel caracterizar dois tipos: a terra rora apurada: e a terra roza’ encarogada. As diferencas sio aparentemente texturdis mas, ndo é impossivel na realidade serem mais profundas. De outro lado no é absurdo pensar que, das diferenciacées da rocha original resultem varlagées no solo ainda nao.percebidas devido 4 deficiéncia de ob- servacGes. A diferenciagdo das terras roras apuradas e encarocadas parece derivar prin- cipalmente das feigdes topograficas. Em regides mais acidentadas h4 maior eliminacfo de material fino, de sorte que, aumenta a proporcdo do material grosso, que se torna maior que a verificada num solo de regides de relévo menos acidentado. Nas duas regides naturais Escarpa do Planalto e Terra Roza afloram as eruptivas da série de Sdo Bento. A diferenca inicial é o relévo que, na primeira é bastante abrupto ao passo que, na segunda é mais ou menos senilizado. Assim na Escarpa do Planalto, sio mais abundante as terras roras encarogadas ao Passo que, na segunda domina a terra roza apurada. Superficialmente, é maior o desenvolvimento da terra roxa na regido desig- nada por éste nome, razdo que justifica a designacéio. & a area do alto do Pla- nalto onde aflora o lencol efusivo sem « capeamento do terciario, e que se esten- de principalmente pelo vale do Moji ‘suacu. A regiéo Escarpa do Planalto in2lui a feigdo topografica importante. Para o norte a escarpa degratia-se progressivamente fazendo que a reg\io se confunda com a precedente. Os dois solos dominam respeciivamente em cada uma das regides sem serem exclusivos, ao lado de solo de ter-a roza aienosa e mais localmente os solos dos campos do Planclto. Do Planalto Oriental ocorrem em Areas limitadas solos de terra roxa corres- pondentes a dykes e lengéis eruptivos. F — Soles das matas de espigio Essa regio eleva-se sobre o Planalto Ocidental, formando como que um de- grau, limitado por escarpa disfarcada, visivel ainda nas serras de Agudos, de Monte Alto, ete. Limita-se @ parte central’ dos tratos do Planalto limitados pelos rios mais importantes, pésto que, a certa altura do curso do Tieté aproxime-se de suas margens em altitude inferior & comum. - A formacio regional é 0 arenito de Bauru, de cimento caledreo com certa pro- porgao de argila, de idade cretdcea. A vegetaciio original consiste em: matas e cerrados. A topografia mostra-se suavemente ondulada. As variagdes dos solos eluviais derivam principalmente das condigdes de dre- nagem e da topografia que regem a eliminagao dos carbonatos e da argila. 0s solos, arenosos, contém certa proporedo de caledreo e de argila: ofere- cem céres palidas, pésto que alguns localmente vermelhos. O subsolo é vermelho. A presenca de humus di-lhes freqiientemente as céres preta e parda. As seguintes andlises fisico-quimicas centesimais de solos de Pirajui, ex- traidas do livro do Dr. Vizioli sébre a lavoura da cana de agticar, dio uma idéia dos solos caledéreos: TRANSCRICORS wT DESIGNACAO G — Solos dos campos do Planalto Ocidental Corresponde a felcio fisiografica as areas de exposi¢éio das camadas mo- dernas possivelmente terciarias e do arenito de Botucatu, no alto do Planalto. As camadas modernas tém constituic¢io andloga a do tercidrio dos arredo- res da cidade de Sao Paulo: argilas e areias, em geral de cor vermelha. Os solos produzidos séo de cor vermelha, argilo-arenosos. De um désses solos foi retirada uma amostra pelo autor na estrada de Tor- rinha a Jai, sendo analisada no laboratério do Servico Geolégico e Mineralégico do Brasil; sua composicao fisica centesimal é: 0,00 0,70 81,00 2,00 11,80 3,10 078 8,120 3,120 vestigios vestigios 0,160 0,030 0,190 83,150 SPESE zponuage aneee 0,027 vestigios Acidez em Ca Cos 0,015 4,600 As terras resultantes da eluviacdo dos arenitos de Botucatu sio talvez mais arenosas, com maior propor¢do de areia fina. H — Solos aluviais Incluem-se neste grande grupo os solos de transporte. & ébvio lembrar sua diversidade. Como ficou dito, sua distribuigéo em grande parte subordina-se aos solos eluviais. 368, BOLETIM GEOGRAPICO O conhecimento déstes solos, problema exclusivamente pedoldgico, esté ain- da muito pouco adiantado. : Os materiais sio em geral argilas e drelas, podendo em alguns casos incluir caleéreo. Depositados os materiais, processam-se os fenémenos de evolugio: concen- tra-se a areia, ao passo que a argila aumenta na zona sub-superficial eluviada e migra o éxido de ferro. . A evolugdo dos solos aluviais pode ser mais ou menos adiantada. Quando pronunciada, tém-se solos eluviais provenientes de depésitos aluviais modernos. 0 caso dos depositos pleistocénic ‘Na hipétese contraria solos aluviais propriamente ditos. Deveriam ser classificados os solos aluviais conforme a textura e o grau da evolugao. Provisoriamente, é possivel considerar de acérdo com as felgdes fislogréficas os seguintes grupos: 1 — Solos de baizadas e varzeas. Sao solos aluviais anexos a solos eluviais disseminados nas diversas regiées fislograficas. Sao em geral mais arenosos que os solos eluviais correspondentes pelos mo- tivos expostos; abaixo existe uma camada mais argilosa chamada tabatinga. 2 — Solos das planicies aluviais de grandes rios. Compreende os solos dos depésitos fluviais de extensio apreciavel, mais an- tigos, pleistocénicos talvez, submetidos a processo evolutivo j4 bastante adianta- do a par de depésitos modernos menos evoluidos. A textura varia dentro de li- mites muito largos. Da mesma maneira a cor, em geral palida, amarela ou escura, As regides cobertas com ésses solos correspondem as matas ciliares dos gran- des rios. No vale do Paraiba recobrem em grande parte as camadas tercidrias. 3 — Solos aluviais marinhos. ’ Sao restritos & estreita faixa ao longo da costa. Consistem essencialmente em material denominado vaza, argilo-silicoso, de textura muito fina, ‘As consideragées feltas siio de ordem a mais geral. Constituem menos do que uma mise au point ou um balanco do que se conhece atualmente sobre a gé- nese e a distribuigio dos solos de Sao Paulo. Séo mais uma stimula dos pro- blemas que se deparam. O autor apresenta o trabalho com tédas as reservas, Est4 certo que os con- ceitos exarados carecem de revisdo severa, merecendo reforma a maloria. Seu objetivo foi mais despertar a atencdo sobre assunto que, em Sao Paulo, se apresertta como necessidade de ordem pratica. Com efeito, a Javoura rotineira, de cardter extensivo, j4 progrediu até a bar- ranca do rio Parana. Pronuncia-se a tendéncia para o regresso com a utilizagao das terras mais proximas dos mercados, melhoradas pelos processos racionais de cultura. A diferenca de fretes compensa largamente o custo désses processos. Para a pratica da lavoura racional, com o emprégo adequado de corretivos & a escolha judiciosa das plantacées, é indispensdvel o conhecimento dos solos. Bsse conhecimento nao pode ser obtido em casos isolados mas na base de sua génese e distribuicao. © adiantamento dos conhecimentos sobre a génese e a distribuigéo dos solos de Sao Paulo reclama observagdes meticulosas e sistematicas. TRANSCRICOES 369 Seria possivel esbocar um programa, no importando na organizagéo Ime- diata de um mapa pedologico detalhado: & — revisdo dos grupos de solos aventados pelo autor e sua delimitacio no mapa na escala 1:1 000 000; b — organizacéio de algumas félhas pedolégicas detalhadas, em escala .... Cote das regides de maior interésse como Campinas, Ribeirao Préto, , etc. ‘ Bibliografia Bureau, of Soils: — Instructions to Field Parties. Cabral de Vasconcelos, P. W.: — Contribuigdo para o estudo da terra roza. Camargo, Teodureto e Correia dé Melo, Paulo: — Estudo comparativo sdbre estado de saturacdo e bases substituiveis em cafeeiros hd cérca de 30 anos; Relatorio do Instituto Agronémico de Campinas dos anos de 1925 e 1926. Dafert, F. W.: — Sébre a denominagdo das terras do Estado; Relatério do Ins- tituto Agronémico de 1892. : Sébre as terras do Estado: Relatério do Instituto Agronémico de Campinas le 1893. Dafert, F. W. e Uchoa Cavalcante, A: — As terras do Estado de Sdo Paulo; — Relatério do Instituto Agronémico de Campinas de 1889. Hilgard, E. W.: Soils. Melo, Morais, — Andlises de terra; — em Vizioli, José — A industria agucareira no Estado de Séo Paulo. Merril, G. P.: — Rocks, Rock-Weathering, and Soils. Oliveira, Eusébio Paulo: — Solos: — Boletim do Instituto de Engenharia de So Paulo. Pais Leme, Alberto Betim: — Gnaisses dos solos dos cafézais; — Boletim do Museu Nacional vol. IIT. Saes, O. e Krull, H: + Andlise de terras; Publicagio do Instituto Agronémico de Campinas. Uchoa Cavalcante, A. B. e Adolfo, B: — As terras do Estado de Séo Paulo; Rela- t6rio do Instituto Agronémico de Campinas de 1890. Vizioli. José: — A indistria agucareira no Estado de Séo Paulo; Boletim de Agri- cultura de Sio Paulo. ‘A Evolucéio dos Transportes no Brasil para a Aviagao* Transerito do Bulletin de la Société de'Geopraphte de Lille n° de Natal — Preexs DEFFONTAINES © principal problema humano que apresenta o Brasil 6 um problema de co- municagées, em virtude da sua propria grandeza e das dificuldades que apne- senta o meio brasileiro. Os rios foram as primeiras estradas: o Brasil possui a maior bacia fluvial do mundo, 0 Amazonas, que entra no interior do pais como um verdadeiro brago de mar e permite aos navios transatldnticos penetrar sem descarregar a mais de 2 000 quilémetros nas terras; infelizmente essa maravilhosa réde hidrografica serve & regio. menos povoada e menos desenvolvida econémicamente. As outras regides possuem também rios gigantes, mas no apresentam as mesmas vanta~ gens; a maioria corre numa direco oposta as comunicacées, éles ndo se dirigem Para o mar, mas para o centro do pais, para a grande caiha mediana do Pa- rand-Paragual; J4 se falou que o Brasil era um pais virado ao contrario, para ‘0 interior. Isto é verdade, pelo menos para a regiéo ao sul da Bahia. ‘Além disso, a maior parte dos rios ¢ cortada de rapidos e cascatas; aquéles que pertencem’ a vertente atlantica brasileira, 0 SA Francisco, o Doce, 0 Pa- raiba... tém em'suas embocaduras barras arenosas instdveis, que tornam a sua entrada muito dificil. Assim, s6 a parte norte e amazénica utiliza o transporte fluvial; éste € mesmo o tnico meio de comunicagao ali, A zona sul constitui um outro dominio de transporte, onde reinam sobre- tudo os transportes por carga e por tracao. Entretanto, o pais nao é favordvel & estrada; o relévo constantemente ondulado em “meia-laranja”, segundo a expres sao local, a espessura dos terrenos de decomposicao dando uma areila plastica, escorregadia e impermedvel, a cobertura florestal mantendo uma umidade cons- tante, sdo obstdculos muito sérios. Por muito tempo a réde de estradas foi ape- nas uma réde de caminhos de mulas, em que a passagem das carruagens era im- possivel. A manutengao, que durou até os nossos dias, do.transporte por tropas de burros se explica pela dificuldade do caminho. O oficio de ttopeiro foi dos mais espalhados no Brasil, assegurando o transporte dos produtos exéticos e dos minérios a distanclas enormes. A antiga unidade do Brasil foi realizada em grande parte por ésses tropeiros némades; hoje ainda ésse horizonte de trabalho con- tinua fundamental. Apesar da politica rodovidria recente muito ativa, hé Estados intelros do Brasil que nao tém ainda sendo uma insignificante quilometragem de estradas verdadeiramente carrocdveis e de automéveis. O revestimento da estrada com materiais duros é dificil de realizar; o aleatrao é caro no Brasil, sendo necessa- riamente importado; a cimentacdo é onerosa; a cal é um produto raro; o pais € em sua imensd maioria cristalino, e o calcéreo ai é raro e localizado em zonas muitas vézes longinquas. Deve-se reconhecer também que ainda nao se encon- trou a formula da estrada tropical. Além disso, 0 automével é caro e 0 petréleo é um produto de importacao; enfim, o perfil acidentado ndo permite caminhoes esados com alto rendimento. Nao obstante, o enorme progresso da réde rodo- vidria de 10 anos para cé — ela quase decuplicou — abre a uma vida de relacées mais largas zonas até entio circunseritas a economias quase fechadas. A estrada de ferro ja tinha realizado anteriormente uma evolugdo andloga; mas aqui também a eficdcia do transporte permanece reduzida. O relévo é um obstéculo ainda mais grave para a rodovia; sobretudo a subida da serra do Mar, + N-R. — A traduefo para a lingua portugutes fol felta pelo professor Orlando Valverde, eccretdrlovassistente do Conselho ‘Nacional ‘de Geogratia TRANSCRICOES om permitindo transpor do litoral sul o planalto interior, continua como a principal barreira, colocada na propria entrada do pais. A maior parte das linhas que so- bem a serra séo ainda de cremalheira. Tais vias possuem naturalmente um ren- dimento muito fraco; os comboios dos funiculares tém somente trés vagoes e, no interior, muitas linhas comportam sdmente trens de cinco a sels vagdes no maximo. Assim, a réde é muitas vézes insuficiente para assegurar o escoamento dos produtos; por exemplo, o acréscimo da producio algodoeira na parte ociden- tal do Estado de Sao Paulo provocou um engorgitamento asfixiante das esté g6es da réde da Sorocabana. Muitas companhias permanecem irremediavelmen- te deficitarias. Para evitar trabalhos demasiadamente dispendiosos, as linhas tém rampas muito fortes e sinuosidades inumeraveis e muito acentuadas; muitas estdo colo- cadas diretamente sobre a terra, sem leito empedrado; quase tédas sio de uma s6 linha, mesmo a principal, a do Rio de Janeiro a 840 Paulo que, entretanto, une cidades de mais de um milhdo de habitantes. Uma s6 companhia 6 verdadeira- mente bem organizada: a Paulista, no Estado de Sio Paulo;: ela é ademais em grande parte eletrificada. A réde férrea 6 ainda pouco desenvolvida, apenas mais dé 35 000 quilémetr sobretudo ela nao constitul ainda uma réde centralizada, O Brasil néo conta verda. deiramente com vias axiais; éle est4 ainda no regime das vias de penetracdo par- tindo dos portos para o interior e atingindo a pontos terminais na regiao vir- gem, nas bécas de sertéo, como se diz no Brasil. As diversas linhas estéo assim separadas sem conex4o; élas pertencem a companhias miltiplas, e tém afasta~ mentos muito varidveis. Ha, além disso, ainda capitais de Estado que nfo estaéo lgadas spor vias férreas, como Cuiab& em Mato Grosso, e Goiania, a nova capital le Golds. Assim, a unidade comercial hoje no é assegurada nem pela réde ferroviéria, nem pelas estradas, nem pelos rios. O grande eixo de transportes fica fora do pais, a via maritima; é 0 mar que assegura ainda a maiorla das trocas e o essen- clal das comunicaées entre os Estados. Mato Grosso e Golds, os dois Estados mais afastados do oceano, sio também os menos desenyolvidos, pois que sdo 0s mais centrais; o pais continua periférico e nao concéntrico; uma quantidade de regides ainda nao foi atingida pelas comunicacses. Até aqui, os diferentes melos de transporte nao trouxeram ao Brasil a gran- de vantagem de uma centralizacio. Nessas condigdes, compreende-se com que interésse foram seguidos os progressos da aviagdo comercial. Para um pais em que a distancia ¢ 0 grande obstéculo, em que os produtos transportados séo a maioria das vézes de volume fraco e de prego bastante elevado, transportes mit- dos e difusos, 2 via aérea aparece como a grande esperanca. : Esta esperanca esté a ponto de realizar-se? © Brasil apresenta 4 aviacio condigées particulares. Primeiro, o seu clima: O calor nao é um verdadeiro obstdculo, mas reclama certas adaptacces; para os motores, o resfriamento por ar néo é suficiente e pa- rece preferivel utilizar-se o resfriamento por Agua; quanto a0 material empre- gado para a construcdo do avido, o calor umido torna preferivel a utilizagéo da chapa metalica, de preferéncla & casca de madeira ou 4 madeira compensada, Ademais, os movimentos de ar nas horas quentes do dia, movimentos de con- ‘vecoao, devidos ao aquecimento do solo, nfio sio mais uma dificuldade para os potentes avides que se possuem hoje em dia; ao contrario, éles impedem a ater- tisagem do Zepellin antes das quatro ou cinco horas da tarde e o aeronauta deve as vézes esperar o fim dos redemoinhos de ar, fazendo evolugdes sobre © Rio. As variacées barométricas, na maior parte do Brasil, sio de pouca impor- tancia e de uma regularidade espantosa, variacdes diurnas essencialmente. Nada faz lembrar estas sucessoes de depress6es que se lancam sobre a nossa Europa e que causam perturbacoes constantes. Ao sul do Rio, comeca um regime um pou- co mais movimentado pela passagem de nticleos de altas pressdes vindos do Pa- cifico que atravessam os Andes e sobem pura o norte, seja pelo sulco do Parana, seja a0 longo da costa; isto explica a relativa instabilidade no gdlfo de Santa Catarina e é umas das raz6es pelas quais as viagens do Zepellin nao passam do Rio de Janeiro para o sul. ‘ma BOLETIM GEOGRAFICO A visibilidade e nebulosidade sio dois fatéres determinantes da circulacio aérea. Por uma sorte admirdvel, o bastiio proeminente do Brasil no Atlantico, © Nordeste brasileiro, embora seja a zona mais maritima é também a mais séca a mais luminosa, fsse € o privilégio da regio de Natal e de Pernambuco, cons- tituindo um cabo de boa visibilidade avancando através da zona equatorial, ne- bulosa e chuvosa, para a Africa senegalesa, igualmente séca e luminosa. G fa~ moso “pot au noir” (pote de tinta preta) do equador em nenhuma parte é tio retraido. Em compensaciio, a costa sul com a sua franja da serra do Mar, é mais chu- ‘yosa e os nevoeiros ai so freqiientes na vizinhanca da montanha; no inverno — julho, agésto, setembro —, so os nevoeiros (nebulosidades imidas com chuva fina), no verao — dezembro, janeiro, fevereiro —, so as nuvens de tempesta- de com enormes precipitagdes, os aguaceiros. Esse fator umidade tem uma grave influéncia sdbre os campos de aviacdo; muitos séo estabelecidos em solos de decomposi¢do impermedveis, que constituem a maioria dos solos brasilelros que, na época das chuvas, dao terras moles, muito dificeis de utilizar, sobretudo para os grandes avides pesadamente carregados. Ha terrenos que so quase impraticé- veis em certas estacdes; assim, na Bahia, durante a estagao das chuvas que aqui correspondem a estacao fria _(julho, agdsto, setembro), os avides da Air France néo se detém, Em compensacéo, em Porto Alegre, é durante a estag&o quente. que as chuvas sio mais fortes e as partidas se tornam entao delicadas. Numerosos sa0 os terrenos que reclamam grandes trabalhos de cimentacao, como os que se en- contram em Natal. " fsses trabalhos devem ser prosseguidos, nfo sdmente no terreno de aviagéo, mas também na estrada que liga o aerddromo & cidade. A réde ro- dovidria, ainda pouco desenvolvida, obrigou a maioria das vézes a construir ca- minhos especiais para servir as estacdes aéreas, vias de acesso muitas vézes lon- gas, cuja conservagao pode tornar-se muito onerosa. Aconteceu muitas vézes que certos campos de aviacio ficaram com as comunicacées cortadas durante varios dias por ocasiéo das chuvas; a hangar do Zepeliin, perto do Rio, em Santa Cruz, ficou mais de uma vez cercado de verdadeiros lagos de Agua e, em certos dias, 0 dirigivel teve que seguir viagem sem aterrissar. : ‘A dificuldade para se achar uma boa localizagio de campo de aviacdo, cau- sou muitas vézes a multiplicago das estagées de avido. No Rio de Janeiro, por exemplo, contam-se olto: 0 campo dos Afonsos, a vinte quilémetros do centro, serve & aviagao militar e aos avides da Air France, A companhia Condor (germa- no-brasileira)* tem seu campo de hidro-avides principal, no fundo do porto, no Caju, enquanto que a estacho de hidro-avides principal, utilizada pela Pahair (americano-brasileira), est. no Calabougo em plena cidade, a beira da baia. O Zepeliin tem seu hangar em Santa Cruz, a 50 quilmetros da cidade; a Air France possui um terreno anexo menos exposto ao nevoeiro que 0 campo dos Afonsos, sobre a laguna arenosa do litoral em Jacarepagud; a marinha militar brasileira estabeleceu. seu campo na ilha do Governador. Esta inseguranca do solo duro no clima brasileiro dé uma primeira vantagem a0 emprégo do hidro-aviao; éste é ainda favorecido pela raridade de superficies planas em certas regides; o relévo em domos (melas-laranjas), cobre uma parte importante do litoral ao sul da Bahia e dos planaltos interiores. O perigo dessas terras, to onduladas como uma carneirada de vagas, aumenta ainda em virtude do seu revestimento florestal, floresta primitiva ou floresta secundaria; na_bacia amazonica, os rios constituem as tinleas superficies sem florestas e'impdem 0 emprégo de hidro-avides; a descida sobre os rios é também delicada por causa dos numerosos troncos de drvores flutuantes pouco visiveis. A poténcia da vida vegetal reclama em diversos campos de aviagéo constan- tes limpezas muito onerosas; o avido deve ser adaptado a superficies mal desco- bertas; reclamam-se aparelhos com trem de aterrissagem alto para poder rolar nas plantas baixas ou nas ervas altas. Compreende-se que ésses diferentes obs- tAculos do solo, do clima e do relévo déem vantagem ao hidro-avido, apesar do rendimento menor déste e da sua velocidade mais reduzida. De fato, a aviacdo no Brasil é hoje essencialmente uma hidro-aviacéo. Além disso, isto néo é Unicamente por adaptacdo as condigées fisicas; a circulagéo 4 Bncorporada mais tarde pelo govérno brasilelro, pasando a denominar-se Servigos Aéreos ‘Cruzeiro do Sul. TRANSCRIGOES 313 aérea ficou até hoje submetida ao antigo elxo de circulacdo ao longo da costa. A direeéo mais percorrida é desde muito tempo a via litoral; mais de 9/10 do trafego aéreo no Brasil se faz pela linha Natal, Pernambuco, Bahia, Rio de Ja- neiro, Pérto Alegre, Montevidéu, Buenos Aires e Chile. Neste percurso todas as companhias se encontram hoje menos em concorréncia do que em_colaboracdo: a Air France assegura inicamente o transporte do correio por avides muito r: Pidos voando dia ¢ noite; a Condor e a Panair transportam passageiros e correio em grandes avides com horarios menos apertados e tnicamente de dia. As par- tidas sao, gracas ao acrdo entre as companhias, quase didrias; agora gastain-se apenas dois dias para se ir do norte ao sul do Brasil, enquanto que sao precisos 15 a 20 dias por navio. ' Essas linhas séo também muitas vézes partes de grandes rédes internacionais: a Air France combéia o correio da Europa ao Brasil em 2 dias e meio, como traves- sla do Atlantico sem escalas em 12 horas. A Condor transporta também o cor- reio sObre o Atlantico para a Europa, mas com escala em 2 vapores que estacionam no meio do Atlantico; os transportes se fazem por hidro-avido; o correio leva 3 a 4 dias. Quanto ao Zepellin, transporta cada 15 dias durante 8 meses do ano 20 a 30 passageiros em 5 ¥ dias do Rio de Janeiro a Friedrichshaven e Francfort com uma regularidade notavel. A Panair, pelo Para, as Guianas e as Antilhas atinge Miami, na Florida, téda semana e liga a América do Norte a América do Sul, de maneira que o meio mais rapido de se enviar uma carta da Europa aos Estados Unidos é enderegd-la via Natal, no Brasil, onde a corres- pondéncia é assegurada. Nao ha no mundo linha aérea intercontinental tao bem servida quanto a do Atlantico sul e do Brasil. As ententes entre as companhias permitiram uma par- tida cada 3 dias e as perguntas e respostas da Europa a América podem ser trocadas pelo correlo em 1 semana. Desta linha axial do litoral comecam a se ramificar linhas de penetracao para passageiros e correlo. No norte do Brasil, de Belém parte uma linha para Manaus servida pela Panair; no Estado de Sao Paulo, uma companhia privada mantém um trafego para o oeste até Rio Préto e Uberaba. No Rio Grande do Sul, uma outra companhia brasileira tem tentaculos que penetram para o oeste do Estado. A Condor pés em servico uma outra linha indo de Sao Paulo para Co- rumba e Cuiabé, capital de Mato Grosso. Tédas essas linhas reproduzem em suma a antiga réde de comunicagées; eixo litoraneo e vias de penetracdo para o interior."A revolucao do transporte ainda nfo foi realizada pela aviacao. Entretanto, iniciativas atuais fazem prever mudangas. A aviacdo militar do Brasil se ocupou’em abrir novas rotas & navega- ga0 aérea; ela exerce uma verdadelra funcao de pioneira e se lancou ousadamen- te para o interior, para o sertdo; ela continuou a politica de penetracao ja en- cetada pelas companhias privadas, mas sobretudo ela comecou uma politica de juncao das diferentes partes do Brasil; ela marca as novas rotas, organiza os primeiros campos de aterrissagem, estabelece balizamentos provisorios, instala, de acérdo com os servicos metecroldgicos, postos de previsio do tempo; enfim e sobretudo, ela transporta o correio em algumas horas a regides que ndo o recebiam senfo depois de semanas e que, por éste fato, ficavam fora da érbita politica e econémica do pais. : A linha militar de Rlo-Sio Paulo-Goids ¢ ainda uma linha de penetracio; mas, recentemente puseram-se em servico duas linhas de jungdo transversais, assegurando uma ligagdo entre o norte e o sul do Brasil por outra via que ni a da costa; tédas duas atingem Belém, uma por Belo Horizonte, Pirapora, des- de o Sdo Francisco até Juazeiro, chega 4 costa em Fortaleza e caminha ao longo dela para Belém; a outra aproveita o vale do Araguaia e desemboca diretamente na foz do Amazonas, perto de Belém. Uma terceira linha da mesma ordem, igualmente norte-sul, esta em estudo; 0 trajeto ja fol efetuado; é a linha Ma- naus-Cuiabé pelo vale do Tapajés em regiées florestais ainda pouco conhecidas. As jungées leste-oeste esto também em vias de realizacdo; a aviacdo militar efetua voos regulares desde o Rio ¢ Séo Paulo para Campo Grande, no sul de Mato Grosso, e dai os avides se dirigem por duas rotas para a fronteira do Pa- Taguai, onde outros aparelhos paraguaios transportam o correio para Assun¢ao; 314 BOLETIM GEOGRAPICO hoje o correio paraguaio comeca a chegar & Europa pela via brasileira e a Air France notadamente assinou um acérdo com a aviacad militar brasileira para assegurar ésses transportes. : Na Bolivia, a linha Condor, que ja liga Corumb4 a Sao Paulo é prolongada por uma linha germano-boliviana até Lima e La Paz. Além disso, a linha de Manaus ao longo do Amazonas deve ser prolongada proximamente pelo vale do Madeira até o Territério do Acre e atingira assim, em diregao de Rio Beni e dos campos de petréleo, a fronteira boliviana. O Territério do Acre também vai ser atingido pelo prolongamento da linha de Culaba, que seguiré o Guaporé até o Madeira. A linha de Manaus ter proximamente uma outra ramificagio para oeste, que subira o Amazonas até Tabatinga, na fronteira do Peru, e atingira Iquitos. & questo enfim, num futuro mais afastado, uma jungéo Manaus-Bogo- ta, pelo vale do rio Negro. © Brasil j4 contava’ em 1935, 60 000 quilometros de linhas aéreas em servico, , ou seja, 1 800 mais que em 1934. Essas linhas asseguraram os transportes seguin- tes para 1935: : passagelros 25 500. bagagens 325 toneladas correios » >” 20” 180 As duas principais estagdes de avides sio: Rio de Janeiro, com 3 500 passageiros embarcados a $ 600 desembarcados. Pérto Alegre, com 2 800 passageiros embarcados e 2 700 desembarcados. Esse tréfego é ainda incipiente, mas progride com uma rapidez espantosa; JA se entrevé que a navegacdo aérea esté destinada a transformar o sistema da circulacdo do Brasil. Quando tédas as juncdes transversais norte-sul ou leste- oeste estiverem realizadas (e elas o estaraéo certamente num futuro muito pr6- ximo), a circulacao no Brasil deixard de ser inicamente periférica e exterior; 0 pais intelro participaraé da vida de relacdes, desempenhard ésse papel a que a sua situacdo geografica o chama e que éle‘ainda nao preencheu: o de ser a fachada de téda a América do Sul para o leste, para a Europa; éle concentraré as comu- nicagées entre os dois continentes. Da mesma forma, na Europa, a Franga foi chamada como término ocidental do continente para servir de ponto de partida park a América. O interior do Brasil em vez de ser uma zona de isolamento e de enclausuramento tornar-se-4 uma zona de passagens e de ligacdes. # téda a unidade do Brasil que se achar4 consolidada e fortificada pelo avido. Hoje, a aviacdo ainda nao trouxe ao Brasil uma grande revolugéo na sua circulacao, ela ainda n&o assegura, como os outros meios de locomogio anteriores, sen&o uma circulacdo de franja, mas se pode prever para um breve prazo 0 novo estégio em que o interior do pais contaré com numerosas estacées de avides e seré enfim integrado na circulagdo geral. NOTA — Para dar uma idéia do desenvolvimento aerondutico do Brasil, damos aqui as esta- tisticas do movimento aéreo comercial nos witimos anos. Bsses dados, que pela primeira ver sfio publicados, sfo devidos a uma especial gentilesa do brigadelzo Listas Avcusto Ropercuss. TRANSORIGOES x8 : Correio Aéreo Militar ano Linas aes Horas de véo Kin voades Gucane as 740 472,30 54 888 340 045, +3 695 865,20 127 100 130 445 7 7 000 7 1 776,15, 251 505, 3 834 132 2 8 219 p 4 279,55 “| 615 785, "| 10 428 406 10 280 ‘5 71415 i 925 020 18 365 877 12 250 6 449,15 1 080 39 | 23 907 282 18 878 0 | 191030 | 44 000 260 14 916 P1663 40 | a8 mie 252 19 7 10 759,35 1995 708 55 163 911 ~ 100. | iss70 | 10900 | 205000 | 60 a25 450 Correio Aéreo Nacional ano Has siees Horas de vé0 Km voatos ee ot, fae wis | 12 052,45 2 174 489 66.008 130 cee | R044 14 75815 2-416 017 122 086 303 Z 12 632,05 E 2 520 634 999 862 755 - 1944 sms | sade | 2503 042 | 256-080 483 : Aviagio Comercial (Continua) Ano Passages Sagagene—| Cornponatc Gace 1930, 4 667 “| 33 864 31 946 | 9 “606 1931, 5 102 46 618 47 908 121 916 1982, ‘8 804 101 884 68 207 129 874 1933, " . 12 750, 145 O74 15 057 112 755. 1934, 18 om | [as 089 ‘73 542 142 636 . Pages asso] aa 102 7a 682 | 101 720 478 057 118 652 "188 013 795 998 | 149 138 735 024 36 BOLETIM GEOGRAFICO Aviacio Comercial (Continuacto) Bagagem Correspondéncia Carga AN Passagelras ray ck) tke BB, eects 63 423 894 940 185 642 354 975 70 724 990 804 202 620 446 138 82 869 1 027 305 234 962 432 368, 99 688 1 612 153 233 456 735 066 122 123 2 085 379 298 522 1 106 272 171 860 3 043 893 566 940 2 953 926 121 248 2-105 007 361 425 1 667 868 * 56 no 1 semestre Este “Roletim”, a “Revista Brasileira de Geografia” ¢ as obras da “Biblioteca Geografica Srasiielra’ encontram-se 4 venda nas principais livrarias do pais e ma Secretaria Geral do Conselho Nacional de Geografia — Praca Getalio Vargas, 14—dificlo Francisco Serrador - 52 andar — Rio de Janeiro, D. F. Resenha e Opinides do _relévo nordestino Caracteristie: (regiao litoranea) Terrenos de diferentes constituices e estruturas geoldgicas, sob a acao dos mesmos agentes do metassomatismo, oferecem os seus respectivos coeficien- tes de resisténcia & erosdo. De Lanessan levando o darwinis- mo ao reino inorganico, acha que a luta pela existéncia prevalece também en- tre os minerais. De certo modo, ape- sar de se tratar de um conceito mais fi- loséfico que cientifico, concebe-se que os constituintes essenciais dos terrenos — 0s minerais — “lutem pela sua so- brevivéncia”, mas ésse modo de luta é passivo: uma constante adaptacao. O terreng-atuado pelos diversos agentes de erosao toma a forma, de acérdo com @ sua constituic¢éo e estrutura geolé- gica, que melhor lhe permite resistir A sua ‘destruicio. Dai as proeminéncias cOnicas, os morros arredondados, os declives, os perfis de equilibrio, as es- foliagdes, etc, meios e formas pelos quais a rocha “procura” perpetuar-se numa insustentavel defesa, contra a agao mecanica e quimica da atmosfera, Entretanto tem o terreno, muitas vézes, um aliado, um escudo de prote- go com 0 qual ’estabelece um acérdo tacito; é 0 manto de revestimento de natureza organica, que em troca déle recebe alimento e arrimo. As formas do terreno que tém revestimento vegetal esto quase sempre, praticamente esta-~ bilizadas. O recife de arenito dotado de protecéo coralina, resiste quase eter- namente ao embate das vagas. Sendo desuniforme pelo Nordeste- Oriental o regime das chuvas e dos rios, a velocidade dos ventos, a altitude e a direedo da costa, sucede que a inter- feréncia désses fatéres, sbre um ter- reno da mesma constituicao geoldgica, acarreta variagdes geomorficas, apre- ciaveis, entre dois pontos nao’ muito afastados. Assim, o aspecto do relévo das ser- ras e serrotes, que se filiam ao macico da Borborema, no Rio Grande do Nor- te, contrasta muitas vézes, com as ele- vag6es similares de Pernambuco ou Pa- raiba; outro tanto acontece com o de- senvolvimento dos tabuleiros de acérdo com a latitude e também com a morfo- logia do relévo marginal as praias. Definem-se na faixa dos trabalhos do Destacamento, no Nordeste, trés or- dens morfolégicas no relévo, que se subordinam naturalmente, as ‘respecti- vas estruturas e formacdes geolégicas. I) Relévo da faixa litorénea, cons- tituido pelas rochas sedimentarias, ter- cidrias e quaternarias, Il) Relévo das rochas eretdceas. TI) _Relévo das rochas cristalinas. © relévo da faixa costelra esté compreendido por altitudes, que me- deiam entre as planivies litoraneas de vaza, as praias e os tabuleiros, isto é, entre o nivel do mar e altitude de 250 metros. As formas do terreno que ai se encontram sao: planicies de vaza, praias, dunas, morros, outeiros, tabu- leiros ‘e chas. : “Todo 0 solo eleva-se em colinas Pequenas e amenas; montes notaveis por alguma altitude nao existem nos litorais, nas soliddes”, observava Marc- grave, em meados do século XVII. O relévo da rocha eretacea, é tipicamen- te a chapada, As vézes chamada serra, atingindo a altitude de cérea de 200 metros. © ‘relévo das rochas ‘cristalinas pode ser decomposto' de acérdo com @ sua fei¢éo, em serras da encosta da Borborema, serras e serrotes isolados ¢ numa peneplanicie. No dorso de muitas serras falta muitas vézes a crista; a ar- quitetura 6 entéo tabular, aparece a chapada; as chs, topoplano nas fai- xas estreitas; tabuleiros nas zonas pe- neplanizadas, amplas, porém sem as demais caracteristicas dos tabuleiros do litoral. No relévo do eretaceo e do cristalino ‘obtém-se a confirmacao das modernas idéias sobre o relévo do Bra- sil, o qual conforme os nossos melhores autores geograficos vém acentuando, a- fim-de desfazerem conceitos erréneos, “6 muito mais de planaltos do que de serras prépriamente, Os desnivelamen- tos que se observam no Brasil e que m8 BOLETIM GHOGRAFICO vulgarmente recebem o nome de serras sio na realidade, simples bordas de planaltos e chapadas; nao sao geral- mente elevaces com declives acentua- dos de um e outro lado, mas sim es- carpas, que dao a impressao de serra aos que as contemplam de um nivel mais baixo, Galgada, porém, uma des- sas escarpas, chega-se a um planalto com relévo pouco acentuado e declive geral suave. Por essa razao, ja foi pro- posto o curioso nome de 'semi-serras 4s serras brasileiras. Em duas palavras podemos sintetizar as formas de relé vo no Brasil: degraus e patamares; ou melhor, escarpas e planaitos”. (Dr. Fa- bio Macedo Soares Guimaraes. Geolo- gia e Relévo). No peneplano ou peneplanicie cris- talina, que assinala a maior parte do relévo da faixa ocidental dos trabalhos do Destacamento, observa-se nos vales dos grandes rios, que gozam de regi- me torrencial, um relévo de baixa al- titude, normalmente de menos de 100 metros. Atestando ésse vasto trabalho de desgaste, nitidamente pelas aguas fluviais e pluviais, sobressai-se o vale do rio Paraiba. Em regra mantém-se a altitude do cristalino abaixo de 150 metros, salvo nas serras, alguns serrotes.e picos, quando atinge a cérca de 800 metros. Em_sintese, sob 0 aspecto de re- lévo, a faixa litorénea do Nordeste onde operou o Destacamento, apresenta-se na costa, com planicies (praias, man- gues, restingas), outeiros, morros, bar- teiras e dunas; ‘no centro com as chas e na maior parte tabuleiros, mais res- tritos ao sul do Capibaribe; na faixa interior, a peneplanicie do cristalino, serras ¢ serrotes isolados e cin grande parte do Rio G. do Norte, as chapadas cretaceas. 1) RELEVO DA FAIXA LITORANEA, OU DOS SEDIMENTOS TERCIARIOS E QUATERNARIOS. Pernambuco: — Ocorrem ai as pla- nicies costeiras, com as praias, man- gues restingas, varzeas, constituindo © nivel mais baixo do terreno, que na faixa em apréco se alteia, gragas aos sedimentos argilosos e arenosos do ter- elario, até um pequeno planalto de cérea de 200 metros de altitude, do qual se derivaram por eroso, as colinas ou outeiros, barreiras, morros, chas e ta- buleiros. As chas e tabuleiros sio formas topeplanas do reléyo dominantes na faixa litoranea. (Sobre a sua morfolo- gia véde Notas através do reconheci- mento geodésico, de uma faiza do lito- ral nordestino, existente no Arquivo Técnico do Destacamento). Os outeiros, morros e barreiras, cuja parte mais alta é 0 “caculo” ou “pina- co”, na_terminologia do caboclo do li- toral sao residuos ou testemunhos da erosao das chas ou tabuleiros medean- do altimétricamente entre ésses as pla nicies. Entre as formas désse relévo em Pernambuco, destacam-se: Os morros ao sul do Capibaribe, que so os mais altos, situados alias préximo ao Recife: — morro da Areia Branca e os historicos outeiros de Gua- rarapes, respectivamente com 87 e 74 metros de altitude. Ao norte do Capibaribe os morros mais notaveis séo a barreira do Monte ou morros do Gil com 65 metros de al- titude, em Olinda; os morros reves- tidos de capoeira baixa junto a locali- dade de Nova Cruz dominados pelo morro do Cemitério, com 67 metros de altitude: os morros’da ilha de Itama- raca, com alguma mata, tendo os dois mais altos, ao norte e no centro da ilha respectivamente 80 a 70 metros de altitude, Finalmente. completando essa: lis- ta de morros da costa pernambucana, aparecem na barra do Catuama, 0 Se- leiro e 0 Funil, revestidos de alguma mata e com 70 metros de altitude apro- ximadamente. O comandamento do relévo na fai- xa em consideracao, reside entretanto nas chas e tabuleiros ao norte do Ca- pibaribe. Bssas formas do relévo atin- gem sua maxima altitude e mais tipica expressio, na bacia hidrografica do rio Arataca, onde restam ainda alguns testemunhos de mata. Ai se encon- tram as chas do Infinca e Palmeira, com 190 e 181 metros de altitude respectivamente. Paraiba: — O relévo da faixa se- dimentaria tercidria paraibana apre- senta-se sob a forma tipica de tabu- Jeiros, alguns morros e barreiras, que alias 'sio escarpas dos primeiros. Citemos agora os tabuleiros mais notaveis dessa regido paraibana. ‘Ao sul do rio Paraiba desenvolve- se a vasta regiao tabular, em que se encontram as nascentes do Gramame e Mumbaba. As primeiras, no tabuleiro de Meio do Mundo, que é'um dos mais altos da faixa sedimentaria tercidria do Nordeste Oriental, com a altitude RESENHA E OPINIOES de 210 metros. Entre os tabuletros das vertentes do Mumbaba acha-se o do Mata do Rélo, com 146 metros. Entre os rios Paraiba e Guaju, des- dobra-se uma zona de altos e extensos tabuleiros, que em seguida discrimina- mos com as respectivas altitudes: San- ta-Helena, com 196 metros; Santana, com 125 metros; Sucupira Torta, com 150 metros; Caboco, a oeste de Lucena, com 92 metros; os vastos tabuleiros entre os rios Camaratuba e Maman- guape, onde se encontra Marla-Pitanga, com 201 metros; o tabuleiro dos Mar- cos, onde nasce o Guaju, formando divisa com o Estado do Rio Grande do Norte, com 186 metros de altitude. Entretanto, a regiao dos tabuleiros mais elevados, de téda a faixa terciaria e possivelmente de téda a formacao sedimentaria do Nordeste - Oriental, com exclusao forcosamente das bacias sedimentarias do interior, é a que se encontra no divisor do Camaratuba e Curimatai, proximo e a leste da vila de Jacarau, com a altitude aproximada de 250 metros. © relévo da costa paraibana nao é a repeticao integral do de Pernambuco. A diferenclacdo esta no desenyolyimen- to, em varios trechos, junto as praias, de barreiras cujas alturas variam de 10 a 30 metros e perlongando-se, as vézes, de 2 a 3 quilémetros. Essas barreiras representam a tran- sigéio dos outeiros e morros da costa pernambucana, para as dunas do lito- ral riograndense do norte e cearense. As barreiras sao falaises ou melhor, escarpas, ostentando argilas variegadas e denunciando uma brusca interrup¢ao de processo estratigrafico de sedi- mentacao. Certos trechos das barreiras per- mitem conjecturar, se nao resultaram de uma falha da qual sao espelho, es- tando o primitivo prolongamento do tabuleiro submerso, ou constituindo hoje, uma praia ou planicie costeira. Contudo € corrente que as barrel- ras so o produto da erosdo das vagas, admitindo-se preliminar e logicamente que s6 apés 0 processo normal de sedi- mentacao terrigena, que deu lugar aos tabuleiros, tivesse ocorrido uma trans- gresséo marinha ou movimento nega- tivo da crosta. Do sul para o norte, as barreiras mais notaveis da Paraiba estéo pouco ao norte da vila de Pitimbu, cujo nome deriva, segundo 0 pratico Filipe F. Pe- reira, de “uma barreira esbranquicada, 9 do’ feitio de uma vela latina”; junto & praia de Mucatu ficam as mais altas barreiras da costa paraibana, das quais diz a célebre carta de Mouchez: “gran- de falaise rouge visible 20 milles”; se- guem-se as de Garat; as do Grama- me; as que se revestem de enorme im- portancia geografica, _estendendo-se por cérca de 2 quilémetros da praia da Penha a de Tambati, contendo 0 fa- moso cabo Branco, onde se encontra a ponta do Seixas; extremo oriental da América; as do Miriri e finalmente as barreiras que se prolongam do “Forte”, na baia da Traicéo ao rio Camaratuba. Os morros de dunas (relevos de acumulacéo) na Paraiba principlam a esbogar-se entre o rio Mamanguape e a baia da Traigdo, em monticulos, que num trecho ao sul desta, provocando © represamento das aguas dos rios Si- nimbu e da Estiva, formam a lagoa de Sinimbu, da qual se escoa o rio Ca- murupim. Ao relévo das dunas esto claramente relacionados certos aspec- tos hidrograficos litoraneos, principal- mente no Rio Grande do Norte: for- macao de lagoas, obstrucdo.e desvios das barras dos rios. Os morros mais altos da costa pa- raibana, velhas dunas_perfeitamente estabilizadas pelo revestimento floris- tico, estéo entretanto ao norte do Ca- maratuba e dai por diante prosseguem com algumas solucdes de continuidade, que se encontram nas reas de mangue, das imediagées das embocaduras dos grandes rios. Satélites das dunas sao as lagoas das quais mais adiante tra~ taremos em resumo. As dunas ao sul do rio Guaju e as junto 4 povoacdo praieira de Pavuna apresentam-se com excecéo de .dois morros, cobertas de mata e capoeira, sao pois na classificacéo de Raja Ga- baglia, “dunas mortas”. Entretanto o topo das duas que ficam em Pavuna, tendo a mais alta 94 metros de altitu- de, acha-se atapetado de graminea, completo alimento da criacdo caprina, do lugar, pois as félhas retém certa sa- linidade'do ar do mar vizinho. ‘As observagoes que fizemos de nu- merosas dunas da Paraiba e Rio Gran- de do Norte, permitem-nos afirmar que na maior parte delas, a espessura de areia é muito diminuta, surgindo logo abaixo, sedimentos ~ silico-argilosos. Tanto que numa delas, a de Cipoal, proximo & bafa Formosa, no Rio Gran- de do Norte, ha até rocado. Agora Tespondamos a uma per- gunta: E’ o revestimento floristico que impede a existéncia de “dunas vivas” ou francamente movedicas, nesse tre- cho da Paraiba e em parte do Rio Grande.do Norte? Nao. Se bem que seja sabido que varios paises, como Portugal e Franca mesmo 0 nosso (barra do Rio Gran- de, barra do Cunhat, etc.) adotam em certos pontos, o processo de fixacao das dunas, por meio de espécies vege- tais arenicolas de raizes bastante fas- ciculadas, Nas dunas em apréco néo houve intervengéo do homem, plantando. A vegetacdo nelas surgiu, por modifica do operada no regime dos ventos nes- Se trecho do litoral, como justificare- mos adiante, e por outro lado pela fa- vordvel pluviosidade ai reinante. Rio Grande do Norte: — A faixa sedimentaria tercidria e quaterndria désse Estado, apresenta o relévo mais rico e original em formas, que os de- mais Estados do NE. — Oriental. Caracteriza o relévo da eosta do Rio Grande do Norte e Ceara, até a regiéo da Fortaleza, onde alcahcamos trabalhos do Destacamento, os trechos de morfologia de dunas, portanto tipi- camente devidos & acéo edlla, ao con- trario dos agentes normais da modela- gem do terreno, Isto é, as Aguas plu- viais e fluviais. ‘A causa principal da formagao de dunas nesse trecho do Nordeste, resi- de nos ventos de sueste na sua per- sisténcia e intensidade, que se acentua justamente nas horas ‘de maior calor, quando as areias esto mais sécas. Por outro lado, outros fatéres concorrem, por exemplo, as condigées pluviométri- cas désse trecho do litoral, menos plu- vioso de todos, notadamente entre Natal e Fortaleza. Também os recifes que se desdobram até as alturas do cabo Sio Roque, sio freqiientemente do tipo praieiro,’ contribuindo para a retengao da areia cujos grios, logo que secam sao levados pelo vento para as praias. E entretanto na velocidade dos ventos predominantes de sueste, nes- se trecho do Nordeste, que se manifes- ta a explicacio da ocorréncia das du- nas litoraneas, cujas arelas sé assim puderam cobrit morros de cérea de 100 metros de altura. E’ também admissivel que a inten- sidade dos ventos de SE, e ESE, no li- toral norte da Paraiba'e dai para o Ceara, fosse outrora muito maior que presentemente. Essa hipotese decorre do encontro de areias de origem edlia, a mais de 10 BOLETIM GEOGRAFICO quilémetros do mar formando antigas dunas (Guarapes a SO, de Natal) ¢ revestindo morros, caracteristicamen- te entre a lagoa de Guarairas e as pro- ximidades de Touros. © morro de Guarapes atesta ple- namente, a grande velocidade outrora dos ventos de SE., pois as arelas foram transportadas a 16 quilometros da cos- ta, subindo até 110 metros de altitude. Com ésses morros, outros se apresen- tam com areias avermelhadas, ferru- ginosas, demonstrando intensa oxida- 40; como corrasdo das camadas argi- loss subjacentes, que se interpunham & violéncia do vento. A média da velocidade do vento em Natal, durante o ano de 1938 foi de 8.8 metros por segundo, nao sendo in- ferior a 7m/s em qualquer més do ano, ao passo que em Jodo Pessoa nao fol superior a 3.5m/s. Por sua vez os dados meteorolégicos de Olinda, durante 14 anos (1924-37) mostram ‘a velocidade média do vento, em cada um désses anos até 3.5 m/s. A principio, ao observarmos a dis- tribuicdo.das dunas no Nordeste, es- tavamos atribuindo como um dos faté- tes principais na formagio das mes- mas, ao rumo do litoral NNO a partir do cabo Branco até Touros, e dai ao Tumo geral L.-O. até Tibau, seguindo depois na direcéo de Fortaleza na di- regdo geral NO. Tinhamos entéo em vista, por um lado as direcGes gerais dessas inflexdes e por outro, os ventos predominantes de SE. Entretanto numa observacao mais acurada do litoral verificamos que se formam dunas e notdveis, em praias que se distendem na direcio geral N-S, como entre Ponta Negra e Natal. Portanto, como explicar a nao ocorréncia de tais formas de relévo, no trecho do litoral do Nordeste tam- bém N-S, assim entre ponta de Pedras e cabo Branco, onde também os ven- tos predominantes sio de SE? A explicacéo reside fundamental- mente, como mais elogiientemente fa- lam os dados abaixo, na persisténcia dos ventos fortes de SE., na regido de dunas. A existéncia de dunas balxas, no trecho L-O do litoral do Rio Grande do Norte, é devida & secura dessa area do Nordeste, justamente submetida ao fe- némeno da séca, que conjugada orientacdo da costa, restringe a faixa de penetragao das areias pelo interior. Estao nesse trecho as dunas tipicas, as chamadas “dunas vivas”. RESENHA E OPINIOES 381 PRIMEIRO E SEGUNDO VENTOS PREDOMINANTES De Fortaleza a | De Sio Roque a ESTAGAO DO ANO Sao Rogue Pernarbueo Dezembro, janeiro @ fevereiro... Seco SE, ESE SE, ESE Outono Margo, abril ¢ maio.... SE, ESE SE, ESE Anverno Junho, jutho e agésto. SE, SSE ‘SE, SSE Primavera Setembro, outubro ¢ novembro SE, ESE SE, SSE Tal € 0 regime dos ventos ao largo Sao bem expressivos os dados ane- da costa do Brasil, entre Fortaleza e mométricos, referentes a Natal e Joao Pernambuco, segundo as “Pilot Chart” Pessoa, que permitem uma compara- publicadas pelo “Hidrografie Office” e ¢ao sébre a velocidade dos ventos, en- 0 “Weather Bureau” (Morize-Clima do tre duas regides relativamente préxi- Brasil) . mas, uma com dunas e outra nao. a ss [73 | 6 \ 9.0] 90] 8.7] 84] 84 Bocce | il al | 2 — | 3a] 85] a4] 7.7 sf utr fs |-]- \ 73 92) ual — | — Velocidade Froqlléncia anual r Fey, | Margo| Abril | Malo} Jun. | Jutho |Agdsto| Set.) Out, n 3.0 aT 3.3 a 3.3 7 2.9 2 27 36 2.9 382 BOLETIM GEOGRAPICO As demais direcdes surgem déste modo: NE. 8. 80. Observa-se 9 ausénels ventos de 0., NO. e N. © contraste mais elogiiente ressalta do quadro abaixo: CAPITALS. Froqunela anual Velocidade Soh (pelo menos entre o amanhecer e as primetras horas da noite), de Velocidad m/s Velocidade m/s 8.2 13 32 28 Os dados mensais sObre Natal permitem também inferir, que mutto influ! na movimen- taco das dunas, 0 acréscimo da velocidade do vento, colneldindo com a época menos ehuvosa (setembro a dezembro).. Retomamos novamente as formas do relévo das rochas sedimentarias ter- clarias e quaterndrias. As dunas podem apresentar-se nesse Estado, estabiliza- das ou “mortas”, movedicas ou “vivas” e mistas, isto é, semi-fixas, Sob 0 ponto de vista altimétrico podemos dividir as dunas désse Esta- do, em trés tipos: A) Dunas que atingem até cérca de 120 metros de altura. B) Dunas de altitude maxima com~ preendida entre 70 a 100 metros. C) Dunas de altitude inferior a 710 metros, As dunas do tipo A ocorrem de Saji na barra do Guaju a Natal, na barra do Potenji. Sio dunas pratica- mente consolidadas pela vegetacao, mas contendo ainda, algumas, certas par- tes que estio sendo alteradas pela acao eélia, Esse trecho do Nordeste € um dos mais belos do litoral brasileiro, pois no possul apenas a monotonia paisa- gistica das longas e classicas praias dos coqueirais e das barreiras de Per- nambuco e Paraiba; os morros, dunas, praias e baias dio a ésse pedaco do li- toral riograndense do norte inexcedivel variedade, ora no recanto manso de suas bafas; ora, nas pralas de aguas limpidas e mar bravio; ora, no conjunto variado de morros agrupados 4 ma- neira de pequenas serras verde-escuras, contendo picos, cumes arredondados ¢ colos; ora, manchas de areias alvissi- mas ou avermelhadas, coroando as ele- vagoes ou galgando’'as encostas dos morros; e, enriquecendo a paisagem, combina-se a essa variagdo do relévo, uma sucesséo de grandes e pequenas Jagoas. O iitoral, na serra do Mar, entre Vi- téria e Santos, tem o encanto da pers- pectiva vertical, ao passo que o das du- nas do Nordeste tem beleza em pers- pectiva horizontal. Entre o Guaju e a barra do Cunhau, 9s morros que se destacam sio os da barra do Saji e os de sueste da baia Formosa: Joao dos Santos, Urubu e Ci- Poal, éste com 93 metros’ de altitude. Da barra do Cunhaii 4 lagoa de Guarairas, levantam-se morros, alguns pouco mais altos que o de Cipoal, Os mais importantes sféo: o de Susana, préximo & povoacéo de Cunhat; os das imediagdes de Cibatima e Pipa; os do Madeiro com o cume mais alto de 87 metros de altitude, que na descri- ga0 do pratico Filipe Francisco Perei- ra (Roteiro da costa norte do Brasil, desde Maceid até o Pard) — “tornam- se bem conhecidos por serem altos e escarpados e em varios pontos apre- sentam terra vermelha”, RESENHA E OPINIOES Entre a lagoa Guarairas e o Poten- J_erguem-se as mais notaveis forma- gées de dunas sobre os morros. Salien- tam-se os do Camurupim, com 0 Arri- pia (98 metros) os morros’ Amarelo, Ati, Rio Doce e das Casas (95 metros) , pro- ximos ao povoado de Alcacus, 0 morro das Casas deve ser aquéle que apresen- ta “pela face do mar um areial, que visto ao longe, tem a configuracdo de uma frente de casa”, segundo o Roteiro de Filipe Pereira, Seguem-se os morros da barra do Piranji; o caracteristico morro do Navio ou Vermelho (106 metros), que se le- vanta em forma de pico, entre o po- voado de Aleacus e a parada de Ca- jupiranga; os morros do Pium; os mor- ros de Ponta Preta, Estrondo'e Pedrés e préxima e ao sul de Natal, a regiao das dunas dominantes do litoral do Nordeste, entre as quais avulta o morro das Mochilas, com 124 metros de altitu- de, confrontando-se com a ponta do Pinto, Entre o Potenji e Reduto desenvol- Yem-se os morros de dunas do tipo B, isto 6, com altitudes maximas, que me- deiam de 100 a 70 metros. Os principais morros séo os de Prataji; Pitangui; 0 do Caboco, jun- to & praia de Murii; 0 Vermelho, ao norte do Maxaranguape e j4 afastado do mar; os morros da barra do Maxa- Tanguape, confrontando com o famo- 50 cabo Sao Roque. Rste promontério tao mencionado na geografia patria, néo se apresenta na costa com o 1 ce, que se nos afigura na imaginaca passa mesmo desapercebido, se um pra- tico ou conhecedor da regiao nao apon- ta-lo. Dessa opiniao compartilha o pra- tico Filipe F. Pereira: — “O cabo Sao Roque nao apresenta alteragdo sensi vel na costa com as terras vizinhas — é antes uma ponta e alguma coisa mais saliente que um cabo propriamente dito. Efetivamente, a ponta do Calca- nhar, a cérca de quilémetros a NO., de Touros é que melhor assinala a mu- danea de direcao para oeste, déste trecho da costa brasileira. Os morros mais notaveis de Sio Rogue para Touros so: o morro dos Anéis; Santa Cruz; Pintado: Mata-Ca- boclo (1,5 quilémetros a SE. do povoado Rio do Fogo) , tendo a SO. o morro de Alexandre Velho e finalmente os mor- ros de Touros. Entre Cajueiro e Caiana (Lagoa do Sal) ergue-se o morro Croado ou do Coelho, que passa a assinalar para oeste 383 as dunas do tipo C (com menos de 70 metros de altitude e francamente movedicas) . Proximos a Reduto ficam o morro Préto e o do Arame vistos do mar a cér- ca de 30 quilémetros. Ja nas dunas de Reduto € acentuada a acdo edlia e o testemunho elogiiente, esta no encon- tro de madeiras silicificadas oriundas de grossas quixabeiras que foram soter- radas pelas areias, as quais tempos de- Pois foram novamente removidas pelo vento. Entre Reduto e Caicara ocorre uma sucesso de dunas baixas, caracteriza- das pela auséncia de vegetacao de re- vestimento, das quais os morros mais altos sao os do Cotia e Canto de Cima. De Trés Irmaos para 0 oeste as du- nas levantam-se mais um pouco, ofe- recendo morros de tépo arredondado, mas do classico perfil parabélico: — morro do Ronca, junto a Sao-Bento; morros do Maxixe e Jacaré, que apa~ rentam ser os mais altos até a regiao de Macau, com cérca de 40 metros de altitude. Dai para Tibau, na fronteira com © Ceara, os morros de dunas mais altos. s8o os que formam a ponta do Mel (chamada antigamente ponta do Meio) contendo algumas barreiras; notam- se também os morros de Cristévao, en- tre ponta do Mel e Areia Branca e fi- nalmente o morro do Tibau, bem perto de 50 metros de altitude, em cuja praia deparam-se umas dunas variegadas e areias coloridas. De Tibau para Fortaleza prossegue pelo litoral o relévo do terciario e qua- ternario barreiras e dunas — notando- se, porém, que ja oferece muitos morros revestidos de mato e por outro lado ob- serva-se maior largura na faixa do areal costeiro, lembrando 0 trecho da costa do Rio-Grande-do-Norte, onde o litoral se orienta na direcao geral NO- SE. Os morros mais importantes sio 0 de Manimbu, dos Picos, Mandioca, Ca- noa-Quebrada, Cumbe, Sucatinga, Branco, Cajueiro, Guaiai; ‘Uruau, Igua- pe e Gojabeiras, que também nao as- cendem a mais de 120 metros de al- titude. Completando a morfologia da fai- xa sedimentaria tercidria e quaterna- tia do Rio Grande do Norte estéo os tabuleiros, as varzeas e planicies cos- teiras. 304 BOLETIM GEOGRAFICO Temos que considerar os tabulei- Tos e varzeas compreendidos entre as dunas e a peneplanicie de oeste na parte do Estado, que se desenvolve na dire- ¢40 geral NNO-SSE; bem como os ta- buleiros, varzeas e’planicies compre- endidos’entre as dunas e o relévo do cretéceo, jé na regido setentrional. Na 1.8 sub-faixa a forma predomi- nante do relévo é tabuleiro. Os tabulei- ros do Rio Grande do Norte caracteri- zam-se pela menor altitude em relacéo aos de Pernambuco e Paraiba e vao progressivamente baixando da altitude de 190 metros para menos de 100 me- tros, da Paraiba para o norte, na dire- gio de Touros; outrossim revestem-se de uma camada de areia mais espés- sa e fofa, como apresentam também menor variedade floristica, a proporeao que decresce a latitude, refletindo a di- minuigéo das chuvas. Os tabuleiros mais notaveis sio do sul para o norte: — os das cabeceiras do Piquiri, com 190 metros de altitude, © mais alto de todos; os tabuleiros da regido de Brejinho, entre o Jacu e 0 Trairi, com 180 metros; os tabuleiros onde esto as nascentes do Pitimbu e Cajupiranga, com 115 metros; Entre o Potenjf e 0 Maxaranguape, os mais al- tos tabuleiros nao véo normalmente além dessa ultima altitude. Assim o ta- buleiro entre o Ceara-Mirim e o Poten- ji, atinge nas proximidades de Maca- randuba e altitude de 91 metros e acha- mos pouco provavel que se encontre al-. gum outro nas adjacéncias ou seguin- do para Touros, que tenha altitude su- perior a 115 metros. Na 2 sub-faixa (entre as dunas e 0 cretaceo) o relévo mantém-se pre- dominantemente na monotonia de pla- nicles e varzeas, com raras proeminén- cias, entre as quais citamos a dos Altos, com cérca de 130 metros de altitude, no municipio de Touros, atravessada pela estrada de Pureza a'Baixinha; Quixa- beira, elevagdo préxima a Parazinho; serra Morord, com cérea de 80 metros de altitude, a SE. de Séo-Bento, em cujo sopé ocorrem afloramentos de cal- cAreos, portanto apenas a 10 quilome- tros do mar aproximadamente. Ainda entre as raras elevacdes do terciario, destacando-se das planicies vizinhas, salienta-se 0 Mangue-Séco a SE. de Macau, com cérca de 11 metros de al- titude ‘recuado da costa uns 12 quil6- metros. Este acidente figura na carta do Almirantado inglés: “Rio Mogoré to St. Roque Channel”. Na faixa terciéria ao sul da ponta do Mel, entre 0 Mocord eo Acu, de- senvolve-se uma vasta regiio de tabu- leiros, muito secos, arenosos, cuja alti- tude a cérea de 12 quilémettos do mar ascende a 170 metros aproximadamen- te, mas que vao se alteando para SO., onde esta a serra do Carmo, cujos ca- begos dominantes, formados de suaves arqueamentos, pedregosos, atingem cér- ca de 240 metros de altitude na Capo- eira dos Homens, Cabego-Grande © Agude. Do Apodi para o Ceara, quando a faixa tercidria inflete na direcao geral de NO. os tabuleiros mantém-se baixos, atingindo cérea de 70 metros de alti- tude. II) RELRVO DA FAIXA DAS ROCHAS CRETACEAS E ARENITOS CRE- TACEOS: Topa~se ésse relévo na parte seten- trional do Rio Grande do Norte, entre © tercidrio da costa e complexo crista~ lino. Caracteriza-o extensas chapadas, raros cabecos e algumas “serras”, que na realidade sio meras aparéncias des- se relévo, pois o nome provém do as- pecto que dé a erosao, as abas ou a algum trecho escarpado pendente para os vales dos rios principais. . As formas do terreno mais variadas encontram-se entre o baixo-Acu e 0 municipio de Baixa-Verde, justamente onde o cretceo sofreu perturbagées no- taveis, devido & erupeao e intrusio de magmas basilticos. A cérca de 14 quilémetros ao norte da cidade de Baixa-Verde, destaca-se das planicies calcareas, adjacentes, uma lombada capeada por areias séltas, cujo perfil lembra os tabuleiros do li- toral: — é a serra Verde, com cérca de 250 metros de altitude. A NO. dessa elevagdo nota-se uma chapada onde esté a fazenda Trés-Ir- méos; uma proeminéncia curiosa, é 0 cabeco Chapéu-de-Sol, de suposto co- roamento basiltico, préximo 4 Terra- Santa e junto estrada de Baixa-Ver- de para Saéo-Bento. A cérca de 10 qui- ldmetros a ceste désse cabeco acha-se © cabego Joao-Félix, pequena saliéncia de 70 metros de altitude aproximada- mente sdbre a chapada cretdcea, que esta logo abaixo, a menos de 10 metros. Essa elevagdo formada de pequenos blocos de basalto, reveste-se na crono- logia geolégica de grande interésse, pois, segundo o geélogo Luciano J. de Morais, corroborou para demonstrar RESENHA EB OPINIOES 385 que a idade da erupeao, na regido ignea de Lajes, encontra-se entre o andar do cretéceo superior e a era ceno- z6lea. As demais serras da faixa cretécea so a serra Verde, homénima da pri- meira citada, mas desta vez a cérca de 30 quilémetros ao norte de Lajes; é uma tipica chapada coberta de im- buranas, em que 0 caledreo é explotado numa caleira proxima. Serra-Preta, junto & estrada da vila de Epitdcio-Pessoa para 0 Poco-Ca- boré, Esta serra de 4 quilémetros de ex- tensao e com a altitude aproximada de :220 metros, foi o maior centro de ati- vidade eruptiva na regiao de Lajes, se- gundo 0 gedlogo Luciano J. de Morais; nela o basalto apresenta-se de maneira continua e em alguns monticulos, em toda a cumiada da serra. Cabego-do-Neco, pico de basalto, a 9 quilometros a NE. da fazenda Sao- Paulo, municipio de Lajes. Cabeco-do-Careto, com cérca de 125, metros de altitude, a 5 quilémetros a oeste da vila Afonso-Bezerra, munici- Pio de Angicos. Serra-da-Capivara, chapada escar- pada em alguns trechos, situada a NE. da cidade de Acu, entre a vila de Sacra- mento e o povoado de Arapud, na mar- gem direita do rio Agu. Finalmente na faixa de caledreos e arenitos, entre o baixo-Acu e a fron- teira como Ceara, desenvolve-se uma regiao tipicamente de vastas chapadas oretaceas, em alguns pontos revestidas de arenito ou melhor, arelas sdltas. Ca- racteriza essa faixa ‘a classica chapa- da _do Apodi, entre o rio désse nome e © Jaguaribe, abrangendo uma rea de 4 000 quilometros quadrados e cérca de 160 metros de altitude, no munici- pio de Mocoré, constituindo a mais no- tavel expressao do relévo tabular, atra- vessado pelo Reconhecimento da Tri- angulacao do Destacamento Especial do Nordeste. Essa chapada, assinala tam- bém o maior avanco pelo interior, do terreno sedimentario da faixa litora- nea do Nordeste, pois o seu extremo esta a cérca de 120 quilémetros do mar. A estrada de rodagem Mogoré-Acu através de 74 quilémetros percorre uma tinica chapada, que descamba suave- mente para Mogor6 e apresenta para a vertente do Acu maiores efeitos da ero- sao, como entre outros testemunhos, a serra da Vaca-Morta. No quilémetro 41 da referida estrada esté o ponto Ata- Iho, com cérca de 120 metros de altitu- de, em cujas proximidades se nota um trecho de arelas sdltas, orlundas possi- velmente da desagregacio de arenito, Coneluindo as apreciagées sobre 0 relévo da falta sedimentaria, contem- pladas pelos trabalhos do Destacamen- to, devemos estar prevenidos contra a denominagao de “serras”, que se encon- tram em uma série de mapas dessa re- gio. Trata-se quase sempre da gene- Talizagao a um todo, de uma feig¢ao par- ticular, restrita, désse mesmo todo. como no caso das chapadas cretaceas muitas vézes chamadas impropriamen- te de serras: Assim também certos ta- buleiros, que por se destacarem da pla- nicie circunvizinha séo as vézes deno- minados “serras", Erréneas so, pois, as seguintes clas- siflcagdes que se encontram nas cartas parciais de Pernambuco e Rio-Grande- do-Norte, na escala de 1:200 000, im- pressas pelo 8. G. H. E,, oriundas da ampliacao de mapas da I. F. 0. C. 8. e completadas com elementos das cartas municipais. Pernambuco: — Serra Tarilama e serra do Jardim. Tratam-se de chas e nao de serras situadas a SSO. de Goiana. A 14 deve ser Itapirema. Rio-Grande-do-Norte: — Sfo ta- buleiros ou melhor, chapadas recama- das de areias sOltas: a serra Verde, ao norte da cidade de Baixa-Verde; as serras do Carmo e Umbuzeiro entre Acu € o Upanema. Sao chapadas, as deno- minadas serra do Lombo ao norte de Lajes; serra do Cué e serra da Capi- vara, ambas 4 margem direita do Acu; as serras da Vaca-Morta e do Paulista, entre o Agu e o Upanema e finalmen- te a serra do Apodi, entre os rios Ja- guaribe e Apodi. II) REL&VO DAS ROCHAS CRISTALINAS ‘Ao passo que na Area dos trabalhos do D. E. NE, a largura da regiao lito- ranea sedimentéria vai crescendo qua- se progressivamente, de Pernambuco até a fronteira do Ceara, sucede o con trério com as rochas do complexo cris- talino. Perto de 3/4 do relévo de Pernam- buco, na area em apréco pertencem a regiao de rochas cristalinas; na Pa- raiba cérea de 2/3 e no Rio-Grande-do- Norte aproximadamente a 5.° parte. J4 no Ceara a faixa sedimentaria cos- teira estreita-se novamente-e formas de relévo do cristalino aproximam-se 386 BOLETIM GEOGRAFICO bastante do mar, sendo a relacdo apro- ximada de 2/3 da Area para as rochas metamérficas e 1/3 para as sedimen- tarias. Por uma tendéncia simplista, alias decorrente do conhecimento fracioné- rio do assunto, onde se espelha mais uma vez o espirito humano propen- dendo para generalizagces, alguns au- tores, consideram apenas no Nordeste, uma “peneplanicie cristalina”. Em parte tal expressio denota a influéncia do conceito do “ciclo geo- grafico”, introduzido por Davis, ensi- nando em cada caso particular, como se tinham sucedido as formas jovens, maduras e senis. Entéo, como etapa fi- nal aparecia, em regra geral a forma- ‘cdo do penepiano ou peneplanicie. Mas, ver apenas uma peneplanicie no Nor- deste, é estar em desacérdo com o pro- prio Davis, que admite interrupgoes ou solugédes de continuidades no desenvol- vimento normal dos ciclos, por pertur- bagoes de natureza tectonica ou vul- canica. A geomorfologia do cristalino por onde se desenvolveram os trabalhos do Destacamento, nao esta reduzida ape- nas 4 senilidade do relévo, em téda a sua extensio. Fatdres houve que in- terromperam em trechos e areas bem apreciaveis, aquela pretensa uniformi- dade, como se depreende da leitura dos capitulos anteriores e final déste nosso trabalho. Realmente basta considerar a li- mitagéo a certa zona, da atividade eruptiva inter-Cretaceo e distribuicao geografica, quantitativa das chuvas e em certas areas a falta periddica das precipltacdes, para se conceber que o Telévo do cristalino nao tenha atingido in totum, em todas as partes, 0 mesmo estégio evolutivo. Da mesma forma que Davis introduziu o conceito de “ciclo 4rido” relativamente as regides sécas do oeste americano, paralelamente po- demos admitir um’ “ciclo semi-arido” para as regides das sécas do Nordeste. Se bem que no relévo das rochas cristalinas predominem maiores exten- soes de formas senis, ou peneplanicies, observam-se também acidentes jovens e maduros, para usar as nodes de Da- vis. Ao lado de um relévo de erosio presencia-se em varios pontos, o relévo eruptivo ou de acumulacio, como noto- riamente evidenciam as regides erup- tivas de Lajes e de Fernando-de-Noro- nha. A mais alta expressio da pene- planicie cristalina reside na chapada da Borborema e entre as serras de sua encosta e o relévo sedimentario do li- toral, a peneplanicie cristalina aparece novamente no relévo das chas e_ta- buleiros, na terminologia usual em Per- nambuco e Paraiba para as formas to- poplanas, mas que diferem fundamen- talmente dos tabuleiros e chapadas das faixas sedimentarias sob 0 aspecto geo- logico € floristico. ‘Ao passo que os picos traduzem o rejuvenescimento do relévo por ativi- dades vulcanicas (Cabuji_e outros da regio de Lajes; ilha de Fernando-de- Noronha): as “pedras brancas”, “pe- ladas”, demonstram umas constituirem testemunhos da erosao, gracas ao acen- tuado grau de metamorfismo, que de- nunciam relativamente as rochas vi- zinhas; outras “pedras” ou serras de- vem a'sua feicio a falhas ou ao fend- meno da esfoliacio e desabamentos, outras finalmente ao arqueamento dos quais por intrusoes de granito. IV DISTRIBUIGAO DO RELEVO DO CRISTALINO: Pernambuco: — Em Pernambuco, a faixa do complexo cristalino que foi percorrida pelo Destacamento Especial do Nordeste, afastando-se até cérca de 80 quilémetros do oceano, pode ser con- siderada em dois trechos bem defini dos e cuja linha de separacio-é o rio Capibaribe. Na regio ao sul do Capibaribe nao 86 0 relévo se espraia mais aproximan- do-se do mar, chegando a ccorrer na costa seus afloramentos (Santo-Agos- tinho, Pedras-Pretas) tnicos em todo 0 litoral do Nordeste, como concentra os macjcos de maiores altitudes vizi- nhas 20 oceano. As principais expresses do relévo, encontram-se nas seguintes elevagoes: Serra das Rucas, entre as cidades de Amaraji e Gravaté, formando tre- cho do divisor do Tpojuca e Una. Pedra-Selada, a cérca de 7 quil6- metros ao sul de'Escada, com 311. me- tros de altitude, Cabo de Santo-Agostinho, a mais avancada proeminéncia do cristalino no continente americano, elevando-se a 79 metros de altitude, junto ao farol. Ainda na costa, a cérea de 6 qui- Témetros ao sul do Tamandaré, erguem- se colinas de granito, com 40 metros de altitude aproximadamente. RESENHA E OPINIOES 387 Pedra do Hildrio, macigo junto 20 Ipojuca, entre as cidades de Vitéria e ‘Amaraji, levantando-se a 497 metros de altitude, coberto ainda de vegetacio densa e com arvores de grande porte. Serra do Lampedo em cujas fraldas se forma o rio Tapacura, afluente do Capibaribe, que banha Vitoria. Atinge © seu cume 647 metros de altitude, que se acha revestido de vegetagao de balxo porte. Pedra-Pimenta, a SE. de Vitéria, proxima e a SO. da’ vila de Jucaral, ele- va-se a 414 metros de altitude, apre- sentando o topo um revestimento ex- posto de gnaisse. Pedra-Branca, ponto culminante de todo o relévo ‘cristalino, pereorrido pelo D. E. NE., com 781 metros de alti- tude proeminéncia de escassa vegeta- Go, que se levanta a cérea de 5 qui- ldmetros a SE. de Gravata. Pedra-Pelada — macico com 371 metros de altitude, entre Moreno e Vi- térla, revestido em’ suas encostas de ar- vores de grande porte, tendo no cimo a exposicao do cristalino despida de vegetacio, donde o seu nome. Serraria — pequena serra de 421 metros de altitude, revestida de mata, que se ergue a NO. de Vitoria, entre os rios Gravaté e Tapacura. _ Serra-do-Brito — Proeminéncia a oeste de Vitoria, com 459 metros de al- titude, no divisor do Cotunguba e Ta- pacura, Serra-da-Passira — macigo de as- pecto cénico, caracteristico, com 430 metros de altitude, desnudo em parte de vegetagiéo; com espécie de caatin- ga em outros pontos situado ao sul de Limoeiro, entre o Cotunguba e o Salo- bro: Outeiro-do-Cativo — com 259 mé tros de altitude, situado a oeste de Gl ria-do-Goita. Ao norte do Capibaribe, as prinei- pais elevacées do cristalino’ sao: Torto-macico de cumes peneplani- zados, com 489 metros de altitude, alon- gando-se na direcdo N-8, a NE. e pro- ximo & cidade de Jardim, oferecendo em sua cumiada j4 decomposta, terras de cultura, Pedra-do-Urubu — altitude de 282 metros, com vegetacéo rala, aparece junto 4 cidade de Limoeiro. Trapué — proeminéncia _isolada, com 260 metros de altitude, a NE. de Carpina, junto A estrada Nazaré Miritiba — pequena serra de cumiada peneplanizada, alongada na direcio NE-SO junto ao Engenho Al- deia, proximo a Mucurepe. Altitude 254 metros. Serra-da-Conesi¢io — Desenvolve- se também na diregéo NE-SO, proxima ao povoado de Caramuru. Apresenta ao Jado do .solo aravel, afloramentos de granito e alguns testemunhos da mata densa. Altitude 284 metros. As mais notaveis altitudes estio entretanto no sistema de pequenas ser- tas e/alongados macicos mohtanhosos, que formam parte dos limites de Per- nambuco e Paraiba, constituindo tam- bem 0 divisor de aguas das bacias dos rios Paraiba e Goiana, Esse relévo de- senvolve-se na direcdo geral NE-SO, das imediacdes da/’vila de Serrinha, na di- isa daqueles dois Estados, até a re- j40 de Cha-do-Rocha e Natuba. Entre as alturas mais importantes encontra-se: — A serra do Olho d’Agua, com 267 metros de altitude, distenden- do-se na direcao N-S aproximadamente préxima a vila de Serrinha. &’ coroada por vegetacdo de carrasco nas partes altas, rochosas; oferecendo também solo agricola no dorso da elevacao. Serra-do-Caldeirao, ja na Paraiba, a oeste de Serrinha com 302 metros de altitude. Desenvolve-se na direcdo ge- ral NE-SO e nos seus cumes predomi- na um carraseal de juremas. Serra-do-Piraua, com cérea de 40 metros de altitude, desenvolve-se na di- recao geral de NE-SO entre a bacia do rio Goiana, representada pelo Capi- baribe-Mirim e o Paraiba. E’ um maci- go mentanhoso notavel por servir de divortium entre duas regides naturais; a leste a regido da mata e dos rios pe~ renes e a oeste a regido da caatinga e dos rios intermitentes. Também inte- gra a elevada regiao serrana, que vai até o divisor do Paraiba e Capibaribe, cujas cumiadas vo de perto de 500 a 700 metros de altitude, constituindo uma verdadeira muralha, retentora dos ventos timidos do litoral, 0 que contri- bui para o desenvolvimento da vegeta- So e perenidade dos rios que ai nascem. Do alto de Piraud, o observador, num relance, descobre 0 contraste im- pressionante, entre suas naturezas fi- tolégicas —- a da regio imida e a da regido séca ou semi-arida. A pedra-do- Abura, na extremidade NE. da serra de Piraua, é um ressalto gnaissico a 574 metros de altitude, servindo de magnifico mirante, que permite abran- 388 BOLETIM GEOGRAFICO ger num golpe de vista, grande parte do sul do Estado da Paraiba com 0 vasto yale do rio homénimo. Outro mirante para o vale do Pa- raiba e serras de oeste, esté no NO. da serra do Piraud, na transicéo para a caatinga, onde se encontram enormes locos dé desagregacdo e esfoliacao de gnalisse como as curiosas “pedras” do Navio, Bico e Santo-Antonio. Na zona imida de Piraué, dotada de excelente clima de média altitude, ainda se encontram reduzidos teste- munhos de mata e aproveltamento das dreas agricolas: rogas, cafézais e cana- viais. Bsse _macigo prolonga-se até & re- gifo do Natuba, mais a SO. oferecendo ai uma magnifica regiao serrana, de altos cumes arredondados pela erosio e alguns com revestimentos de mata. Lembra essa regido certos trechos das ramificagdes do macico da Mantiqueira, em Sao-Paulo e Minas-Gerais, onde se encontram as mais famosas estancias hidro-minerais do pais. Ha possivel- mente sincronismo geolégico na geo- morfologia dessa regiao e a similar na fronteira de Minas e Sao-Paulo. © macigo da regio de Natuba que se eleva a cérca de 700 metros de altitu- de, o qual jé denominamos de Ferve- douro, apresenta também em seu sopé, uma notavel emanacao de aguas de origem profunda, entre fendas de lep- tinolito; tem os seus mais altos cumes chamados de Coitadinha (686 metros) Gado, Paquivira e Jucard. E” interes- sante notar que éle nao constitul o di- visor do Paraiba e as aguas drenadas para Pernambuco, pois é contornado a leste pelo riacho Natuba, afluente do rio Paraiba. E possivel que as aguas que eme gem na fonte do Fervedouro, sejam ré dio-ativas e 6 estranhavel 'o siléncio, que a literatura sdbre as nossas aguas minerais mantém a seu respeito. Nas fendas da fonte ascendem emanacoes gasosas e as Aguas sao tidas como al- calinas, magnesianas. Por outro lado as rochas locais oferecem particularidades como os sericitos-gnaisses e mica- chistos. Como no macico de Piraud, a regio serrana de Fervedouro e grande parte do municipio de Sao-Vicente em Per- nambuco, oferecem terrenos, onde a pe- renidade das Aguas, umidade dos vales e altitude, bastante favorecem a po- licultura. A lavoura ai nao se resume no pratico exelusivismo da cana de acti- car, mas se notam outras culturas: café, cereais e frutas, entre as quais a da uva. A SO. das serras de Fervedouro, alteia-se a serra Verde e a Cha-do-Ro- cha, onde se encontra Palmeira-Gran- de, com 563 metros de altitude. ‘Ainda em Pernambuco, entre 0 cor- dao de serras que separam ésse Estado do da Paraiba e o relévo tabular li- toraneo, ao norte do Capibaribe, er- guem-se algumas serras destacadas, re- vestidas em parte de mata densa. Do macico do Piraué desprende-se na di- Tecéo L-O um contraforte, constituido pelas serras de Mascarenhas e Jundia, formando as mais notaveis alturas di- yisoras dos cursos superiores do Capi- baribe-Mirim e Siriji. Eleva-se ésse Te- Jévo a 500 metros de altitude aproxi- madamente e na serra de Jundié, qual esporao oriental, com 486 metros de al- titude, na Capela em ruinas, ainda se encontram cumes revestidos de mata secular. Finalmente, outras proeminéncias- isoladas, destacam-se como 0 morro do Murici ‘entre Bom-Jardim e Nazaré, com 371 metros de altitude, achando- se ainda revestido de mata na vertente norte. Paraiba: — O relévo da faixa cris- talina paraibana apresenta-se tam- bém mais notavel no bordo ocidental da faixa dos trabalhos do Destacamen- to, ou a cérea de 70 quilémetros do ocea- no, As formas mais representativas dés- se relévo deparam-se ao norte do rio Paraiba e podemos destacar dos grupos de serras, um na bacia do mencionado tio, mais’ isolado do grande macico da Borborema e outro entre os rios Ma- manguape e Curimatat, componentes mais definidos das “serras da encosta da Borborema”. ‘As serras mais notaveis da bacia do Paraiba penetram nos limites das ta- refas do Destacamento, isto é, Campina Grande, destacando-se a serra Verde, Sino, Ventura, Paquevira, Uru. ... Ca- tuama, Santo’ Antonio, Caturité, Quei- madas, Furnas. A sudoeste de Campi- na Grande o imponente pico do Catu- rité, com 805 metros de altitude, assi- nala o ponto culminante do relévo, na area triangulada pelo. Destacamento, desde 0 rio Cearé-Mirim, do Rio-Gran- de-do-Norte, ao rio Una, em Pernam- buco. A serra do Sino, também chamada Pedra do Sino é uma proeminéncia gnaissica de 355 metros de altitude, RESENHA E OPINIOES 390 revestida de caatinga, que se levanta ao norte de Tabaiana. Orienta-se na direedio geral NE-SO, sendo o cume ina- cessivel pelo lado oeste, cuja face pa- rece ser resultado de uma falha ou de- sabamento. Tal conformacao oferece também a serra do Ventura, que se ergue logo ao norte, sendo um pouco mais alta, todavia inferior a 400 metros de altitud Destacando-se pelo isolamerito na peneplanicie do Paraiba, nota-se um serrote denominado N. Senhora, logo a noroeste da vila de Gurinhém com 237 metros de altitude. Alonga-se segundo a direc&o L-O, entre os rios Gurinhém e Gurinhénzi nho, oferecendo a singularidade da ma- ta de revestimento, ter sido de certo modo respeitada. A serra Verde, cujo ponto culmi- nante é a pedra do Buriti, com 517 me- tros de altitude, orienta-se na direcéo geral N-S, a cérca de 24 quilémetros a NO de Tabaiana, entre os rios inter- mitentes Gurinhém e Mojeiro. Reves- te-a a vegetacdo da caatinga principal- mente juremas. © relévo das rochas cristalinas, en- tre as bacias do Mamanguape e Curi- mata, apresenta-se nao sé mais rico de formas desde a vasta peneplanicie que “é a chapada da Borborema, aos aspectos tipicamente serranos; como também em algumas partes, distingue- se pelo revestimento floristico peculiar & regiao timida, que oferece 0 “Brejo” e alguns trechos da peneplanicie mais a leste. A regido serrana do “Brejo” parai- bano assemelha-se muito, a regiao mon- tanhosa das serras do Piraud e Fer- vedouro, em Pernambuco, nao sé pela existéncia de aguas perenes, como pela economia agricola policultora, Das elevagées percorridas pelo Des- tacamento destacam-se: Salitre, 285 metros de altitude, a cérca de 1'quilémetro a NO da vila’ de Alagoinha, Jurema, 370 metros de altitude, a cérea de 2 quilémetros ao norte de Gua- rabira, junto ao rio Tapessirica; desen- volve-se na direcio NE-SO, 4 maneira de um esporao de uma das ramificagdes da Borborema. Apresenta alguns tes- temunhos de mata. Serra da Raiz, cérca de 350 metros de altitude, onde esta a vila de Cupao- ba (330 metros), separando com as suas ramificagées, trechos das bacias do Curimatai, Mamanguape ¢ Camara- juba. Tabocas, altitude 505 metros, noté- vel proeminéncia gnaissica, junto a0 Curimatai, préximo a vila’ de Belém, Ja na regio da caatinga. Pé de Serra, com 258 metros de alti- tude, proeminéncia gndissica com erup- ges de granito, situada entre o Curi- mata e 0 Camaratuba, a 10 quilome- tros a SE de Caicara contendo terra de cultura, ao lado ‘de uma vegetacdo de “caatinga-brejada”. Pipiri, altitude 197 metros, serrote situado entre o Camaratuba e o Ta- Pessirica, a cérca de 20 quilémetros a OSO de Mamanguape. & bastante in- teressante sob 0 ponto de vista geold- gico, pois nela ocorre um dique de ro- cha eruptiva. E’ ésse, por ventura, um dos diques de eruptiva escura, seme- Ihante a diabasio, a que Branner se refere, como existentes nas proximida- des de Guarabira, da qual fica alids a 25 ENE. Fidélis, altitude 206 metros, serrote gndissico, escarpado, com vegetacdo de caatinga. Fica a cérca de 7 quilometros a SE de Nova-Cruz, alongando-se na direcdo L-O. Rio-Grande-do-Norte: — © reiévo das rochas cristalinas nesse Estado caracteriza-se quanto a altitude, pelo contraste que oferece, principalmente em relacio ao de Pernambuco no to- cante ao afastamento do oceano de altitudes superiores a 300 metros. Realmente, ao passo que em Per- nambuco encontramos uma altitude da ordem de 300 metros (Pedra-Selada) a cérca de 24 quilometros do mar, no Rio- Grande-do-Norte, altitudes dessa or- dem e superiores ‘sO se vao encontrar a mais de 60 quilometros do oceano. Na Paraiba, a altitude do cristalino supe- rior a 300 metros mais proxima do mar é a serra da Raiz aos 55 quilémetros aproximadamente. Lembremos entrementes que ésse contraste n&o decorre da direcéo ou forma da costa. A explicacdo é apenas de ordem geolégica — 6 que a faixa sedimentaria no Rio-Grande-do-Norte € muito mais larga que a de Pernam- buco, assinalando como demonstra a altitude do seu relévo cretaceo (cérca de 200 metros), quanto foi notavel o movimento epirogénico, de que resultou a regressao do mar cretéceo no Rio- Grande-do-Norte, deixando t&o longe as eminéncias do cristalino. As principais elevacées do cristalino no Rio-Grande-do-Norte, na faixa dos trabalhos do Destacamento, sio: 390 BOLETIM GEOGRAFICO Micaela, altitude 202 metros; bossa gniissica, grosseiramente hemisférica, situada a cérea de 5 quilometros a ONO da cidade de Santo-Anténio e a 55 qui- lémetros do oceano, isolada no pene- plano cristalino, ao lado de dois outros serrotes. Nessa’ escarpada_proeminé cia, uma “flora xer6fila dos pedrai ostenta-se no tépo, com predominancia de bromeliaceas. Serra Caiada, altitude 277 metros situada a cérca de 65 quilémetros do mar, junto A vila de Caiada-de-Cima. A escarpa de gnaisse claro, que deve ter resultado de uma falha, voltada para leste, motivou a sua denominacao. Serrote Préto, com cérca de 270 metros de altitude, logo a leste de Caia- da e cujo nome parece provir da vege- taco de agreste, que o reveste, vista de longe. Lagoa-do-Serrote, altitude 155 me- tros, pequena proeminéncia, destacan- do-se do peneplano do agreste, proxi- ma a vila de Bom-Jesus. Serra-Azul, altitude 251 metros jun- to vila de Sdo-Pedro. ‘Traduz no no- me um dos aspectos mais caracteris- ticos das elevagdes do Rio-Grande-do- Norte, a exposi¢ao do cristalino, se revestimento floristico. > Pedra-Pelada, altitude 171 metros, a cérea de 6 quilometros ao sul de Taipu. Deve o seu aspecto como da Pedra-Branca, Micaela e muitas outras proeminéncias, & esfoliacio do gnaisse 86 condicionado & vegetacao xerdfila dos pedrais. Pousa, latitude aproximada 150 metros, serrote proximo ao povoado de Pousa, revestido da vegetacao de agreste ‘Torreéio, com 260 metros de altitude aproximadamente a cérca de 2 quilé- metros a oeste de Baixa-Verde. E’ um morro, segundo 0 gedlogo Luciano J. de Morais, formado de uma bossa de gra- nito, coroado de matacdes e com o re- vestimento floristico do tipo xeréfilo dos pedregais. Serrote-Agudo, com 280 metros de altitude aproximadamente, junto & es- taco de Jardim, onde se véem enor- mes saliéncias de gnaisse assinalando para quem vem de Natal, o inicio de uma regido com ciclo de eroséo semi- rida e reflexos de atividades erupti vas, que mais se evidenciam nos muni- cipios de Lajes e Angicos Serra-Preta, com cérca de 250 me- tros de altitude aproximadamente, jun- to a vila e estacao do mesmo nome. O nome traduz desta vez, rochas de ati- vidade eruptiva do magma basiltico. Apresenta varios cumes revestidos de uma vegetacdo de transic&o do agreste para a caatinga. Serra-da-Manicoba com cérea de 350 metros de altitude, entre Lajes e Jardim-dos-Angicos, ja na caatinga. Serra~do-Vidéu, 250 metros de alti- tude aproximadamente, a cérca de 7 quiléretros ao norte de Lajes, osten- tando grandes blocos macigos de gnaisse cercados da vegetacdo tipica dos pe- drais, que é na regiao, jurema e xique- xique. Picos-das-Alpercatas, com 250 me- tros de altitude aproximadamente, a 12 quilémetros ao norte de Lajes. EB” de origem eruptiva, basalto, havendo no morro gnaisse com intrusoes de gra- nito. Serra-Aguda, altitude aproximada 260 metros a cérca de 10 quilémetros a SE de vila de Epitacio-Pessoa. Apre- senta um pico caracteristico de vulea- nismo pretérito, formado por um neck de basalto, andlogo, segundo 0 gedlogo eilado, ao que formou o Pico-do-Ca- Uji. Pico-do-Cabuji — Segundo o livro de Tavares Lira (O Rio Grande do Norte), tem ésse majestoso acidente orografico a altitude de 600 metros, o gedlogo Luciano J. de Morais encontrou 690 metros e nosso nivelamento baro- métrico apenas 550 metros. Essa culmi- nancia, situada a 9 quilémetros a oeste da cidade de Lajes, ¢ sem divida a mais notavel de tédas situadas na regiao palmilhada pelo D. E. NE, quer pela sua natureza geolégica, quer pelo sev aspecto inconfundivel; um cone de 250 metros de altura, de pequenos frag- mentos de basalto, assentado num ter- raco de gnaisse. Difere pois da proemi- néncia denominada Cabujizinho, situa- da entre éle e Lajes, que é constituida por intrusées de granito no gnaisse. No alto do Pico-do-Cabuji ha uma area horizontal de forma aproximadamente elitica de 25 por 12 metros respectiva- mente N-S e L-O e no basalto decom- posto, raras e raquiticas cactéceas re- presentam simbdlicamente ‘a flora da caatinga, num ambiente séco e de- sértico Do Cabuji para leste escava-se 0 vale do Ceara-Mirim, perlongado por um dyke de diabasio. J4 a vertente oci- dental contribui para o rio Amargoso que ruma para Macau. Apesar de distar cérca de 70 qui- lémetros da costa, o Cabuji é uma ver- RESENHA E OPINIOES 301 dadeira atalaia para amplo setor do oceano e_em velhos roteiros da costa hé mencéo do pico do Cabuji, como referéncia & navegacéo, entre Caicara ea ponta do Tubardo, isto é, numa amplitude de 50 quilémetros aproxima- damente. Seus horizontes mais restritos esto nos quadrantes do sul, nas dire goes da serra do Feiticelro e chapada de Sant’Ana. Finalmente as outras elevacées siio: Serra Caicara, com altitude de 250 metros aproximadamente, situada a cérca de 15 quilometros a’SSE de An- gicos. Consta de quatro cumes altos, de granito, que recobrem a serra de enormes matacdes. Como essa proeminéneia, na bacia do Agu, pequenas elevacées descobrem- se para oeste, das quais as mais carac- teristicas sio’o cabeco do Carau, serra Branca (nome devido & rocha desnuda), serra das Pinturas e serra Coberta. Entre a bacia do Acu e do Apodi, representado pelo Upanema, alteia-se a serra do Cu6, proxima a Augusto- Severo, assinalando 0 ponto do crista- lino mais recuado (100 quilometros) do oceano, no Rio-Grande-do-Norte dentro dos limites da agdo do Destacamento, Ainda entre o Upanema e a bacia do Acu, representado pelo Parat, ergue- se a proeminéncia chamada Serrinha. Serra Mogoré: — Com cérea de 200 metros de altitude, mostrando que o teléyo do cristalino, no Rio-Grande- do-Norte, depois de'um grande recuo para o sul, a partir de regio de Taipu Para oeste, mantendo-se a 69 e mais quilémetros afastado do mar, vai des- Pontar na serra de Mocor6, ja a 30 qui- lometros do mar. Esta pequena serra, como a que lhe fica oeste — serra Dan- tas-de-Fora (250 metros -de altitude aproximadamente), j4 no Cearé, sio os mais notdveis acidentes da faixa cris- falina entre os rlos Mogoré e Jagua- e. A vegetacdo da serra de Mocord, 4 esté sob a influéneia da umidade ma- ritima, o que explica o seu revestimento floristico do tipo agreste. Observagées: — As altitudes das elevacées, compreendidas entre os rios Ceara-Mirim, no Rio-Grande-do-Norte e Una, em Pernambuco, foram obti- das do nivelamento trigonométrico, rea- lizado pelo Destacamento Especial do Nordeste, ao passo que as demais resul- tam de hivelamento barométrico, pelo autor. A documentacdo cartografica_bé- sica, onde se encontra a quase totalida- de das citacées geograficas, contidas nos artigos publicados, reside nas car- tas topograficas levantadas e desenha- das pelo Destacamento Especial do Nor- deste (fracéo do Servico Geografico do Exército); nas cartas geograficas dos Estados do Nordeste elaboradas pela I.F.0.C.8. e nas cartas topograficas levantadas pelo Servico da Malaria no Nordeste (trechos do Rio-Grande-do- Norte e Ceara). Cap. M. Morais (Série de.artigos publicados no jor- nal “A Unido”, érgao oficial do Estado da Parafba). * A evolucio industrial dos Estados- Unidos ~ © Sr. Adolf A, Berle Jr., embaixa~ dor dos Estados-Unidos-da-América no Brasil, pronunciou, no dia 9 de abril do corrente ano, no auditério da Asso- clacio Brasileira de Imprensa, a se- guinte conferéncia sobre a Evolucdo Industrial dos Estados-Unidos: Por todo o mundo, os povos vém reclamando niveis de vida mais altos. E a satisfaco désse reclamo tornou-se © objetivo mais absorvente das pessoas esclarecidas, estejam elas no exercicio do govérno ou sejam simples cldadaos. Reconhece-se agora que a indus- trializagéo € 0 principal roteiro para aleangar-se éste objetivo. S6 na indis- tria em desenvolvimento se podem am- parar populagdes em desenvolvimento e Se podem proporcionar padroes de vida em constante ascensio. E’ pois, perfei- tamente natural que no Brasil, como em outras partes da América, os pro- blemas de industrializagio desempe- nhem um vasto papel nos debates po- litlcos e econémicos. Eu e todos os ami- gos do Brasil prevemos para éste pais, no decorrer dos préximos 30 anos, um desenvolvimento similar. HA apenas algumas décadas, os Estados-Unidos enfrentaram éste mes- mo problema. Trés grandes campanhas politicas abriram caminho & fundagao social da industria americana: 0 mo- vimento agrario que desfechou na elel- sao do presidente Cleveland em 1888; © movimento social industrial em que se baseou a gestiio do presidente Theo- dore Roosevelt e a campanha pelo es- tabelecimento da responsabilidade so- cial da industria, causa da elelgdo do presidente Woodrow Wilson, em 1912. Estes trés episédios da Histéria Ameri- 392 BOLETIM GEOGRAFICO cana langaram o allcerce da indistria americana. As doutrinas que se torna- ram efetivas foram muitas vézes por ela contestadas. Mas, ao fim, ficou provado que sdmente através da acel- taeao dos seus principios poderia a in- dustrializagdo expandir-se e a inds- tria realmente prosperar. © conceito social basico pode ser expresso simplesmente: 6 se pode jus- tificar a industrializacao se ela melhora © padrao de vida das massas. O coro- jario econémico foi igualmente estabe- lecido: a indistria sO se pode expandir e prosperar se também se ampliar 0 poder aquisitivo das massas. Esta concepeiio foi propagada e en- trou em vigorosa atuacéo no periodo compreendido entre os anos de 1885 © 1915. Como resultado, a indistria americana tornou-se um grande siste- ma. Nao foi por acaso que aquéle pe- riodo coincidiu com o aparecimento dos Estados-Unidos como poténcia mundial. Uma vez que os amigos do Brasil prevéem, e com razao, a aproximacio de uma etapa similar na Historia Bra- sileira, néo deixa de ter sua oportuni- dade uma evocacao dos problemas ame- ricanos naquela época. Encontraram-se solugdes para éles porque as agremiacées politicas estuda- ram os casos e propuseram as medidas necessarias, imprimindo 4s suas pro- postas a forma de programas partida- rios. Tais programas foram discutidos no desenrolar das campanhas politicas, especialmente em trés delas: o debate agrario, na gestéo do presidente Cle- veland; o combate contra a oligarquia industrial, travado pelo presidente Theodore ‘Roosevelt, ea luta pela ele~ vacéo dos niveis de vida, sustentada pelo presidente Wilson. IL Devido em grande parte ao resul- tado dessas discussées, levantadas atra- yés dos anos, os Estados-Unidos acei- taram e puseram em pratica certos prinefpios e certas medidas. Bsses prin- cipios e essas medidas constituem os postulados atuais de industrializagio nos Estados-Unidos: Primeiro: A indistria depende de um amplo mercado interno, e portanto a sua primeira necessidade é a de um sistema nacional de transporte acces- sivel a todos e a baixo custo. As medidas para conseguir isto: Auxilio direto do govérno nacional na construgdo de estradas de rodagem ¢ ferrovias, acompanhado de controle fe- deral sobre tarifas, métodos e servicos. Segundo: Ampliagao constante da distribuigdo de produtos industriais me- diante a reducao continua dos precos, & proporgaéo que aumente a eficiéncia das indistrias. As medidas para conseguir isto: Eliminagaéo de monopélios, apoio a li- vre concorréncia, e desenvolvimento de uma politica comercial de maior pro- dugéo a custo menor em vez de produ- edo menor a precos altos. Terceiro: Devem estar sempre dis- poniveis capitais a longo-prazo e cré- dito a curto-prazo, para o desenvolvi- mento continuo e'a continua circula- cdo da producio. As medidas para alcancar isto: Recursos erescentes postos & disposicao dos bancos e banqueiros pelo govérno nacional, que os fiscalizara, promoven- do a baixa das taxas de juros; e, quan- do necessario, fornecimento de capital a longo-prazo e crédito a curto-prazo, diretamente feito através dos dorgaos do govérno federal. Quarto: Assegurar & indistria, a0 lado de um mercado urbano, um mer- cado rural, 0 que se conseguir com o amparo aos precos do campo e a ell- minagio das sobrecargas que os inter- mediarios lancam sdbre a agricultura, tais como juros altos, comissoes eleva- das sébre vendas e manobras de atra- vessadores. mm © grande debate sobre industriali- zagéio nos Estados-Unidos iniciou-se em 1880, nao sobre industrializacao pro- priamente dita, mas sobre transportes. Por aquela época havia, dispersa, uma industria. em pequena escala, notada~ mente téxtil. A crescente populacdo do pais j4 nao podia ser mantida pela terra, e grassava uma vasta revolta contra as durezas da primitiva vida agricola. Fazendeiros e trabalhadores do campo queriam, sobretudo, comprar a precos razodveis os artigos que os antigos moinhos e fabricas tinham mos- trado que éles podiam produzir, e que- riam mercados mais amplos para a venda dos seus produtos. Todavia, a produgéo de mercadorias manufatu- radas era ainda limitada. E 0 acesso aos mercados era dificil. RESENHA E OPINIOES Das dificuldades, das dividas, dos altos eustos das utilidades manufatura- das e dos baixos precos dos produtos agricolas, surgiu e desenvolveu-se um grande movimento de fazendeiros e tra- balhadores do campo, principalmente no interior, Bles se organizaram em miicleos que se chamaram “eranjas” — dando denominagio a sua revolta agra- ria. Ela é conhecida, na Histéria Ame- ricana, por “movimento granjeiro”. E dela se gerou um partido politico ten- dente para a esquerda — o “Partido Populista”. Esses grupos fizeram da questiio do transporte a sua principal reivindicacao politica. J& estavam lancados os comegos de um sistema de transporte. Subsi- dios federais e estaduais, auxiliando o capital privado, j4 haviam construido ferrovias do Atlantico ao Pacifico. Tra- gara-se, j4, 0 esbdco de um sistema de linhas-tronco. Mas, os ploneiros fer~ rovidrios viram no transporte um ins- trumento de dominacio do comércio do pais e procuraram transformar 0 Oeste americano numa espécie de “co- Yénia” comercial. Desfrutando do di- reito de cobrar pelo transporte o preco que bem entendessem e — 0 que era ainda pior — cobrar fretes baixos a uma emprésa e altos a outras, as estra- das de ferro investiram-se virtualmente na fungao de decidir qual o produto agricola que podia encontrar mercado, e qual o que nao podia. Homem de negécios que caisse nas gracas das fer- rovias podia montar uma fabrica e ficar certo de que os seus produtos che- gariam aos mercados a custo razoavel. © que nao contasse com tal camara-, dagem se depararia com fretes tao ele- vados que ihe tornavam impossivel a concorréncia. Através désse_procedi- mento as estradas de ferro ficaram em condicées de, em certas indtistrias, pro- poreionar substanciais direitos mono- polistas aos seus industriais prediletos. Os agrarios atacaram éste proble- ma por processos politicos diretos, Exi- giram que tédas as formas de transporte féssem consideradas de dominio publi- co; que, assim sendo, fossem intimadas a servir a todos, sem distingdo; e que fossem também intimadas a cobrar fre- tes razoavels. Exigiram ainda que o govérno tomasse medidas no sentido de garantir que tais servicos ptblicos, ainda quando de propriedade particular, servissem a todos da mesma maneira promovessem um aumento de suas facilidades onde quer que se tornasse necessario o transporte de mercadorias, 38 Os seus candidatos, eleitos para o Con- gresso, bateram-se por um programa nacional de contréle: ‘Ja em 1886 constituiam um pode- roso bloco parlamentar, e em 1887 0 Congresso dos Estados-Unidos aprovoy uma lel conhecida por Lei de Comércio Interestadual. Embora a legislacdo néo tivesse vigorado senZo em 1903, ficara desde entao tracado pelo “movimento granjeiro” o essencial em matéria de industrializacéo: troca de _produtos agricolas por produtos manufaturados, efetuada através de um sistema nacio- nal de transportes. Nessa famosa luta politica nos Es- tados-Unidos surgiu um caso que néo sera desconhecido de muitos brasilei- ros. Como o Brasil, os Estados-Unidos so um Govérno Federal, composto de Estados. Alguns désses Estados esfor- garam-se por conservar autonomia de controle dos transportes dentro das suas fronteiras. Fracassaram. Feliz~ mente para os Estados-Unidos. Se hou- vessem conseguido os seus intentos, 0 pais terla sido fracionado em quarenta e olto pequenas areas, nenhuma das quais tem mercado bastante amplo para um moderno sistema industrial, com a sua vitéria nessa luta, 0 movimento agrario estabeleceu que o mercado in- dustrial interno dos Estados-Unidos era um mercado nacional a assegurar um sistema nacional de transportes, Vv Quase imediatamente, um segundo problema importante de industrializa- do apresentou-se em cheio ante o pais, Foi 0 da questio de precos para os produtos manufaturados. Os pioneiros da indistria nos Esta~ dos-Unidos achavam que tendo arris- cado os seus capitais para produzir mer- cadorlas, estavam no direito de cobrar por elas'o que bem quisessem. O pais estava crescendo. Havia mais encomen- das do que producdo. Os industriais podiam — e em geral o faziam — fixar Precos que eram muito mais altos que 90 custo de producio e Ihes davam lucros de extorsio, especialmente nos artigos indispensaveis 4 vida, como vestuarios, Com o desenvolvimento do trans- porte, tornou-se dificil a um fabricante saber se 0 outro nao iria incrementar a produgao, baixar os seus precos, disputar ‘0 lucro acrescido. Transporte “significa: ou monopdlio nacional, ou concorréneia nacional. A concorréneie: trouxe a baixa dos pregos, A cone: 304 réncia, com efeito, fora um dos obje- tivos do “movimento granjeiro”. Daf se desenvolveu nova fase. Os fabricantes, freqiientemente estimula- dos pelo capital financeiro do Este, co- mecaram a se combinar na formacio de monopélios nacionais, chamados trusts (depésitos) denominagao deriva da do fato dos advogados terem engen- drado um método de agrupar a proprie- dade de emprésas competidoras em uni- dades monopolistas, pondo as ages de stock in trust (em depésito). Assim, um. simples grupo de industrials podia controlar as operagées, os pregos e 0S mereados de téda uma industria. Entre os anos de 1890 e 1905 a industria ame- ricana andou muito perto de se tornar uma colegao de monopélios. ‘Bsses trusts ou monopdlios manti- nham precos elevados. Mas, também faziam alguma coisa de ainda pior. Res- tringiam deliberadamente a produgdo. O plano, na economia mals da época, era conservar o suprimento de merca- dorias sempre aquém das quantidades reclamadas. Déste modo, os precos po- diam continuar altos, e os lucros se torriavam maiores. E’ claro que isso também impedia um continuo progresso industrial. E na verdade, freqiiente- mente o trust ou monopélio se interes- sava mais em evitar que uma nova industria surgisse na arena do que em ampliar os recursos industriais do pais. Comentando essa epoca, um economista americano disse que o objetivo da in- distria dos Estados-Unidos parecia ser o de fabricar délares, em vez de fabri- car mercadorias. E tornou-se a pedir que o proble- ma fésse resolvido de acérdo com o in- terésse geral da populacéo. Desta vez 0 movimento agrario no interior encon- trou aliado nas necessidades e reivin- dicaces dos ainda desorganizados tra- balhadores das cidades. Os radicais insistiam pelo esférco livre concor~ réncia. Os conservadores — jé em 1890: — atacavam essa doutrina como “comunismo”, Nesse ano de 1890, depois de furiosa. discusséo, 0 Congresso aprovou, e o presidente Harrison sancionou, uma lei Proibindo monopélios ¢ vedando as emprésas comerciais a realizacio de acordos entre si, com o fito de restrin- gir os negécios. Nenhuma emprésa par- ticular podia constituir-se em monop6- Ho sem se tornar culpada de crime. ‘A lei proclamou o principio. Toda- via, era longa a distancia entre procla~’ mar um prinefpio e dar-Ihe aplicacio pratica. Por isso, o estabelecimento de BOLETIM GEOGRAFICO um sistema nacional de contréle de transporte também permanecera como mero principio, em vez de se transfor- mar em fato consumado. Mas, dez anos mais tarde, um personagem ‘dindmico surgiu no cendrio americano: Theodore Roosevelt, presidente, em virtude da morte acidental do presidente McKin- lay. Em 1903 langou uma campanha para por em execugao e melhorar a lel dos transportes nacionais, atualizando © reclamo no sentido de que as estradas de ferro servissem a todos da mesma maneira ea fretes razodvels. Ao mesmo tempo ordenou ao seu Procurador Ge- ral que fizesse cumprir a lel contra 0 trust. Entéo, as emprésas privadas © os comerciantes que possuiam monopé- ios, e os que haviam restringido a pro- duo, e os que cobravam precos extor- sivos, foram arrastados aos tribunais — e alguns sentenciados & prisao, por cri- me contra o bem-estar econémico dos Estados-Unidos. Os caricaturistas pin- taram Theodore Roosevelt como um César. Os politicos adversirios apon- taram-no como socialista. O pais que- ria reduedo dos fretes nas ferrovias e baixa dos precos — e apoiou-o. E éle venceu. Demonstrou, do ponto de vista econémico e pratico, e a ca~ valeiro de qualquer diivida que pudesse ser levada a sério, que sistema mono- polista conduz a um s6 tempo a dois resultados maléficos. Havia restringi- do a produgao... o que causara o entor- pecimento da industrializagdo, e a es- cassez de mercadorias, e a manuten¢ao dos precos altos. Isso constituia uma inigiiidade tanto contra os consumido- res como contra o desenvolvimento do pais.O segundo maleficio: os monopé~ ‘lios tentavam, por meios licitos ou ilici- tos, evitar que outros elementos entras- sem nos negécios — e com tal procedi- mento entravavam a expansio ulterior da indstria. Era precisamente o que a let anti-trust se destinava a obstar, uma vez que pela concorréncia buscava con- seguir a reducdo dos precos, a ampliacdo dos mercados e maiores oportunidades industriais. A opiniao piblica dos Es- tados-Unidos amparou Theodore Roo- sevelt; a opinido comercial da época sustentava que a sua politica resulta- ria ‘na ruina da industria americana. Entretanto as estatisticas mostraram que, dissolvidos os monopélios pelo go- ‘yérno, sobreveio para a industria ame- ricana um imenso desenvolvimento, nas grandes linhas basicas: aco, carvao, te- cidos, petroleo, materiais de constru- ¢ao, produtos quimicos, e outros pro- dutos essenciais. RESENHA E OPINIOES 395 © passo final no desenvolvimento do principio de baixa de precos e am- pliacdo do mercado interno, coube d4-lo nao @ um politico, porém a um homem de negécios conhecido em todo o mun- do: Henry Ford. Este pioneiro da indistria auto- mobilistita queria, como todo homem de negécios, ganhar dinheiro e dirigir transagées de éxito. Mas, também sen- tiu profundamente que os Estados-Uni- dos e o resto do mundo seriam bene- ficlados se o transporte se tornasse rapidamente accessivel a todos. Assim, difundiu a doutrina dos automéveis fa- bricados o mais barato possivel, para yenda por preco mais barato possivel — um prego que, Ihe proporcionava lu- cro, € verdade, porém o minimo possi- vel! Desencadeou-se uma tempestade de protestos dos seus colaboradores dos rivais. Um dos seus sdcios proces- sou-o por graves danos, clamando que éle havia “‘cedido” os proventos da Com- panhia Ford. Ford foi ridicularizado; alguns diziam que éle era filantropo, mas nao comerciante. Outros o acusa- vam de estar solapando o mecanismo dos lucros, vendendo carros a baixo custo, quando o podia fazer a custo mais alto.’ Todavia, como resultado da sua politica de precos baixos, os negécios de Ford prosperaram — e o seu mercado alargou-se firmemente. Ford lucrava pouco em cada carro vendido, mas ven- dia, com seguranga, mais e mais carros, simplesmente porque os vendja barato e assim era maior o numero de pessoas que os podiam comprar. Pouco a pouco foi se tornando patente que o seu plano no era bom apenas do ponto de vista da economia social, mas, era também um bom negécio. A sua doutrina, num crescendo, ganhou altitude nos cireulos de negécios americanos, que se educa- ram com 0 seu exemplo e o seu evidente sucesso comercial, aprendendo que © comércig que lanea mercadorias a bai- xo custo num grande mercado 6 mais luerativo do que 0 que vende mereado- rias a alto preco num mercado peque- no. Isso nao constituiu tio sdmente bom negécio. Foi também um bem para o pais — de vez que por essa ma- neira a massa de consumidores foi con- templada nas vantagens da industria- lizagao. Falando de um modo geral, o prin- eipio de expansio dos mercados me- diante a reducdo dos precos e a cres- cente situacdo dos produtos ao alcance do povo é agora doutrina aceita nos Estados-Unidos, tanto na teoria eco- némica como ha pratica responsavel dos negécios. Mas, para essa aceltacdo geral foram necessarios os esforcos com- binados dos radicais agrarios, de Theo- dore Roosevelt e de Henry Ford. E’ elementar que nenhuma indus- trializacdo conseguira obter éxito sem que disponha de-mercados para a sua producéo. Nos Estados-Unidos, como no Brasil, constitui fato j4 inconteste que o maior mercado para produtos in- dustriais deve ser o mercado interno — porquanto um pais exporta com a exclusiva finalidade de se capacitar a fazer compra no exterior. # pois estranhavel que a preocupa- ¢&o com o poder aquisitivo das massas tenha surgido ha relativamente pouco tempo. Também nisto Henry Ford foi um condutor. Ousadamente, sustentou que nao s6 estava direito, mas que era tam- bém essencial que se aumentasse os sa~ larios 0 mals depressa possivel. Chove- ram protestcs quando éle, espontanea- mente, fixou em $5.00 didrios o salario miniino nas suas fabricas. Ford estava convencido de que podia ampliar a sua producéo. Mas, ndo estava certo de que o poder aquisitive do povo se expandisse numa velocidade correspon- dente Aquela ampliacio. A idéia encontrou apoio na férca crescente das unides trabalhistas, as quais — e muito naturalmente — dese- jam melhor pagamento para os seus membros. O episddio da existéncia des- sas unides sio em si mesmo uma his- toria, Mas o fato foi que, logo que a indistria americana comegou a se desenvolver, as organizagdes de unides trabalhistas tomaram a iniciativa de negociar com os empregadores no sen- tido de que ficasse assegurado que os salarios subiriam & medida que fossem aumentados os lucros da industrializa- cio. ‘Seguiu-se um longo processo de debate econdmico e desenvolvimento ju- ridico. Nao foi facilmente aceito o principio ja agora reconhecido, ou seja, © de que trabalho tem direito a se con- gregar e regatear um salario decente com os homens de negécios. O mundo comercial dos Estados-Unidos aceitou mais facilmente a idéia da elevacio dos salarios do que a da organizacao traba- Thista. Escritores como Upton Sinclair, industriais como Myron Taylor, juris- tas como Louis Brandeis, homens pi- blicos como La Guardia, todos tomaram parte no violento debate que durou mais de vinte anos. O desfecho veio na ges- tao do presidente Franklin Roosevelt, 306 BOLETIM GEOGRAFICO quando a legisla¢do americana, através da chamada Lei Wagner consagrou as + negociacées por intermédio das enti- dades trabalhistas como um principio no comércio americano e como um mé- todo pelo qual os proventos da indiis- tria sio distribuidos por setores cada vez maiores da populacao. Pelo que nos dizem os atuais resul- tados econdmicos, 0 processo, em geral, tanto provou ser’ uma boa pratica co- mercial como uma boa pratica social. £ claro que qualquer proceso de ne- goclacdo esta sujeito a deturpacées ¢ abusos; e que ainda existem numero- sos problemas a serem sdlucionados. Mas a industria americana acolheu o principio econémico segundo o qual, pelo pagamento dos mais altos salarios possiveis dentro das circunstancias, as- segura-se um mercado industrial’ em constante expansio. Embora se ainda registem varias disseng6es quanto 4 amplitude desejavel para as organizacées e para o poder trabalhista, bem poucos so os que ain- da contestam que adequados padroes de salarios séo tao essenciais a expan- sao industrial quanto as técnicas clen- tificas, a maquinaria e o capital. Vv © crescimento da indistria requer, necessatiamente, um desenvolvimento de capital e de crédito a curto-prazo. Nos Estados-Unidos, os principios fun- damentais da expansao do capital e do crédito ainda estéo em evolucdo. E, mesmo agora, sera provayelmente muit cedo para tenitar-se uma declaracao de- finitiva dos seus resultados. Todavia, podem ser fixados certos marcos a0 longo da estrada ja percorrida para a solugéo do problema do capital. Para funcionar, a indistria exige, néo apenas a firme inversdo de capital a longo-prazo, mas a constante existén- cia de um fundo de circulacao de eré- dito a curto-prazo. O capital a longo- prazo constréi a estrada de ferro, a fabrica ou a usina de ago; 0 crédito a curto-prazo movimenta as matérias pri- mas através do beneficiamento e leva- as aos mereados onde afinal sio vendi- das. A interrupedo de disponibilidades de capital a longo-prazo e crédito a curto-prazo paralisara o sistema indus- trial —o que, por sua vez implicara na paralisacao’de grande parte da vida do pais. Historicamente, os Estados- Unidos tém experimentado uma crise dessa natureza em cada década, até ‘a que comecou em 1933, Ainda ao movimento agrarlo deve- mos as primeiras tentativas de luta con- tra semelhante situacéo. Foram extre- mamente rudes. Na crise financeira de 1873, quando o capital ja nao era livre- mente invertido, e o crédito a curto- prazo tinha sido banido por todos os bancos, o movimento agrario, em ascen- so, propés para o transe uma solugao simples: cunhar ou imprimir mais moe- da e fazé-la circular sem peias. De fato, no desespéro daquela época, tentaram- se varias experiéncias com’ a inflagéo pura. Elas falharam, quanto & con- secti¢éo dos resultados que visavam, po- rém deixaram atras de si um nucleo de idéias que prossegue sendo parte integrante dos principios da politica americana. Capital ainda é produgao retirada do consumo e votada a producio de mercadorias e facilidades destinadas a produzir ou auxiliar a producio de ou- tras mercadorias. Isto é verdadeiro, quer o capital tenha provindo do exte- rior ou do interior’ do pais; quer éle se componha de economias invertidas em outras emprésas, ou, distribuidos como dividendos, resuite ‘de lucros de uma emprésa, logo re-invertidos na prépria emprésa. Por outro lado, o crédito a curto-prazo, como a moeda corrente, deve ser eldstico e tende a suportar uma certa afinidade com o total de merca- dorias em produgdo ou em vias de dis- tribuicdo. Em regra geral, o capital nao acumulado por empresas que o retirem dos seus préprios lucros, vem sendo for- necido através dos mercados de inver- s0es, pela venda de acdes e titulos. O crédito a curto-prazo, pelos bancos, através da extensio de empréstimos. Nenhuma linha nitida separa as duas categorias. © “movimento granjeiro”, que de- pols encontrou campo comum com ou- tros elementos da coletividade, advo- gou, nominalmente, uma direta infla- co’ da moeda corrente. No entanto, a sua teoria basica era mais profunda. © que com isso éles buscavam, na rea- lidade, era o fornecimento direto, pelo Govérno Federal, ou de capital a longo prazo ou de crédito a curto prazo em qualquer ocasiéo em que as disponi- bilidades de um ou de outro fossem insuficientes. Varios remédios topicos, para problemas individuais, foram mi- nistrados de quando em quando. Mas, a questo s recebeu cuidados genera- ligados quando 0 presidente Woodrow Wilson tomou a si rever as leis banca- rias, com a aprovacéo da “Lei de Re- serva Federal”. RESENHA E OPINIOES 397 Essa lel, sancionada em 1914, faz parte da histéria financeira e' nao carece de ser analisada aqui. Os espe- cialistas brasileiros conhecem-na per- feitamente. Ela se inspirou no conceito de que o Govérno nacional devia for- necer meios que habilitassem os ban- cos a estarem sempre em condigGes de emprestar a curto-prazo, sob garantia de produtos em transito ou em confec- go. Isso, pensavarse, tornaria possivel o continuo fornecimento de crédito, uma vez que os bancos estariam auto- rizados a amplid-lo, e 0 Banco de Reserva Federal estaria pronto a em- prestar-lhes numerario para tal fim. claro que, numa larga medida, o aparelho forneceu fundos necessarios: mas, também é claro que nao chegou a gerar, da parte dos bancos, boa von- tade para fazer empréstimos. Além disso, a Lei de Reserva Federal nao atacou o problema criado pelo fecha- mento dos mercados principais, que impossibilitou a venda de titulos e acoes. & provavel que ela tivesse resol- vido as dificuldades da década com- preendida entre 1890 e 1900 e, prova- velmente, as que irromperam’ da ra- pida crise financeira de 1907 — transes ambos que foram entdo enfrentados pelos elementos privados, e nao pelo govérno. &, também, fora de divida, que a Lei de Reserva Federal muito al- cancou na tarefa de suavizar a crise financeira de 1921, que se seguiu ao término da primeira guerra mundial. ‘Mas, no correspondeu na crise de 1929, quando tanto o capital como 0 crédito a curto-prazo chegaram a um estado de total paralisacao, do que resultou a grande crise americana de 1932. Mais uma vez o pais tendeu forte- mente para as velhas concepcdes dos agrarios do oeste e dos progressistas: a concep¢ao da agdo direta. Em 1931 © Congreso lancou os lineamentos da Reconstruction Finance Corporation que em 1933 entrou em plena atuacao sob o estimulo do presidente Franklin Roosevelt. Bste organismo, de inteira propriedade do govérno, e exclusiva- mente por éle fornecida ‘de fundos, foi investido de poderes para fornecer ‘nu- merario onde quer que éle se tornasse preciso. E € interessante notar que a teoria fundamental foi mais além do que 0 mero desejo de assegurar funciona- mento permanente e desenvolvimento do transporte e da industria. Eram partes definidas da concepgao: que se devia proporcionar emprégo; que o es- tancamento de capital significaria de- semprégo generalizado; e que, déste modo, 0 continuo desenvolvimento do pais tornava-se necessario para pre- servar o povo da inércia e da fome. Ao mesmo tempo o banco foi habi- litado, mediante operagoes do seu sub- sidiério, 0 Banco de Exportacio Importacdo, a emprestar numerario no estrangeiro, onde quer que isso se mos- trasse aconselhavel — funcao que re- sultou extremamente Util como instru- mento da politica de boa vizinhanca, assim como em outros casos. Pela primeira vez na histéria fi- nanceira comecaram a surgir as linhas mestras de um sistema amadurecido. Os mercados particulares de inversdes continuaram como dantes; as ativida- des bancarias a curto-prazo, também Mas, agora existia um redo de reserva capaz de enfrentar a situacao caso o capital privado se tornasse de impossi- vel obtencao, ou o crédito a curto- prazo deixasse de ser distribuido. Nao ha nenhum indicio atual de que ésse érgao, que hoje conta mais de doze anos, venha a ser abandonado, As fu- turas discussées — e elas serdo de certo numerosas — hao de versar, nao sobre ‘a legitimidade da intervencéo do go- vérno — porque esta parece estar acei- ta — mas, sobre a ampla utilizagao do poder nacional neste sentido. Em relagio a isso, um episédio existe que merece ser mencionado aqui. A questo da taxa de juro. Em 1933 adotou-se definitivamente a teoria de que os Estados Unidos ficariam melhor de recursos se as taxas de juros fos: sem baixas: a industria e outras ini- clativas poderiam atuar mais rapids e sadiamente se os gravames fixos sdore a sua estrutura féssem reduzidos a um minimo, Exatamente como os agra- Tios, nas décadas de 70 e 80, haviam insistido em que nenhum fazendeiro poderia encontrar mercado se tivesse de pagar taxas de juros extorsivas, as- sim também os préprios industriais chegaram entio & conclusao de que os seus mercados nacionais _ficariam ameagados se as taxas exageradgs in- capacitassem a populacao agraria para adquirir as suas mercadorias. Por éste motivo, embora nao destinada a com- petir nos mercados do capital privado ordinario, a Reconstruction Finance Corporation foi investida de atribui- oes para fazer empréstimos onde quer que o capital particular ndo fosse contravel a juros razodveis — atribuicio que se demonstrou util nos dias tor- mentosos de 1933 e 1936. Assim ficou estabelecido um método mediante 0 398 BOLETIM GEOGRAFICO qual se podiam assentar normas para taxas de interésse. O govérno podia, Por concorréncia direta, obstar que o capital privado insistisse em cobrar taxas mais altas do que as que a in- distria e a agricultura podiam supor- tar. Quando o capital é vasto e de facit acesso ésse poder de reserva nao se precisa exercer com muita freqiién- cia; mas, nas épocas em que a espe- culagao ansela por capital, ou o médo amarra os mercados de inversées, éle permite uma acdo direta, para que o proceso industrial nao se paralise. Kis uma linha reta que parte do movimento agrario da década de 70, a pedir ao govérno que imprimisse notas de banco, e William Jennings Bryan a pedir cunhagem de moedas de prata — por mais rudes e enganosos que ésses mé- todos féssem — eis uma linha reta que nasce ali e vem até o pensamento eco- némico mais esclarecido que em 1914 proporcionou crédito bancario através da Lei de Reserva Federal, que no de- correr da década de 20 proporcionou crédito agricola através de uma série de medidas especificas, e afinal, em 1983, crédito direto de capital. VI Industrializacéo nfo é problema que se resolva de uma vez por tédas. £ um método ininterrupto de orga- nizagdo da economia nacional; e novos problemas aparecem quando os mais velhos esto solucionados. & como deve ser; porque 4 medida que se eleva o padrao de vida num pais, éle é obri- gado a defender as vantagens que co- theu. Assim, havendo alcancado o mais rapido desenvolvimento industrial ja- mais registado na Historia, os Estados Unidos tém agora que litar com o grande problema de assegurar com- pleto e permanente emprégo, sob um sistema em que os homens sao livres. Este é, na hora atual, o principal de- talhe em discussio nos Estados Unidos —e numerosos projetos em separado estao sendo submetidos a estudos. Em resumo: é um problema que pode ser resolvido. E também em resumo: é um problema que sé se torna agudo nas etapas mais avangadas do progresso Industrial. O Brasil o enfrentara no devido tempo, embora alguns anos ain- da se tenham que passar até que a questo se torne premente. Depois déle, outros problemas virdo. | Mas, assim como encontramos solugées para as dificuldades iniciais, confio em que encontraremos as respostas para as in- terrogagées mais novas que se levan- tardo ao longo do desenvolvimento da, industria. Haveis de ter notado, nesta breve resenha certos curiosos ‘fatéres, mas fatores constantes. A industrializacao requer uma dupla aproximacéo: a do hhomem de negécios em busca de lucros ea do moralista social em busca da expansdo do bem-estar econémico. No incessante debate em que os politicos democraticos procuram dar forma tangivel ao pensamento eco- némico e a ética social, estamos apren- dendo aos poucos uma licdo maior: na vida nacional, o mais avancado ponto de vista em moral social costuma se demonstrar na mais sadia politica co- mercial e econémica. Por meio da sua producao, a industria promove uma erescente elevacéo do nivel de vida. Mas, igualmente, exige um alto pa- dréo de vida para os seus mercados. Através dos anos, e & medida que com- preenderem a verdadeira natureza do problema industrial, 0 moralista, 0 co- merciante e 0 politico iréo encontrando, a mais e mais, um campo de ac&o comum”, * Questées demograficas francesas A derrota militar francesa de 1940 foi freqiientemente considerada como @ conseqiiéncia inevitével da situacao demografica francesa; enquanto a este do Reno as familias proliferavam e o balanco dos nascimentos e dos fale- cimentos era positive, na Franca, ao contrario, ndo havia mais criancas e os mortos eram mais numerosos que os recém-nascidos. Pode-se ver facilmen- te quais possam ter sido os sub-enten- didos de um certo tipo de propaganda que se esforgava por apresentar os fatos da maneira esquematica, e por conseguinte mentirosa, que acabo de adotar: se a realidade 6 mesmo essa, © bom senso manda que se admire os costumes e as instituigdes que asse- guraram ao Reich uma tal vitalidade; obriga também a reconhecer que & Franca esté decadente e que, em con- seqiiéncia, para se reerguer'ela deve destruir suas institulg6es politicas e escolares que séo as responsdveis pela crise moral das familias francesas. Esta argumentagao, j4 em voga antes da guerra em 1939, foi _muitas vézes ventilada nas homilias dos ho- mens de Vichi e em muitas outras; nao seré surpreendente acrescentar-se

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