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HOJE Michel Agier iPermanentes, ide um ie para ef a cidade”, = tio concreto OS SABERES URBANOS DAANTROPOLOGLY Asflexio que proponho nio tata da cidade, mas da investigacao urbana anuopol6gica. Apoia-se num fo: nfo &a pari da propria cidade que emergem os conhecimentosda antropologia urbana, mas partir de uma montagem de sequéncias da vida urbana retiradas. de uma infima parte do curso real do mundo. O conjunto dessas informasécs representa uma espécie de cidade bis, como resultado dos procedimentos de coletae arranjo (organizagéo, gestio) dox clados urbanos. E 0 que zo caréterantropolégico dessa construgio? Em que se diferencia dos resultados de outras abordagens? Num Primeiro momento, pode-se reter dois critétios. Primeiro, uma diferenca de escalu:osconhecimentos produzidos pelo anteop Sogo sstéo ancorados no nivel microssocial! Sendo geralmensc verade, "A vetsio original deste capitulo foi publicads na revista Enguéte,n. 4, Mar szille, Parenthéses, 1997, pp. 35-58 ae gas Fonte de visa, atipoloia altura das cides qu R. Fox commas pars da: grandes fancies urbana iewae,adminisacives,mexcanty,indeseal) fea uturalisa que antropolégica no sentido em que abandona a ccala micnan et 59 — isso significa, contudo, que na cidade os conhecimentos retirados dessa pesquisa de campo sio inevitavelmence parciais e sé abrangem a totalidade urbana através de procedimentos deanilise: metonimias (acidacle€ a rua), metéforas (a cidade é uma selva ou um mosaico), comparag6es (queconduzem, por exemplo, uma tipologia cultural dlos bairros de uma cidade) e didlogo incerdisciplinar (encaixe das escalas do etnélogo com as da economia, da macrossociologia, da politica urbana exc). O segundo eritério de distingao &0 da pesquisa empirica, que, para 0 antropdlogo, se baseia em informacées diretas, (de primeira mao e de caréter pessoal) recalhidas “no campo”, ou seja, no Ambito de relagBes cara a cara em espagos de interconheci- niento acessiveis individualmence, Essas duas caracteristicas fuzem com que seja através de uma sequencia de operagées indutivas que «9 antropSlogo “eleva’ as informagées urbanas a construgées teé ricas da (ow d escala da) cidade. A coexisténcia de uma prética de pesquisa microssociale pessoal, por um lado, ¢, por outro, de um quadro de questionamenco (ou mesmo de um objero) inacessivel empiticamente apesir da sua aparéncia de realidade que se impée colocam o problema das nogées intermedidriss que permitem fxzer a passagem de uma & outta, E nesse nivel intermediivio, entre a dividue torna-se uma pessoa: uma pessoa ésimplesmente un individuo que tem, em alguma parte, em alguma sociedade, um Status social, mas 0 status vem a ser, finalmente, uma questi de diseancia — distancia social”, ‘Mas como e por que sewiil Cidade? A regiio €0 que tum ponto de vista “regional” sobre a istingue 0s espacos no conjunto urbano, Como Wes Malton Sretm Chisago, on des popu com asa ders chow cis de desrnpregaos fos tablhadorskineate) cderelccce go, dono: CEM. Hlbwac, Chicag,expéience nique [1992] Gein Pas RPA ores), 1984p 286: N, Anderson, Le oa Sail ana DO Paris Nathan, 1993, Io, Qestuema decade dfnide por Pack Burges¢comentalo por M. Habbwachs, op ct, p. 291 1 RE Rak A comunidad urbanacomo congas espa cordam mon [19% fi ties (ms irs de eclegie humana. Sio Paulo: Lveata Martina tod p. 140, tuma primeira abordagem “durante uma excursio, mesmo ida ¢ superficial, através das runs de Chicago", Ein vues eimes ss ela permite loclizar s identidadesligedas a0 espago urbano, € enquanto identidides externas. Falo de identidacl, “nternas” no sentido de que els emanam primeiro de umn olha clo: atores exeriores 20 espaco considerado, Gmnseguida ttomadas.a parce de dentro nas tclacbes de ego com, Guvrent. Claro que a dialética identidade-altevidade torna ew defniséo fluruante, Maso que pensar, porexcmplo, da categoria “indio” na Amética Latina? Construida pelo poder colonial ena identidade ésnica contta os etndnimos locais, ela foi teutliont, imal secenitemente pelo conjunto politico dos grupos locais de origem amerfndia nas suas relages com o Estado, ‘mesmo que elas sejam, Aproveltando essa incerteza de fronteras, © ponto de vista “te aplicado a qualquer espaco, indezendentemente de seu limite ou de sua escala, Desse modo, oder-se-iacegistar a maneire como um lugar & definido'* pelos ators urbanes quaisquer que sejam (desde o planejador avé 0 € sentido do lugar supoe a Cidade intel como concexto de referencia, Cottesponde 2 anne cartogtafia imagindria dos citadinos que vivem em certas partes da cicade continuando a er, sobre as outros expacos, gional” ganhatia, parcce-me, em ser pelo menos ‘leas experincias,idias ou imagens, ara nio tomeras flat dadescomo um dado adquitido, convém, além disso, “jogat” com © Ponto de vista regional, deacordoccom os movimentos de rowsio 1M. Hilfwachs, ope, p. 322, ‘Num sentido equivalent so que fiz com ‘que “una sewasZ0 see defini pelo ene volsimento subjetvo dos ators", com oe veri mais adiante loupe da ade © ajuste usuais da ancropologia das identidades. Vou ilustrar com © caso da cidade de Salvador da Bahia, no Brasil. Desde a sua fundagio, na segunda metade do século XVI, uma dis- tingao separava a cidade aka (aristocrética, intelectual e politica) da cidade baixa (popular, comercial e portusria). A passagem de Salvador As dimensées das grandes meted poles Jatino-amecticanas traduziu-se, por volta dos anos 1960, por uma inverséo de perspectivas.” Hoje, a cidade pode ser dividida de outro modo simbilico dual, opondo 0 Jado que dé paraa bafa eo lado que seguea beira do oceano Adantico, Uma série de representagées (boatos, jonais), trajetos (profissionais, de lazer, familiares), construsées (edificios piblicos, igre, lojas, resi- dencias) e objetos urbanos (vefeulos mais ou menos luxuoses, vtrinas sobreos passeios, esculturas,lixeitas et.) compéem, acumulando-s, uma eartografia imaginéria da cidade atual. De acordo com uma separagéo em duas grandes regiées, 0 lado da bafa (que inclui a cidade baixa e uma grande parte da cidade alta) representa hoje um polo negativo nao diferenciado, Agrupa 0s bairros maisantigos, os mais desvalotizados pela politica urbana ¢ abandonados pela populagio em ascensio social. Aqui se encon- tram 0s habitantes mais pobres ¢ com a pele mais escura, vivendo sobretudo em habitat de auroconstrucio, ou mesmo em * (instalacoesilegais e precérias) sem ordenamento urbano prévio. Na escala de toda a cidade, essa regido 6 designada como “marginal” ou “periférica’, sendo frequentementeesse termo, como no easo da Liberdade (ver abaixo) e mais ainda do centro antigo (Pelourinho), 6 sinal de criacto de uma distancia mais social que espacial © De 200 mil habitants em 1900, a cdade passou a 650:mi em 1960, 1 milhio em 1970. 2,5 milhses em meados dos anos 2000, 68 — Em sentido oposto, 0 ordenamento utbano da orla do oceano desenvolveu-se desde os anos 1960. Esta regidio caracteriza-se pela seguinte aparéncia: grandesaglomeragbes de condominios,' prédios altos residenciais ou de escritérios padronizados por um estilo local de arquitetura modemista, numerosos centros cometciais ecenttos de negécio, concentragdes de cinemas, parques de diversdes, clubes privados e praias particulares, vivendas fechadas ¢ guardadas etc ‘com uma populacao visivelmente mais branca que do outro lado da cidade, De resto, a menos que af haja um servigo de emprego, os habitantes do lado da baia frequentam apenas excepcionalmente © lado do occano, £ comum ouvir a midia e os intelectuais falarem, 4 propésio de Salvador, de “apartheid social”. Continuando a utilizaro mesmo ponto de vista do interior do lado da aia, descobre-seo modo como sio definidas outtas regioes, As- sim, Liberdade (um conjunto de vavios bairros que pendem sobre 4 bafa de Salvador) tem uma identificagio externa de tipo racial, social ¢ culturalista: € chamado “negro”, apesar de as estaristicas indicarem uma mestigagem dominance." E chamado “proleratio” ou “miserdvel”, eno entanto concentra hi mais de meio século uma importante populagto de estivadores e operitios que encarnam a ascensio social possivel de negios e mulatos da cidade, Lor limo, desde os anos 1970, designado como um dos “maiores baitros negros fora da Africa” pelos grupos caravalescos negros que se for © Undos bairtos des: regio fei constuila para acomadse peincipalmente,tcnicos « trobalhadores asalarindos do polo petroquimko implantado nos anos 1970 na Buhia¢ foi chamado “o dormitéti do pole * Concavamie, no recenseamento de 1980, no subdlitito de Santo Artemio, que inclu Liberdade, 18% de negros, 60% de mestigns € 229% de brancor. Para roa a cidadede Salvador, ess txaeextm ripestivamente 17.3%, 584%, 24.3%. leg as Avera da cidade maram na Liberdade, Esse movimento cultural fayoreceu a ctiacdo de lugares com ar “éeaico” ~ como senzala do barro preto,” a rua " ou a praga central do bairro, rebatizada em 1992 de praga Nelson Mandela, gracas & iniciativa de um politico local, Kingston’ Assim, conhecido na cidade como um bairro negro ¢ proletétio, populoso eanimado, a Liberdade é um lugar atcaente mas também. temido e, para alguns, fechado. Nessa identificagéo contrastante, outras fronteiras imagindtias so definidas pelos habitantes a partir dos sub-bairros ¢ das ruas residenciais. Essas identidades sio fre- quentemente associndas a algumas caracteristicas espectiicas que podem, ocasionalmente, repercutis bem ou mal sobre a Liberdade no seu todo, 0 que, nesse caso, se torna um meio literalmente ‘moral” no sentido original dado por R. Park, Assim, a avenida Peixe (nua estreita e longa localizada num bas-forid em forma de bevo) & identificada como a referéncia dos “marginais” do bairro, autores de diversos delitos (roubo de carcos, tréfico de droges ct.) Oestigina e a releigio podem ser reforsados pelos habitantes das 4reas vizinhas, spesar de certo sucesto social que os leva a sentir uma imagem negativa atribufda do exterior ao baitro da Liberdade no seu conjunto, ¢ a demarcarem-se, reservando essa imagem a uma certa parte do bairro, concentrando nela toda a mé repatagio. Desdea cidade como um codo até os espacos de interconhecimen- t0 (ruas, conjuntos de becos, pracinhas e suas areas contiguas), a nopao de regiao € til no registro das identidades. Mas trata-se de idencidades relativas, porqueas fronteiras da cidade nio so nem 1 ildioonde se realaavamas fests deum grupo catnavaleso negio,de 1976 © Rua na qual acontecem os bails de um outro grupo catnarakesco. —m— Crntis wih aaa ais verdadeitas nem menos construfdas que as da etnicidade.” E, tal como nesse dominio, deve-se ter cuidado com as teificagies cémodas que mantém, por exemplo, na metifor da cidade- -mosaico,”a ideia de uma transparéncia de sentido sob forma de grupos socialmente coerentes e espacializados que reencontram, finalmente, o paradigma do gueto." Pode-se dizer que essa via de investigagio (incorporada pelos programas de “monografia de bairro” e “estudo de comunidades’, independentemente de suas, qualidades) representou uma longa e duradoura resisténcia da ancropologia & cidade e 20 modo de vide urbane. O risco culturaliscaestard tanto mais Jonge quanto melhor € mais rigorosamente se defina a caracterizaga0 moral das regides urbanas, jf evocada por Park, A transformagao dos espagos urbanos em, fronteiras identitérias, mesmo em sua forma mais completa, a do bairro éinico, é sempre fundada sobre olhares cruzados que poem «em jogo diferencas de gostos, de estilos de vida e de comportamen- «0s. Oconjunto desses critérios resulta de uima configuraydo global devalores morais A escala da cidade, Basta evocar as argumentages da diferenca entre vizinhos de rua, de bairro ou de cidade para Pelo menos como é entendida na perspectiva constutvisa de B Barth (Eibnie Groupe and Bonn daris, The Social Organization of Culture Dffrence. Boston: Litle Brown, 1969). Inireduzide pelo prépeie Pask, “La ville Proposition de recherche eur le com- portemenc humain en milieu usbain” (1925), in Y Grafineyer eI. Joseph (ogs.)s 1984, p 121 As desrigoes de Oscar Lewis das ecindades da Cidade do México e do baitto Es meralda em Porto Rico si carsceristcasdaimpresio de fechamentofisicoesocel trlado pela carta eserrindo de context “comuniteic” pars o etd dis Familias tarbana, Ver Ler enue: de Sanches. Autobiegaphie due famille mexuatye 1961 Paris: Calimmard, 1963; La Vide. Uvefamilleportricaine dans une cule depend Paris Gallimard 1969. oad cae ver sobre quais prine{pios se constroem as tegides morais, Assim, ¢m Salvador, nos préprios baitros populares, a estigmatizacées mais comuns referem-se aos maus costumes, & delinguéncia © & aparéncia. Esses argumentos de acusagao ou difamacéo. ‘do préximo (virinho de rua ou de bairvo) voltam aos tes regstros seguin 0 da ordem familiar (a “mulher de me vida’); 0 da participagso social, e mais particularmente da oposigao entre as figuras do ma- andro (0 “pequeno bandido”) e do wabalhador;* , finalmente, 0 das diferencas de estaturo cuja lembranga sempre sentida como Necessirin’*e que se manifesta pelo vestuitio, pela postura corporal oupela cor de pele. Ora, éno conjunco da cidade atual de Salvador ue a familia, © trabalho ¢ o estacuco (vinculado particularmente cor) representam as principais linguagens da classificacao social Assim, éa partir de uma configuragio especifica de critérios morais que a cidade, como um conjunto, sc faz espelho de identidades ou mesmo de “fator de etnicidade”,”” Conceito pata um nivel intermediétio entre a escala microssocial © cidade como referéncia global e inacessivel, a regigo moral permite procurar 0 sentide das classificagSes socioespaciais cor- entes.* Qs tiltimos limites de sua eficécia heuristica sio os do A. Zales A Maquina ea Revel de esenizaicpputarseesiguiado da pba Sto Paulo: Brsiiense, 1985, R. DaMartadedica todo um capfiulo desu cbia sobre asambiguidadesdh socedade brasileea a tstar do “ritual do ‘voce sabe com quem est filando?™. Rc Dakar, Garnaca, bats e ber, Pais Seuil. 1983, JL, Amvele “Eshnies et espsces: pour une anthropologe topologique", in J-L. Anuélle ¢ E. MBokolo (orgs, Au coeur de Ite. Ende, tbasne ey Eos ey Afiique Pasi: La Découverie, 1985, pp. 1-48, "A seulo de exemplo, algumas duplcases de grandee cdads que suger de um tcatamento ‘regions: Rio-zona sul e Ro-zona nore, Médico ¢ Chales Dowdle New Bell, Dakare Pike, Cll e Agua Elance hivel apreensivel pela pesquisa de campo direta, quer dizer, os do interconhecimento dos atores ¢ do antropdlogo. Nesse caso, 0 ponto de vista sobre a cidade pode “gitar” (pivoter) e a pesquisa pode centrar-se em situagdes de interago, Surgem, entéo, outros problemas de ajuste metodolé Situagio Sea regio moral permite 4 anilise aceder a uma comprecnsio do tariter relative e incerto das fronteiras espaciais eidentitdrias da ci- thade, a abordagem situacional, por seu lado, des-espacializa ainda mais a pesquisa urbana: liberta 0 observador do constrangimento monogréfico habitual 4 etnografia, Porque néo so os limites espaciais que definem a situagio, mas os da interagao, Devem-se 40s antropélogos afiicanistas da Escola de Manchester no Rhodes- Livingstone Institute (na atual Zambia), e particularmente a J.C. Mitchell, as elaborazées sistematicas relativas ao concei- 10 dle situagéo na pesquisa de campo urbana, Essa abordagem abstém-se, por escolha metodoligica, de fazer intervir o career estrutural/institucional das relagées observadas. Ea observacio dos fenémenos na escala interacional que deve permitir identificar (05 constrangimentos reais da ordem social mais vasta. Para um Iigrante ou qualquer citadino, o contexto fenomenoldgico da interagio pode variar de uma situagto para outra varias vezes por dia (trabalho, familia, lazer etc.). Segundo Mitchell, & necessatio “por todo 0 peso da andlise no contexto da interagio e nfo no ® Sobre as relagdes entre + “rego” dis cdnelacsociais¢ a “zona? dos urbanites, ver Capita 5 4ackground dos individuos implicados na sicuagio ou nas ‘culeuras? em nome das quais interagem”.® Em primeiro lugar, apreventarei a perspectiva situacional tal como J.C. Mitchell « conccbe, a partir de duas nogdes-chave: a “situ fo" na sua coeréncia interna e 0 setting (0 quadro, a disposicio dos constrangimentos). A situacio resulta da operacio que consiste em isolar intelectualmente um acontecimento ou um conjunto de acontecimentos a fim de facilicar uma anilise coerente. Essa coeréncia 6 dacla, primeiro, “pela definigao cognitiva” da situagio. Segundo Mitchell, ela precisa de “um mifnimo de sentido partilhado” (Wxared meaning), que &0 quc define “uma percep¢ao social endo individual da situagéc”. O quadto social (ssting) é, além disso, o “contexto es- trutural dentro do qual as inceragoes esto localizadas, Fo conjunto das restrigdes globsis suscetivcis de determinar ral ou tal aspecto da situagio: densidade residencial da cidade, heterogeneidade étnica © regional, diferenciagdes econdmicas ¢ otgantzacao do trabalho espectficas de cada cidade, sistema politico ¢ administrativo etc Resta saber quais sio os efeitos de um cal contexto sobre as normas (patierns) de comportamento dos atores, © debate é recorrente em anttopologia. Vou retomé-lo aqui com o objetivo tinico de fixar usos possiveis da perspectiva siwacional na pesquisa urbana Para que uma situ: uma definicio emic e de uma definigio etic, De um lado, os atores “definem a situagio”, envolvendo-se com um minimo decoeréncia 0 suscite interesse anteopoldgico precisa de Comunicativa (0 que néo impede 0 conflito): é a idcia do ‘sentido pattilhada” (0 shared meaning de Mitchell). De outro, a situagéo * J.C Mitchel, “The Situational Perspective", in Clive, Society and Sacel Perception ‘A Central Afican Pospewie. Oxfocds Clarendon Press, 1987, pp. 1.33, he (Os bers urban da arinilia poe em acto constrangimentos “estrucurais” ou globais. Além disso, hid, em cada caso, certa dose de comportamentos forcadas no en- volvimento situacional. O sentido que os atores dio a uma situacao pode ser mais ou menos imposto ow negociado conforme esta se inscreva num espago muito escruturado, fechado e regulado a priozt (por exemplo, uma fibrice, uma escola, uma igreja) ou menos (por cexemplo, a vizinhanga, a praia, a rua). A abordagem situacional nao cxclui, por conseguinte, a “realidade™ dos espagos urbanos, mas os engloba em sua definigo em ver de ser definida por eles (como acontece nia monografia de baitto, por exemplo). Pelo contritio, certos lugures podem ser plurissituacionais em fungéo do momento do dia ¢ do envolvimento dos atores presentes. Ao longo de um mesmo dia, um bar do baitro Liberdade pode ser, entre outros, 0 quadro 1) do encontiode uma das equipes de furebol do torneio do bairro (um grupo de pares com cerca de doze pessoas discutindo e bebendo durante uma hora); 2) de um jogo frenético de dominés juntando outra meia diizia de homens mais idosos que os anteriores num fim de tarde; 3) da passagem didti jd noite, de um opecério regressando do polo petroquimico que bebe uma cerveja, 6 ou com uum colega, antes de it para casa, Cada sicuagio assinn delimitada atribui um sentido diferente & frequéneia de um mesmo lugar A abordagem situacional jé eraz algo mais que apenas a perspectiva interacionista, Com efeito, na descrigSo das rieualizagées menores que faz Erving Goffman, a “definigao” das situages nao é nem emie nem etic (pode tatst-se, a0 limite, das interagées minimas das quais fala Hannera para definir as celagées mais uibanas), A 10 emana do autor (do qual se pode diver, a0 contririo, que 'E,Gollman, La mite en sine delve quotidenne, Pais: Minuit, 1973, 2 vo. autre & intervensao na descrigéo ¢ maxima). E ele que intraduz como modo deleitura« mecifora teatral: a cena, a decoracio, os bastidores, » © ai€ a representacao € 0 pliblica, sie, no uso. que Goffman faz, nogdes meraféricas de uma ponta a outra. Eé 0 mesmo autor que decretao carter ritual do que observa, partir do 0s axores, 0s papéi momento em que identifica ages normalizadas e repetitivas. Essas ritualizagées menores ngo devem ser confundidas com as sieuagées rituais (ver abaixo), Para dar mais densidade, global ou estrutural, 4 abordagem interacionista ~ cuja “afinidade” com o trabalho et- nogrifico sabre © campo € sublinhada ~, Olivier Schwarte sugere que se trate as sequéncias de interacoes como “unidades empiticas de base”, cujo sentido scria abordado a luz do “fato social total” maussiano, ” Efetivamente, encontra-se nesse caso uma definigio etic minimalista da situaséo, Contudo nota-se que o desvio de escalas continua a ser importante entre as niveis empiricos ¢ tebricas, ¢ 0 estatuto da deserigao néo é regulado, Em outros termos, a “leitura” das interagbes através do conceito maussiano de “fato social toral” niio diz como os atores se apercebem ¢ definem a situacio, Se o interacionismo isolado fica aquém da perspectiva situacto- nal, a abordagem desenvolvida por Gérard Althabe em sua in- Vestigacao sobre os “processos reciprocos” entre corresidlentes de edificios HLM do subtirbio® prolonge-a, icando mais perto das observacées. Com efeito, para Althabe, és elementos, ¢ no mais dois, compéem a situacio observade: para além da “cocrencia dos modos de comunicagia” e das “modalidedes através das quats as 1D. Schwa ‘smpiriane iréductbte,posticio de N. Anderson, 1993, p. 289, * G Alta, La ésidnce comme ene in G. Ale ea, Ubon eeu tid termins cbnologiqucs dans ta France actuelle Pais Anttropes, 1985 tee ip me Anthropes. 1985b, Ov saves ans seal regulagoes da soctedade global trabalham nesse nivel microssocial” (que se pode aproximar diretamente do “sentido partilhado” ¢ do serting de Mitchell), a pesquisa sobre essas modalidades deve levar o investigador, peimanentemente, gos contextos urbanos ¢ profissionais dos diferentes acores em presenca. Ora, esses con- textos nfo se situam noutra escala social de acesso mais ou menos arbitrétio, ees sio os outros espagos sociais aos quais conduzem os wrajecos eas redes de cada um dos individuos observados. Deve-se terem conta farores determinantes como a articulagio e os efeitos reciprocos entre as diferentes situag6es vividas pelos citadinos."" A s da vida urbana, pesquisa revela, assim, os campos socials essen inais perto dos fatos, ¢ 2 sua respectiva importincia.** Rede ‘Asduas abordagens anteriores mostraram que, para aprender a ci- dade, 0 antropélogo pode descreveras suas regioes por referéncia as representacdes espaciais e morais dos atores (tocando-se, entéo, no dominio das identidades relativas)e, em seguida, deve libertar-se da limitagao vinculativa dasreferéncias espacial e institucional a fim de poder construir quadros de pesquisa interacionais ¢ intersubjetivos, apreendidos em situagto, © antropélogo uzbano fica totalmente mével quando, num terceiro tempo, se apoia sobre as diferentes situagées para “ver” e “seguir” as redes sociais que operam, iv sit. %G. Althabe, ‘Proche et lintsn: une Figure svante de Iécrnger’ in S, Outrowetley (org), 1996, p. 80; ver, ambem, na mesma obra, M, de LaPradelle, “Comment <écrite un marché, pp. 91-104, “A andisestuacional sed aprofurdada adlarte, no Capulo3,¢m queso coasideradas quatro siuagées 'm primeiro lugar, dois aspectos dessa abordagem ~ a ancoragem eo desenvolvimento das redes-, Para em seguida me dedicar 4 sua “qualidade”, A ancoragem & ao mesmo tempo, individual (empiricamence) ¢ ‘strunural (Ceoricamente), dado que cada individuo tetsa de sua Posisfo, na ordem soctal da cidade, cera caracteizagio moral, A Fea bet & itt primeiro, pelo ponto de origem, ou sj, ie dlividuo como cabeca da rede. Esse individuo deve ser cscolhicly 20 aces (egundo Aidan Southal), deve seroindividuo cujo compor- Tamento se quer estudar (egundo Clyde Mitchel), pode também Set am casal (para Elisabeth Bott, que estuda especialmente as redes Eamillares, ineroduzindo, enti, a nocéo de joint nemoork),* Pos Ultimo, para Barnes, as scdes formam um conjunto de laces (set o tnkage) no eto dos limites de “nko importa que tomintcate fa, rbanlzasio 2” Nesse quad, ele distingue a interagoes numa “estrela de primeira ordem” © nourta de sepunda orden primeiro eis 0 conjunto das relagbesdiddicas de X (abega de rede), em SeBuida as relagses didlicas que partem de cada ponto desea primeica ‘strelae formam as relagées de segunda ordem. A tela alarga-se. Essa * Sohal i) Sil Changin Sadr fone Onn , 0 fi Londo Oxon! Unt Pe, 126: 1.€ Mle, “TheComeprand Ue Seal Seon ey as (re), Dan Sian eco rn don ge sche Maho Uae Pra tip se hee ee Network. Londtes: Tavistock, 1957, a Be Pace JA. Bames, “Networ litical Process, in 9 Tas ks and Political J. Mitchell (0732), 1969, pp, ag sores urn daantopedoga representacio dos fatos permite chamaraatengio para fendmenos de proximidade e de distancia social (bastante proximos cla ideia cstrucural-funcionalista de relagbes “primétias’ e “secundaria” ‘Mas o seu interesse, na perspectiva de Barnes, reside mais no de- senvolvimento tedrico quase “gréfica” que permite, delimitando 0 conjunto das redes numa sicuacéo dada: Barnes fala nesse caso de “rede parcial”, pensando no modelo de uma “tede total". E, para Hannera, ¢ 0 conjunco da cidade que se torna compreensivel para © antropblogo a partir de sua redefinigio como a “rede das redes”, Trata-se certamente de representagées mais metafbricas que reali: tas, Essas nocoes resultam do desenvolvimento méximo da anilise de redes, € 0 seu principal interesse reside na ajuda que oferecem A desctigto mais do que na prépria observagio. Passo a paso, 0 espago urbano pode ser representade como um conjunto articulado (rede total) ¢ 0s meios sociais urbanos podem ser estudados como sistemas solidérios, ou mais ou menos facciosos ou “mafiosos” (rede parcial). No contexto teérico atual, néo é to importante marcas, como nos anos 1950-1960, a oposicéo entre a pesquisa em espagos sstruturados e institucionais € a que é efetuada em quadros néo cstruturados. Mas € possivel ver nessas anilises de rede objecos bem “usbanos’ ¢ atuais tornarem-se de repente mais préximos do antropélogo como as diferentes formas da “gangue”, das méfias, dos sistemas de corrupgio, das campanhas politicas etc, Com a ancoragem ¢ clsenvolvimento das redes, um terceito elemento parece-me essencial. As redes diferenclam-se mais ou menos segundo 0 scu principal crisério de cooperacao, ou, em ‘oucras palavras, segundo a nacureza da relacdo social que esté na base de sua existéncia, a qual também ngo ocorreria sem uma fingie ou um uso. A presenga ou ausencia de lagos de parentesco aga Joop da side ©2 definiséo normativa dessa rela (Eliagao, alana, parentela ‘ipisiual ou ficttca), @ aproximaséo por sexo e classe de idate (os Stupos de pares), a cortesidéncia (redes de vizinhos, de rua) etc, sto

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