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Panorama da Gestão de
Compras e Suprimentos
nas Empresas
Industriais Brasileiras
Ataide Braga e Maria Fernanda Hijjar
A
década de 90 experimentou o emergir da impor- Suprimentos, e no ano de 2007 preparou a primeira pes-
tância do conceito de Supply Chain Management quisa brasileira que demonstra como está organizada a
(SCM) ou Gerenciamento da Cadeia de Suprimen- gestão de suprimentos nas empresas no nosso país.
tos, principalmente no que se refere à integração, maior Este artigo, portanto, relata, de forma resumida, algu-
visibilidade entre os agentes da cadeia e redução de va- mas constatações registradas no documento Panorama
riabilidade nos processos que suportam os negócios en- da Gestão de Compras e Suprimentos nas Empresas In-
tre estes players. dustriais Brasileiras, que é o relatório completo da pes-
Neste contexto, procurou-se definir SCM como a rea- quisa. Serão abordados aspectos que refletem a impor-
lização de um conjunto de processos-chave de negócios tância da área de Compras para as organizações onde
que interligam os agentes da cadeia desde o consumidor elas estão inseridas, a estrutura organizacional destas
final até o fornecedor inicial de matéria-prima (Lambert áreas e onde as empresas estão empregando os recursos
et al.,1998; Fleury et al., 2000). Estes processos podem destinados à obtenção dos bens e serviços.
ser sintetizados na relação abaixo: A pesquisa propriamente dita foi realizada com 105
indústrias entre as mil maiores e melhores empresas,
• Relacionamento com os clientes conforme classificação estabelecida pela revista Exame.
• Serviço aos clientes O faturamento destas empresas está compreendido en-
• Administração da Demanda tre R$ 187 milhões e R$ 15 bilhões. Os setores analisados
• Atendimento de pedidos seguem abaixo relacionados:
• Administração do fluxo de produção
• Compras/Suprimentos • Açúcar e Álcool
• Desenvolvimento de novos produtos • Alimentos e Bebidas
• Automotivo
Compras/Suprimentos, sendo um dos processos-cha- • Autopeças
ve acima, acompanhou o desenvolvimento do SCM e • Eletroeletrônico e Equipamentos
no Brasil, nos últimos dez anos, vem apresentando sig- • Higiene, Cosméticos e Farmacêutico
nificativas alterações, particularmente sobre como esta • Material de Construção
função vem sendo gerenciada e ganhando status dentro • Mineração
das organizações (Braga, 2006). • Papel e Celulose
O Centro de Estudos em Logística, preocupado em • Químico e Petroquímico
contribuir com a construção do conhecimento deste se- • Siderurgia e Metalurgia
tor no Brasil, vem realizando estudos sobre Compras/ • Têxtil e Calçados
Figura 1 – Nível hierárquico do principal executivo de Compras Figura 2 – Valor anual comprado / faturamento bruto – Brasil x EUA
fornecedor específico.
• Maior facilidade de desenvolver
e coordenar estratégias de Compras: É
muito difícil de se criar, implementar e
Standard Benchmarks 2007
mudança organizacional ou de processos, pois isto não Há ainda os que acreditam que a estrutura mais apro-
se traduz em prioridade para o comprador e, também, priada seja aquela que concilie as vantagens das duas
devido à necessidade de ter que conquistar este mesmo estruturas apresentadas acima, resultando em uma con-
comprador sob uma perspectiva de voluntariado. figuração híbrida ou mista, conjugando centralização
Em contrapartida, a organização descentralizada possui com descentralização.
algumas vantagens que a distinguem da centralizada, mais Neste formato, há a possibilidade de se estabelecer
especificamente devido ao apelo de que o atendimento do uma autoridade de Compra local, mas existe um poder
pessoal de Compras pode ocorrer onde a ação está aconte- central no qual as políticas, normas e estratégias são
cendo, ou seja, na ponta da execução, obtendo-se alguns estabelecidas por um comando único. Além disso, um
benefícios como os abaixo relacionados: significativo volume de aquisições ocorre centralmente:
• Velocidade e resposta rápida: Os defensores deste por exemplo, as obtenções de elevado volume financei-
tipo de estrutura alegam que a descentralização permite ro, itens estratégicos e compras de itens nos quais se pu-
que o comprador esteja bem mais perto de onde a ne- der utilizar o princípio da consolidação.
cessidade está acontecendo, sendo mais sensibilizado e A pesquisa demonstrou que as estruturas centralizadas e
envolvido pelo desenrolar das ações do setor onde surge híbridas foram predominantes no cenário brasileiro, acom-
a demanda de bens e serviços e, portanto, respondendo panhando a tendência destas configurações no restante do
com maior rapidez do que na opção centralizada. mundo. Observe a Figura 4, onde 31% das empresas de
• Entendimento dos requerimentos operacionais: grande porte possuem suas estruturas de compras total-
O pessoal de compras que atua em uma estrutura des- mente centralizadas e 57%, estrutura híbrida, mas com a
centralizada possui a habilidade de melhor entender e maioria das decisões e processos realizados centralmente.
valorizar os requisitos operacionais que são característi- A Figura 4 também nos permite comparar a situa-
cos do setor solicitante de uma determinada aquisição. ção brasileira com o resultado de uma pesquisa seme-
• Melhor suporte ao desenvolvimento de novos lhante realizada no Japão no ano de 2006, na qual
produtos: A estrutura descentralizada facilita a adoção da foram consultadas 118 empresas sobre o desenho das
estratégia de envolvimento do fornecedor nos estágios ini- suas estruturas de Compras. O resultado foi que 53%
ciais de desenvolvimento de novos produtos. Isto aconte- adotavam a estrutura centralizada e 40% estavam es-
ce porque o pessoal de compras das unidades de negócios truturadas de forma híbrida.
pode interagir com o fornecedor com maior facilidade,
avaliando localmente as especificações dos materiais que Análise dos gastos anuais
integrarão o novo produto que está sendo desenhado, de-
terminando as estratégias de suprimentos destes itens e Para se ter uma noção de como estão distribuídos os
identificando a disponibilidade de materiais substitutos. gastos anuais das empresas participantes da pesquisa,
Produtos com baixo valor anual comprado (em R$) e com alto risco de Produtos com grande valor anual comprado (em R$) e com alto risco de
Fonte: Pesquisa Cel/COPPEAD - 2007
Risco de fornecimento
fornecimento, ou seja, com pouca disponibilidade de fornecedores de fornecimento, ou seja, com pouca disponibilidade de fornecedores de
insumos, cuja falta pode causar problemas significativos na operação insumos, cuja falta pode causar problemas significativos na operação
da empresa da empresa
Produtos com baixo valor anual de compra (em R$) e com baixo risco Produtos com grande valor anual de compra (em R$) e com baixo risco
de fornecimento, ou seja, grande disponibilidade de fornecedores de fornecimento, ou seja, grande disponibilidade de fornecedores
alto risco de fornecimento e alto valor anual de compra como o setor de Compras deve gerenciar os materiais
podem ser denominadas “estratégicas”, por serem nor- situados nos quatro quadrantes e abandonar as velhas
malmente muito importantes para a empresa e, geral- práticas de tratar a todos da mesma forma.
mente, se comunicarem diretamente com os clientes. Os itens considerados não-críticos, por exemplo,
Já os produtos de baixo risco de fornecimento e baixo requerem processamento eficiente, padronização dos
valor anual de compra são conhecidos como “não-críti- produtos, otimização da quantidade comprada e con-
cos”, devido à sua facilidade de aquisição (materiais de trole de níveis de inventário. Os itens classificados
escritório, por exemplo). Por fim, os itens de baixo risco como de alavancagem permitem que a empresa com-
de fornecimento e alto valor anual de compra são classifi- pradora explore o seu poder de compra, como, por
cados como “alavancáveis”, devido às grandes oportuni- exemplo, com negociações apertadas, fixação do preço
dades de redução de custos neste grupo, pois é aqui que a de compra dos produtos e substituição dos mesmos.
competição entre os fornecedores é incentivada. Os itens considerados como de gargalo podem cau-
Retornando à nossa pesquisa, solicitamos que as sar problemas para a organização compradora e trazer
empresas realizassem o enquadramento dos gastos risco para sua operação. É recomendável assegurar o
ocorridos durante o ano anterior, segundo a matriz aci- fornecimento através da garantia de volume de com-
ma comentada. O resultado foi a classificação demons- pra para atrair o vendedor, bem como possuir controle
trada na Figura 6. É interessante ressaltar que a soma do fornecedor, seguro dos inventários e plano de con-
das categorias de itens estratégicos e de alavancagem tingência para descontinuidade no abastecimento.
representa 76% do total anual comprado. Esta propor- Finalmente, os itens estratégicos requerem como
ção encontrada na prática está muito alinhada com o principais tarefas o desenvolvimento de relacionamen-
registrado na literatura, onde vários autores indicam to de longo prazo com o fornecedor. Para estes itens,
que as duas categorias em apreço representam cerca de devem ser empregadas técnicas analíticas adicionais,
80% do volume anual comprado. incluindo análise de mercado, análise de risco, previ-
Normalmente, o volume financeiro de 80% dos gas- são de preços, simulação e modelos de otimização.
tos anuais é alocado a um conjunto de fornecedores
que não representa mais do que 20% de toda a base de Conclusão
fornecedores da empresa. Assim, as categorias de itens
estratégicos e de alavancagem devem ser gerenciadas A crescente pressão do mercado por redução de cus-
empregando-se estratégias de relacionamento com o tos e maximização dos níveis de serviço tem trazido à
fornecedor que permitam, ao mesmo tempo, garantia tona a importância da eficiência na gestão empresarial.
de fornecimento e redução de custo. Especificamente, observa-se nas companhias brasileiras
A análise de gastos retratada neste texto pode ser a valorização das atividades relacionadas ao suprimen-
bastante útil como primeiro indicador para se definir to de produtos, devido ao seu potencial de gerar econo-