Você está na página 1de 8

ROTAS DO MÁRMORE – REDE INTEGRADA DE CIRCUITOS

GEOTURÍSTICOS

V. Lamberto
to
Dep. Geociências - Universidade de Évora, vsilva@uevora.pt, vlamberto@mail.telepac.pt

1. Motivações

O conceito de turismo sustentável, em harmonia com o ambiente local, comunidades e culturas,


considera todas as formas de desenvolvimento turístico, planeamento e actividades que
mantenham a integridade social e económica das populações, bem como a perenidade do
património natural, construído e cultural. Neste contexto, o geoturismo, associado a uma filosofia
de desenvolvimento sustentável de utilização do potencial turístico para constituir riqueza, toma
como ponto de partida o enquadramento geológico de uma região para oferecer ao visitante uma
leitura integrada das características desse território (e.g. geomorfologia, património, ocupação
humana).

O projecto ROTAS DO MÁRMORE - Rede Integrada de Circuitos Geoturísticos assenta no


pressuposto da valorização de um território a partir da matéria-prima que lhe conferiu a sua
identidade – o mármore, mediante criação de uma rede integrada de percursos, que tem por
enquadramento o anticlinal de Estremoz. Nesta rede o património geológico surge como
ferramenta essencial para a leitura/compreensão deste território e como factor indutor de
desenvolvimento e promoção turística, sem lhe causar danos significativos, promovendo a
sensibilização da população em geral para a importância do mármore e da indústria de rochas
ornamentais associada, aproximando as pessoas da natureza, valorizando os seus recursos,
promovendo a sua recuperação para novos usos e dinamizando a economia da Zona dos Mármores.

Pretende-se que as Rotas do Mármore, através da definição e implementação de propostas de


animação turística e lazer no espaço natural, estimulem uma forma salutar de lazer e de contacto
directo com a natureza (e.g. pedestrianismo, cicloturismo, BTT e turismo equestre), que exigem
infra-estruturas mais económicas, contribuem para a saúde do utilizador e permitem o contacto
com a natureza envolvente. Estas actividades permitem dinamizar, nas zonas rurais, acções que
complementem a economia ligada às actividades tradicionais (e.g. artesanato, gastronomia),
promovendo o desenvolvimento socioeconómico, rendibilizando outros sectores turísticos que a
ela se associam (e.g. hotelaria e restauração) e contribuindo para um desenvolvimento sustentado
dessas mesmas zonas.

2. Enquadramento geológico-mineiro

A rede de percursos está centrada no denominado anticlinal de Estremoz (fig. 1), estrutura
geológica responsável pelas características únicas que a região apresenta, nomeadamente:

1
Borba

Vila Viçosa
Estremoz

Fig. 1 - Anticlinal de Estremoz (escala aproximada: 1/400.000, adapt. www.igm.pt)

- extensos afloramentos carbonatados (mármores e dolomitos), responsáveis, face à


largamente dominante envolvente xistosa, pelas especificidades do relevo, recursos
geológicos e hídricos, solos, fauna e flora, ocupação humana e toponímia;
- maior mancha de mármores do país e mais importante área extractiva e transformadora
de rochas ornamentais nacional, apresentando a maior intensidade e uma notável
continuidade histórica de exploração mineira, principal responsável pela colocação de
Portugal entre os dez maiores produtores mundiais de rochas ornamentais;
- um dos principais pólos de desenvolvimento da região Alentejo, determinante para a
manutenção de um elevado volume de emprego nesta região.

Desta forma, a presença da maior e mais importante jazida de rochas ornamentais do país (os
«mármores de Estremoz») constitui o principal factor estruturante da região, espaço humanizado
de forma mais ou menos intensa e permanente, mas onde se mantêm em pleno funcionamento os
processos naturais.

3. A Rede

Um conjunto de pressupostos influenciou a criação da rede de circuitos na Zona dos Mármores,


com destaque para os seguintes:
- presença de importante indústria extractiva e transformadora de rochas ornamentais,
com importante património industrial (e.g. pedreiras, escombreiras e maquinaria) a
proteger, valorizar e divulgar, nomeadamente no âmbito do turismo industrial;

2
- ocupação humana do território com alguns aspectos distintivos, influenciados pela
existência de condições favoráveis à fixação das populações (e.g. bons solos e
importantes recursos hídricos);
- excelente localização, infra-estruturação e interessante património natural, construído e
cultural (e.g. enogastronomia);

- crescente apetência da população para conhecimentos de índole geológica (base para


interpretação/compreensão do meio ambiente e veículo para um maior entendimento e
aproximação do Homem à Natureza);
- hábitos e preferências dos turistas, cada vez mais direccionados para a fruição da
Natureza e de realidades locais específicas, com toda a diversidade de situações mais ou
menos originais que existem numa região, como verificado no decurso de algumas
actividades, bastante concorridas, entretanto levadas a cabo na região (e.g. Geologia no
Verão, SlowFood, Association des Géologues du Sud Est – França).

3
A rede de percursos, baseada no mármore e na actividade mineira aí instalada, pretende assumir
uma grande importância na conservação, preservação e divulgação do património e no contacto
directo com as suas gentes, potenciando o desenvolvimento sustentável da região, nomeadamente:
- divulgação da Geologia, com base no anticlinal de Estremoz, essencialmente carbonatado
e envolvido por formações «xistosas», onde são observáveis diversas litologias (Pré-
Câmbrico-Cenozóico) e inúmeras estruturas geológicas, graças à excelente exposição
proporcionada pela intensa actividade mineira presente;
- necessidade de intervenção na valorização dos produtos e subprodutos locais,
dinamizando sectores económicos locais de uma forma integrada e sustentável,
nomeadamente mediante promoção do mármore, como recurso geológico ímpar;
- contribuição para a educação ambiental ao ar livre, promovendo a descoberta da
Natureza, de cada um dos participantes e de valores cada vez mais secundarizados;
- expansão do potencial do turismo de natureza, cultural e industrial de forma
sustentada, mediante condução dos geoturistas por trilhos, evitando a degradação de
zonas circundantes sensíveis;
- implementação de estruturas e acções de apoio ao desenvolvimento da animação
turística, dada a necessidade de infra-estruturas para dinamização de iniciativas privadas
geradoras de emprego local.

O projecto visa igualmente estreitar as relações da população residente com o meio envolvente,
nomeadamente através dos seguintes propósitos:

4
- recuperação da tradição de percorrer o campo por antigas veredas, retomando antigas
ligações entre povoações e redescobrindo velhas rotas de peregrinação;
- sensibilização para antigos e novos hábitos, nomeadamente na população mais jovem,
mediante promoção de saudáveis actividades de ar livre que possibilite m uma ligação mais
forte ao território, através de uma visão abrangente do mesmo, do ponto de vista
temático e espacial.

Desta forma, a rede de percursos deverá contribuir para o desenvolvimento sustentável da


região, nomeadamente através da expansão do potencial de turístico de natureza, cultural e
industrial e da implementação de estruturas e acções de apoio ao desenvolvimento da animação
turística.

4. Os percursos/trilhos

O projecto envolve a definição, caracterização e marcação e sinalização de uma rede de circuitos


com as seguintes características:
- ponto s nevrálgicos nas três sedes de Concelho (Estremoz, Borba, Vila Viçosa) e, de forma
complementar, em aglomerados populacionais menores (e.g. Bencatel, Veiros), permitindo
a ligação entre eles e a descoberta de espaços e lugares que os circundam, por antigos
caminhos e veredas;
- desenvolvimento circular;
- disposição em rede, i.e. a possibilidade, em determinados pontos, de ligação entre
percursos;
- diferentes graus de extensão e de dificuldade (geralmente reduzida);
- normalização, a nível de denominação e de sinalização, com os demais existentes em
Portugal e na Europa, possibilitando a sua dignificação e promoção como produto de
qualidade e integração em redes nacionais e europeias, com óbvios benefícios para a
região.

A primeira fase, já concluída, consistiu no levantamento e ensaio de uma rede de 20 percursos


de natureza, distribuídos da seguinte forma:

5
- Concelho de Estremoz: 8 circuitos;
- Concelho de Borba: 4 circuitos;
- Concelho de Vila Viçosa: 8 circuitos.

A rede é composta por trilhos geograficamente abrangentes e com diferentes extensões,


permitindo a descoberta desta região por parte de diversos perfis de geoturistas (fig. 2).

Borba

Vila Viçosa
Estremoz

Fig. 2 – Trilhos percorridos pelas ROTAS DO MÁRMORE (escala aproximada: 1/400.000)

São disponibilizados mais de 400 km de trilhos, distribuídos por circuitos urbanos, rurais e
mistos (os maiores centros urbanos da região funcionam como pontos de partida e chegada da
maioria dos itinerários) que possibilitam dar a conhecer, de uma forma integrada, a Zona dos
Mármores:
a) percursos urbanos:
- articulação entre o património geológico e o património construído e cultural,
contribuindo para a divulgação da região e de toda a sua riqueza (e.g. geologia,
arquitectura, sociedade);
- observação da utilização de rochas ornamentais, nomeadamente mármore, em
Estremoz, Borba e Vila Viçosa (e.g. calçadas, igrejas, palácios, castelos, tabernas);
- possibilidade de saborear a enogastronomia alentejana em tabernas e
restaurantes tradicionais e de conhecer o artesanato da região, entre outros
aspectos;
b) percursos rurais:
- centrados na geologia e na actividade mineira, proporcionam o contacto directo
com o património natural da região e contribuem para a divulgação do mármore e
da indústria de rochas ornamentais (e.g. pedreiras e serrações, propriedades da
matéria-prima, importância económica, ambiente);
- fruição sustentada de interessantes paisagens alentejanas, onde convivem olivais,
montados, vinhas, zonas fortemente industrializadas e habitats de muitas
espécies da fauna portuguesa;
- nível de dificuldade variável, face à topografia, piso e distância;
c) percursos mistos:
- percorrem espaços urbanos, como sedes de Concelho e núcleos urbanos menos
importantes (e.g. Veiros, Arcos, Bencatel), e a sua envolvente rural, mais ou menos
humanizada.

6
A rede de circuitos trilha e visita inúmeros espaços característicos da região (e.g. pedreiras,
serrações, escombreiras, fornos de cal, olivais, montados, vinhas, searas, oradas, núcleos
urbanos, tabernas), abordando diversas temáticas características da região (e.g. à descoberta de
Vila Viçosa, Borba e Estremoz; entre olivais, montados e pedreiras; à descoberta da cal; a rota
das tabernas; pela Serra d´Ossa; através dos mármores; entre vinhedos e petiscos).

A sua implementação permitirá captar turistas para a região e aumentar o seu tempo de
permanência, através de usufruto, de uma forma sustentada, do património único da Zona dos
Mármores, região que oferece condições ideais para a prática de actividades ao ar livre.

5. Observações finais

O pressuposto em que assentam todos os trilhos é o da valorização de um território a partir da


matéria-prima - o mármore - e da estrutura geológica - anticlinal de Estremoz - que lhe
conferem uma identidade muito própria, através da fruição e compreensão da Natureza e sua
humanização (e.g. olival, vinha, pedreiras).

A rede ROTAS DO MÁRMORE percorre e dá a conhecer o património da Zona dos Mármores


através de um espaço que surge como museu natural e que se constrói ao longo de percursos que
constituem recursos didácticos para o conhecimento da geologia e do importante recurso
geológico que é o mármore, contribuindo para a valorização de uma região, da importante
indústria de rochas ornamentais e de um produto natural, através do desenvolvimento de
actividades de geoturismo.

7
O desenvolvimento deste projecto conduzirá à produção de diversos outputs (e.g. brochuras,
guias, CD-ROM, SIG, website), à criação e implementação de sinalização uniforme normalizada, a
acções de divulgação, promoção e formação, e à infra-estruturação de espaços.

A terminar, refira-se a futura ligação a outras redes e percursos em fase de definição bastante
avançada, visando a criação de uma rede regional de atravessamento do Alentejo, centrada no
património geológico regional.

Você também pode gostar