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Índice

Agradecimentos.................................................................................................................4
Introdução..........................................................................................................................5
1.Problemática...................................................................................................................8
1.1 Descrição do conceito de Shopping........................................................................8
1.2.Tempo e espaço.....................................................................................................10
2.2.O tempo de trabalho e o tempo de não-trabalho..................................................13
2.3.Tempo ocupado, tempo livre e tempo de lazer.....................................................16
2.4.Conciliação da vida profissional com a vida pessoal/familiar.................................17
2.5.Questões de género e o papel social da mulher....................................................19
2.6. A relação entre as habilitações literárias e a herança cultural e as influencias nos
percursos profissionais.................................................................................................22
2.7.Modelo de análise..................................................................................................24
3.Metodologia..................................................................................................................25
3.1.Descrição do espaço de análise..............................................................................26
3.2. Definição da amostra............................................................................................27
3.3. Caracterização dos entrevistados..........................................................................28
3.4.Breve descrição dos entrevistados..............................................................................30
3.5.Caracterização da situação profissional dos indivíduos..............................................32
3.6. A estruturação da entrevista.................................................................................32
3.7.Obstáculos encontrados.........................................................................................34
4.Análise de dados...........................................................................................................35
4.1.Conciliação da vida profissional com a vida familiar..............................................35
4.1.1.Tempo de trabalho..........................................................................................43
4.1.2.Os horários atípicos e o trabalho ao fim de semana.......................................45
4.1.3.Tempo de não trabalho e de lazer...................................................................46
4.2.Nível de satisfação no trabalho..............................................................................49
4.3.Percursos profissionais e expectativas futuras.......................................................55
3.4.Tipologias de trabalhadores...................................................................................65
Conclusão.........................................................................................................................70
Referências bibliográficas................................................................................................78
ANEXOS.........................................................................................................................84

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Operacionalização dos conceitos 1...................................................................................88
Operacionalização dos conceitos 2...................................................................................89
Guião de entrevista...........................................................................................................90
Grelha de análise de conteúdo..........................................................................................95

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Agradecimentos

Um trabalho de investigação é algo que exige uma elevada concentração e


uma grande força de vontade. No inicio existe a sensação que estamos perdidos e
de seguida sente-se o tempo a escassear, Para além de ser um trabalho individual,
existe sempre o contributo de outros elementos indispensáveis e merecedores da
nossa gratidão.
Quero agradecer em primeiro lugar, á minha orientadora Dra. Emília
Araújo, que foi a pessoa que mais me fez acreditar em mim e nas minhas
capacidades. Sou inteiramente grata pela partilha da sua imensa sabedoria e
experiencia em investigação, sem dúvida que aprendi bastante. Agradeço todas as
suas palavras de força, nos momentos em que me senti mais desanimada, mais
cansada. Ao longo deste trabalho mostrou-se sempre disponível e com sugestões.
Quero agradecer a todos os entrevistados, que gentilmente cederam o seu
tempo e prestaram o seu depoimento. Sem estas pessoas este trabalho não teria
sido possível. Quero também agradecer á secretária de administração do centro
comercial em estudo que prestou esclarecimentos sobre as questões logísticas do
centro.
Por último, quero agradecer á minha mãe que teve a paciência de me ver
sempre colada a este computador durante meses e sempre me apoio. Á minha tia

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que mesmo a 365km de distancia nunca deixou de me dar palavras de incentivo e
conforto. Agradeço também aos meus verdadeiros amigos dos quais me afastei de
há uns meses para cá, e mesmo assim compreendem as razões e continuam a
torcer por mim.

Introdução

O acto de fazer compras transformou-se numa actividade bastante


importante nas sociedades actuais. Um dos marcos que transformou a história do
comércio e do consumo foi o aparecimento das grandes superfícies comerciais.
Trata-se de espaços planeados ao pormenor, para, no mesmo local, concentrarem
todos os serviços necessários ao consumidor. Funcionam, também, como local de
lazer, cultura, convivialidade e entretenimento. Independentemente da dimensão
ou do lugar onde se localizam, estes espaços são considerados as catedrais dos
novos tempos modernos (Cachinho, 2000).
O facto de os Shoppings Center constituírem um fenómeno relativamente
recente e pouco abordado no nosso país, constituiu o motivo fundamental para a
escolha deste objecto de estudo. Podemos considerar este tipo de espaço como um
dos efeitos da modernidade que se tornou possível graças ao aparecimento de
inovações tecnológicas, como o aparecimento da luz artificial que possibilita que
estes espaços se mantenham abertos durante a noite. Os espaços dos centros
comerciais podem ser considerados como catedrais de hedonismo e
convivialidade. Podemos caracterizá-los como um pequeno mundo, em que nos

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abstraímos da rotina do dia-a-dia, e nos dedicamos a nós próprios. Este tipo de
empreendimentos, para além de contribuírem para o lazer da população, é
relevante pelo facto de serem também locais onde podem ser observadas relações
sociais.
Os centros comerciais, bem como o trabalho no sector dos serviços, como
o comércio, não têm sido alvos de reflexão por parte dos sociólogos no nosso país.
Existem apenas alguns estudos sobre centros comerciais das zonas metropolitanas
do Porto e Lisboa, embora não direccionadas para o âmbito da sociologia. Uma
investigadora que teve um grande contributo no estudo dos aspectos relacionados
com estes espaços, e mais especificamente com o contexto laboral, é Sofia
Alexandra Cruz. Esta socióloga realizou alguns trabalhos no sentido de retratar os
principais traços identitários dos trabalhadores de superfícies comerciais, dando
ênfase à precariedade laboral e às experiências vividas.
Os Shoppings Centers podem ser considerados como um marco
inovador no comércio a retalho. Torna-se particularmente importante dar relevo
aos trabalhadores destes locais, pois são eles que dão tudo de si para tornar
possível a grandiosidade deste local. Este tipo de empreendimento comporta
horários bastante alargados, para permitir uma maior oferta e comodidade ao
cliente, daí obrigando os que trabalham neste espaço a um modelo de vida
assíncrono. Os horários nocturnos, fins-de-semana, feriados e turnos rotativos
tornaram-se a realidade destes indivíduos. Por isso, é importante identificar que
estratégias utilizam para gerir o tempo atípico no quotidiano. É certo que todos os
indivíduos que trabalham em horários ditos normais efectuam um grande esforço
no sentido de conciliar a vida pessoal com a vida profissional. Mas, e um
indivíduo que trabalha num Shopping? Trabalhando noites, fins-de-semana,
feriados, como organiza a sua vida? Que tempo tem para dedicar aos seus entes
mais próximos? Se, enquanto todos se divertem no Shopping, ele tem de
trabalhar, sentir-se-á satisfeito? Será que a sua remuneração compensa os
sacrifícios que faz? Quem são estes indivíduos? O que esperam para o seu o seu
futuro? Estas são algumas questões que surgiram ao longo deste trabalho. Assim,
o presente trabalho de investigação é centrado na vida dos trabalhadores de
centros comerciais, focando sobretudo a atipicidade dos horários e a gestão do

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tempo destes indivíduos. Inerente à gestão do tempo, encontra-se também a
conciliação da esfera profissional com a familiar. É das dimensões fulcrais neste
trabalho, pois implica compreender de que forma os indivíduos trabalhadores de
Shopping gerem a atipicidade do tempo e do espaço a que estão sujeitos no seu
quotidiano.
Considerou-se necessário conhecer um pouco mais acerca da vida destes
trabalhadores, para que fosse possível analisar mais profundamente. Deste modo,
foram explorados aspectos como os contextos socioeconómicos, os percursos
profissionais e as respectivas expectativas futuras, condições de trabalho e nível
de satisfação com o mesmo, passando também pelas implicações na saúde.
O presente trabalho de investigação realizou-se num Shopping Center na
cidade de Guimarães. Foram realizadas 21 entrevistas a trabalhadores deste local,
19 mulheres e 2 homens, sendo que desse total de mulheres 4 são casadas, 5
vivem em união de facto, 8 são solteiras e 2 são divorciadas. Em relação aos
homens, foram apenas entrevistados 2: 1 casado e 1 solteiro, para evidenciar a
questão das diferenças de género, que se consideram importantes, visto que é uma
profissão essencialmente dominada pelas mulheres.
Após a realização das entrevistas, foi elaborada uma análise de conteúdo
aos depoimentos dos entrevistados, possibilitando conhecer os contextos laborais
e sociais onde se inserem, bem como outros aspectos essenciais, com vista a
concluir os objectivos a que me propus.
Fazendo uma breve apresentação deste trabalho, podemos então dividi-lo
em três capítulos: o primeiro capítulo é relativo à problemática, contendo um
pequeno enquadramento teórico, onde são apresentados os conceitos e as
dimensões fundamentais desta investigação: em primeiro lugar, é feita a
abordagem do conceito de centro comercial, procedendo-se a um enquadramento
histórico sobre o seu surgimento e evolução, bem como as suas definições. De
seguida, são apresentados os conceitos de tempo e de espaço. Ao falar-se em
tempo torna-se necessário fazer a divisão do mesmo em tempo de trabalho e
tempo de não-trabalho, onde são descritos os tipos de tempo e de lazer. Neste
ponto, é também referida a rotina e a relação do tempo com a produtividade,
dando o exemplo da divisão do trabalho. Outro dos pontos referidos é a

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importância da conciliação da vida familiar e profissional e considerando sempre
as diferenças de género, finalmente outra dimensão importante será abordar a
importância da herança cultural e relacionar com os percursos profissionais.
No segundo capítulo é descrita a metodologia utilizada. O método
escolhido foi o indutivo e a técnica utilizada a da entrevista semi-estruturada.
Desse capítulo consta uma caracterização da amostra, bem como a explicação de
todos os passos realizados para a concepção desta investigação, não descurando os
obstáculos encontrados.
No terceiro capítulo, é feita a análise dos resultados das entrevistas. Esta
análise foi também dividida três dimensões, que se consideram as mais
importantes deste trabalho: em primeiro lugar, a conciliação da vida familiar com
a profissional, onde o tema dos horários é fortemente abordado; em segundo
lugar, o nível de satisfação no trabalho, que implica as condições de trabalho
subjacentes e em terceiro lugar, outra dimensão fulcral, que será a dos percursos
profissionais e expectativas futuras, onde um dos temas mais fortemente
abordados será a relação da profissão com as habilitações literárias.
Após a análise das dimensões encontradas nas entrevistas, são
apresentadas a descrição e explicação das tipologias encontradas. A concluir o
trabalho, são apresentadas as conclusões obtidas, onde são relembrados os
objectivos que conduziram esta investigação, deixando inclusivamente algumas
sugestões de aspectos que poderiam ser melhorados, no âmbito nesta profissão.

1.Problemática

Este trabalho incide sobre a organização do tempo e do espaço atípico a


que estão sujeitos os trabalhadores de centros comerciais. Neste sentido é
importante para compreender esta problemática determinar os conceitos
fundamentais e são eles: compreender antes de mais o que são centros comerciais,
os conceitos de tempo e de espaço, o conceito de família e a conciliação com a
profissão, a questão das diferenças de género e finalmente a herança cultural.

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1.1 Descrição do conceito de Shopping

O termo centro comercial começou por ser usado para descrever as ruas e
zonas urbanas onde se concentravam grande número de estabelecimentos
dedicados ao comércio. A expressão centro comercial é uma tradução de um
termo que surgiu nos Estados Unidos “ Shopping Center” (Cachinho, 2000).
Cachinho num estudo sobre centros comerciais em Portugal, publicado no
Observatório do Comércio, descreve assim este conceito: “Empreendimentos
comerciais planeados, constituídos por um conjunto diversificado de lojas de
venda a retalho e serviços, localizados num ou mais edifícios contíguos,
promovidos pela iniciativa privada ou pública e associados às novas formas de
urbanismo comercial” (Cachinho, 2000:8).
Os centros comerciais distinguem-se dos centros de comércio
tradicional do ponto de vista genético, fisionómico, cartográfico e funcional. Do
ponto de vista genético, pois são concentrações de estabelecimentos concebidos
enquanto uma unidade. Do ponto de vista fisionómico, porque todos os
estabelecimentos têm traços uniformes de imagem que diferem do comércio
tradicional e topológico porque enquanto o comércio de rua se encontra no rés-do-
chão e se alinha ao longo de uma rua ou avenida. Nos centros comerciais as lojas
são instaladas em edifícios construídos para o efeito. Do ponto de vista funcional,
os centros comerciais têm a vantagem de, no mesmo local, ofereceram uma
grande variedade de serviços, além das facilidades de estacionamento (Cachinho,
2000).
Nesta linha de pensamento, consideramos que a maior vantagem dos
Shoppings é realmente o facto de neles podermos usufruir de um grande número
de serviços, ou seja, podemos encontrar lojas de vestuário, bijutarias, sapatarias,
lingerie, ourivesarias, lojas de malas de viagens, livraria, lojas de
electrodomésticos, de desporto, de brinquedos, para além da oferta de serviços
como um sapateiro, lavandaria, florista, serviços de costura, agência de viagens,
cabeleireiro, farmácia, hipermercado, quiosque, loja de animais, salas de cinema,
para além de uma grande variedade de restaurantes e até um local onde os pais

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podem deixar os seus filhos enquanto fazem as suas compras comodamente.
Existem também alguns centros que dispõem de ginásios e parques de diversões
no seu interior. Resumindo, no Shopping podemos encontrar e fazer de tudo,
desde comprar um cordão até marcar uma grande viagem, comprar um
medicamento para um filho doente, deixar a roupa na lavandaria enquanto se
arranja o cabelo ou as unhas, ou fazer um programa recreativo, como jantar em
família e terminar numa sessão de cinema.
Contextualizando historicamente o conceito de centro comercial, alguns
autores defendem que nasceram na Europa, enquanto outros atribuem a sua
origem aos Estados Unidos. No entanto, provavelmente, será uma criação norte
americana, que se expande especialmente a partir dos anos cinquenta, e começa a
evidenciar-se na Europa, na década seguinte. Depois da segunda guerra mundial, a
Europa ficou bastante destruída, vivendo uma fase de reconstrução que não
favorecia o investimento na venda a retalho. Nesta fase, a prioridade foi
reconstruir as fontes produtivas, criar emprego, resolver problemas das famílias
desalojadas e reabilitar sectores da cidade afectados pelos bombardeamentos. Face
à conjuntura económica, o mercado consumidor ficou em graves dificuldades de
desenvolvimento, e uma vez que a população não tinha poder de compra, seria
difícil os centros comerciais atingirem sucesso.
Os Estados Unidos foram pouco afectados pela guerra, quer em danos
físicos ou económicos. O aumento do consumismo, que atingiu este país,
propiciou então o sucesso destes empreendimentos. (Cachinho, 2000)
Embora os centros comerciais, da forma como os conhecemos hoje em dia,
tenha sido difundida nos Estados Unidos, a ideia de concentrar no mesmo espaço
o conjunto diversificado de estabelecimentos vem do século passado. Exemplos
vivos disso são as galerias Vittorio Emanuelle em Milão , a Royal Opera Arcade
de Pall Mall em Londres ou as galerias Vivieenne em Paris. Podemos então
afirmar que, apesar de o conceito de centro comercial se ter expandido nos
Estados Unidos, é nas arcadas e antigas galerias comerciais europeias do século
passado que remontam as suas origens (Cachinho, 2000).
Em Portugal, os centros comerciais surgem um pouco mais tarde do que
no resto da Europa devido à instabilidade social, económica e politica. O baixo

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poder de compra das famílias e a pouca abertura do país a alargar horizontes para
o exterior, por influência da ditadura, conduziram a que o surgimento destas
superfícies só se desse no nosso país nos anos oitenta. Após o período conturbado
da revolução do 25 de Abril, a economia tornou-se mais estável, o que
proporcionou o desenvolvimento do comércio retalhista e um aumento do
consumo (Cachinho, 2000).

1.2.Tempo e espaço

A noção de tempo e de espaço é fulcral no âmbito deste trabalho, pois


o “tempo revela-se objecto de apropriações contextualizadas de práticas,
trajectórias, representações individuais e colectivas” (Cruz, 2003:75).
O espaço e tempo são dois eixos responsáveis pela estruturação das
identidades individuais e colectivas, ou seja, cada indivíduo existe num
determinado espaço e num determinado tempo, e a sua função é concebê-lo e
administrá-lo. (Araújo, 2007)
Podemos associar o início da era moderna a vários factores. Mas, sem
dúvida, um dos que marca o ponto de viragem é a emancipação do tempo sobre o
espaço, pois o tempo, ao contrário do espaço, pode ser mais facilmente
manipulado e modificado (Bauman, 2000).
Na era pré-moderna, o tempo e o espaço estavam ligados pelo lugar.
Algumas invenções, como o relógio e o calendário, proporcionaram um dos
marcos mais importantes que separou o tempo do espaço. Este tipo de utensílios
de medição do tempo provocaram mudanças estruturais na vida quotidiana,
mudanças essas universais (Giddens, 1997). O tempo moderno é o tempo
mecânico, ou seja, medido pelo relógio e separado dos ritmos circassianos. “No
mundo moderno não só o ritmo da mudança social é muito mais rápido, como
também o é o seu âmbito ou a profundidade com que afecta as práticas sociais e
os modos de comportamento preexistentes” (Giddens, 1997:14). Com esta
afirmação, Giddens procura referir-se às mudanças inerentes que a modernidade
provocou nos estilos de vida da população em geral, a industrialização, a mudança

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nos espaços de consumo, inovações tecnológicas e o surgimento do emprego
atípico.
O tempo é uma realidade complexa e susceptível de mutações. É
portanto um conjunto de conceitos, fenómenos e ritmos. Podemos considerar
existirem vários tipos de tempo, por exemplo, o tempo biológico e o tempo do
relógio. Entre estes dois tipos de tempo usualmente encontramos os maiores
conflitos. Um exemplo disso é quando efectuamos uma viagem para outro país,
onde o fuso horário é diferente, pois os nossos ritmos biológicos alteram-se
completamente (Hall, 1996). Se quisermos dar um exemplo que se adapte a esta
investigação, podemos referir o facto de grande parte dos indivíduos que
trabalham em centros comerciais não terem a possibilidades de fazer as refeições
em horários regulares. Segundo informações facultadas pelos lojistas, os horários
permitidos por lei são: das 10h às 19h, sendo que neste caso o horário de intervalo
é das 14h às 15h; para quem trabalha o turno da noite, o horário estipulado é das
13h às 22h, sendo o intervalo entre as 18h e as 19h- Se bem que nem todos
cumpram este horário, porque ainda existem muitas lojas onde o funcionário é
privado do seu momento de pausa. Alguns comem na loja e, caso surjam clientes,
param a refeição, e o mais provável é comer a comida fria ou ser obrigado a dar
por terminada a refeição. Muitas das lojas viram-se obrigadas a alterar os horários
para o exigido por lei, em resultado de fiscalizações da Autoridade para as
Condições do Trabalho. Os horários praticados impendem o indivíduo de fazer as
refeições a horas certas, o que origina o conflito de sistemas de tempo.
Segundo Einstein, referido por Edward Hall, o tempo é aquilo que o
relógio nos indica, e esse relógio pode ser qualquer coisa, desde um cronómetro,
um calendário, um programa de produção e até mesmo um estômago pelo meio-
dia. Isto significa que o nosso organismo tem mecanismos internos que nos
permitem medir o tempo, e pedir que necessidades como comer, dormir e acasalar
sejam satisfeitas (Hall, 1996).
Os relógios foram uma invenção da Europa no século XIV. Mas, só as
famílias com maior poder financeiro os possuíam. A sua difusão em mercados e
maior acesso à maioria dos cidadãos ocorreu só no século XVI.

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Na Idade Média, o tempo era medido em unidades religiosas: através dos
sinos das igrejas marcavam-se os tempos de comer, de trabalhar e até de rezar. No
entanto, com a invenção do relógio mecânico, foi possível saber as horas com
precisão, quer se estivesse perto de uma igreja ou não e assim o tempo deixa de
depender do espaço (Sennett, 2000). É através do relógio que temos uma maior
noção de que o tempo passa, foge ou se arrasta. Por vezes, os relógios não estão
em sincronia, isto é, o relógio interno com o externo. Isto significa, segundo
Edward Hall (1996), que quando estamos ocupados e satisfeito o tempo passa
depressa ou não nos apercebemos de ele passar. Em contrapartida, quando
estamos aborrecidos, contamos os minutos e esses mesmos minutos parecem uma
eternidade. Este autor refere também que o facto desse aborrecimento do “ tempo
parece que não passa” poder conduzir a estados depressivos.
Nesta investigação os tipos de tempo que são mais importantes são o
tempo a que chamamos de tempo de trabalho e o tempo de não-trabalho, e a
interacção deles resultantes.

2.2.O tempo de trabalho e o tempo de nã o-trabalho

Segundo uma perspectiva histórico-dialéctica, o trabalho é fonte de toda a


riqueza, não só material, mas é também um dos motivos de realização de um
indivíduo, integrando a sua identidade pessoal. (Oliveira, 2004)
Com a emergência das sociedades industriais ”a estandardização do tempo,
a sua mensurabilidade em horas minutos e segundos e o consequente
assalariamento de muitos trabalhadores, separam o tempo de trabalho do tempo de
não-trabalho” (Cruz, 2003: 77).
Nas sociedades modernas, o tempo traduz-se em intervalos de almoço,
feriados, fins-de-semana e férias, licenças (Oliveira, 2004). Mas, para atingir estes
direitos, no passado grandes lutas se travaram entre o assalariado e o capitalista.
Ao ser institucionalizado o tempo de trabalho é também institucionalizado
o tempo de não-trabalho. Este não é mais do que o tempo no qual o trabalhador
estaria disponível para outras actividades que não o trabalho. É deste modo que se
traduzem as organizações sociais da era moderna, na qual o trabalho é a principal

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referência de tempo usada pelo individuo na ordenação da sua vida, isto é, tudo
gira em volta do trabalho e dos intervalos de tempo entre o exercício do mesmo
(Oliveira, 2004). No seguimento desta linha de pensamento, E.P. Thompson,
referido por Cruz, postula que as sociedades industriais apresentam um tempo
estruturado pelas relações sociais, fundado numa economia de tempo e na
importante separação do tempo de trabalho dos demais tempos sociais. Assim, o
tempo de uns não será o mesmo que o de outros (Cruz, 2003).
Ao falarmos de tempo de trabalho e de não-trabalho, podemos associar
facilmente a palavra rotina. Sennett diz-nos que “ a sociedade moderna está
revoltada contra a rotina, o tempo burocrático que pode paralisar o trabalho ou o
governo ou outras instituições.” (Sennett, 2000:51). Nas sociedades modernas, os
indivíduos queixam-se da rotina, de ter de se levantar todos os dias à mesma hora,
fazer diariamente o mesmo trabalho, ir buscar filhos á escola, fazer o jantar, fazer
os preparativos para o dia seguinte. É nossa convicção conceptual que o tempo
dos indivíduos trabalhadores está sujeito a este modo de vida, o que pode suscitar
uma necessidade de quebrar essa mesma rotina, é compreensível pois vivemos
numa época onde o fenómeno do lazer cada vez mais seduz os consumidores
(Oliveira, 2004). Podemos referir que Marx defendeu na sua obra “ o Capital”
(1973) e também referido por Borges (2004), que o trabalho é encarado como
causador de sofrimento e desprazer pois baseia-se na exploração do tempo de
trabalho do trabalhador. Marx refere que” o tempo que o operário trabalha, é o
tempo durante o qual o capitalista consome a força de trabalho que comprou. Se o
assalariado consumir para si próprio o tempo que tem disponível estará a roubar o
capitalista.” (Marx, 1973). Aliás, o homem, nesta perspectiva Marxista, é apenas
força de trabalho e, por isso, todo o seu tempo disponível é, por direito, tempo de
trabalho que pertence ao capital e á capitalização (Marx, 1973). É mediante o
tempo dedicado ao trabalho que se organizam as restantes esferas da vida, pois é
através do trabalho que se garante a subsistência. O trabalho deixa, assim de valer
por si mesmo e passa a valer pelo salário que permite auferir (Cruz, 2003). Marx
refere que para os capitalistas o tempo dedicados á instrução, ao desenvolvimento
intelectual, á realização de funções sociais, familiares e de amizade, é uma “mera
patetice”, ou seja, não é importante. O importante é trabalhar o mais possível e

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aumentar a produção para satisfazer o desejo do capitalista ao qual chega a
comparar com um “ vampiro sanguinário que só se anima quanto mais sangue
chupar” esta é uma ideia bastante forte que pretende demonstrar a superioridade
do trabalho. Mas este tempo explorado é considerado por Marx como “roubado”
pois poderia ser aproveitado a desfrutar da luz do sol e a respirar ar livre. Até o
tempo das refeições é contabilizado ao minuto e, por vezes incorporado no
processo de produção e até o tempo de sono é reduzido ao mínimo (Marx, 1973).
Com o surgimento do capitalismo industrial, tal como já aludimos, não
era tão evidente que a rotina fosse um mal. Contudo, no século XVIII, começa a
compreender-se que o trabalho rotineiro, para além de ter um aspecto positivo e
frutífero tem também uma faceta que poderá ser considerada destrutiva (Sennett,
2000).
Sennett faz referência a dois autores que mostram as duas faces da
moeda, ou seja, o que existe de positivo e negativo no trabalho rotineiro. Na
enciclopédia de Diderot publicada em 1776, este autor defende que a rotina no
trabalho podia ser uma forma como qualquer outra de aprendizagem. Por outro
lado, Adam Smith considerava que “ a rotina anestesiava a mente”, e na obra “ A
riqueza das Nações” descreve o lado negativo da rotina (Sennett, 2000).
Num dos capítulos da enciclopédia de Diderot referida por Sennett, é
descrita uma grande alteração no trabalho: a separação da casa do trabalho. Até
meados do século XVIII, o lar era o centro da economia uma vez que muitas
famílias produziam muito do que consumiam e praticavam muito trabalho no
local de residência, á qual o antropólogo Defert chama de economia do domus:
em vez da escravatura do salário, havia a conjugação do abrigo e o serviço ao
senhor (Sennett, 2000). Sendo assim, efectua-se a separação da casa do trabalho
no sentido em que na fábrica não há lugar para o alojamento e aufere-se um
salário. Beber deu grande destaque á divisão da esfera pública da esfera privada e
afirma que a separação do trabalho e da casa é primordial nesta sociedade
(Araújo, 2007).
São as rotinas precisas que ditam a ordem no capitalismo industrial, tudo
tem o seu lugar marcado e todos sabem o que têm de fazer. Sumiu considerava
que esta rotina podia tornar-se autodestruais no sentido em que o ser humano

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perde o controlo do seu próprio esforço, a falta de controlo do tempo de trabalho
significa “ que se morre mentalmente” (Sennett, 2000), por essas mesmas razões,
este autor considera que a rotina industrial ameaça diminuir o carácter humano,
Senecta continua a defender que a rotina depois de instalada não acrescenta nada á
história pessoal nem ao carácter de um indivíduo. Por isso, é necessário quebrar a
rotina para que isso aconteça (Sennett, 2000).
Neste trabalho de investigação, apesar de o contexto laboral não ser o dos
operários industriais dos tempos das lutas de Smith e Marx, será válido comparar
o tempo dos trabalhadores de centros comerciais com a do proletariado dos
tempos passados, pelo menos no sentido da rotina do dia-a-dia, e a falta de tempo
para o lazer. Tal como Marx e Smith referem, o Homem vale como instrumento
de trabalho (Marx, 1973). Por isso, o principal objectivo é produzir o máximo
possível, sendo neste caso concreto o essencial o volume de vendas. Enquanto nas
linhas de produção do passado “ a criatura estúpida e ignorante” de Smith se
tornava ignorante por realizar horas e horas seguidas a mesma tarefa, sem
acrescentar nada de novo á sua história pessoal e tornando-se assim depressiva e
consequentemente diminuindo a sua produtividade (Sennett, 2000), podemos
assumir que os trabalhadores do Shopping experimentavam estes sentimentos,
embora por motivos diferentes: têm bastantes horas mortas, passam muitas horas
sozinhos e a rotina é elevada. Esta actividade, só em raros casos permite uma
ascensão profissional, não acrescentando nada de novo à história pessoal. Tal
como se afirmou antes, no passado século XVIII, com a Revolução Industrial, o
horário de trabalho era mais alargado. Era comum a existência de cargas horárias
de 12,14 e 16 horas por dia e várias lutas se travaram em busca da diminuição do
horário de trabalho. No entanto, podemos assumir que existem várias
semelhanças, pois de facto também no Shopping existe uma inequívoca
dependência do tempo de vida face ao tempo de trabalho.

2.3.Tempo ocupado, tempo livre e tempo de lazer

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No período pós-anos 70 constatou-se uma alteração de valores, sobretudo
no que diz respeito à crescente valorização dos tempos familiares e dos tempos
individuais, ou seja, acredita-se que o tempo de trabalho perde a sua centralidade,
face a um aumento do valor do tempo livre e do tempo de lazer (Araújo, 2007).
Araújo, na sua obra Introdução á Sociologia dos Estilos de Vida, refere alguns
autores como Rojek, Dumazedier e Rifkin os quais postulam que os indivíduos
estariam cada vez mais dispostos a trocar tempo de trabalho por mais tempo livre
(Araújo, 2007:34). Ora, claro está que isso não será assim tão linear, pois as
condições económicas são algo importante nesta escolha de tempo livre e tempo
de trabalho.Com efeito, aqueles que detêm maior poder financeiro têm a
capacidade de guardar para si mais tempo de lazer e mais tempo livre do que
aqueles mais carenciados economicamente (Araújo, 2007).
O tempo pode ser dividido em tempo ocupado e em tempo livre, sendo
que, este último pode ainda ser subdividido em tempo de lazer. O tempo de lazer
pode ser considerado em relação ao tempo livre como dono de uma maior
autonomia. É no tempo livre que incluímos sobretudo as nossas rotinas
fisiológicas, os cuidados com a casa e a família e o trabalho desenvolvido para si
mesmo ou para os que o rodeiam. Já o tempo de lazer é relacionado com tudo
aquilo que é feito para romper com a rotina (Araújo, 2007). Segundo Dumazedier,
referido por Araújo (Araújo, 2007:36), há três definições de lazer: a primeira diz-
nos ser possível existir lazer em todas as actividades. Refere os exemplos de
estudar, trabalhar e ouvir música ao mesmo tempo. No Shopping, podemos dar o
exemplo dos funcionários que enquanto trabalham, navegam na Internet ou têm
conversas pessoais com as colegas de trabalho e até mesmo lêem livros e revistas.
A segunda definição mostra o lazer no sentido oposto do trabalho profissional.
Neste caso, o lazer diz respeito a todas as actividades que não estejam
relacionadas com o trabalho. Para este mesmo autor, o lazer é dotado de três
funções: o repouso, o divertimento e o desenvolvimento da personalidade. Aliás, “
Num primeiro tempo, o repouso liberta-nos da fadiga que acumulamos durante
um dia” (Araújo, 2007:36).

16
2.4.Conciliaçã o da vida profissional com a vida
pessoal/familiar

Tal como percebemos, o trabalho e família constituem-se como


componentes da vida. Saber como conciliar estas duas esferas torna-se
fundamental numa sociedade onde todos se esforçam para ser realmente bons, e
para ser verdadeiramente bom é necessário que todos os papéis sociais
desempenhados no quotidiano sejam executados no seu devido tempo. Com
efeito, isso é algo que exige estratégias de conciliação para gerir o tempo da
melhor forma. Apesar do número de horas semanais na Europa ter vindo a
diminuir, para muitos, o equilíbrio entre trabalho e vida familiar constitui um
grande dilema. O aumento da esperança de vida, que origina um aumento de
idosos dependentes necessitados de cuidados, a diminuição da taxa de natalidade e
consequentemente uma diminuição do agregado familiar são factores que fazem
com que as redes de solidariedade primárias se tornem menores dificultando a
entreajuda (Guerreiro te Al., 2006). O surgimento de novas formas familiares,
como o divórcio ou os nascimentos fora do casamento, são outras das
consequências da modernidade e que dificultam também a conciliação entre a
esfera familiar e profissional (Guerreiro te al, 2006).
O trabalho está no centro da satisfação das necessidades essenciais e ocupa
mais de metade do tempo de cada indivíduo, podendo ser uma fonte de realização
pessoal e de alegria ou, pelo contrário, de tensão e stress (Oliveira, 2006). A
Revolução Industrial criou um novo conceito de trabalho, alterando a sua natureza
e organização. O crescimento tecnológico conduziu a um aumento excessivo do
ritmo de trabalho provocado pela pressão do tempo, que advém da elevada
competitividade no mercado de trabalho, resultado não só das inovações
tecnológicas, mas também de alterações nos padrões de vida da população em
geral. Com efeito, esta evolução conduziu ao aparecimento de novos serviços
como Shoppings, portagens, linhas de atendimento 24 horas, estações de serviço e
empresas que, com o objectivo de aumentar a produção, trabalham 24 horas.
Surgem assim, não só novas profissões, mas também novos formatos de horários,
os quais podemos considerar atípicos. Neste sentido, devido ao aumento

17
substancial da oferta de emprego com esta atipicidade de horários, surgem novas
exigências no que toca à articulação do tempo para as suas necessidades
familiares, pessoais e profissionais. Pressupomos que os indivíduos que trabalham
por turnos ou em horários alternados sentem mais dificuldades em conciliar a vida
profissional com os compromissos familiares. Por conseguinte, uma vez que a
conceptualização de tempo é primordial na nossa investigação, torna-se
importante abordar o tema dos horários de trabalho regulares e irregulares,
nocturnos e diurnos, pois é através do horário de trabalho que se organiza todo o
quotidiano. O aspecto que nos interessa realçar ao formular esta assunção diz
respeito às consequências produzidas na vida familiar, isto é, à forma como os
indivíduos organizam a vida doméstica e as relações conjugais e parentais.

2.5.Questõ es de género e o papel social da mulher

Todos os indivíduos dentro de uma sociedade são actores sociais e


desempenham um papel, ao qual chamamos papel social. Os papéis
desempenhados dentro da família são denominados de papéis familiares, sendo
estes definidos através das seguintes características: sexo, idade e grau de
parentesco (Amaro, 2006). De entre os papéis familiares, têm-se destacado os
papéis conjugais relacionados com a divisão sexual do trabalho, tendo os homens
e as mulheres tarefas diferentes dentro do seio da família. As principais diferenças
nos papéis femininos e masculinos estão directamente ligadas com aspectos de
natureza cultural, pois ambos têm a capacidade de realizar todas as tarefas
(Amaro, 2006). Porém, os homens estão tendencialmente mais ligados ao espaço
público. Geralmente não desempenham tarefas no espaço doméstico de cariz
rotineiro, nem de carácter diário. Já às mulheres, cabem tarefas mais rotineiras,
como cuidar da casa. Estas actividades, em virtude do seu carácter diário, ocupam
muito tempo. Além disso, devido à necessidade de aumentar os seus rendimentos
e à sua realização pessoal, muitas mulheres trabalham fora de casa, resultando
assim numa grande sobrecarga. (Silva, 2001)

18
Ao observarmos os resultados obtidos pelo Inquérito à ocupação do tempo do
INE sobre a divisão das tarefas domésticas, constatamos que a mulher é que se
encarrega da maioria do trabalho doméstico.
As mulheres estão mais condicionadas na organização e gestão do tempo,
comparativamente com os homens, uma vez que têm a maior parte das tarefas que um
agregado familiar necessita. Devemos perceber que, nas sociedades ocidentais, a
mulher é estereotipada como mãe, esposa e dona de casa. A sua identidade é sempre
vista como a cuidadora. Neste seguimento, podemos referir que Freud e Parsons,
defendiam que à mulher compete cuidar da família, realizar as tarefas domésticas e
manter o clima afectivo integrador dos seus membros. Ao homem, por seu turno,
compete sair do lar para ganhar o sustento, e assim estabelecer a ligação da família
com a sociedade exterior, sociedade que ele representa no seio da família através do
exercício da autoridade racional (oposta ao papel afectivo da mãe) (Silva, 2001).
Durante várias décadas, devido a toda uma corrente histórica subordinada
a determinismos conservadores, a sociedade portuguesa incutiu certos princípios,
valores, práticas e representações nos seus indivíduos, que se registaram como uns
dos principais entraves ao desenvolvimento e progresso do país. Contudo, é
possível traçar um ponto de viragem nesta matéria, recorrendo ao que é
considerado o maior e mais importante marco histórico da sociedade portuguesa –
o 25 de Abril de 1974 – ao qual se seguiu, em 1976, a aprovação da Constituição
da República Portuguesa, em que a igualdade entre homem e mulher foi
oficialmente estabelecida no seio do casal, anulando-se o, até então, modelo
vigente (em que o homem se apresentava como o chefe de família, responsável
pelo sustento dos membros do núcleo familiar, e a mulher, tal como os filhos,
subordinada à autoridade masculina, à qual cabia as responsabilidade da esfera
doméstica). Neste modelo, quer o homem, quer a mulher, eram agora pensados
como indivíduos que, no respeito pela sua liberdade, se queriam igualmente
activos, autónomos, contribuintes e interessados em ter e cuidar dos seus
descendentes.
Em Portugal, o fenómeno da entrada das mulheres na esfera profissional
aconteceu num período mais tardio, quando comparado ao de outros países
industrializados. Todavia, as várias transformações ocorridas não aconteceram de

19
forma linear: “ se em países de crescente modernidade, as elevadas taxas de
actividade feminina acompanham um progressivo equilíbrio dos estatutos e papéis
atribuídos à mulher e ao homem no seio do grupo familiar, por outro lado, na
sociedade portuguesa, apesar de alguns avanços, verifica-se ainda
comportamentos bastante tradicionais.” (Guerreiro, 2006: 6). No mesmo âmbito, a
proporção de casais com filhos que trabalham a tempo inteiro, o prolongamento
da escolaridade nas gerações mais novas, com forte evolução nos níveis atingidos
pelas mulheres, a imergência de novas formas familiares decorrentes de divórcios
ou de nascimentos fora da conjugalidade, bem como a, ainda reduzida,
participação efectiva dos homens na esfera familiar, reflectem a dificuldade que as
actuais famílias têm em gerir o tempo entre a vida familiar e profissional. Na tese
de doutoramento de Biehl, a autora faz referência a uma investigação realizada no
sector dos serviços – Projecto Qualidade de Vida numa Europa em Mudança –
cujos resultados indicam que “ para uma média europeia de trabalho semanal
efectivo de 41h para o sexo masculino e de 34h para o feminino, em Portugal se
registam, respectivamente, perto de 45h nos homens e de 44h nas mulheres.
Dados deste mesmo estudo revelam, também, que as mulheres ocupam o dobro do
tempo dos homens com a vida doméstica (14h para 7h semanais) e quase metade
dos homens declaram sentir que fazem menos trabalho doméstico do que deviam,
enquanto apenas umas em cada 10 mulheres expressam idênticos sentimentos.”
De acordo com a autora, “estas formas de viver o quotidiano profissional têm
implicações no modo como se organiza a esfera doméstica e na desigual situação
profissional e familiar de mulheres e homens.”
Relativamente ao papel do homem nos cuidados afectivos da família,
constata-se que se encontra, ainda, bastante estereotipado devido a um preconceito
incutido na socialização, dominados por diferenciações de género. Para além
disso, as entidades empregadoras acabam por demonstrar algumas dificuldades no
que diz respeito ao reconhecimento da importância do papel do pai na prestação
de cuidados aos filhos. Toda esta conjuntura resulta, por um lado, do facto de as
mulheres ainda desempenharem uma espécie de “jornada de trabalho” e, por
outro, no dos homens estarem afastados da participação nas tarefas familiares,
resultado de um receio de estigmatização social. Tal situação, leva a que homens e

20
mulheres se vejam obrigados a tomarem opções entre a família e a carreira
profissional, tendo, por vezes, de abdicar de direitos que lhes são legalmente
definidos, para evitarem alguma exclusão e descriminação no emprego ou em
outros contextos sociais. Segundo um estudo, realizado sobre a temática da
paternidade, publicado na Revista de Saúde Pública (2009), “(…) os homens/pais
entrevistados apresentaram posições sociais reveladoras de algumas
transformações ocorridas no âmbito das responsabilidades masculinas. Contudo
mantém-se a hegemonia do modelo patriarcal. O homem continua a entender seu
papel de pai predominantemente como provedor material e moral da família,
contrapondo-se à necessidade da divisão de responsabilidades emergentes das
mulheres e ao princípio de que a educação dos filhos deve ser permeada pela
proximidade física e afectiva de pai e mãe. Sendo assim, entre os papéis sociais
de género, que acompanham mulheres e homens em todas as fases do seu ciclo
vital, persistem os do modelo tradicional orientando o trabalho masculino para a
produção e o feminino para a reprodução biológica. (…)
Deste modo, as necessidades de conciliação entre trabalho e família
tendem a reflectir-se com maior dificuldade de progressão profissional por parte
das mulheres, já que o modelo ideal-típico do profissional competente,
prevalecente na maioria das culturas organizacionais, continua a ser o do
indivíduo do sexo masculino, sem responsabilidades familiares que façam perigar
a sua disponibilidade (quase total) para o exercício de uma profissão. Os homens
têm dificuldades em ver reconhecidos os seus direitos nas responsabilidades
familiares, tanto a nível legislativo como a nível profissional, e mesmo no seio do
núcleo familiar, onde a importância dos seus contributos – ou da ausência deles –
é ainda minimizada. Neste sentido, uma das assunções decorrentes é de que as
mulheres têm mais dificuldades em gerir o tempo entre a vida familiar e
profissional, resultado das tarefas que lhes são impostas, profissional e
familiarmente.

21
2.6. A relaçã o entre as habilitaçõ es literá rias e a
herança cultural e as influencias nos percursos profissionais

Um dos sociólogos que se interessou pelas questões da educação foi Pierre


Bourdieu, que criou uma teoria para explicar as desigualdades escolares. Nos anos
60, teve o mérito de revolucionar, não apenas a Sociologia da Educação, mas
também o pensamento e prática educacional em todo o mundo (Nogueira, 2002).
Até aos anos 50, considerava-se que a escolarização teria um papel primordial no
que diz respeito à melhoria das condições de vida, mais precisamente no aspecto
da evolução económica. Considerava-se que, sendo a escola de acesso gratuito a
todos, esses problemas seriam resolvidos ou minimizados, pois todos os cidadãos
teriam as mesmas oportunidades de ascensão social. Esperava-se que os
indivíduos fossem tratados de igual forma dentro do estabelecimento de ensino e
fossem distinguidos pela sua inteligência e esforço. Seriam estes dons que
permitiriam ao indivíduo construir a sua escalada escolar e profissional,
(Nogueira, 2002). Consequentemente, isto definiria a sua posição na hierarquia
social. A escola seria uma instituição imparcial, com a função de disseminar
conhecimentos, seleccionando os alunos com base em critérios racionais
(Nogueira, 2002).
No final dos anos 50, alguns estudos mostraram que o sucesso ou
insucesso escolar tinha alguma relação com a classe social. No entanto, estas
conclusões foram consideradas como lacunas do sistema de educação transitório.
Porém, abalou a confiança dos cidadãos, na perspectiva da escola como instituição
igualitária (Nogueira, 2002). Com o passar do tempo, tornou-se crucial admitir
que, inerentes ao desempenho escolar, factores como classe, etnia, sexo, local de
moradia, entre outros ligados ao contexto socioeconómico, contribuiriam para o
sucesso ou insucesso no percurso académico (Nogueira, 2002).
Uma afirmação constante é a de que a verdadeira base para uma boa
educação começa em casa, ou seja, junto dos agentes de socialização primária que
são os pais e também os avós. É nesta fase que são transmitidos valores, que
determinam os comportamentos sociais, a linguagem, gostos, aquilo a que
podemos chamar um habitus familiar.

22
Para Bourdieu, o indivíduo não é um ser isolado, nem dotado de
autonomia para agir individualmente. Os indivíduos são caracterizados pela sua
bagagem cultural, em que a escola terá um papel imperativo no sentido de definir
o seu curriculum (Nogueira, 2002). Essa preparação cultural inclui categorias
como o capital económico, pois o factor económico propicia mais facilidades a
bens e serviços. Outra das categorias igualmente importantes é o capital social,
que se refere aos relacionamentos influentes na sociedade, e por último, o capital
cultural conquistado basicamente por títulos escolares (Nogueira, 2002).
Segundo indicadores do Observatório das Desigualdades do Centro de
Investigação e Estudos de Sociologia, o abandono escolar precoce apresenta
níveis bastante elevados comparativamente ao resto da União Europeia. É nas
classes mais desfavorecidas que essa situação acontece com mais frequência,
embora nos últimos anos o número de casos tem vindo a diminuir.
Neste trabalho de investigação é pertinente considerar as habilitações
literárias dos intervenientes, pois é um dos factores que define largamente o seu
percurso profissional. Os trabalhadores de centros comerciais têm, em grande
maioria, origens sociais humildes, em que os pais têm níveis de escolaridade
baixos. Segundo a teoria de Bourdieu, o facto de os pais possuírem baixas
habilitações e serem carenciados economicamente influencia bastante o insucesso
escolar e, consequentemente, o abandono escolar precoce (Nogueira, 2002). Este
tema será abordado mais detalhadamente mais adiante, na análise dos resultados,
no ponto sobre os percursos profissionais e expectativas futuras.

2.7.Modelo de análise

Após uma explicitação da problemática referente ao que propomos


analisar, construímos um modelo de análise, em que através do cruzamento de
algumas variáveis importantes, construímos algumas hipóteses.
Podemos considerar que existem duas ideias fundamentais que atravessam
esta investigação: em primeiro lugar, a conciliação da esfera familiar com a esfera
profissional e, em segundo lugar, a relação existente entre a profissão exercida,
conformismo no trabalho, habilitações literárias e origens sociais. Ou seja,

23
podemos assumir como hipótese principal que as mulheres trabalhadoras de
centros comerciais casadas têm uma maior dificuldade em conciliar a vida
profissional com a pessoal do que as solteiras. Como segunda hipótese, considera-
se que o conformismo existente com a profissão exercida depende das habilitações
literárias e origens sociais.

estado civil sexo

existencia de
existencia de colaboração por
filhos parte de
familiares
organização
do tempo

idade

habilitações percurso
literárias profissional

conformismo habilitações
profissão dos
pais com a literárias dos
profissão pais

24
3.Metodologia

A organização do tempo dos trabalhadores de centros


comerciais é um tema não muito abordado no âmbito da Sociologia, de
forma que a base teórica para este tema era praticamente inexistente.
Optamos por uma abordagem qualitativa, em virtude do universo em
estudo ser algo que não pode ser quantificado e que necessita encontrar
respostas específicas, que estão centradas no quotidiano e no processo
social. Na pesquisa qualitativa, o mais importante é encontrar o
significado dos fenómenos e não propriamente a frequência com que
ocorrem, como acontece na metodologia quantitativa, embora não
negligenciando de todo a frequência. Outro dos aspectos que teve por
base a escolha deste tipo de metodologia está relacionado com a
flexibilidade na recolha de dados que esta nos permite. Com efeito, o
método utilizado é o indutivo, no sentido em que será através da
análise de conteúdo dos testemunhos encontrados e também na
observação participante, que se formularão as principais conclusões e
teorias a respeito do que nos propomos a investigar. Neste capítulo
serão apresentados os procedimentos para a realização deste trabalho,
descrição do espaço da investigação, caracterização da amostra,
técnicas utilizadas, bem como alguns dos obstáculos que surgiram.

3.1.Descriçã o do espaço de aná lise

O centro comercial eleito para esta investigação encontra-se localizado na


cidade de Guimarães. O concelho de Guimarães pertencente ao distrito de Braga,
tem de 162592 habitantes, segundo dados do site do Instituto Nacional de
Estatística do ano 2009.
Podemos então descrever o supracitado espaço como sendo um centro
comercial pequeno, comparativamente com outros já existentes, sendo constituído
por 113 lojas, 1800 lugares de estacionamento e aproximadamente 1300

25
trabalhadores. Um dos maiores trunfos para o seu sucesso deve-se à sua boa
localização, no centro da cidade, junto à central de camionagem e em frente ao
Hospital. Isto para além da Repartição de Finanças, bem como inúmeros bancos
circundantes e outras infra-estruturas de relevo. Por todas estas razões, é um
Shopping que, diariamente, tem uma grande afluência de clientes. Mesmo com a
inauguração de outro Shopping, de uma empresa concorrente, o movimento no
Shopping onde se realiza este estudo não diminuiu. Resultante da sua centralidade
e do hábito que os clientes criaram nestes 15 anos de frequência deste espaço, é
possível observar que certos indivíduos se dirigem a este local diariamente com o
intuito de almoçar, comprar qualquer coisa, ir ao hipermercado e até para
unicamente estacionar o carro, uma vez que parque de estacionamento não é pago.
Sendo um Shopping com 15 anos, sofreu uma remodelação em Novembro
de 2009. Foram introduzidas novas lojas, com mais variedade para os clientes. Em
relação ao tipo de lojas existentes, são maioritariamente lojas de pronto-a-vestir,
sapatarias, lojas de acessórios, de desporto, de óptica, um hipermercado, bem
como algumas lojas de serviços como lavandaria, sapateiro, farmácia, agência de
viagens, quiosque e livrarias. A acrescer todas estas vantagens, dispõe ainda de 6
salas de cinema e uma ampla zona de restauração, onde existe uma zona de
fumadores.

3.2. Definiçã o da amostra

O tipo de amostra seleccionada para este trabalho é não probabilística, no


sentido em que nem todos os indivíduos teriam igual probabilidade de ser
escolhidos para fazer parte desta amostra. A amostragem é por quotas, porque os
indivíduos entrevistados foram seleccionados através de um determinado número
de características, com vista a tentar criar uma réplica da unidade de análise em
questão – o referido centro comercial. Visto que não existia nenhuma base de
dados referente aos funcionários (deste centro comercial), pode considerar-se que
estamos perante uma amostra por conveniência do investigador. Com efeito, foi
através de conhecimentos do investigador, que funcionou como informante

26
privilegiado, que chegamos aos entrevistados. Esta selecção assentou nos
princípios de serem essencialmente mulheres, pelos motivos que já referimos
anteriormente, porque é nas mulheres que se regista maior dificuldade em gerir o
tempo. Procurou-se que o estado civil dos entrevistados fosse diversificado, com o
objectivo de criar um contraste entre os indivíduos solteiros e aqueles que têm
responsabilidades conjugais, tendo também em linha de conta a existência ou não
de filhos, já que é um factor bastante importante. O objectivo inicial seria o
entrevistar 5 homens, ao invés dos 2 aos quais foram efectivamente feitas
entrevistas. Pretendia-se que desses 5 pelo menos 2 fossem casados, com filhos e
os restantes solteiros. No entanto, em virtude seu reduzido número a trabalhar
neste local, tive dificuldade em encontrar, indivíduos com estas características.
Esta situação é considerada uma das desvantagens da amostragem por quotas, e é
denominada como afunilamento, ou seja a dificuldade em preencher determinada
quota.
Após entrevistar os homens, não se verificaram grandes diferenças no seu
discurso, apesar de um ser solteiro e o outro casado. As opiniões convergiam, as
rotinas tinham algumas semelhanças, de forma que as duas entrevistas realizadas
foram de encontro aos objectivos deste trabalho, que neste caso seria percepcionar
as diferenças de género, existentes na organização do tempo dos trabalhadores
deste tipo de área comercial.

3.3. Caracterizaçã o dos entrevistados

Caracterização socioeconómica, estado civil, estrutura etária e filhos

Para este trabalho foram realizadas no total 21 entrevistas, das quais 19 a


mulheres e 2 a homens. Tinha-se previsto inicialmente entrevistar 20 mulheres e 5
homens, no entanto, após as 19 entrevistas, os dados atingiram a saturação. Neste
local, os trabalhadores são essencialmente do sexo feminino. Por essa razão, os
entrevistados são maioritariamente mulheres, uma vez que se procura uma
aproximação à realidade na representatividade da amostra dos trabalhadores deste

27
centro comercial. Baseado em diversos estudos, bem como inquéritos realizados
pelo Instituto Nacional de Estatística, assume-se que as mulheres têm uma maior
carga de trabalho devido ao facto de acumularem com a sua profissão as tarefas
domésticas. Como o tema central é a organização do tempo, considera-se pertinente
a focalização no género feminino. Uma vez que a questão das diferenças de género
é pertinente neste trabalho, apenas foram entrevistados 2 homens, no sentido de
contrastar as visões respectivamente á profissão que executam.
Podemos caracterizar a amostra como sendo por conveniência, no sentido
em que o investigador é ao mesmo tempo um informador privilegiado, visto que
trabalha neste local há 8 anos, tendo a oportunidade de, todas as semanas, observar
lojas e trabalhadores diferentes.

Caracterização geral dos entrevistados por sexo e idade

Total de Sexo Sexo Média Idade Idade


entrevistas feminino Masculino Das Mínima Máxima
idades
21 19 2 32 Anos 21 54
Anos Anos

Fonte: entrevistas realizadas

Estrutura etária dos entrevistados

Idade Número
De indivíduos
20-25 Anos 2
25-30 Anos 9
30-35 Anos 6
40-45 Anos 3
Mais de 50 anos a 1
Fonte: entrevistas realizadas

28
Caracterização do estado civil dos entrevistados

Estado Numero
Civil De indivíduos

Casados 5

Solteiros 9

União de facto 5

Divorciados 2

Fonte: entrevistas realizadas

Existência de filhos

Filhos Número de
indivíduos
Sim 8

Não 13

Fo nte: entrevistas realizadas

3.4.Breve descriçã o dos entrevistados


Nome Idad Estado Nº Habilitaç Tipo de Profissão Profissão Habilitaç Habilitaç
e Civil Filh ões loja Da mãe do ões ões
os Literárias Pai Pai Da
Mãe

Catarina 32 Solteira 0 12ºano Sapataria Operária Picheleir 4ª Classe 4ª Classe


Fabril o
reformada
Paula 31 Divorcia 1 9º Ano Sapataria Comerciant Comercia 4ª Classe 4ª Classe
da e nte
Sílvia 33 Solteira 0 9º ano Sapataria Operária Auxiliar 4ª classe 4ª classes
têxtil numa
reformada escola

Fátima 41 Casada 2 9º Ano Puericultur Doméstica/ Mecânico 4ª Classe 4ª Classe

29
a ama
Odete 51 União de 1 12ºano Loja Doméstica Camareir 4ª Classe 4ª Classe
facto Doces o
Deolind 45 Divorcia 2 6º Ano Pronto-a- Operária Bancário 6º Ano 4ª Classe
a da vestir têxtil reformad
reformada o
Sandra 34 casada 2 12º ano Óptica Doméstica Agente 4ª Classe 4ª Classe
da Gnr
Vanessa 21 Solteira 0 12ºano Loja de Costureira Emprega 4ª Classe 4ª Classe
unhas de do de
gel armazém
Idalina 25 Solteira 0 12º Ano Loja Operária Operária 4ª Classe 4ª Classe
acessórios têxtil têxtil
Maria 41 Casada 1 9º Ano Pronto-a- Doméstica Comercia 4ª Classe 4ª Classe
vestir nte
Susana 30 Solteira 0 Finalista café Limpezas Trolha 4ªclasse 4ªclasse
de reformada
licenciatur
a
Luísa 27 Solteira 0 11º ano Óculos de Operária Operário 4ª Classe 4ª Classe
sol têxtil têxtil
Nome Idad Estado Nº Habilitaç Tipo de Profissão Profissão Habilitaç Habilitaç
e Civil Filh ões loja Da mãe do ões ões
os Literárias Pai Pai Da
Mãe
Rosa 33 União de 0 Licenciad Interiores Doméstica Empresár 6ºano 4ª Classe
facto a io
Elsa 29 Solteira 0 11ºano Cosmética Costureira Artes 6ºano 6º Ano
desemprega gráficas
da
Marta 27 União de 0 12ºano Malas Empresária Empresár 4ª Classe 4ª Classe
facto io
Leonor 24 Solteira 0 Licenciad Pronto-a- Hotelaria Operário 4ª Classe 12ºano
a vestir têxtil
Alexand 30 União de 0 12ºano Pronto-a- Operária Serralheir 9ºano 4ª Classe
ra facto vestir têxtil o
Cláudia 33 Casada 1 12ºano Pronto-a- Auxiliar Comercia 4ª Classe 4ª Classe
vestir educação nte
reformada
Olívia 28 União de 1 9ºano Malas Dona de Vendedor 4ª Classe 4ª Classe
facto um café
Pedro 26 Solteiro 0 9ºano Relógios Costureira Talhante 4ª Classe 9º Ano
desemprega
da
Joaquim 27 Casado 0 12ºano Pronto-a- Auxiliar de Porteiro 9ºano 9ºano
vestir acção
educativa

30
Após esta descrição, estão apresentados os nossos entrevistados. As
habilitações literárias dos próprios e dos pais, tal como as profissões dos pais,
funcionam como indicadores de classe social.

3.5.Caracterizaçã o da situaçã o profissional dos


indivíduos

Antiguidade no emprego dos entrevistados

Antiguidade no N
emprego
1 a 2 anos 4

2 a 5 anos 5

5 a 8 anos 5

8 a 10 anos 3

10 a 15 anos 2

15 a 20 anos 1

Mais de 20 anos 1

Total 21

Fonte: entrevistas realizadas

3.6. A estruturaçã o da entrevista

Na fase exploratória foi necessária uma exaustiva pesquisa


bibliográfica, que incidiu especialmente em artigos no âmbito das
condições do trabalho, sobre noção de tempo e espaço, estudos
relacionados com o stress, conciliação da profissão com a vida familiar
e artigos sobre centros comerciais. Através desta revisão de literatura,
concluímos também que, uma vez que este projecto engloba múltiplos
conceitos mediante os quais novas dimensões poderão surgir, a

31
entrevista é a técnica mais adequada, sendo que o tipo de entrevista
utilizado é a semi-estruturada, no sentido em que previamente foi
estruturado um guião. As questões poderão ser adaptadas a cada caso
concreto, já é algo estruturado, mas não rígido. O guião de entrevista
foi elaborado com base nas leituras exploratórias e nas assunções que
foram surgindo ao longo do projecto.
O guião da entrevista foi estruturado por categorias, ou seja, foi
dividido mediante as dimensões que nos propomos a analisar. A
primeira parte é um questionário de identificação, onde se pretende
conhecer os dados básicos e indicadores do contexto socioeconómico:
estado civil, nº de filhos, habilitações literárias, profissão e habilitação
literária dos pais, antiguidade no emprego, funções exercidas na loja,
tempo dispendido em deslocações casa/trabalho, tipo de habitação. A
segunda parte consiste numa caracterização sobre ambições
profissionais iniciais. A terceira parte é onde se pretende que se faça
uma descrição da actividade profissional, em relação aos horários e
tipo de contrato. De seguida é abordado o tema dos percursos
profissionais. Outro dos temas abordados, e bastante relevante no
âmbito de trabalho, é a descrição das rotinas destes trabalhadores.
Seguidamente, outro tema abordado no guião diz respeito ao nível de
satisfação do entrevistado com o trabalho. Mais adiante é ainda feita a
abordagem do tema da conciliação do trabalho com a família. Outro
aspecto levado em consideração é o das implicações do trabalho na
saúde, sendo a fase final direccionada para as expectativas
profissionais.
Uma vez que o tema é a conciliação entre a vida familiar e
profissional, foram elaboradas questões abertas, que possibilitem ao
entrevistado uma maior liberdade de resposta, evitando assim possíveis
constrangimentos. O papel como entrevistadora incidirá na condução
do entrevistado para o tema fulcral, com o objectivo de compreender
melhor a gestão do tempo que por eles é feita.

32
A técnica da entrevista proporciona a possibilidade de
encontrar novas dimensões no estudo. Por isso, para além de uma série
de questões-chave abertas, esta entrevista será uma conversa que fluirá
naturalmente. Estas entrevistas foram gravadas e posteriormente
transcritas para uma análise de conteúdo.
Todas as entrevistas foram posteriormente sujeitas a uma
análise de conteúdo, tendo como principal propósito encontrar pontos
concordantes e discordantes entre os vários testemunhos, para numa
fase posterior, ser possível efectuar comparações e relações mediante o
contexto do seu discurso. Esta análise consistiu na identificação,
segundo elementos do discurso, de categorias temáticas possivelmente
explicativas do fenómeno que nos propomos analisar. È de salientar
que também podem ser utilizadas como técnicas para este caso as
histórias de vida, que nos permitiam ainda um melhor conhecimento da
vida dos indivíduos em estudo.

3.7.Obstá culos encontrados

Todas as investigações têm os seus obstáculos, mas o


importante é reconhecê-los, para numa fase posterior, em que se deseje
aprofundar a investigação, seja possível contornar melhor essas
mesmas dificuldades.
Inicialmente, uma das dificuldades foi ter acesso ao número de
funcionários existente naquele Shopping, visto que não existe nenhuma
base de dados actualizada, ou seja, não havia acesso a uma listagem
com características básicas, facto que dificultou que a amostra fosse
seleccionada com a devida precisão. O afunilamento devido à escolha
da amostragem por quotas constituiu outra das desvantagens, visto que
nem sempre conseguimos preencher determinada quota, como o caso
dos homens, já referido no ponto anterior.

33
Durante as entrevistas, os obstáculos encontrados estiveram
relacionados com o tempo que os indivíduos são obrigados a
despender para a entrevista, pois todas foram realizadas no local de
trabalho, o que limita o tempo. Como as entrevistas abordavam temas
que implicam entrar na esfera íntima do indivíduo, nem sempre as
pessoas se encontram à vontade para aprofundar certos assuntos.
Apesar do grande esforço do investigador em manter-se neutro e tentar
abstrair-se, torna-se difícil porque, ao mesmo tempo que conduz esta
investigação, é funcionário no mesmo Shopping há muitos anos e,
como tal, encontra-se familiarizado com ele. O facto de se encontrar
inserido no meio pode ser uma vantagem, no sentido de ter grande
conhecimento acerca do tema estudado, mas por outro lado, leva a que
possa ser influenciado e certos aspectos importantes possam ser
descurados.

4.Aná lise de dados

Neste capítulo serão apresentados os resultados das entrevistas, após


recorrer ao SPSS, para tratar os dados quantitativos, procedemos também a uma
análise de conteúdo. Estes resultados foram divididos em três dimensões:
conciliação profissão/vida familiar, nível de satisfação no trabalho, percursos e
expectativas e finalmente as tipologias de trabalhadores encontrados.

4.1.Conciliaçã o da vida profissional com a vida familiar

Todos os indivíduos em sociedade têm um papel social e um papel


familiar. Na comunidade onde o indivíduo se insere desempenha vários papéis,
como por exemplo trabalhador, pai, marido, amigo, filho, irmão, entre outros.
Para cada papel é exigido tempo para que seja desempenhado. O que por vezes
acontece é a colisão destes mesmos papéis, originando um conflito (Amaro,

34
2006). Nesta parte do trabalho pretende-se compreender como os trabalhadores do
Shopping conciliam os horários atípicos com as exigências da esfera familiar e
pessoal. É evidente que estes indivíduos têm dificuldades em conciliar as duas
esferas trabalho/família devido aos horários pouco convencionais. Registamos
diferenças na organização do tempo entre casados e indivíduos com filhos e
solteiros, que vivem com os pais, As mulheres mostram uma maior dificuldade e
encontram-se mais sobrecarregadas do que os homens.
Independentemente daqueles que têm melhores ou piores condições a
nível de horários, o importante nesta investigação é perceber os efeitos da
atipicidade dos horários. Este Shopping, tal como outros existentes no resto do
país, pratica um horário alargado, estando aberto ao publico desde as 9 da manhã
e encerrando às 23 horas, e aos fins-de-semana às 24 horas. O horário das lojas é
das 10 horas às 22 horas, durante os dias úteis e às 23 horas ao fim-de-semana.
Este horário obriga os indivíduos a praticar turnos rotativos e fora do usual do
resto do universo laboral, pelo que tem horários em que trabalha aos fins-de-
semana, feriados e noites. Assim, o seu tempo disponível para as actividades
extra-laborais tem de ser adaptado aos seus horários. Aliás, uma das queixas mais
comuns neste trabalho é mesmo o facto de os horários condicionarem alguns
elementos da vida privada.
A forma como percepcionam e aceitam estes horários varia segundo
alguns factores, como por exemplo a existência de filhos, o estado civil, a idade, a
antiguidade na loja e mesmo a própria personalidade do indivíduo.
Os horários de trabalho são um dos factores que afectam a saúde mental do
trabalhador. Segundo Amaro (2006), situações como períodos longos de trabalho,
a isenção de horário fixo, situações em que o trabalhador está sempre contactável
por telemóvel ou correio electrónico, são propícias ao stress. Amaro acrescenta
ainda que o trabalho por turnos pode causar alterações no metabolismo e afectar a
eficiência mental e criar relacionamentos problemáticos com a família (Amaro,
2006). Outro aspecto referido neste artigo é a sobrecarga de trabalho. Segundo o
autor, a sobrecarga de trabalho tem origem por vezes na má gestão que o
indivíduo faz do tempo. “ A sensação de que o tempo voa não se sendo capaz de
realizar todas as tarefas que nos estão distribuídas é uma importante fonte de

35
stress no trabalho, acontecendo o mesmo com as nossas tarefas familiares.”
(Amaro,2006:65).
A gestão do tempo e a organização espacial é uma tarefa árdua.
Comecemos por destacar a coordenação a nível de itinerários: trabalho-casa, casa-
trabalho, trabalho-escola dos filhos, isto, para além do tempo que um individuo
tem de despender para a organização do seu próprio trabalho (Cruz, 2003).
Os horários são maioritariamente rotativos, ou seja, o trabalho ocorre das
10 às 19h com hora de pausa entre as 14h e as 15h e, na semana seguinte das 13h
às 22h com hora de pausa das 18h às 19h. Outras lojas praticam horários mais
repartidos, ou seja, das 10h às 16h, sem hora de intervalo, ou das 16h às 22h, sem
hora de intervalo. Quase todos trabalham 40 horas semanais e com duas folgas,
porém nem sempre isso acontece. Observamos alguns casos em que nem sempre a
integridade e os direitos dos trabalhadores são respeitados. Como é o caso de
Deolinda, responsável de uma loja de pronto-a-vestir: é divorciada, tem 45 anos e
trabalha naquela empresa há 23 anos, primeiro numa loja do grupo no comércio
tradicional e há 15 anos no Shopping. Deolinda trabalha 40 horas semanais e só
tem uma folga por semana e a hora de pausa para almoçar ou jantar é inexistente,
considerando que, devido a reduções de pessoal na loja se encontra sozinha, desde
as 10h até às 15h30, hora que chega a colega que faz o turno seguinte. Neste
regime, actos biologicamente necessárias a um ser humano, como ir à casa de
banho ou comer tornam-se muito complicadas. Geralmente tem de contar com a
colaboração das colegas da loja ao lado, para vigiarem, caso entre algum cliente
na loja enquanto vai à casa de banho. Assim se comprova que, mais uma vez, a
integridade do trabalhador não é respeitada. Deolinda explica-nos quais os
horários que faz e como funcionam as horas de pausa:

(…) é rotativo, das 10 às 16h30 ou das 15h30 às 22h. Excepto ao


sábado que é das 10 às 17h30 ou das 15h30 às 23h. (…) Um dia por semana,
é rotativo, nunca calha um fim-de-semana. Sábado nunca temos, só calha ao
domingo (…) dependendo da vaga que tenho é a hora que eu como. (…)
Como hoje tava a esbichar a minha asinha de frango, tive de parar, lavar as

36
mãozinhas para atender o cliente, depois é que fui aquecer outra vez o que
tava a comer, para continuar a almoçar (…)
(entrevista de Deolinda responsável de loja de pronto a vestir,
entrevista nº 6)

Felizmente nem todos os casos são assim tão graves. Com excepção
dos estes exemplos referidos anteriormente, as situações mais usuais são
casos como o de Sílvia, solteira, de 33 anos, funcionária de uma sapataria há
6 anos. Quando questionada sobre os horários praticados na loja onde
trabalha responde que:

(…) os horários são rotativos, quando venho de manhã é das 10 às 7


e quando venho de tarde da 1 às 10. Com duas folgas semanais (…)
(entrevista de Sílvia funcionária de sapataria, entrevista nº 3)

Ao observarmos o conteúdo do discurso é perceptível que as rotinas e as


estratégias de gestão do tempo de quem é solteiro e quem tem obrigações
conjugais e familiares são muito distintas. Assim sendo, para exemplificar
escolhemos dois testemunhos para descrever esse contraste. Pediu-se aos
entrevistados que descrevessem um dia normal seu, com o objectivo de conhecer
as suas rotinas. Podemos dar o exemplo de Fátima, funcionária da loja de
puericultura, que é casada tem dois filhos, um deles com 9 anos e outro com 17
anos. Esta mulher encontra-se sobre grande sobrecarga, resultantes das tarefas que
são exigidas mediante o seu papel de mãe e de trabalhadora. Ela refere que se não
fosse a sua mãe, que apelida de “ fadinha do lar”, nunca poderia ter este emprego.
Fátima relata então como é para ela um dia normal:

(…) Levanto-me às 7.30 da manhã para mandar os miúdos para a


escola, vou levá-los à escola. Quando venho trabalhar de manhã entro na
loja ás 10 da manhã, saio ás 4, vou buscar o mais novo á escola, pego nele e
vou leva-lo ao andebol quando é dia de andebol, acaba o treino vou busca-
lo, dou-lhe banho, faço o jantar, arrumo a cozinha, passo a ferro, e tipo meia

37
noite deito-me. E depois no dia a seguir a rotina é sempre a mesma. (…): Eu.
Sempre eu. Eu não divido nada com o meu marido porque ele não é nada
jeitoso, é muito bom rapaz, mas não é muito jeitoso. Qualquer coisa que lhe
peça diz não sei fazer, e portanto neste contexto eu faço.(…) O que gosto
menos neste trabalho é dos horários, porque é aborrecido para mim e para
todas as mães, fazer horários depois da 10 noite! É aborrecido, é
complicado, mas pronto é o que tenho. Não posso reclamar muito (…)
(entrevista de Fátima funcionária de loja de puericultura, entrevista
nº4)
Elsa de 29 anos, solteira a viver em casa dos pais, tem a sua vida
bastante mais calma, mesmo a nível das tarefas domésticas. Confessa que é a
sua mãe que faz tudo, tendo assim mais tempo para uma vida social. Quando
se pediu à Elsa para descrever um dia normal esta foi a sua resposta:

(…) Depende do meu horário na loja. Levanto-me, venho directa para


o Shopping. Tomo o pequeno-almoço, venho trabalhar saio daqui às 18h ou
às 19h dependendo da hora que eu entrei, e vou para casa e janto e depois
vou tomar um café. Se entrar á 13h levanto-me mais tarde e depois saio às
22 e tomo mais um café e venho (…): é tudo a minha mãe, eu não faço nada.,
Arrumo o meu quarto e já é muito. Não é que seja muito para mim, porque a
minha mãe está em casa e ocupa-se dessas coisas, e eu não tenho que me
preocupar. (…)
(Entrevista de Elsa, funcionária de loja de cosméticos, entrevista nº14)

Mesmo tendo uma vida mais relaxada a nível de tarefas domésticas, os


indivíduos solteiros queixam-se de falta de tempo. Por exemplo, continuando
no caso da Elsa e também a Catarina da sapataria, estas referem que existem
actividades que são condicionadas pelos horários que fazem no Smoking,
como por exemplo apostar na sua formação. Há formações modulares que
apenas são leccionadas à noite e que, por isso, não podem frequentar. Quando
se perguntou à Elsa o que teve de mudar na sua vida por trabalhar no

38
Shopping, no sentido de actividades que se encontra impedida de fazer devido
aos horários, respondeu o seguinte:

(…) Por exemplo acabar os estudos, ter horários certos para ir ao


ginásio aquele horário certinho todas as semanas, se quiser tirar cursos
porque á noite uma pessoa estando a trabalhar é impossível (…)
(Entrevista de Elsa, funcionária de loja de cosméticos, entrevista nº14)

As solteiras sem filhos têm a percepção das dificuldades que as suas


colegas de trabalho, casadas, com filhos, atravessam na gestão do tempo.
Pois, se já consideram complicado gerir o seu tempo, tendo menos
responsabilidades, depreendem facilmente que para aqueles que têm filhos
será bastante mais difícil. Confessam que é algo que lhes faz bastante
confusão, como é o caso da manicura Vanessa, de 21 anos, que se prepara
para casar este ano. Ela diz que não querer ser mãe e trabalhar no Shopping.
Quando questionada sobre a sua maior preocupação no dia-a-dia Vanessa
responde:

(…) O que me preocupa é vou casar, e pensar como vou conseguir


gerir estes horários e depois com os filhos, como vou conseguir gerir a
minha vida. Agora já não vou ter a minha mãe em casa e as coisas tenho de
faze-las eu. (…) Sinceramente não acredito que consiga conciliar este
trabalho no Shopping quando tiver filhos (…): eu questiono-me muitas vezes
sobre isso, como é que é possível, e tem de se ter muitas ajudas. (…)
(entrevista de Vanessa, manicura na loja de unhas de gel, entrevista
nº8)
Mas nem todas têm essa posição. Luísa, solteira, diz por exemplo que
existe sempre forma de conciliar, mas claro, desde que exista o apoio e
divisão das tarefas por parte do futuro marido. Luísa foi interrogada sobre
como pensava conciliar o papel de mãe e a sua profissão no Smoking, tendo
esta sido a sua resposta:

39
(…), e aquilo que penso é que há uma mãe mas também há um pai,
quando há, mas á partida se pensas em ter um filho é porque estás bem a
nível de relação, se houver alguns momentos que eu não possa o pai tem de
estar ali, vai-se tentar conciliar na vida de duas pessoas(…)
(entrevista de Luísa funcionária de loja de óculos de sol, entrevista
nº12)
Isto são apenas visões de quem nem sequer tem filhos, ou tem
compromissos conjugais. Aqueles que já constituíram a sua família já referem
as dificuldades devido aos horários, pouco tempo passado com a família e os
filhos, afastamento dos amigos e há também quem refira que existe um maior
afastamento do cônjuge, como é o caso de Odete, funcionária da loja de
doces, que vive em união de facto e que tem um filho já tem 30 anos. A
mesma refere que acaba por haver um afastamento entre si e o seu parceiro,
porque ao fim-de-semana, quando ele se encontra de folga, ela está a
trabalhar, ou seja, raramente as folgas coincidem. A Odete foi questionada
sobre as mudanças a que foi obrigada a fazer na sua vida por trabalhar no
Shopping esta foi a resposta:

(…) Muitas vezes não podemos tar juntos aos fins-de-semana.


Durante a semana quando eu tenho folga está ele a trabalhar, em filhos não
falo porque tenho um filho que já é criado e não vive comigo. A nível
conjugal às vezes é difícil conciliar as folgas, há quem esteja pior até me
posso dar por contente, temos um fim-de-semana ou dois por mês já não é
muito mau, mas que prejudica um bocadinho a vida conjugal prejudica, as
pessoas afastam-se muito mais do que se tivessem um horário normal de
entrar às 9 ou 10 e sair ás 7 da tarde com os fins de semana livres. (…)
(entrevista de Odete, funcionária da loja de doces, entrevista nº 5)

Cláudia diz que se perde muito da infância dos filhos trabalhando no


Shopping. Diz que todos os seus momentos livres procura aproveitá-los na
companhia do marido e da filha de 5 anos. Neste momento, a sua
preocupação é no próximo ano lectiva a filha ir para a escola primária e,

40
devido aos horários, receia não lhe prestar o devido acompanhamento. Outro
aspecto pelo qual culpa o seu trabalho é pela diminuição das suas relações
sociais com amigos e familiares. Devido aos horários acabou por se afastar da
rede de amigos. Leonor, ao contrário de Catarina, é solteira e também refere
que se afastou mais dos amigos. Foi perguntado à Catarina qual a sua maior
preocupação no dia-a-dia e o que teve de mudar na sua vida devido a este
trabalho, tendo-se registado a seguinte resposta:

(…) O futuro dela (filha), por exemplo ela agora vai para a escola
primária, como é que vou acompanha-la? Ir busca-la, ver se tão os deveres
feitos, e na semana que vier fazer noite nem isso vou conseguir acompanhar.
Aqui no Shopping com estes turnos rotativos perdemos muito a infância dos
nossos filhos. Perder os melhores anos deles, quando dás por ela a criança
já não tem piada, a partir dos 8 acaba por ser uma menina normal, já perdeu
aquela piada das brincadeiras (…) As amizades foram-se diluindo, falamos
mas não é a mesma coisa que antigamente, tinha o domingo livre ou tinha as
noites livres dava para ir tomar café, agora é muito difícil ou tem que ser
dito com muita antecedência para poder marcar, senão às vezes é muito
complicado. (…)
(entrevista de Catarina sub-gerente de loja de pronto a vestir,
entrevista nº18)

Acaba por ser primordial para estas mulheres existir na família um


elemento que as apoie com os filhos, ou um marido que divida as tarefas.
Segundo os resultados do inquérito à ocupação do tempo, do Instituto
Nacional de Estatística, são as mulheres que se encontram mais
sobrecarregadas, pois em grande maioria as tarefas domésticas estão a seu
cargo, podendo-se no índice de quadros nos anexos constatar esses dados. Os
relatos das entrevistadas servem para, uma vez mais, confirmar essa ideia.
Conta-se muito pouco com o apoio do cônjuge, o qual só acontece em raros
casos. Normalmente são as mães ou sogras a funcionar como pilar da gestão
familiar. São estas que muitas das vezes tomam conta das crianças, as vão

41
buscar à escola, prepararam refeições para o marido e as crianças, entre outras
funções, que normalmente estão a cargo das mães, mas que este contexto
profissional específico a impede de fazer, devido ao trabalho durante a noite e
fins de semanas. Fátima refere que tem a mãe que colabora bastante com ela.
Quando lhe foi perguntado quem fazia as refeições para os filhos, quando
tinha de trabalhar à noite, respondeu que:

(…) Aí entra a minha fadinha do lar que é a minha mãe, porque sem
ela, eu não podia ter este tipo de emprego, porque o meu marido trabalha
das 10 da manhã às 10 da noite (…) Tinha de trabalhar numa outra área
qualquer, não sei muito bem o quê, mas tinha de arranjar outra coisa
qualquer, porque não podia trabalhar aqui no Shopping, era impossível, não
podia abandonar os meus filhos o dia inteiro, porque não posso contar com o
apoio do pai (…)
(entrevista de Fátima funcionária de loja de puericultura, entrevista
nº4)

4.1.1.Tempo de trabalho

Outro aspecto que se procurou compreender é como estas


trabalhadoras encaram o tempo de trabalho no seu quotidiano. Considera-se
pertinente conhecer quais os momentos que custam mais a passar, se existe
diferença entre os dias da semana e as diferenças entre jornadas de trabalho.
Com base nos depoimentos dos entrevistados, apurou-se que os
momentos considerados mais entediantes são aqueles em se encontram
sozinhas na loja e não entram clientes. Torna-se monótono e desmotivante
não ter o que fazer, em primeiro lugar porque a pessoa sente-se inútil e em
segundo lugar porque gera uma certa tensão. O baixo volume de vendas pode
colocar o posto de trabalho em risco. Estes indivíduos sofrem pressões por
parte das suas entidades patronais em relação às vendas, pois é isso que
permite a sobrevivência do negócio. Maria, responsável de uma loja de

42
pronto-a-vestir, refere esta questão quando questionada sobre como se sente
no final de um dia de trabalho:

(…): vou lhe dar o exemplo de dois dias de trabalho: um dia de


trabalho em que se vende muito eu saio daqui satisfeitíssima, agora num dia
de trabalho em que eu estou aqui sentadinha á espera que entre alguém que
não entra! Saio daqui ESTOURADA! (…)
(Maria responsável de loja de roupa, entrevista nº10)

Como Edward Hall refere, quando estamos ocupados e satisfeito, o


tempo passa depressa ou não nos apercebemos de ele passar. Em
contrapartida, quando estamos aborrecidos, contamos os minutos e esses
mesmos minutos parecem uma eternidade. Este autor refere, também, que o
facto desse aborrecimento do “ tempo parece que não passa” pode conduzir a
estados depressivos (Hall, 1996).
Outro aspecto com que nos confrontamos em relação às percepções do
tempo pelos entrevistados é o facto de considerarem os dias da semana todos
iguais Tal acontece devido aos seus horários: trabalham Sábados, Domingos,
feriados e em turnos rotativos, sendo as folgas igualmente rotativas. Por tudo
isto, acaba por não haver diferenciação entre dias da semana e fins-de-
semana. Sandra dá uma boa explicação para tal. Foi-lhe perguntado qual o dia
da semana que mais gostava e a sua resposta foi a seguinte:

(…) São todos iguais! Muita gente o dia que mais gosta é a 6ª porque
é o ultimo dia de trabalho e vem o fim-de-semana, nós não. Como as nossas
folgas não são sempre ao fim de semana nem são sempre nos mesmos dias, é
evidente que o dia da folga é sempre um dia desejado, quebra-se um
bocadinho a rotina, mas quando se tem filhos e temos de nos pôr a pé todos
os dias á mesma hora para os levar á escola acabamos por se calhar não
sentir isso, por exemplo eu já não me lembro de dormir até às 9h30 ou 10h,
não sei o que isso é há 6 anos, portanto acabam os dias por ser todos mais
ou menos parecidos (…)

43
(Sandra ,funcionária de loja de óptica, entrevista nº7)

4.1.2.Os horá rios atípicos e o trabalho ao fim de semana

Um dos motivos de maior insatisfação por parte dos trabalhadores


prende-se com o facto de ter de trabalhar aos fins-de-semana e feriados,
principalmente aqueles que são casados e têm filhos. Enquanto a maioria das
pessoas pode desfrutar do seu tempo de lazer a passear no Shopping, eles são
obrigados a trabalhar. Estes indivíduos demonstram uma certa frustração,
porque têm de ir para o trabalho, enquanto o marido e filhos ficam em casa.
Para além dos transtornos a nível de vida privada, relatam que também são os
dias que o Shopping tem maior fluxo de movimento, tornando-se cansativo
pelo ruído. Referem também que o tipo de cliente nesses dias é diferente. Na
realidade, gera uma pequena “ inveja” ver que, enquanto todas as famílias
passeiam muito felizes, aqueles que amam estão em casa, tal como refere
Olívia, trabalhadora numa loja de malas, que vive em união de facto e é mãe
de um menino de 2 anos. À questão sobre como se sente quando tem de vir
trabalhar ao Domingo, responde:

(…) Triste! Por causa do meu filho porque eu antes não me importava
porque podia tar com o meu namorado noutra altura qualquer, mas com o
meu filho custa-me mais deixa-lo, agora ele esta a ficar maiorzinho, já
entende e não quer que eu venha e fico triste. (…): é o domingo. tá toda a
gente em casa e eu venho para aqui e sei que vou deixa-los a eles, não posso
tar com eles, não é que me faça diferença o dia, é por ser aquele dia em que
as famílias estão mais juntas e fico pensar que podia também estar com eles,
posso estar com eles nos outros dias das folgas, mas não sei é diferente(…)
(depoimento de Olívia funcionária de loja de malas, entrevista nº19)

Mesmo para aqueles que são solteiros, trabalhar nestes dias não é do
seu agrado. Apesar de não terem responsabilidades familiares, é nestes dias

44
que muitas das vezes se poderiam dedicar às suas relações sociais, bem como
a si próprios. Como o caso de Sílvia, que quando questionada a respeito das
mudanças que foi obrigada a fazer na sua vida devido ao trabalho nos diz que:
(…) Os encontros de família ao domingo, ao fim de semana, sem
dúvida que nos rouba mais tempo, os horários são mais complicados. Os
almoços ao domingo por exemplo já há muito que deixei de participar,
mesmo festas de anos, passeios que se fazem ao fim de semana e eu não vou,
não participo. (…)
(entrevista de Sílvia funcionária de sapataria, entrevista nº3)

4.1.3.Tempo de nã o trabalho e de lazer

No período pós anos 70, constatou-se uma alteração de valores,


sobretudo no que diz respeito à crescente valorização dos tempos familiares e
dos tempos individuais, ou seja, o tempo de trabalho perde a sua centralidade
face a um aumento do valor do tempo livre e do tempo de lazer (Araújo,
2007).
Ao ser institucionalizado o tempo de trabalho, é também
institucionalizado o tempo de não-trabalho, que não é mais do que o tempo no
qual o trabalhador estaria disponível para outras actividades. (Cruz, 2003). O
tempo pode ser dividido em tempo ocupado e em tempo livre, e o qual se
divide em tempo de lazer. O tempo de lazer pode ser considerado em relação
ao tempo livre como sendo dono de uma maior autonomia. É no tempo livre
que incluímos sobretudo as nossas rotinas fisiológicas, os cuidados com a
casa e a família e o trabalho desenvolvido para si mesmo ou para os que o
rodeiam. Já o tempo de lazer é relacionado com tudo aquilo que é feito para
romper com a rotina (Araújo, 2007). Consideramos neste sentido interessante
saber como os trabalhadores do Shopping ocupam os seus tempos livres:
aqueles que são casados e com filhos são unânimes a relatar que aproveitam
para passar o máximo tempo com os entes queridos. As mulheres casadas,
principalmente, frisam bastante o facto de nas folgas serem obrigadas a

45
perder bastante tempo com as tarefas domésticas, o que implica perda de
tempo para uso próprio. Fátima, funcionária de loja de puericultura e mãe de
dois filhos, quando questionada acerca do seu tempo livre dá uma resposta
muito caricata:

(…) Como não tenho, nunca pensei nisso. Agora se me disseres o que
é que te vem logo á ideia? Fazer uma limpeza mais aprofundada à minha
cozinha, é ridículo não é? Mas como tenho falta de tempo, enquanto há umas
que dizem “ ai eu ia relaxar para um SPA”, não me posso dar a esses luxos,
não tenho tempo, todo o tempo extra que eu consigo arranjar, ou vou limpar
as persianas, ou vou limpar os vidros, ou vou desarrumar as gavetas para
limpar melhor, é uma tristeza, mas é isso. Nem me vem à ideia dizer, tou de
folga ou tenho tempo livre vou passear, não. Ou tenho as camas por fazer ou
o pó por limpar, ou o chão por aspirar, sou uma triste entendes? Porque vivo
em função do meu trabalho, e dos meus filhos e do respectivo pai, portanto é
uma tristeza. (…)
(Fátima, funcionária de loja de puericultura, entrevista nº4)

Já no caso de Deolinda, divorciada e mãe de dois filhos, responsável


de uma loja de pronto-a-vestir, mostra uma posição diferente relativamente à
mesma questão. Apesar de dedicar muito do seu tempo às tarefas domésticas,
apresenta sinais de saturação e esgotamento, quando faz as seguintes
declarações sobre a ocupação do seu tempo livre:

(…) Durmo até tarde, levanto-me faço o almoço, arrumo o que tenho
para arrumar, uma percentagem grande do dia tou no sofá a jogar gameboy
(risos), há dias que vou fazer uma caminhada, vou tomar um café, mas por
norma os meus dias de folga é para eu tirar para eu estar em casa. Estou
cansada, mesmo da confusão, prefiro no meu dia de folga isolar-me e fazer
qualquer coisa diferente e que no dia-a-dia faço, que é conviver com as
pessoas no fundo. A minha folga é isso mesmo eu tirar um dia diferente, não

46
ir passear, ou ir para um Shopping ou confusão. É sim estar comigo própria,
dedicar tempo a mim própria (…)

(excerto da entrevista de Deolinda, responsável de loja de pronto a vestir,


entrevista nº6)

É bastante curioso que muitas das entrevistadas tenham referido que


aquilo que procuram nos seus dias de folga é estar em sítios ao ar livre, ou em
contacto com a natureza, como por exemplo ir a jardins ou praias. Evitam ir a
Shoppings e locais com muita gente. Estas escolhas estão certamente
relacionadas com o facto de o local onde trabalham ser bastante fechado, com
luz artificial e com muita afluência de pessoas. Por esse motivo querem fazer
algo diferente, como estar isoladas, relaxadas e respirar ar puro. Isso mesmo
nos relata Odete quando a interrogamos sobre o que faz nas suas folgas:

(…) é assim: quando tenho folga ao fim de semana estou com o meu
marido e se estiver bom tempo gosto de sair e fazer um churrasco fora onde
tenha muito pouca gente, isto só ao sábado, porque ao domingo não saio de
casa (…) ir á praia, ir até a um jardim sossegado ler um livro, relaxar
porque gente já eu vejo todos os dias, mas não tenho tempo para isso (…)
(entrevista de Odete, funcionária de loja de doces, entrevista nº5)

Em síntese, relativamente à ocupação dos tempos livres, os


entrevistados com maior dificuldade em tirar para si próprios mais tempo
livre são aqueles que têm filhos, já que ocupam esse tempo a dedicar-se às
tarefas domésticas e à família. Os solteiros referiram actividades como sair
com os amigos, ir ao ginásio, ver filmes e estar com namorados. A
necessidade de encontrar paz em espaços ao ar livre e relaxantes é algo que
procuram fazer, ou que gostariam de fazer, se tivessem mais tempo.

47
4.2.Nível de satisfaçã o no trabalho

No Inquérito Europeu às Condições de Trabalho, desenvolvido pelo


Observatório Europeu das Condições de Trabalho, realizado em 2005, mais de
80% dos trabalhadores europeus responderam encontrar-se satisfeitos ou muito
satisfeitos com o actual emprego. Os motivos pelos quais dizem estar satisfeitos
são os seguintes:
 Sentimento de pertença à organização onde se trabalha;
 A percepção de se ser devidamente recompensado;
 Uma maior autonomia e controlo sobre o próprio trabalho;
 Maiores exigências intelectuais no trabalho, sem pressão ou
intensidade do trabalho excessivas;
 Potenciais oportunidades de progressão na carreira;
 Satisfação geral com o equilíbrio entre a vida profissional e
pessoal;

Já em relação aos menores níveis de satisfação, estes estarão associados


a factores como: cargas horárias pesadas, horários atípicos, altos níveis de
intensidade de trabalho e baixos níveis de autonomia e a exposição a riscos de
saúde.
Os centros comerciais seguem um modelo de horário atípico. Os
motivos referidos pelos trabalhadores europeus neste inquérito também se
aplicam aos nossos entrevistados. Os principais focos de insatisfação são os
horários. Classificam o espaço de trabalho como pouco saudável. Em alguns
casos, consideram que são mal remunerados. No entanto, algumas entrevistadas
disseram-se satisfeitas, mas contradisseram-se um pouco nas suas declarações.
Num artigo sobre saúde mental e trabalho, Amaro (2006) refere os
factores que podem provocar stress relacionado com o tipo de trabalho.
Primeiramente, descreve como as condições físicas do local de trabalho podem
afectar um indivíduo. O ruído, calor, iluminação, a humidade, a falta de
arejamento são tudo agentes que podem influenciar na saúde mental dos

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trabalhadores. Neste sentido, dá um exemplo das queixas dos trabalhadores
sobre ambientes artificiais, com base em sistemas de ar condicionado. Uma das
queixas durante as nossas entrevistas é mesmo o funcionamento do ar
condicionado e o ruído. Como refere Marta, quando lhe foi pedido para dar a sua
opinião acerca do ambiente do Shopping:
(…) Ar condicionado é uma boa questão! No Inverno parece que tamos
na Antárctida e de Verão parece que estamos no México ou em Cuba. A nível de
ar condicionado é uma porcaria. (…)
(entrevista de Marta, funcionária de loja de malas. Entrevista nº15)

Durante a entrevista, foi aplicada uma questão sobre a existência de


confrontos com a entidade patronal. Salvo algumas excepções, todos
responderam negativamente. No entanto, entrevistamos a dirigente sindical do
Sindicato do Comércio, Escritórios e Serviços do Minho, que nos referiu que o
sindicato recebe muitas reclamações, e acrescenta que existem muitas
irregularidades. Acrescentou ainda que muitas vezes as pessoas se informam
sobre os seus direitos, mas depois não avançam na sua luta por eles por medo de
represálias:

(…) Começa agora a ser de conhecimento que existe uma pessoa no


Shopping que é dirigente sindical, e que representa um sindicato ao qual as
pessoas se podem dirigir. Mas as pessoas têm medo, muitas vezes as pessoas
vêm me perguntar e ficam a saber mas depois não agem (…)
(depoimento de Sandra, funcionária de loja de óptica e dirigente
sindical, entrevista nº7)

Em algumas situações, as condições de trabalho não são as mais


favoráveis. No entanto, como refere Fátima, “ é o que há” ou “ é o que
tenho”. Apesar de terem conhecimento de que não estão a usufruir dos seus
plenos direitos, têm medo de reclamar por sofrerem pressões psicológicas no
trabalho ou mesmo perder o emprego. Fátima (funcionária de uma loja de
puericultura) foi a que mais se abriu a nível de confrontos existentes com a

49
entidade patronal e refere alguns. Fátima declara que quando faz horas
extraordinárias não é compensada, nem em tempo nem monetariamente,
como acontece com a maioria das entrevistadas. Trabalha 40 horas semanais
e só recentemente tem uma folga semanal, pois, anteriormente tal acontecia
apenas quinzenalmente. Não tem hora de almoço, nem de jantar, ou seja,
trabalha 6 horas sem pausas. São bastantes as irregularidades a que se sujeita,
porque tem dois filhos, 41 anos e apenas o 9º ano de escolaridade. Quando
lhe foi pedido para falar sobre algum confronto com o patrão refere o seguinte
episódio:
(…): o último foi porque fomos obrigados a trabalhar o domingo de
Páscoa, contra a vontade do meu patrão, mas tivemos de trabalhar o
domingo de Páscoa (…) A batalha anterior foi de reivindicar a minha folga
pois eu achava que tinha direito a ela todas as semanas e não estava a ter,
mas agora já tenho, por isso tá tudo mais ou menos controlado. (…) Diz que
sim, mas não tou a ter. Sei que sim, mas é o que há. (…)
(entrevista de Fátima, funcionária de loja de puericultura, entrevista
nº4)
Apesar de todas estas queixas da Fátima, quando lhe peço que dê uma
nota de 0 a 10 à sua satisfação no trabalho, esta atribui um nível elevado. Tal
é um pouco contraditório. Aliás, ao perguntar-lhe se recomendaria o trabalho
no Shopping a alguma das suas irmãs, responde que nunca o faria,
argumentando que:

(…) Apesar destas coisas dos horários, eu gosto de trabalhar nesta


loja e gosto daquilo que faço, vou dar um 8 porque se desse 5, não tava a ser
justa comigo mesma, estava a dizer que não me sinto realizada e não é isso
que acontece. Eu gosto de trabalhar aqui e sinto-me realizada, o que não
gosto é de certas coisas, pronto é isso. (…) Nunca! Até porque elas sabem
das minhas queixas, e felizmente elas não precisam porque elas são
formadas … eu não. (tristeza) (…)
(depoimento de Fátima funcionária de loja de puericultura, entrevista
nº4)

50
Tal como tem vindo a ser evidenciado, as queixas mais frequentes
dizem respeito aos horários. Mas outro aspecto referido também como motivo
de insatisfação é a percepção sobre forma como são tratadas por alguns
clientes. Segundo alguns relatos estas trabalhadoras sentem-se rebaixadas por
alguns clientes, os quais a ignoram completamente, demonstrando na sua
óptica, falta de respeito pelo seu trabalho. Mas nem todas as entrevistadas se
mostraram tão melindradas com esta situação. Rosa, de 33 anos, por exemplo,
afirma o seguinte:

(…), Há pessoas que infelizmente acham que quem está atrás de um


balcão é alguém inferior. Infelizmente já apanhei aqui muitos clientes em que
uma pessoa diz um bom dia se for de manhã e uma boa tarde e parece que
estamos a falar para um balcão e dirigimos nos á pessoa e perguntamos se
precisa de ajuda e nem uma nem duas, e saem porta fora sem ter dito uma
única palavra. É essa talvez a parte mais desagradável deste trabalho é nós
sermos nós próprios e termos nós a educação e a pessoa que entra dentro de
uma loja não tem nenhuma. (…) Normalmente costumo etiquetá-las como
nos novos-ricos, foram pessoas que nunca tiveram nada na vida delas e de
repente singraram na vida (…) olham para nós como inferiores, e às vezes a
inferioridade está nelas próprias e sentem-se bem é a pisar quem eles acham
que é inferior (…)
(entrevista de Rosa funcionária de loja de interiores, entrevista nº13)

Podemos assumir que o facto de Rosa se ter licenciado há nove anos


atrás e agora ser funcionária nesta loja, possa interferir com sua auto-estima,
evidenciando-se um pouco diminuída. É um trabalho onde se lida com todo o
tipo de pessoas e nem todas são agradáveis. É claro que alguns dos
trabalhadores superam melhor estas situações e outros deixam-se afectar
mais. Em relação aos aspectos mais positivos do trabalho em geral, destacam
o gosto pelas vendas e o contacto com o cliente, pois sentem-se satisfeitos ao
ajudar o cliente, e referem a confiança que depositam em quem os está a

51
atender. Catarina, funcionária de sapataria, quando questionada a respeito do
aspecto que mais gostava no seu trabalho, responde:

(…) Gosto de vender, de comunicar com o cliente, de vender, das pessoas


confiarem em nós, e perguntarem se fica bem ou se fica mal e acabam por levar
(…) (entrevista de Catarina funcionaria de sapataria, entrevista nº1)

É contraditório que grande parte dos entrevistados tivesse referido gostar


do trabalho. Embora quando questionados se esse emprego era recomendável a
familiares seus, a resposta tenha sido “nem pensar” ou “apenas em casos de
extrema necessidade”. Apenas aqueles que incluímos na tipologia de
trabalhadores satisfeitos referiram que seria recomendável, como Luísa,
funcionária da loja de óculos de sol, que se auto define feliz com o seu trabalho e
o recomenda neste local:

(…) Recomendaria porque acho que o Shopping tem tudo, tem a carga
horária, mas a nível da carga horária também se vai conseguir tirar mais
dinheiro, e depois a nível de segurança, a nível de limpeza, a nível de pessoas
(…)
(entrevista de Luísa funcionaria de loja de óculos de sol, entrevista nº 12)

Encontrámos casos em que o nível de saturação com este trabalho já é


mais elevado. Classificam o nível de satisfação como bastante baixo. Encontram-
se à procura de novo emprego. Consideram o seu trabalho desvalorizado. São
sobretudo os horários e o pouco tempo para a família, os elementos que mais
desagradam. Cláudia, sub-gerente de uma loja de pronto-a-vestir, considera o seu
trabalho desvalorizado. Afirma ter pouco tempo para a sua família. Afirma mesmo
já ter pouca paciência para os clientes:

(…) neste momento sinto que não dou o meu melhor, acho que o meu
trabalho e o de algumas colegas minhas não está a ser valorizado. Não foi
valorizado ao longo destes últimos tempos, e acho que não me sinto

52
realizada por isso (…) Acabas por te desmotivar e desleixar nas tarefas que
tens. (…) Acho que já não tenho muita paciência mesmo para aturar os
clientes, acho que tou a ficar no limite (…)
(entrevista de Cláudia sub-gerente de loja de pronto a vestir,
entrevista nº18)

Tudo tem o seu lado positivo e negativo. Na sua grande maioria, as


entrevistadas referem como principais aspectos positivos o gosto pelas vendas e o
contacto com o cliente. Como aspectos negativos, são largamente referidos os
horários, o trabalhar aos fins-de-semana, pouco tempo para a família e em alguns
casos a remuneração, bem como a má-educação de alguns clientes, que fazem
sentir o seu trabalho desvalorizado.
Pode observar-se que se encontraram também indivíduos realizados
com o trabalho. Muita dessa satisfação advém das condições de trabalho que a
entidade patronal lhes proporciona. Podem ser superados os aspectos negativos
referidos anteriormente se, em contrapartida, a remuneração compensar, o
ambiente de trabalho for agradável e os direitos dos trabalhadores forem
respeitados. Sandra, funcionária numa loja de óptica, diz que se sente realizada
com o trabalho, pois considera um trabalho útil, que conduz as pessoas a
sentirem-se mais confiantes. Quando interrogada acerca do aspecto que mais gosta
no seu trabalho, responde da seguinte forma:

(…) Nunca pensei em vir a trabalhar em óptica, mas é de facto uma coisa
que eu gosto de fazer, porque acho que se nós fizermos o nosso trabalho bem
feito é uma área que pode contribuir para que as pessoas se sintam melhor (…) é
um ramo que tem a ver com o conforto, com a saúde, com a pessoa se sentir
confiante, porque muitas vezes as pessoas não gostam de usar óculos, muitas
vezes querem lentes de contacto e não podem usar e ficam desiludidas, e nós
temos aí talvez um papel a desempenhar no sentido de incentivar as pessoas (…)
(entrevista de Sandra, funcionária de loja de óptica, entrevista nº7)

53
A concluir este ponto, resta acrescentar que se constatou que os
aspectos destacados pelos entrevistados como mais positivos são o gosto
pelas vendas, o contacto com o cliente e a satisfação em ajudar os outros.
Relativamente aos aspectos negativos mais frequentemente apontados,
destacam-se: os horários, a falta de educação e descaso dos clientes, a
desvalorização do próprio trabalho por parte das entidades patronais, a
remuneração e irregularidades nas condições de trabalho. O facto de esta não
ter sido a profissão de eleição, faz com que estes trabalhadores se sintam, na
sua grande maioria, pouco realizados.
Amaro (2006) refere que a falta de identificação com o trabalho a
realizar e o trabalho pouco estimulante são factores que afectam na saúde
mental, conduzindo ao stress. Noutros casos analisados, apesar de esta
profissão não fazer parte das suas ambições iniciais, referem que, com o
tempo, aprenderam a gostar dela e acrescentaram que existem cenários ainda
piores, tais como um emprego em condições ainda mais adversas, ou até
mesmo o não ter nenhum.

4.3.Percursos profissionais e expectativas futuras

(…) Não queria estudar, e então decidi ir trabalhar (…)

(excerto da entrevista de Fátima funcionária de loja de Puericultura,


entrevista nº 4)

Esta citação, retirada da entrevista da Fátima, retrata o início do


percurso profissional da maioria dos nossos entrevistados. Abandonando
precocemente os estudos, estes indivíduos são indirectamente forçados a
ingressar no mercado de trabalho para sobreviver. Direccionamos a entrevista
para o tema dos percursos profissionais dos indivíduos, de forma a
conhecermos os motivos que os levaram ao abandono escolar e a um início
antecipado da vida activa. Procurou-se compreender se a profissão que

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executam corresponde às suas ambições iniciais. Outro aspecto levado em
linha de conta foi a detecção da existência de casos de ascensão na carreira.
Efectivamente, apenas um caso respondeu que foi esta a profissão que
imaginou ter quando era mais novo. 99% dos entrevistados mencionou que na
adolescência pensava que teria profissões como médica, advogada, educadora
de infância, enfermeira, professora, hospedeira ou cantora, enquanto que, dos
homens entrevistados, um referiu que nunca tinha pensado nisso e o outro que
gostaria de ter sido futebolista. È pertinente o facto de as escolhas terem
recaído em maioria em profissões que requerem habilitações ao nível do
ensino superior. Porém, praticamente todos abandonaram os estudos bastante
jovens, quer por falta de incentivo dos pais, quer por força de vontade, mas
principalmente porque queriam atingir rapidamente a sua independência
financeira. Isto pode significar, e analisando as profissões e habilitações
literárias dos pais, que abandonaram os estudos e se entregaram ao trabalho
para puder ter aquilo que os pais não lhes poderiam dar. Note-se que a
adolescência é uma idade bastante complicada, onde ainda estamos a
construir a nossa identidade, e existe a necessidade de pertença a um grupo.
Certas roupas, acessórios ou estilos de vidas são uma forma de aceitação em
determinado grupo a que se procura pertencer. Nem sempre os pais têm
possibilidades financeiras para proporcionar determinado estilo de vida, o que
pode levar o adolescente a sentir-se inferior e até mesmo rejeitado. Logo, este
poderá constituir um motivo para se querer trabalhar e ter independência
financeira o mais cedo possível.
Pierre Bourdieu deu importância às questões da educação e herança
cultural. Este autor defendia que existia uma relação intrínseca entre o
percurso escolar e respectivo sucesso com a classe social de origem de cada
indivíduo, no sentido em que é a partir do processo de socialização inicial,
recebido do ambiente familiar e social, que se irá traçar o seu percurso escolar
e, previsivelmente, o seu futuro profissional (Nogueira, 2002). A herança
cultural, transmitida pela família inclui certos componentes que influenciarão
naquilo que denominamos de cultura geral, como por exemplo: gostos em
relação a arte, decoração, vestuário, desporto, literatura e vocabulário. Com

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efeito, os indivíduos oriundos de classes mais altas teriam mais vantagens a
nível educacional do que os mais desfavorecidos economicamente, como
resultado do background sociocultural adquirido, o que faria com que a
escola funcionasse como a continuação da formação recebida no seio social e
familiar. Assim, as crianças mais pobres teriam, por exemplo, de se adaptar a
determinado nível de linguagem, pois não tinham sido socializadas segundo
aqueles valores. Tal pressupunha uma maior herança cultural, a qual
favoreceria então um maior êxito escolar. Por isso Bourdieu refere na sua
obra “ A Reprodução” que a escola funciona como reprodutora das
desigualdades sociais (Nogueira, 2002). O factor económico também tem
grande relevância na educação dos indivíduos, já que a educação dos filhos é
um investimento: enquanto o filho anda a estudar não pode contribuir para o
sustento da família e, para além dos gastos que isso envolve, aqueles que vêm
de classes sociais mais baixas, não têm oportunidades de aceder a
determinados estabelecimentos de ensino e mesmo a certos bens culturais.
(Nogueira, 2002). No Plano Nacional para a Inclusão de 2010, uma das
medidas do governo é no sentido de combater o insucesso escolar e o
abandono escolar precoce. Nos últimos anos tem sido feito um grande esforço
para combater as desigualdades. Entre essas medidas encontram-se o
reconhecimento, validação e certificação de competências, cursos e
formações modulares para jovens adultos, bem como aumento de apoios de
acção social para o financiamento dos estudos. Apesar deste esforço, a
escolarização dos jovens em Portugal continua a ser baixa, o que origina uma
posição de desvantagem no mercado de trabalho.
Segundo um estudo de Rodrigues, (2008), é nas classes mais baixas
que se verifica o maior número de insucesso e abandono escolar. Nesse
mesmo estudo, Rodrigues afirma que:

A educação escolar constitui um dos pilares estruturantes dos


Indivíduos e condição fundamental de partida para a sua inclusão social,
devendo começar nos primeiros anos de vida. Nesta perspectiva, a escola
constitui um espaço privilegiado, a partir do qual podem detectar

56
precocemente, prevenir e combater as situações de pobreza e de exclusão
social. Porém, a escola tende a reproduzir no seu funcionamento regular as
desigualdades económicas e sociais que a envolvem, sendo reflexo
tradicional da incidência de níveis mais elevados de insucesso e abandono
escolar precoce junto das crianças e jovens originárias de grupos sociais
mais desfavorecidos.
(Rodrigues, 2008:105)

Os entrevistados que foram alvo de análise deste trabalho são


exemplos do que é defendido na teoria de Pierre Bourdieu, já que são
oriundos de meios em que os progenitores têm baixos níveis de escolaridade e
profissões mal remuneradas. Assim, o seu processo de socialização não lhes
incutiu a valorização da educação e formação como uma mais-valia para o
seu futuro.
As profissões que ambicionavam, e que pressupunham formação
superior, foram abandonadas, face ao investimento económico necessário
para frequentar uma universidade. Esta conjuntura conduziu a que
abandonassem os planos iniciais. Catarina, de 32 anos, solteira, sem filhos,
trabalha numa sapataria há 8 anos. Ambicionava ser advogada. No entanto,
logo que acabou o 12º ano, foi trabalhar para o Shopping. Quando lhe
pergunto se os pais a incentivaram alguma vez na escolha de alguma
profissão, responde:

(…) È assim … incentivo, incentivo NÃO! Sei lá … gostavam que tirasse


um curso. Não pude ir para a universidade, vim trabalhar … (…), não foi o que
sonhei para mim, mas gosto do que faço, e quando faço alguma coisa tento dar o
meu melhor possível (…)

Neste caso estamos perante ambições que não se concretizaram. Catarina,


desde que acabou o 12º ano, há 14 anos, trabalha no Shopping, tendo já sido
funcionária em diferentes lojas. Afirma não saber o que é ter outro trabalho,
acrescentando que esta é a única realidade profissional que conhece. O caso da

57
Alexandra, de 30 anos, é também um caso de ambições que foram ceifadas
precocemente ou adiadas. Alexandra é da Covilhã e veio morar para Guimarães
porque conheceu o namorado quando este andava a tirar uma licenciatura na
Universidade da Beira Interior. Quando este terminou o curso e regressou à sua
terra natal, Alexandra abandonou a Covilhã. Como já trabalhava numa loja de
pronto-a-vestir há quatro anos num Shopping daquela cidade, pediu transferência
para a mesma loja no Shopping em Guimarães. Aquilo que gostaria de ter seguido
era algo relacionado com crianças, tal como educadora de infância. Contudo,
abandonou os estudos e foi trabalhar:

(…) Sim também educadora de infância, eles sempre viram que eu


tinha jeito para crianças (…) o meu primeiro emprego foi ama! Tinha 18
anos, fui trabalhar porque os meus pais não tinham muitas possibilidades
e queria dinheiro para as minhas coisas, mas sempre conciliei com os
estudos, comecei a estudar á noite e trabalhava durante o dia. (…)
(entrevista de Alexandra funcionária de loja de pronto a vestir
entrevista nº17)

Diz-se farta desta vida de Shopping principalmente devido aos


horários que, segundo ela, não lhe permitem ter uma vida normal. Refere
que gostaria de tirar um curso superior na área da educação ou da
sociologia. Luísa é responsável de uma loja de óculos de sol. Depois de já
ter trabalhado em restauração, entrou no ramo do comércio, até que
conseguiu um posto de responsável de loja, onde está actualmente. A
Luísa tem 27 anos, trabalha há 2 anos nesta loja e a profissão que gostaria
de ter seguido era a de cantora. Como chegou a participar em alguns
concursos e teve sucesso, os próprios pais incentivaram-na nesse sentido.
Contudo, não se proporcionou uma continuidade nessa área, e descreve
então um pouco o seu percurso profissional e os motivos que a levaram a
ingressar no mercado do trabalho:

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(…), Chegas a uma certa idade na adolescência em que queres saber
como é e mesmo ter a tua independência monetária, queres experimentar. E
comecei num part-time no Segafredo e também na Pizza Hut, tinha 17 anos.
E depois disso trabalhei na área de comércio como estou hoje ainda. (…) Na
altura já estava um bocadinho saturada do meu horário, porque lá está o
comércio de rua acabas por ter pouco tempo para fazer algumas coisas que
são importantes no dia-a-dia, porque era um horário das 9.30 até as 19.30,
só tinha o domingo (…) interessou-me principalmente a nível de horário e
independentemente de trabalhar num Shopping tenho folgas ao fim de
semana o que é muito bom. Porque no Shopping tem outras vantagens que
num comércio de rua não tem que é trabalhar á noite mas também o lado de
as receber, acaba por ser um vencimento superior, que mensalmente faz
muita falta, o dinheiro é muito importante. (…)

Luísa aceita bastante bem os horários que tem e até vê vantagens


nisso, porque tem boas condições de trabalho, tanto a nível de remuneração,
como de flexibilidade de horários. Para além disso, e como resultado da sua
personalidade, aprendeu a ver o lado positivo das situações, com que
frequentemente se depara no exercício das suas funções. Também o facto de
ainda viver com os seus pais, ser solteira e não ter filhos, pode influenciar um
pouco este seu positivismo, já que, apesar dos seus horários, tem bastante
tempo para si própria. As responsabilidades fora o trabalho não serão tantas
como as de uma pessoa casada e com filhos a cargo. Como a situação
profissional anterior a deixou saturada, pois considerava ter um horário muito
preso e a remuneração era inferior, compreende-se que se considere satisfeita
na situação profissional actual. E, uma vez que ganha mais e se encontra num
posto profissional superior, já que é responsável por uma loja, podemos
afirmar que houve uma ascensão profissional.
No caso da Sílvia, de 33 anos, solteira e funcionária de uma sapataria
há 6 anos, esta imaginava que iria ser monitora de ginástica ou coreografa,
mas a vida não lhe proporcionou oportunidade para isso, pois não houve
incentivo dos pais e foi trabalhar muito nova, com apenas 16 anos, numa

59
fábrica de sapatos e depois sempre trabalhou em comércio. Sílvia descreve
então o seu percurso profissional da seguinte forma:

(…) o meu primeiro emprego foi mesmo numa fábrica de sapatos,


tinha 16 anos(…) Com aquela idade queria atingir a minha independência
financeira. E então disse aos meus pais que queria ir trabalhar e queria
deixar os estudos e não houve incentivo também da parte deles em continuar
os estudos. Disseram “ queres ir trabalhar vais trabalhar” (…) E pronto
depois de trabalhar na fábrica de calçado fui para uma loja que a minha
patroa abriu e depois vim para o Shopping (…) Uma colega minha já cá
trabalhava, e uma colega dela ia sair e sugeriu me e vim trabalhar, vim á
entrevista e fiquei.
(Entrevista de Sílvia funcionária de sapataria, entrevista nº3)

É pertinente, quando descrevemos os percursos profissionais dos


indivíduos, fazer a abordagem das suas expectativas em relação ao seu futuro
profissional e pessoal. Ao longo da recolha das entrevistas foi possível
observar que as habilitações literárias dos entrevistados condicionaram a
mudança de emprego e, consequentemente, a mudança de vida. No entanto,
também não esperam muito mais do que aquilo que têm. Pode referir-se que
estamos perante um tempo acomodado. Em geral, todos os nossos
intervenientes afirmam que esta não era a profissão que imaginaram ter, mas
após abandonar os estudos, foram escolhidos por esta profissão. Digo
escolhidos e não que a escolheram, no sentido em que não era nada que
tivessem procurado, foi simplesmente uma oportunidade que surgiu e as
pessoas acomodaram-se naquele emprego pelos motivos já referidos: a falta
de habilitações ou a idade, pois ou consideram que já é tarde para mudar ou
porque têm medo da mudança.
Segundo o relatório mensal do mês de Maio de 2010 do Instituto de
Emprego e Formação Profissional, o concelho de Guimarães tem 12884
desempregados inscritos no Centro de Emprego do concelho. Este número

60
tem vindo a aumentar de mês para mês, o que resulta no receio de mudanças
de emprego por parte dos entrevistados e, por esse motivo, como Catarina
refere “ (…) não sei o que vou fazer amanhã, mas isto também está mau e
tens de agarrar aquilo que tens (…).” Neste momento existem 12 lojas
encerradas no Shopping em análise. Num centro comercial é comum a
rotatividade de lojas. Os lojistas assinam contrato de seis em seis anos, que
pode ser renovado ou não pela administração. Este é um dos motivos pelo
qual os trabalhadores se sentem inseguros quando o movimento e fluxo de
vendas é menor, pois vêem o seu ganha-pão em risco. Como nos diz Sílvia no
seu testemunho a “ famosa crise instalou-se”

(…) Sim há momentos com hora bastante mortas e ultimamente tem


sido assim por isso é que estou a falar nisso (…) Sinto-me apreensiva, com
medo do futuro até, porque vejo que a “famosa crise “ instalou-se de
verdade (…) (depoimento de Sílvia funcionária de sapataria, entrevista nº 3)

É de conhecimento geral que o conselho de Guimarães, pertencente à


zona do Vale do Ave, desde sempre foi associado à actividade têxtil, e isso
encontra-se patente se analisarmos as profissões dos pais dos entrevistados.
Assim, verifica-se que na sua grande maioria, em dada altura da vida
estiveram ligados a essa área. Hoje em dia o elevado nível de desemprego
resultante do encerramento de várias fábricas ligadas à indústria têxtil, faz
com que a oferta de emprego diminua e sejam os centros comerciais o local
que ofereça mais emprego, devido às suas dimensões. Como refere Joaquim,
de 27 anos, casado, funcionário de uma loja pronto-a-vestir de homem, é mais
fácil para uma mulher arranjar emprego no Shopping do que para um homem:

(…) Ser homem é mais difícil, nas lojas preferem mulheres sem
dúvida! A maior parte das lojas se vamos ver 80% ou até mais são meninas,
depende da loja mas no meu tipo de loja somos 6 e eu sou o único homem,
trabalhei na Springfield e chegamos a ser 11 e eu era o único homem (…)

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(entrevista de Joaquim, funcionário de loja de pronto a vestir,
entrevista nº21)

Quando questionamos os entrevistados sobre que perspectivas têm


para o seu futuro, quase todos referem que esperam continuar a ter este
emprego ou ter outro que lhes ofereça estabilidade. Pedro, solteiro, de 26
anos, que trabalha há 4 anos numa loja de relógios e que tem como
habilitações literárias o 9º ano, refere que é muito difícil arranjar emprego e
por isso considera ser este o emprego ideal para si.

(…) é claro que gostava de uma coisa melhor, mas por enquanto e
como estou efectivo aqui é mesmo por aqui que vou ficar, mas sempre atento
a alguma coisa que apareça melhor (…) neste momento o emprego ideal é
mesmo este (…) tenho 26 anos já não sou nenhum menino, neste momento
vou tentar manter-me aqui, porque neste momento isto está muito mau para
arranjar emprego, por isso penso ficar aqui algum tempo ainda (…)
(depoimento de Pedro, funcionário de loja de relógios, entrevista nº
20)

Nos casos em que os entrevistados possuem habilitações literárias


superiores, as expectativas e a forma de encarar a profissão é
significativamente diferente. Entrevistamos três mulheres, em que uma delas,
a Susana, está a terminar uma licenciatura em Línguas Aplicadas. A Leonor
terminou a licenciatura em Animação Sociocultural este ano, mas ainda não
encontrou colocação e, finalmente, a Rosa, licenciada em Inglês/Alemão há 9
anos. Apenas duas encaram esta profissão no Shopping como uma situação
temporária, que só ocorre por não terem encontrado trabalho na sua área. No
caso da Rosa, talvez por já ter terminado a sua formação há mais tempo do
que as outras entrevistadas, não mostra ter esperança de abandonar o emprego
que tem para trabalhar na sua área de formação, tendo confessado que
inclusivamente já nem procura, porque considera não valer a pena.

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A Leonor, de 24 anos, licenciada em animação sociocultural, sempre
trabalhou no Shopping e conciliou este trabalho com os estudos. Mas
esperava encontrar logo após o término da licenciatura, colocação na área. No
entanto, isso acabou por não acontecer, pelos menos por enquanto. No seu
testemunho deparámo-nos com muita revolta e frustração, pois depois de
tantos anos de estudo a tirar um curso superior, acabar como vendedora numa
loja não lhe parece o melhor panorama. Nenhum ser humano gosta de ser
rejeitado e curriculum após curriculum entregue e sem sucesso, a entrevistada
refere que isso a “deita abaixo” e considera que a sua auto-estima é
constantemente posta em prova. Encontra-se ansiosa por sair do Shopping e
encontrar trabalho na sua área, mas confessa ter medo que tal não aconteça.
Quando questionada sobre a sua maior preocupação e quanto tempo acha que
vai continuar neste emprego, responde o seguinte:

(…)é pensar que vou ficar sempre nesta vidinha medíocre, a sério isto
assusta-me ene e tou a entregar um curriculum e olho para a cara das
pessoas e me dizem , “vamos ver os recursos que temos disponíveis e não sei
quê,”… fogo isso deita-te logo abaixo, tas a entregar um curriculum e já tas
a ouvir um não, e nem sequer viram o curriculum, tipo ninguém precisa de
uma licenciatura para trabalhar numa loja de roupa, muito menos num
Shopping! Tenho medo de ficar aqui para sempre! Não vou ficar, sei que
não, não quero isso. Mas é o que mais me assusta é isso, não conseguir
arranjar nada na minha área.(…) este trabalho mísero! Deixar o Shopping
para sempre! Vir aqui só de passagem, nem para fazer compras vir aqui.
(…). Estou sempre a entregar curriculuns, mando pela internet, por correio
ou mesmo às instituições (…) No máximo mais meio ano, 1 ano. Ou dois que
é o tempo de fazer o mestrado. Mas se arranjar um emprego na minha área
vou logo.(…)
(Depoimento de Leonor, funcionária de loja de pronto a vestir,
entrevista nº16)

63
Rosa, de 33 anos, como já terminou o curso há 9 anos e nunca
trabalhou na sua área específica, apesar de ter tentado inúmeras vezes, refere
que o emprego ideal para si seria num hotel ou num aeroporto, e termina a
entrevista com a seguinte frase sobre o seu futuro:

(…) Um grande ponto de interrogação. Cheguei à conclusão que quanto


mais planeamos, mais a vida na passa rasteiras. Tenho aquilo que gostaria que
fosse, mas não imponho que o seja, porque quando nós impomos que algo seja
daquela maneira e acaba por não ser, apanhamos uma grande desilusão e isso
acaba por afectar psicologicamente. Portanto vamos andando e vamos vendo.
(…)
(depoimento de Rosa, funcionária de loja de interiores, entrevista nº13)

Podemos subentender com esta frase da Rosa que de nada adianta fazer
muitos planos, pois nem sempre a vida corre como esperamos. Depois de se ter
licenciado, criou expectativas de encontrar trabalho na sua área e acabou no ramo
do comércio.
Em síntese, os percursos profissionais dos entrevistados são influenciados
pelas suas origens sociais, que acabam por se repercutir nas habilitações literárias
e forma como encaram a vida. Estes indivíduos transformaram a sua vida num
destino ao qual se resignaram. Sentem-se felizes por terem um emprego, visto a
conjectura económica do país ser desfavorável em que o desemprego não para de
aumentar. Daí que “tens de agarrar aquilo que tens” seja uma frase comum a
algumas das entrevistas.

3.4.Tipologias de trabalhadores

Ao longo deste trabalho pôde-se verificar a existência de cinco tipos


distintos de trabalhadores, a saber: indivíduos conformados; indivíduos
inconformados; indivíduos condicionados pela falta habilitações, mas também

64
pela falta de ambição pessoal; indivíduos realizados no trabalho e indivíduos com
elevado grau de saturação.
A construção desta tipologia foi elaborada através da análise e cruzamento
das dimensões do nível de satisfação no trabalho, percursos profissionais e
expectativas e ainda do contexto familiar. Considera-se que indicadores como as
habilitações literárias, estado civil, idade e existência de filhos, influenciam na
forma como os indivíduos encaram a sua profissão.
Na dimensão do nível de satisfação no trabalho, os entrevistados efectuam
o balanço positivo e negativo sobre a sua profissão. Assim, nem todos a encaram a
da mesma forma, por isso é possível dividi-los em grupos, através de um conjunto
de características comuns.
Relativamente à dimensão das expectativas profissionais, verifica-se a
mesma situação. Por isso, através das respostas obtidas, e após o cruzamento das
dimensões do nível de satisfação, percursos e expectativas profissionais, foi
possível traçar uma tipologia, com bases em traços comuns.
Podíamos dividir todos estes testemunhos em apenas dois grupos:
o grupo dos casados e o grupo dos solteiros, pois é principalmente no estado civil
que se verificam as maiores diferença. Contudo, foi possível ir mais além, e
dentro desses grupos, proceder a uma subdivisão mais minuciosa.

Descrição das tipologias

1- Indivíduos “conformados” com o trabalho – são sobretudo


mulheres de idade avançada com elevadas responsabilidades financeiras.
Arrependem-se sobretudo de ter abandonado os estudos e consideram que um
nível de escolaridade superior mudaria a sua vida. No entanto, consideram ser
tarde demais para mudar de emprego em virtude da idade. Disto são exemplos os
casos de Fátima, Odete e Deolinda.
2- Indivíduos “inconformados” com a profissão - são indivíduos
detentores de uma licenciatura ou em fase de conclusão da mesma. Encaram este

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trabalho como algo temporário. Com efeito, anseiam sair deste ramo e finalmente
trabalhar na área à qual dedicaram anos de estudo, receando nunca arranjar outro
emprego que lhes permita mudar de vida. São casos de ambições frustradas ou
adiadas. Recorrendo à análise das dimensões dos percursos e expectativas e nível
de satisfação, e após agrupar as características comuns às entrevistadas, foi
possível criar esta tipologia, inserindo-se neste grupo as entrevistas de Rosa,
Leonor e Susana.

3- Indivíduos “condicionados” pelas habilitações literárias mas


também por falta de ambição – São indivíduos jovens, mas com poucas
habilitações, que não conhecem outra experiência profissional que não o
trabalho em comércio. Gostam do trabalho, mas queixam-se dos horários,
apesar de referirem já se terem acostumado com eles. Estes indivíduos
contam bastante com a ajuda dos pais e têm todo um contrato efectivo.
Arrependem-se de ter abandonado os estudos, apesar de se revelarem
pouco ambiciosos, esperando pouco mais do que aquilo que têm. Nesta
tipologia podemos inserir as entrevistas de Catarina, Paula, Sílvia, Idalina,
da Marta, da Olívia e de Pedro. O processo utilizado para criar esta
tipologia foi já referido no ponto anterior.

4- Indivíduos “realizados” com o trabalho que fazem – São


indivíduos satisfeitos com o trabalho, que consideram ter boas condições
de trabalho. As suas habilitações são ao nível do 12º ano e não se
imaginam noutro trabalho, apesar de revelarem uma personalidades com
um forte poder de permeabilidade à mudança. Nesta tipologia podemos
inserir as entrevistas de Sandra, Vanessa, Maria, Luísa e de Elsa.

5- Indivíduos com elevado nível de saturação – trabalham há


vários anos no mesmo local; são pessoas casadas ou que vivem em união
de facto, e que se sentem desvalorizadas no trabalho, encontrando-se à

66
procura de um novo emprego. Nesta tipologia podemos inserir as
entrevistas de Alexandra e de Cláudia.

Quadro com as tipologias de trabalhadores

Tipologia Principais Entrevistas


Traços característicos
Indivíduos Fátima (E4)
“Conformados”  Idade avançada Odete (E5)
Com a profissão  Elevadas Deolinda
responsabilidades Financeiras (E6)
 Arrependem-se do abandono
 Dos estudos
 Baixas habilitações
 Consideram que é tarde demais para
mudar

Indivíduos Susana(E11)
“Inconformados  Detentores de licenciaturas Rosa(E13)
”  Encaram este trabalho como temporário Leonor(E16)
Com a profissão  Anseiam encontrar emprego na sua área
 Têm receio de não conseguir mudar de
vida
 Ambições cortadas ou adiadas
Indivíduos  Jovens Catarina(E1)
Condicionados  Baixas habilitações Paula(E2)
pelas  Não conhecem outra realidade Sílvia(E3)
Habilitações profissional Idalina(E9)
literárias  Têm contratos efectivos Marta(E15)
 Acostumaram-se aos horários Olívia(E19)
 Contam com a ajuda dos pais Pedro(E20)
 Falta de ambição pessoal
 Medo da mudança

Indivíduos  Satisfeitos com o trabalho Sandra(E7)


realizados  Consideram que têm boas condições no Vanessa(E8)
trabalho Maria(E10)
 Boas remunerações Luísa(E12)
 Personalidades com forte poder de Elsa(E14)
encaixe Joaquim(E21
 Não se imaginam noutro trabalho )

Indivíduos  Trabalham no local há vários anos Alexandra(E


saturados  São casadas ou vivem em união de facto 17)
 Sentem-se desvalorizadas no trabalho Cláudia(E18)
 Encontram-se á procura de novo
emprego
 Níveis de satisfação muito baixos
Fonte: entrevistas realizadas

67
Conclusã o

Com este trabalho de investigação procurou-se compreender a forma como


os indivíduos trabalhadores de Shoppings organizam o tempo e o espaço atípico a
que estão sujeitos no seu quotidiano. Para tal foi necessário conhecer a vida destes
indivíduos no aspecto profissional e pessoal. Estes aspectos englobam várias
dimensões, como o nível de satisfação no trabalho, percursos e expectativas

68
profissionais, condições de trabalho, conciliação da actividade profissional e vida
familiar e contexto socioeconómico.
Foi utilizada uma metodologia apropriada, com instrumentos adequados
para conseguir atingir o objectivo proposto. Assim, a metodologia consistiu, para
além da pesquisa empírica, na análise de entrevistas semi-estruturadas, na
observação participante e também na análise de documentos estatísticos.
Para uma melhor compreensão do objecto em análise, considerou-se
relevante efectuar uma contextualização relativa ao conceito de Shopping, bem
como da sua evolução ao longo dos anos. É também de destacar a importância dos
conceitos de tempo e espaço, principalmente no que concerne ao tempo de
trabalho.
Um dos aspectos verdadeiramente importantes é a identificação dos traços
identitários dos trabalhadores de Shopping. Este perfil é traçado através de várias
variáveis, a saber: funções profissionais que desempenha, tipo de loja, habilitações
literárias, contexto socioeconómico, antiguidade no trabalho e estado civil.
Tornou-se fulcral explicar neste trabalho de investigação, as experiências
profissionais dos entrevistados, reflectindo a organização do tempo de trabalho e
do tempo para actividades extra-trabalho. Para tal, foi necessário a pesquisa
concentrar-se na análise de dimensões decisivas para a compreensão desta
problemática: o retrato do contexto social e rotinas de vida da população
entrevistada, o nível de satisfação no trabalho, descrição da actividade e situação
profissional, conciliação da esfera profissional e familiar, descrição dos percursos
profissionais e considerações sobre expectativas para o futuro.
Podemos definir a mão-de-obra deste centro comercial como sendo
relativamente jovem, maioritariamente do sexo feminino, com baixos níveis de
escolaridade, com origens sociais humildes, em que os progenitores são
igualmente detentores de baixa escolarização. Neste caso concreto, a maioria dos
entrevistados tem um contrato efectivo com a empresa. À excepção de um ou dois
casos, todos os indivíduos têm apenas esta actividade profissional.
Nesta pesquisa, em que tornou primordial conhecer a realidade social e
profissional dos trabalhadores, a precariedade laboral foi algo fortemente
observável. Para além das entrevistas efectuadas, contactámos também Sandra, a

69
dirigente do Sindicato do Comércio, Escritórios e Serviços do Minho. Pedimos-
lhe que nos elucidasse a respeito das maiores reclamações com que se depara.
Sandra declarou o seguinte:
(…) Portanto, as principais queixas vão nesse sentido de a categoria
profissional não ser respeitada, não ser feita a actualização da tabela
salarial, de não ser feita a progressão na carreira. As pessoas passam 5 e 6
anos na mesma categoria profissional, sem ver o ordenado aumentado, sem
serem respeitadas as diuturnidades. As diuturnidades são um acréscimo ao
salário que a pessoa tem direito ao fim de determinados anos na mesma
categoria profissional. (…) Os subsídios de alimentação não são feitos
conforme a tabela. Acontece muito com o pessoal que trabalha nas lojas, os
chamados caixeiros, não recebem o abono de caixa, o subsídio de caixa, e as
pessoas muitas vezes nem sabem os seus direitos. Os horários de trabalho, o
trabalhar aos feriados sem serem remunerados, os feriados têm de ser pagos
a 150%. (…) Existem reclamações de cargas horárias excessivas e
incumprimento da lei em relação ao pagamento do subsídio de turno, das
horas extraordinárias, dos feriados (…) começa agora a ser de conhecimento
que existe uma pessoa no Shopping que é dirigente sindical, e que representa
um sindicato ao qual as pessoas se podem dirigir. Mas as pessoas têm medo,
muitas vezes. As pessoas vêm-me perguntar e ficam a saber, mas depois não
agem. Quando o patrão diz quem não quer há mais lá fora à espera, a porta
é larga e qualquer um cabe, mas isso também vale para o contrário, porque
nós estamos a trabalhar e o patrão não pode despedir só porque eu estou a
exigir os meus direitos, e se o fizer vai ter de ser penalizado por isso, e as
pessoas têm de tomar consciência que de facto quando nós deixamos de fazer
valer os nossos direitos não nos estamos a prejudicar só a nós: estamos se
calhar a prejudicar também os nossos filhos, porque a maioria das pessoas
que trabalha no Shopping é casada e tem filhos. Se concorda em estar a
levar para casa menos - à volta de 150euros- todos os meses, dinheiro que
podia ser utilizado no seu bem-estar para ela, para a família, para os filhos.
Temos de pensar que cada vez que nós não reclamamos os nossos direitos
estamos a contribuir para que os patrões achem que afinal estão a fazer uma

70
coisa que é certa. (…) Que sacrifícios é que podemos pedir? Nenhuns.
Ganhar o ordenado mínimo num sítio onde tem uma folga por semana, os
feriados não são pagos como deve ser, eu não sou respeitada, pronto vou
para lá encher o horário, Quem paga ordenados mínimos tem trabalhadores
mínimos. (…) O que acontece é que a pessoa é vista como um instrumento de
trabalho e não como um ser humano que está ali (…)
(depoimento de Sandra, funcionária de loja de óptica e dirigente
sindical, entrevista nº7)

Os esclarecimentos de Sandra vieram apenas reforçar alguns dos


depoimentos dos entrevistados ao longo desta investigação. Existem várias
irregularidades nesta profissão, principalmente no que diz respeito à remuneração
e aos dias de descanso.
Os centros comerciais são espaços que praticam horários alargados, entre
as 12 e as 14 horas por dia, o que obriga a um regime de turnos rotativos. O tema
dos horários é um dos focos de insatisfação da grande maioria dos entrevistados,
quer pela rotatividade existente, quer pela sua atipicidade. Os entrevistados vivem
segundo um modelo de vida assíncrono, ou seja, os seus horários não se
encontram sincronizados com as restantes instituições. Por exemplo, a grande
maioria dos infantários encerram entre as 18h e as 19h. Isto implica que um
indivíduo que execute esta profissão e saia às 22h, não será capaz de gerir estes
horários. Com efeito, nesta investigação, concluímos que as ajudas de avós ou
familiares próximos são essenciais para obter o sucesso na conciliação da esfera
profissional e familiar. Podemos considerar um modelo assíncrono também no
aspecto da vida social e mesmo familiar, no sentido em que, a grande maioria dos
trabalhadores tem horários em que trabalha de Segunda a Sexta-feira e os fins-de-
semana são para o descanso. Para os trabalhadores de Shopping, os dias passam a
ser todos iguais: feriados, fins-de-semana e dias santos, passam a ser iguais a
todos os outros.
As folgas são rotativas, pelo que os fins-de-semana livres são apenas um
por mês, na generalidade dos casos. A vida social e familiar acaba por ser
afectada, em virtude dos períodos de descanso e de trabalho não estarem em

71
sincronia com os restantes membros da comunidade em que se encontra inserido.
Este trabalho centrou-se, sobretudo, nos usos do tempo, tendo-se confirmado que,
para aqueles que têm responsabilidades conjugais, existe uma maior dificuldade
em gerir esse mesmo tempo, principalmente quando existem filhos. Para os
indivíduos solteiros, as dificuldades em gerir o tempo prendem-se sobretudo com
a vida social, como amigos, namorados e actividades relacionadas com a
formação académica e profissional.
É facilmente perceptível que, como resultado dos motivos já referidos, os
indivíduos trabalhadores nestas áreas comerciais tenham grandes dificuldades em
gerir o seu tempo. As rotinas são descritas de forma simplista através do “roteiro”
Casa-Shopping-Casa.
As mulheres encontram-se ainda mais sobrecarregadas em virtude das
tarefas domésticas. Nos dias de folga referem que se dedicam essencialmente a
actividades do lar, pelo que acabam por não fazer nada que considerem
“prazeiroso”, pois para além disso, acresce ainda o facto de frequentemente se
encontram sozinhos nos seus dias de folga, (pois os familiares ou amigos
encontram-se a trabalhar, não sendo as folgas coincidentes. A única vantagem dos
entrevistados é habitarem perto do local de trabalho, não sendo assim obrigados a
gastar tempo em deslocações.
Uma das conclusões desta investigação é o facto de esta profissão não
proporcionar uma ascensão em termos de carreira. Os indivíduos pouco
acrescentam à sua carreira ao longo dos anos. Pode considerar-se uma profissão
que exige pouca autonomia e que conduz a uma elevada rotina.
Um dos temas abordados nesta investigação foi a dinâmica dos percursos
profissionais e relação com as habilitações literárias e origens sociais. É relevante
o facto de todos os entrevistados serem oriundos de meios familiares em que os
pais possuem baixos níveis de escolaridade e profissões com baixos rendimentos.
A falta de condições económicas e baixa escolaridade dos pais terá possivelmente
influenciado o precoce abandono dos estudos.
Um centro comercial é um local que absorve um grande número de mão-
de-obra e que não exige grandes habilitações, facilitando assim o acesso a este
emprego, como referem os entrevistados. Estamos perante indivíduos que estão no

72
ramo do comércio há vários anos. Alguns não conhecem sequer outra realidade
profissional e outros não se imaginam sequer a ter outra actividade profissional.
Isto porque simplesmente se sentem condicionados devido à falta de habilitações
académicas, falta de formação profissional noutras áreas, mas também, em alguns
casos, devido à idade avançada. O facto de o concelho de Guimarães registar uma
taxa de desemprego elevada e a própria conjuntura económica que o país
atravessa, causa um maior receio quando se fala em mudar de emprego ou mesmo
de ramo. Estes indivíduos conformaram-se com os seus empregos e agradecem o
facto de os ter. Aqueles que encaram a profissão como algo temporário são
aqueles que possuem habilitações superiores. De forma que se conclui que as
habilitações literárias e a idade são dois aspectos que condicionam a mudança.
Em relação ao nível de satisfação, verificou-se que os aspectos apontados
como positivos neste trabalho são o contacto com o cliente e o gosto pelas vendas.
Em relação aos pontos negativos, foi referido que consideram alguns clientes
difíceis e mal-educados, no sentido em que são muitas vezes ignorados por estes.
Sentem que estão a ser inferiorizados como pessoas e que o seu trabalho está a ser
desvalorizado.
O espaço do Shopping é atípico, no sentido em que é um local fechado,
onde não existe a percepção do anoitecer. Os trabalhadores entram de dia e muitas
vezes quando terminam o turno já anoiteceu. É um espaço bastante artificial,
devido às fortes luzes existentes e ao ar condicionado, para além de que o ruído já
faz parte da vida destes trabalhadores. Apesar de este aspecto ter sido pouco
frisado pelos entrevistados, o facto é que se trata de um local com bastante ruído
devido à música ambiente, que se mistura com a música das próprias lojas, bem
como o ruído de fundo dos próprios clientes. Assim, as condições físicas do local
de trabalho interferem com a saúde mental dos trabalhadores (Amaro, 2006). Por
isso, vários entrevistados referem ou demonstram sinais de cansaço psicológico. É
de ressalvar ainda que actividades como estar ao ar livre e o isolamento em sítios
calmos, são referidos como coisas que gostam e procuram fazer quando têm
oportunidade.
Após a análise das entrevistas, foram encontrados cinco tipos de
trabalhadores: indivíduos “conformados” com o trabalho, indivíduos

73
“inconformados”, indivíduos condicionados devido às habilitações literárias,
indivíduos realizados e indivíduos “saturados”. A construção desta tipologia foi
possível após o cruzamento das dimensões do nível de satisfação, percursos
profissionais e expectativas.
Os indivíduos conformados com o trabalho são aqueles que já se
resignaram com a profissão, devido à idade avançada e baixas habilitações, e que
consideram que não têm outra opção de vida.
Os indivíduos inconformados são aqueles que apenas têm este emprego
enquanto não encontram uma situação profissional melhor. São detentores de uma
licenciatura e esperam que esta situação seja temporária e consideram que as suas
ambições estão estagnadas.
Os indivíduos condicionados não diferem muito dos conformados,
encontrando-se a diferença no factor idade: são jovens e, para além de baixas
habilitações literárias, não têm grandes ambições. No entanto, consideram que ter
mais escolaridade lhes abriria outras portas a nível profissional.
No que concerne aos indivíduos realizados, estes têm boas condições de
trabalho, quer a nível de remuneração, quer a nível de folgas, e têm
personalidades com forte poder de adaptação.
Relativamente aos indivíduos saturados, estes trabalham há vários anos
naquele local e consideram ter pouco tempo para si e para a família. Sentem-se
desvalorizados no seu trabalho, face aos sacrifícios que fazem.
Revelou-se curioso o facto de os entrevistados terem referido não esperar
ter esta profissão, já que todos aspiravam a profissões para as quais são
necessárias habilitações académicas superiores. Estamos assim perante vários
casos de sonhos ceifados, verificando-se que as habilitações literárias tiveram um
papel fundamental no trajecto destes indivíduos.
No âmbito deste trabalho, foi possível verificar e reflectir sobre os vários
sacrifícios a que estes trabalhadores estão sujeitos, nomeadamente a dificuldade
em articular a esfera pessoal e a esfera profissional e o trabalho aos fins-de-
semana, feriados e noites, o qual não é, muitas vezes, compensado como deveria.
Um outro sacrifício apontado, relaciona-se com o facto do próprio espaço de
trabalho ser bastante artificial, tornando-se incómodo e pouco saudável para quem

74
lá passa tantas horas do dia. A isto junta-se ainda a precariedade laboral a que
frequentemente estão sujeitos, tendo particularizado o factor dos horários
rotativos, uma vez que estes podem alterar todo um metabolismo, em virtude de
refeições que são feitas extemporaneamente.
Todos os motivos supracitados são focos de insatisfação para estes
trabalhadores, mas que, no entanto, poderiam ser contornados, de forma a,
futuramente, ser possível um decréscimo do grau de insatisfação existente.
São várias as medidas que podem ser tomadas para reverter a situação
anteriormente apontada, algumas das quais já são prática corrente em alguns
países. Seria o exemplo do encerramento dos centros comerciais aos Domingos,
prática que já é usual, por exemplo, na vizinha Espanha. Poderiam, e deveriam,
existir, por parte da Autoridade para as Condições do Trabalho, fiscalizações mais
rigorosas, no sentido de combater a precariedade laboral, principalmente no que
concerne aos descansos semanais e remunerações. Deveriam igualmente ser
criadas estratégias, no sentido de possibilitar uma melhor e mais eficaz
conciliação da esfera profissional e familiar.
A terminar, resta acrescentar que, apesar de, ao longo desta investigação,
se ter verificado a existência de indivíduos realizados com o trabalho, o facto é
que muitos mais poderiam, e deveriam de facto existir, se as condições de trabalho
oferecidas fossem melhores e que, no mínimo, respeitassem integralmente os
direitos fundamentais dos trabalhadores.

75
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81
ANEXOS

82
Índice de quadros

Quadro nº1
População média anual
residente (N.º) por Local de
residência, Sexo e Grupo etário
(Por ciclos de vida); Anual
S Período de referência dos
Grupo etário (Por ciclos de vida)
exo dados
2009

Local de residência
Guimarães
N.º
Total 162 614,0
0 - 14 anos 26 398,5
H
15 - 24 anos 21 606,5
M
25 - 64 anos 94 823,5
65 e mais anos 19 785,5
Total 79 957,0
0 - 14 anos 13 644,5
H 15 - 24 anos 11 112,5
25 - 64 anos 46 835,0
65 e mais anos 8 365,0
Total 82 657,0
0 - 14 anos 12 754,0
M 15 - 24 anos 10 494,0
25 - 64 anos 47 988,5
65 e mais anos 11 420,5
População média anual residente (N.º) por Local de residência, Sexo e Grupo etário (Por ciclos de vida); Anual -
INE, Estimativas Anuais da População Residente
Fonte: www.ine.pt

83
Quadro nº2
Divisão das tarefas domésticas (%) pelos agregados domésticos
privados por Sexo, Frequência de realização das tarefas domésticas e Tipo
(tarefas domésticas); Não Periódica
Período de referência dos dados
1999

Local de residência
Frequên Portugal
Tipo (tarefas domésticas)
Scia de realização
C C C
exo das tarefas C Co
ostuma Costuma Costu ostuma
domésticas ostuma stuma
realizar a ostuma realizar ma realizar realizar
preparar realizar
limpeza cuidar da trabalhos serviços as
as compras
regular roupa de administrativos compras
refeições esporádicas
da casa jardinagem habituais
% % % % %
% %

3 3 3 20 3 24,
Sempre 27,1
5,7 3,2 3,6 ,4 3,4 4
Com 1 1 8 14 2
14,9 8,1
frequência 3,7 1,8 ,7 ,0 1,0
H Alguma 1 1 8 12 1 13,
15,7
M s vezes 7,3 1,2 ,4 ,4 6,0 9
Raram 7 6 5 5, 6 17,
10,1
ente ,5 ,7 ,4 5 ,2 8
2 3 4 47 2 35,
Nunca 32,3
5,9 7,1 4,0 ,7 3,4 9
H 6 4 3 18 1 26,
Sempre 31,4
,0 ,6 ,6 ,6 6,0 1
Com 1 5 3 14 2
17,6 8,5
frequência 1,2 ,5 ,6 ,9 0,6
Alguma 2 1 5 13 15,3 1 14,
s vezes 2,4 0,9 ,6 ,4 9,9 9

84
Raram 1 9 6 3, 7 16,
7,4
ente 2,0 ,8 ,0 9 ,5 6
4 6 8 49 3 33,
Nunca 28,3
8,3 9,3 1,2 ,1 6,0 8
6 5 6 22 4 22,
Sempre 23,1
2,5 9,1 0,6 ,0 9,2 8
Com 1 1 1 13 2
12,4 7,7
frequência 6,0 7,5 3,2 ,2 1,4
Alguma 1 1 1 11 1 12,
M 16,0
s vezes 2,7 1,5 0,9 ,4 2,6 9
Raram 3 3 4 7, 5 18,
12,6
ente ,3 ,9 ,9 0 ,0 9
5 8 1 46 137,
Nunca 35,9
,6 ,0 0,4 ,5 1,9 7
Divisão das tarefas domésticas (%) pelos agregados domésticos privados por Sexo, Frequência de
realização das tarefas domésticas e Tipo (tarefas domésticas); Não Periódica - INE, Inquérito à Ocupação do Tempo
Fonte: www.ine.pt

85
Operacionalizaçã o dos conceitos 1

Família TRABALHO

Dimensão conciliação Dimensão satisfação no Dimensão conformismo com o Dimensão relação


família/trabalho trabalho trabalho/perspectivas futuras habilitações
literárias/trabalho

Composição do agregado Categoria profissional Habilitações literárias Conformismo com o


I familiar trabalho
N
Número de filhos Trabalho extraordinário Responsabilidades financeiras Idade
D
I
C Distribuição das tarefas Horário de trabalho Idade Incentivos familiares

A familiares

D Existência de recursos Antiguidade no trabalho Estado civil Percurso profissional


O humanos no apoio á gestão
R familiar
E
S Género Ambiente trabalho Número de filhos Profissão ambicionada

Condições de trabalho Tipo de contrato

Habilitações literárias

86
Operacionalização dos conceitos 2

Tempo STRESS

Dimensão Dimensão conciliação Dimensão


organização família/trabalho capacidade de resistência
do tempo de
trabalho e
tempo de não
trabalho
I Horários Gestão dos Gestão dos horários
N horários
D
Hobbies/passatempo Número de folgas Número de folgas
I
s
C
A Número de folgas Estado civil Divisão de tarefas
D
O
R Gestão dos horários Género Personalidade dos indivíduos

E
S Género Distribuição das
tarefas domésticas
Estado civil Distancia casa/trabalho Género

Número de Estado civil


filhos

Categoria Número de filhos


profissional
Funções na loja

Guião de entrevista

87
Nome
Idade -----
Estado civil: ------

Número de filhos: idades dos filhos:


Profissão do pai:
Profissão da mãe:
Profissão do cônjuge:

Número de irmãos:
Habilitações literárias da mãe:
Habilitações literárias do pai:

FORMAÇÃO ACADÉMICA
1. Grau académico mais elevado:

--------------- ---------------

2. SITUAÇÃO PROFISSIONAL

3. Local de trabalho:
4. Antiguidade no emprego:
5. Funções na loja: Tempo médio (em minutos) no percurso
entre casa e o trabalho (ida e volta)
7. Como se desloca para o trabalho:
8. Contexto profissional:
9. Nº médio de horas de trabalho por semana:
10-Fora o trabalha no Shopping tem mais alguma actividade
profissional? Ou estuda?

88
Caracterização

1- Qual a profissão que se imaginava a ter quando era mais


nova, por exemplo com 10/15 anos?
2- Qual o emprego que os seus pais gostariam que tivesse tido?
Que tipo de incentivo lhe foi dado pela família?
3- A casa onde mora é própria? Mora com familiares? É
alugada? Está a compra-la a credito?

Descrição da actividade

1- Qual o tipo de contrato que tem? (efectivo, a termo,


temporário)
2- Que horário costuma fazer habitualmente? Quantos dias de
folga têm?
3- Costuma fazer horas extraordinárias? Com que
regularidade? São pagas?
4- Pode descrever quais as suas funções na loja?

Percurso profissional

1-Qual foi o primeiro emprego que teve? Pode contar-me como começou o
seu percurso profissional? (idade, motivo, local)
2-E no shopping? Como surgiu esta oportunidade?
3-Considera o facto de ser mulher/homem este trabalho lhe traz vantagens?

89
Rotinas do dia-a-dia
1-Pode contar-me como é um dia normal de trabalho seu? Desde que se
levanta até deitar? Por exemplo conte-me o seu dia de ontem. ( horas a que se
levanta , tentar obter o máximo de informação por horas )
2-Como é feita a gestão familiar ao nível das tarefas domésticas, como o
cuidado dos filhos (ir levar e buscar á escola) ou mesmo gestão do orçamento
familiar? (casados e com filhos)
3-Por norma como se sente no final de um dia de trabalho? Porquê?
4-Se tiver que trabalhar ao domingo, como se sente ao final do dia?
Porquê?
5-Com que frequência falta ou se atrasa e porque motivos?
6-Como reagem os seus patrões quando tem a necessidade de sair mais
cedo ou mesmo faltar?
7-Qual é o momento do dia que mais gosta e porquê?
8--Qual o dia da semana que gosta mais?
9--E o que gosta menos? Porquê?
10-Qual é o momento do dia que custa mais a passar?
11-Qual o dia da semana que lhe custa mais a passar?

Nível de satisfação no trabalho

1- O que gosta mais no trabalho que faz?


2- E o que é que gosta menos? Porquê?
3- Já alguma vez teve algum confronto com a sua entidade
patronal aqui no Shopping ? Porquê?
4- Recomendaria o trabalho no shopping a familiares? Porquê?
5- Numa escala de 0 a 10 sendo 0 nada satisfeito e 10 muito
satisfeito como classifica o seu grau de satisfação com o emprego actual?
Justifique.

90
Conciliação da vida pessoal com a vida profissional

1- Teve de mudar alguma coisa na sua vida familiar/pessoal


por trabalhar no shopping ?
2- Como ocupa o seu tempo livre? Porque?
3- Sente que o ocupa de forma ideal? Porque?
4- Qual a sua maior preocupação no seu dia-a-dia?
5- Há alguns feriados no ano em que você procure não
trabalhar ou lhe custe mais fazer isso?
6- Conte-me o que faz habitualmente nos seus dias de folga.
7-Faz planos de ter filhos nos próximos anos? De que forma pensa
conciliar o papel de mãe com o seu emprego? (para as mulheres sem
filhos)
8-O que gostaria de fazer se tivesse mais tempo livre?
9-Se pudesse o que mudaria na sua vida?

Implicações do trabalho na saúde

1- Como se alimenta durante o seu horário de trabalho? (onde,


como, quando, quanto tempo)
2- No último ano teve alguma doença ou perturbação na sua
saúde que possa atribuir ao trabalho?
3- Existe algum aspecto no seu local de trabalho que a
incomode no seu bem-estar físico? Qual?
4- Como classifica o ambiente de Shopping em relação á luz,
ruído e outras condições?

Expectativas futuras

91
1-Encontra-se á procura de outro emprego? Qual seria o
emprego ideal atendendo às suas habilitações no momento?

2-Quais são as suas expectativas profissionais para o futuro? Quanto


tempo mais se imagina a fazer este trabalho?
3-Como gostaria que a sua vida fosse daqui a 3 anos? (pessoal,
familiar e profissional)
4-Como acha que a sua vai ser daqui a 3 anos (pessoal, familiar e
profissional)?

3- Considera-se uma pessoa feliz? Porque? (procurar saber bem fazer


várias questões de precisão)

92
Grelha de aná lise de conteú do

Dimensão Categoria/tema E Anál


xcerto ise
interpretativa
Caracterização  Habilitações do próprio e
sócio/económica dos pais.
 Profissão dos pais
 Estado civil
 Encargos com a casa
 Dimensão do agregado
familiar

Caracterização da situação  Tipo de contrato


profissional do indivíduo  Antiguidade no emprego
 Cargo que ocupa
 Funções ou descrição da
actividade
 Tipo de loja
 Carga horária

Percurso profissional do  Ambições iniciais face á


indivíduo realidade actual
 Motivos pelos quais foi
trabalhar
 Compreensão do
percurso profissional para entender se houve
evolução na carreira
 A diferença entre género
 O surgimento da
oportunidade

Nível de satisfação no  As vantagens e


trabalho desvantagens
 Existência ou não de
confrontos com a entidade patronal
 Reclamações
 Compreensão do nível de
cansaço e saturação
 Realização pessoal
 Condições de trabalho
Conciliaçãovida  Diferenças entre estado
profissional/Pessoal civil
 A existência de filhos
 A existência de alguém
que apoia
 Divisão das tarefas
domésticas e organização familiar
 Mudanças que fariam se
possível
 As rotinas diárias
 O tempo livre ou a falta
dele
 As folgas
 Tempo que perde em

93
deslocações trabalha/casa
 O trabalhar no Shopping
 Horários
 Trabalhar aos fins-de-
semana

Implicações na saúde  Descrição do tipo de


refeições e o tempo que dispõe
 Perturbações na saúde
 Classificação do
ambiente (luz, ruído, ar condicionado)
 Perturbações no bem-
estar físico
Expectativas futuras  Sonhos e ambições
 Planos em relação ao
futuro profissional
 Relação
habilitações/profissão
 Idealização do futuro

94

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