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Chagdud Tulku Rinpoche (1930-2002) pertencia à
última geração de mestres que herdaram os
tesouros dos ensinamentos e métodos Vajrayana.
Filho de Dawa Drolma, uma das mais célebres
mulheres lamas deste século, abade do secular
monastério de Chagdud Gonpa no Tibet, Rinpoche
viveu os primeiros vinte anos de exílio, depois da
invasão chinesa de 1959, na Índia e no Nepal. Lá
serviu à comunidade tibetana como lama, médico e
promotor das artes.
Por exemplo, Tilopa, que foi um dos maiores praticantes da Índia, passou sua
vida fazendo óleo de semente de gergelim. Naquele tempo não havia nenhuma
tecnologia fantástica, nem prensas poderosas. A única maneira de fazer óleo de
semente de gergelim era triturar as sementes com a mão. Então, conforme
Tilopa triturava, dia e noite, ele cultivava dentro de si um coração cada vez
mais puro, e na sua mente cultivava atenção unidirecionada cada vez maior. Ele
não deixava sua mente pular como uma pulga. E foi por fazer essa prática
diária que ele atingiu sua grande realização.
Através dessa prática, dentro de suas famílias, dentro de suas ocupações, eles
tiveram a aptidão para superar as limitações da morte e realizar um estado que
é chamado “além da vida e da morte”, ou realização imutável.
Tudo que ela requer, embora soe simples, é que de um lado se nutra a pureza
de coração, ou motivação altruísta, e que se corrija e erradique a motivação
impura. E, por outro lado, que se permita que a mente descanse na sua própria
verdade, na sua própria natureza fundamental ou presença pura. E portanto, de
momento a momento na vida diária, há uma atenção constante tanto para a
pureza de coração quanto para o descanso na natureza pura da mente. É assim
que se pode incorporar o caminho espiritual na vida diária da pessoa.
Como podemos competir num mundo materialista, que algumas vezes é muito
mesquinho, e ainda sermos amáveis e compassivos com todas as pessoas?
Não quero falar apenas sobre princípios, então deixe-me contar uma história.
Na Índia havia um rei muito famoso, Indrabhuti, que era muito poderoso e
muito rico, como todos os reis. Ainda assim, mesmo com todas as suas
responsabilidades e impedimentos mundanos, ele teve aptidão para atingir a
iluminação. A razão era porque o seu propósito não era, de nenhum modo,
egoísta. Seu foco não era apenas o seu próprio melhoramento. Ao invés disso,
ele usou de todos os seus recursos, poder e influência de maneira a servir
constantemente às necessidades dos outros. Através disto, ele conseguiu
efetuar o mais nobre dos feitos, que é realizar verdadeiramente a ausência de
ego.
A meditação é independente de qual século ou cultura você vive, seja ela antiga
ou moderna. O que importa na meditação é o processo de olhar
constantemente para trás e de se avaliar — avaliar e verificar sua própria
mente. Agora, o modo como normalmente operamos nossas vidas é o oposto,
tendemos a olhar para fora da janela. Olhamos para fora da janela e dizemos
“Ó, ele é uma pessoa boa” ou “Ela é uma pessoa boa” ou “Isso é bom” ou “Isso
é ruim”. Estamos sempre verificando, olhando e criando impressões do mundo
fora de nós.
A meditação, por outro lado, é usar a tela de sua mente como um espelho,
onde você olha de volta para você mesmo, ao invés de olhar para fora,
julgando os outros. Você olha para você. Se você usa um espelho, você pode
ver se o seu rosto está sujo e se o seu cabelo está uma bagunça, e então você
pode limpá-los e penteá-los. Com a meditação você olha, e onde quer que você
veja um mau pensamento ou uma má ação, então você realmente tenta mudar
isso dentro de si – como lavar o seu próprio rosto.
Mudar a mente não acontece de uma vez. Mas com constante atenção a ela,
lentamente, lentamente, a mente muda. É uma questão de repetição, de novo,
de novo e de novo, olhando para si e se corrigindo, corrigindo as motivações
impróprias, os sentimentos ásperos. E então, mais do que isto, você se olha e
tenta verdadeiramente acentuar e abraçar as qualidades positivas. Você cultiva
a bondade de sua própria parte. Você não julga todo o tempo que isso e aquilo
é bom ou ruim, mas verifica repetidamente a si mesmo.
A meditação tem algo em comum com todas as religiões, tais como Católica,
Protestante, Judaica?
Cada tradição tem uma mensagem; cada tradição propõe-se a lhe reerguer, a
reduzir o seu sofrimento e miséria, e a ajudar a experienciar mais felicidade na
sua condição humana, até mesmo a experiência de felicidade total.
Basicamente, se você tomar cada religião e examiná-la, nos seus princípios
mais básicos você descobrirá que elas recomendam ajudar os outros ao invés
de prejudicá-los. Esses são os princípios operantes básicos que você encontrará
em todas religiões. Eles são exemplificados pelos grandes líderes de cada
tradição. Seguindo seus exemplos, podemos criar dentro de nós mesmos a
grande harmonia que estes próprios mestres alcançaram. Isso significa reduzir
as nossas próprias faltas e aumentar ilimitadamente nosso amor e compaixão.
Se há um pequeno conselho que você poderia dar a qualquer pessoa hoje, qual
seria?
Eu diria que é cultivar a sua própria pureza de coração. Comece por reconhecer
o quão afortunado você é – todos nós somos. Nós temos corpos humanos
preciosos. Esses corpos são extraordinários, com os quais podemos nos
relacionar com nossas famílias, nossas comunidades, nossa sociedade. Temos
circunstâncias afortunadas; não estamos famintos, pobres ou indigentes.
Realmente, somos tremendamente afortunados. E se olharmos ao redor,
veremos que há outros que certamente não têm este tipo de fortuna, que não
têm estas condições auspiciosas em suas vidas ou que não levam os estilos de
vida que levamos. E uma vez que se reflita sobre isto, então você é impelido a
perguntar, “Como posso, então, ajudar aqueles não tão afortunados quanto eu?
O que posso fazer para que experimentem menos dificuldade, menos
sofrimento?”
Quando você cultiva a compaixão e a bondade amorosa, você cria uma no seu
coração uma jóia que realiza desejos. Você não pode comprar isso. Você não a
obterá no topo de uma alta montanha. Está apenas no seu próprio coração.