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O que vale é a beleza

A tendência entre os fabricantes é investir


mais em design do que em motor

Ariel Kostman

Divulgação

MERCEDES-BENZ SLR MCLAREN – Inspirado nos modelos "flecha de


prata" dos anos 50, o visual do esportivo alemão de 1 milhão de reais
procura transmitir a impressão de potência e velocidade

Por décadas, os fabricantes de carro concentraram esforços na tecnologia e na


criação de dispositivos como freios ABS, suspensão eletrônica, computadores de
bordo e airbags. O poder dentro das montadoras ficava centralizado nos
engenheiros. O resultado é que os automóveis se
tornaram potentes, econômicos, seguros e duráveis. O
visual não recebia igual atenção. Alguns carros ficaram
tão parecidos que mal se distinguia uma marca da
Galeria de imagens
outra. Isso mudou bastante nos últimos cinco anos.
Para se diferenciarem e atrair consumidores, os
fabricantes estão investindo pesado no visual. Estima-se
que nesse período a Ford e a GM tenham aumentado em 50% os gastos com seus
departamentos de design. No início deste mês, a japonesa Toyota anunciou que
gastará 46 milhões de dólares na construção de um centro de estilo na Inglaterra.
Em lugar de engenheiros e homens de marketing, como no passado, as fábricas
vêm aumentando as equipes de desenhistas e roubando talentos das rivais.

Divulgação Michel de Vries


BMW Z4 – Os vincos e as MÉGANE II HATCH – A traseira
depressões na chapa de aço com um corte brusco e o porta-
criaram um efeito camaleão para malas saltado para fora são as
esse carrão de 268 000 reais. características da nova versão
Conforme o ângulo em que é do compacto de 50 000 reais da
observado, contornos que Renault
pareciam suaves se tornam
agressivos

Supervalorizados, os designers hoje têm o passe disputado como estrelas do


futebol. Ao lado de um pacotaço de demissões, uma das primeiras providências
tomadas pelo brasileiro Carlos Ghosn, quando convocado para tirar a japonesa
Nissan do atoleiro, foi roubar o designer Shiro Nakamura da rival Isuzu. A GM
americana tirou da Renault a designer francesa Anne Asensio, criadora do Scénic. A
Volkswagen comprou o passe do alemão Murat Guenak, o responsável pelo
desenho do Mercedes-Benz SLK, e do ítalo-português Walter de'Silva, da Alfa
Romeo. O salário de um profissional do calibre desses três pode chegar a 1 milhão
de dólares por ano, de acordo com a consultoria Booz Allen Hamilton, e a troca de
emprego é constante. Nos Estados Unidos, o maior mercado de automóveis, o
número de modelos à venda cresceu de 910 em 1995 para 1.314 em 2002. "Em
termos técnicos, os carros estão muito nivelados", diz o mexicano Carlos Barba,
que chefiou a equipe de design da Opel na Europa e atualmente faz o mesmo na
GM brasileira. "O principal fator de compra agora é o visual. É preciso emocionar o
comprador para ter chance de vender."  Divulgação

O americano J Mays, o mais badalado designer de


carros da atualidade e criador do Audi TT, do New
Beetle, do Ford Thunderbird e do novo Mustang,
compara os veículos a grandes produções do cinema.
"Você tem de levar as pessoas a um lugar onde
nunca estiveram, tirá-las da realidade", diz Mays. A
regra vale para os superesportivos e também para
modelos mais baratos. O SLR McLaren, um esportivo
de 1 milhão de reais, é visualmente muito mais
agressivo que qualquer outro Mercedes-Benz. O capô
enorme pretende deixar evidente o tamanho do
motor que carrega. Por sua vez, a Renault francesa
fez uma revolução visual em um de seus carros mais
vendidos, o Mégane, que custa por volta de 50.000 Raul Pires: resgate do prestígio da
reais. Lançado no fim de 2002, o Mégane II é Bentley
marcado por uma curvatura brusca do vidro traseiro
e pela tampa do porta-malas saliente. Em um ano,
as vendas do modelo aumentaram 16%. O Mégane comercializado no Brasil não
deve passar tão cedo pela plástica que foi feita em seu irmão francês.

Dentro das fábricas, os estúdios de design formam um universo à parte. Terno e


gravata são substituídos por jeans e camiseta, e muitas vezes os projetistas
trabalham ouvindo rock pesado. "O desenhista precisa estar por dentro da moda,
freqüentar exposições, shows e baladas para saber das novas tendências", diz Luiz
Alberto Veiga, gerente executivo do departamento de design na Volkswagen do
Brasil. Os desenhistas são quase todos jovens: têm 35 anos, em média. Essa é a
idade do brasileiro Raul Pires. Há dois anos ele desenhou o luxuoso Continental GT
da Bentley, marca inglesa de carros de luxo que pertence à Volkswagen. Formado
pela Universidade Mackenzie, em São Paulo, Pires chegou à Bentley em 1999,
depois de estagiar na Volks do Brasil e trabalhar na Skoda, na República Checa. O
veículo resgatou o prestígio da Bentley e ganhou prêmios de design no Salão de
Paris em 2002 e no Salão de Detroit no ano passado.

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