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Minha Viagem com J. P.

Harris
“Fiend strike me blue! I’m scarce able to walk,
And damn me if I can stand upright or talk!”
H.P.Lovecraft
Sempre tive uma vida normal, sem grandes aventuras ou emoções, bom, isso
até que J. P. Harris entrou em minha vida.
No dia, estava no meu habitual banco de praça onde costumava almoçar nos
meus trinta minutos de intervalo entre as aulas da manhã e da tarde quando
ele veio a mim.
- Ei garoto! Gritou. Era um homem de baixa estatura e de meia idade usando
um casaco de couro fechado e jeans.
Perguntei se era comigo, ele assentiu.
- Escuta... quer ver algo incrível? Algo que vai mudar seu jeito de ver e
entender o mundo? Algo que vai abalar suas estruturas?
Eu, como simples estudante do ensino fundamental sempre fui instruído a
nunca confiar em estranhos, mas ele... não sei explicar, ele tinha essa espécie
de aura emanado de seu corpo que passava um sentimento de calmaria.
Insistiu mais um pouco e me deixei ser levado.
O homem me guiou por ruas que jamais havia visitado, pelas vielas tortuosas e
estreitas que compunham a parte leste da cidade.
Andamos muito e rapidamente, mas nossas passadas não impediram o
anoitecer, que veio sorrateiro, acompanhado das fracas luzes da iluminação
pública que se acendiam ao nosso lado.
J. P. apertou o passo, entrando cada vez mais fundo nas entranhas da cidade.
- Estamos quase lá! Dizia – Só mais um pouco e... Aqui estamos!
Passei por ele e pude distinguir um lago que se estendia na imensidão negra
da noite.
- Acho que já vai começar...
Pouco depois desse comentário, pude perceber que o lago começava a
emanar um pequeno brilho, como se cada molécula de água estivesse
emanando uma fraca faísca. Tentei perguntar a meu acompanhante o que
aquilo significava, o que acontecia ali, mas este mandou que eu calasse a boca
e prestasse atenção no centro do lago.
Fiz o que ele me mandava. Agora, a luz que emanava do lago tornara-se muito
mais forte, tornando possível a visualização de seu fundo. Por fim, mirei em
seu centro, e ao fazê-lo, percebi que algo se movimentava ali, algo que... Então
eu vi.
A criatura parecia um peixe comum, mas era vermelha cor de brasa e sua
cabeça não era de peixe... Era humana. A face tinha uma expressão triste,
depressiva. Quando dei por mim, estava imaginando o que ela queria dizer,
porque estava tão aflita. Pode-se dizer que sua expressão foi para mim o que o
sorriso da Mona Lisa é para alguns, e arrisco dizer até mais. De súbito, quis
tocá-lo, chegar mais perto dele.
Corri freneticamente para o lago, tropeçando em um galho solto, arranhando
meu antebraço e cortando a palma da minha mão profundamente, mas aquelas
feridas pareceram não doer, então continuei.
Mergulhei no lago, o ar da noite entrava com esforço em meus pulmões junto
com a água fosforescente do lago enquanto nadava em direção à criatura.
Logo, podia senti-la mais perto, podia ouvi-la, logo nos tornaríamos um só
corpo, um só espírito, podia sentir que sim.
Nadei pouco mais que vinte metros, e quando finalmente cheguei a poucos
centímetros da criatura meus músculos deixaram de responder por conta da
exaustão. O ar começara a se esvair de mim lentamente e sentia que
começava a afundar.
Ali, junto à criatura, cheguei ao fundo do lago, e antes de perder
completamente meus sentidos acho que consegui ver um olhar de decepção
naquela face estranha. Ali, no fundo do lago que começava a perder seu brilho,
morri.
Acordei no dia seguinte como se acorda de um sonho no banco da praça onde
me encontrava antes de H. P. Harris se aproximar. Devo dizer que foi uma das
melhores noites de sono que já tive, mas por algum motivo estava cansado e
dolorido. Tinha que ir para casa, meus pais já deviam ter chamado a polícia
para me procurar.
No caminho de volta, cruzei com o que poderia ser uma perfeita versão de H.
P. Harris em frente à sorveteria, exceto que essa versão era anos mais jovem.
Entrei em minha casa, louco por minha cama. Entrei em meus pijamas e fui
escovar os dentes. Entrei no banheiro, mas o espelho não mostrou a imagem
que esperava que mostrasse. O espelho mostrava a face da criatura que vira
no lago envelhecida no mínimo em vinte anos, o espelho mostrava minha nova
identidade.

E você? Quer ver algo incrível? Algo que vai mudar seu modo de ver e
entender o mundo? Algo que vai abalar suas estruturas? Pois eu vi, e me sinto
ótimo.

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