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FLEXÃO DE VIGAS

Considere o movimento transversal de uma viga elástica submetida a um


carregamento distribuído transversal, conforme mostrado na Figura 1. De acordo com o
Sistema de Referência (SR) considerado, o eixo x está posicionado na direção axial da
viga, enquanto o deslocamento w acontece na direção transversal y. Portanto, w ( x, t )
denota o deslocamento transversal de qualquer ponto x da viga em qualquer instante de
tempo t. Sendo assim, este é um problema dinâmico envolvendo um sistema contínuo; ou
seja, com variação espaço-temporal, que resulta em uma Equação Diferencial Parcial
(EDP). Para a análise de sistemas contínuos, deve-se considerar um elemento
infinitesimal. Desta forma, adota-se um elemento infinitesimal de comprimento ∆ x
localizado a uma distância x da origem do SR.

f ( x, t )

x
∆x
y

Figura 1 – Viga submetida a um carregamento transversal.

Inicia-se a análise fazendo a análise cinemática e o Diagrama de Corpo Livre


(DCL) para o elemento infinitesimal considerado, conforme a Figura 2.
Do ponto de vista cinemático, o elemento sofre movimentos de translação w (t ) e
rotação ψ (t ) , além de se deformar linearmente w ( x ) e angularmente ψ ( x ) . Há,
portanto, dois Graus de Liberdade (GDL’s) neste problema – a saber: deslocamento
linear (translação) na direção y designado por w ( x, t ) (chamado de deflexão da viga) e
deslocamento angular (rotação) na direção z designado por ψ ( x, t ) (chamado de
declividade da viga). Estas grandezas são denominadas variáveis primárias do problema.
Note que este é um problema plano. Outro aspecto cinemático a ser levado em
consideração concerne à geometria do sistema. De acordo com a área transversal A ( x )
que pode variar ao longo da direção x, deve-se identificar a posição do Centro de
Gravidade (CG) da seção. Em geral, ainda que haja variação da seção ao longo da viga, o
CG da seção não costuma variar. Ao plano transversal à área da seção que passa pelo CG
da viga, dá-se o nome de Superfície Neutra, enquanto à reta observada no plano x-y
pertencente a este plano é denominada Linha Neutra (LN).

∆x

x
G

y
w w w
x=x x=x+∆x x=x+∆x
2

ψ x=x+∆x
M x=x F = ∆x f
x=x
x=x
ψ
x=x+∆x

V
x=x
G’ M
x=x+∆x

V
x=x+∆x

Figura 2 – Diagrama de corpo livre para um elemento infinitesimal de viga.


Com relação ao DCL, o carregamento externo transversalmente distribuído
f ( x, t ) gera momentos M ( x, t ) na direção z e forças (denominadas esforços cortantes)
V ( x, t ) na direção y que variam de acordo com a posição x e com o tempo t. Estas
grandezas são denominadas as variáveis secundárias do problema. Os momentos geram
tensões normais σ xx ( x, t ) na direção x, enquanto os esforços cortantes geram tensões

cisalhantes τ x y ( x, t ) no plano x-y. Vale lembrar que a viga pode estar submetida a outros

carregamentos – forças (distribuídas ou concentradas) e momentos. Neste caso, basta


acrescentá-los às Equações de Equilíbrio do problema como forçamentos externos. Isto
não ocasiona perda de generalidade da presente análise.
O próximo passo da análise consiste na obtenção das equações de equilíbrio.
Como o sistema apresenta dois GDL’s, escrevem-se uma equação de Newton (para
translação na direção y) e uma equação de Euler (para rotação na direção z). Fazendo o
balanço de forças (equação de Newton), obtém-se:

∑ Fy = m a G y ∴ V x = x +∆ x −V x = x + F = ∆ m w
&&
∆x (1)
x=x+
2

Note que a aceleração linear a G é tomada em relação ao CG do elemento


y

(ponto G). Além disso, o carregamento distribuído ao longo do elemento f ( x, t ) é


∆x
considerado como uma força concentrada F aplicada em x = x + . Utilizando a
2
relação para a densidade ρ, avalia-se a massa do elemento infinitesimal:

∆m
ρ= ∴ ∆m = ρ ∆V = ρ A ∆ x (2)
∆V

Substituindo as considerações anteriores na Equação (1), reescreve-se:


x = x +∆ x
V x = x +∆ x −V x = x + ∆ x f = ρ A∆x w
&&
∆x (3)
x=x x=x+
2

Dividindo toda a expressão por ∆x, tem-se:

V x = x +∆ x −V x = x x = x +∆ x
+ f =ρA w
&&
∆x (4)
∆x x=x x=x+
2

Tomando o limite da expressao acima, quando ∆x tende a zero, obtêm-se:

V x = x +∆ x −V x = x
∂V
Lim =
∆ x →0 ∆x ∂x
x = x +∆ x x=x
Lim f = f = f
∆ x →0 x=x x=x

∂2 w
Lim w
&& = &&
w = && =
w (5)
∆ x →0 x=x+
∆x x=x
∂ t2
2

Observe que a primeira das expressões relacionadas na Equação (5) corresponde à


definição de derivada. Com isso, escreve-se a primeira equação de equilíbrio por unidade
de comprimento em sua forma final:

∂V ∂2 w
+ f =ρ A
∂x ∂t2
ou (6)

,
V + f =ρ A w
&&
Fazendo, agora, o balanço de momentos (equação de Euler) em relação ao ponto
G’, obtém-se:

∑M z = I* αz ∴

∆x ∆x (7)
M x = x − M x = x +∆ x + V x=x + V x = x + ∆ x = I * ψ&& ∆x
2 2 x=x+
2

Mais uma vez, a aceleração angular ψ (que é função da posição x) é tomada em


∆x
x = x+ . O momento de inércia mássico I * é avaliado da seguinte forma:
2

I* = ∆ m y2 = ρ ∆ V y2 = ρ A ∆ x y2 = ρ I ∆ x (8)

onde y denota a distância do ponto considerado até a LN. De acordo com a definição de

momento de inércia de área: I = ∫ y 2 dA , onde a área considerada é justamente a área


A

da seção transversal, portanto: I = y 2 A .

∆x 
M x = x − M x = x +∆ x + V + V x = x + ∆ x  = ρ I ∆ x ψ&& (9)
2  x=x  x=x+
∆x
2

Dividindo toda a expressão por ∆x e tomando o limite quando ∆x tende a zero,


tem-se:

M − M x=x 
 x = x +∆ x  ∂M
Lim −  =−
∆ x →0  ∆x  ∂x
 

Lim V x = x + ∆ x = V x = x = V
∆ x →0
∂ 2ψ
Lim ψ&& = ψ&& x = x = ψ&& = (10)
∂ t2
∆ x →0 ∆x
x=x+
2

Novamente, a primeira das expressões relacionadas na Equação (10) corresponde


à definição de derivada. Finalmente, escreve-se a segunda equação de equilíbrio por
unidade de comprimento em sua forma final:

∂M ∂ 2ψ
−V = − ρ I
∂x ∂t2
ou (11)

,
M − V = − ρ I ψ&&

É importante notar que ambas as equações de equilíbrio – Equações (6) e (11) –


estão expressas por unidade de comprimento e, portanto, devem ser integradas ao longo
do domínio (comprimento da viga) para contemplar toda a energia de deformação da
viga.

VIGA DE BERNOULLI-EULER:

A hipótese proposta por Bernoulli-Euler para vigas prevê que as seções


transversais permanecem planas e perpendiculares à LN após deformadas. Além disso,
assume-se a hipótese de pequenos deslocamentos/rotações, o que torna o problema linear
uma vez que desprezam-se os termos não-lineares do tensor de deformações. A Figura 3
mostra a relação geométrica entre a deflexão da viga w ( x, t ) e a declividade ψ ( x, t ) .
x
ψ
x=x+∆x
2
y

u
y
∆x
∆y ψ
G’ x=x+∆x
2

Figura 3 – Relação geométrica para a hipótese de Bernoulli-Euler para vigas.

Escreve-se o deslocamento de um ponto qualquer da superfície neutra original na


direção axial x, denotado por u, em função do ângulo ψ. Note que é tomado um ponto de
ordenada y negativa (acima da LN).

   
  u  
tg ψ ∆x = ∴ u = − y tg ψ ∆x  (12)
 x=x+  −y  x=x+ 
 2   2 

Avaliando, agora, a tg (ψ ) através do outro triângulo retângulo destacado na


Figura 3, envolvendo ∆ x e ∆ y , estabelece-se a relação geométrica entre a deflexão da
viga w ( x, t ) e a declividade ψ ( x, t ) .

 
  ∆y
tg ψ ∆x = (13)
 x=x+  ∆x
 2 

Linearizando o problema, também segundo a hipótese de pequenos


deslocamentos/rotações, tem-se que: tg (ψ ) ≅ sen (ψ ) ≅ ψ . Tomando o limite da Equação
(13), quando ∆ x tende a zero, obtém-se a declividade ψ em função da deflexão w para o
elemento infinitesimal considerado.
Lim ψ ∆x
=ψ x = x =ψ
∆ x →0 x=x+
2

w − w x=x ,
∆y x = x +∆ x ∂w ∂w (14)
Lim = Lim = ∴ ψ = =w
∆ x →0 ∆ x ∆ x →0 ∆x ∂ x x=x ∂x

Substituindo este resultado na Equação (12), obtém-se:

∂w ,
u = − y tg (ψ ) ≅ − y ψ = − y = −y w (15)
∂x

Recorrendo ao tensor de deformações infinitesimais (ou seja, desprezando-se os


termos não-lineares), tem-se para a direção x:

0
1  ∂u ∂u j ∂u ∂u  1  ∂ u1 ∂ u1  ∂ u1
ε ij =  i + + k k 
∴ ε 11 =  + = (16)
2 ∂ x j ∂ xi ∂ xi ∂ x j  2  ∂ x1 ∂ x1  ∂ x1
 

Desta forma, para o problema em questão, a deformação axial na direção x é


∂u
dada por: ε xx = . Utilizando a expressão encontrada para u na Equação (15), tem-se:
∂x

∂u ∂  ∂w ∂ ∂w ∂2 w ,,
ε xx = =  − y  = − y   = − y = −y w (17)
∂x ∂x  ∂x ∂x ∂x ∂ x2

Da definição de momento fletor, neste problema, tomado na direção z, tem-se:


M z = ∫ σ xx y dA . Pela Lei de Hooke que prevê um comportamento linear para
A

sólidos elásticos, tem-se: σ xx = E ε xx . Sendo assim, tem-se:


 ∂ 2 w  ∂2 w
( ) 
M z = ∫ σ xx y dA = ∫ E ε xx y dA = ∫ E − y
 2 
y dA = − E
2 ∫ y 2 dA (18)
A A A  ∂x  ∂x A

Lembrando, ainda, que o momento de inércia de área é dado por: I = ∫ y 2 dA ,


A

obtém-se a expressão final para o momento fletor M z ( x, t ) :

∂2 w ,,
M z = −E I = −E I w (19)
∂ x2

Vale lembrar que, ao se descartar a não-linearidade geométrica em função da


hipótese de pequenos deslocamentos, os dois GDL’s originalmente assinalados – a saber:
a deflexão da viga w ( x, t ) e a declividade da viga ψ ( x, t ) passam a constituir um único
∂w
GDL, já que a relação ψ = permite escrever uma grandeza em função da outra. Isto
∂x
implica a necessidade de apenas uma equação de equilíbrio para descrever o problema.
Sendo assim, considerando esta relação, juntamente com as equações de equilíbrio –
Equações (6) e (11) – faz-se uma manipulação algébrica para a obtenção desta única
equação de equilíbrio em sua forma final.
Para tanto, considere o seguinte artifício: tomando o gradiente da Equação de
Euler na direção x – Equação (11) – (ou dito de outra forma: derivando ambos os
membros desta equação com respeito à variavel x), tem-se:

∂ ∂M  ∂  ∂ 2ψ 
 ∂2 M ∂V ∂  ∂ 2ψ 

 − V  = − ρI ∴ − =− ρI (20)
∂x  ∂x  ∂ x  ∂t2 
 ∂ x2 ∂x ∂ x  ∂ t2 

∂V ∂2 w
Mas, da Equação de Newton – Equação (6) – tem-se: =ρ A −f.
∂x ∂t2

∂w
Além disso, da relação geométrica, tem-se: ψ = . Substituindo ambas as expressões
∂x
na Equação (20) e isolando os termos de inércia no segundo termo, obtém-se:

∂2 M ∂2 w ∂  ∂ 2  ∂ w 
+ f =ρ A − ρ I   (21)
∂ x2 ∂t2 ∂x  ∂ t 2  ∂ x 

Considerando, agora, a expressão para o momento na direção z, obtida na


Equação (19) e, além disto, considerando as propriedades mecânicas (E e ρ) e
geométricas (A e I) constantes

∂4 w ∂4 w ∂2 w
EI − f =ρI −ρ A
∂ x4 ∂ x2 ∂ t 2 ∂t2
ou (22)

, ,, , ,,
EIw −f =ρIw
&& −ρ Aw
&&

Por fim, desprezando-se a inércia de rotação da viga, anula-se o termo

∂4 w
ρI e chega-se à seguinte expressão:
∂ x2 ∂ t 2

∂4 w ∂2 w
EI − f = −ρ A
∂ x4 ∂t2
ou (23)

,,,,
EI w − f = −ρ A w
&&
O objetivo do problema é resolver a EDP dada pela Equação (23) para encontrar a
deflexão da viga w ( x, t ) . De posse desta grandeza, basta derivá-la adequadamente para
obter as outras grandezas. O Quadro 1 apresenta cada uma das grandezas e as suas
relações com w ( x, t ) .

Quadro 1 – Relação das diversas grandezas do problema com a deflexão da viga w ( x, t ) .

Definição e
Grandeza Classificação
Unidade no SI

Deslocamento transversal
w ( x, t )
Deflexão (m) Grandezas

Deslocamento angular Primárias


∂w
ψ ( x, t ) =
∂x Declividade (rad)

∂w Velocidade
v ( x, t ) =
∂t (m/s)

∂2 w Momento Fletor Grandezas


M ( x, t ) = E I
∂ x2 (N.m) Secundárias

∂3 w Esforço Cortante
V ( x, t ) = E I
∂ x3 (N)

Carregamento por
∂4 w ∂2 w Equação
f ( x, t ) = E I +ρ A Unidade de Comprimento
∂ x4 ∂t2 de Governo
(N/m)

Este problema apresenta cinco variáveis de estado – duas variáveis primárias e três
variáveis secundárias de acordo com o Quadro 1:
(o único GDL do problema é o deslocamento transversal da viga w)

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