Você está na página 1de 4

Carlos Alberto da Mota Pinto – Teoria Geral do Direito Civil, 3.

ª
Ed., Coimbra: Coimbra Editora, 1985, p. 224-225

«O direito de invocar a anulabilidade é precludido pelo comportamento


malicioso (malitia supleat aetatem) do menor, no caso de este ter usado
de dolo ou má fé a fim de se fazer passar por maior ou emancipado (art.
126.º). Entendemos que, nesta hipótese do artigo 126.º ficam inibidos de
invocar a anulabilidade, não só o menor mas também os herdeiros ou o
representante. O especial merecimento da tutela da contraparte, que está
na base da preclusão do direito de anular implica que todos os legitimados
sejam inibidos de exercer o direito de anulação. Não nos parece coerente
com a “ratio” do preceito, nem dotada de justificação aceitável, a solução
que pretende só se aplicar ao menor — e não já ao seu representante — a
preclusão estabelecida no artigo 126.º. No caso de o menor ter usado de
dolo para se fazer passar por maior, a lei considera não existir — ou estar
atenuado — o ónus geral de diligência do contratante que está em face do
menor, donde resulta não ser invocável a anulabilidade, seja por quem for.

Por outro lado, não basta, que o menor declare ou inculque ser maior. São
necessários artifícios, manobras ou sugestões de carácter fraudulento».

José de Oliveira Ascensão – Direito Civil: Teoria Geral, Vol. 1, 2.ª


Ed., Coimbra: Coimbra Editora, 2000, p. 186-187

«O menor pode, dolosamente, fazer-se passar por maior ou emancipado.

A lei sanciona o dolo, fundada no entendimento natural do menor: este


não poderá invocar a anulabilidade do acto. E da mesma forma não o
poderão fazer os seus herdeiros, pois ficam colocados no lugar do menor.

Discute-se porém se os representantes do menor continuam a poder


actuar a anulabilidade. Nega-o Mota Pinto, considerando que o dolo
atenua o ónus da outra parte de verificar se aquele com quem contrata é
maior. Mas isso pressupõe que a ratio do preceito é a tutela da outra
parte. Se for porém sancionar o menor, já as consequências podem ser
diferentes.

O art. 126.º não diz que cessa anulabilidade; diz que o menor não a pode
invocar, o que significa que o acto continua anulável. Mas não teria
sentido uma anulabilidade que ninguém pudesse invocar. Por outro lado, o
fundamento geral da incapacidade, que é a presunção de não haver
suficiente entendimento e vontade, é incompatível com o afastamento
dessa incapacidade por um acto do menor, que justamente se presume
não ser dotado de entendimento e vontade suficientes. Diríamos assim
que a lei apenas pretendeu excluir a actuação pessoal do menor, mas não
dos seus representantes.

Isso teria como consequência que a impugnabilidade do acto cessaria


assim que cessasse a representação. Portanto, que a anulabilidade
deixaria de ser invocável assim que o menor atingisse a maioridade. O
que por si implica um reforço da posição da outra parte».

António Menezes Cordeiro – Tratado de Direito Civil Português,


Vol. 1, Tomo III, 2.ª Ed., 2007, Coimbra: Almedina, p. 452

«O menor não pode, porém, invocar a anulabilidade quando tenha usado


de dolo para se fazer passar por maior ou emancipado – 126.º. O dolo aqui
referido corresponde a “... qualquer sugestão ou artifício que alguém
empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o
autor da declaração” – 253.º/1. Exige-se, naturalmente, que tais “sugestão
ou artifício” sejam eficazes e, em abstracto, idóneas para produzir engano
quanto à idade do menor. Na prática, deverá tratar-se de falsificação de
um documento de onde conste a idade: qualquer pessoa que contrate com
um jovem terá, como precaução mínima, de lhe pedir o bilhete de
identidade. O artigo 126.º corresponde a um afloramento da regra
expressa pela locução tu quoque.

O artigo 125.º/1, c), permite, como vimos, aos herdeiros do menor invocar,
em certos prazos, a anulabilidade. Pensamos que não poderão fazê-lo
quando o próprio menos esteja incurso no artigo 126.º: dolo quanto à
idade ou emancipação. Na verdade, não podem os sucessores receber
algo que nunca tivesse pertencido ao de cuius.

Já nenhuma razão existe para que o representante legal do menor doloso


não possa invocar a anulabilidade, nos prazos que lhe competem: estamos
fora do tu quoque».
Pires de Lima e Antunes Varela – Código Civil Anotado, Vol. 1, 4.º
Ed., Coimbra : Coimbra Editora, 1987, p. 139-140

«A impossibilidade anulação por parte do menor (que constitui um


exemplo da aplicação prática da condenação no abuso do direito: Cunha
de Sá, Abuso do Direito, n.º 22, págs. 158 e segs.]) impede também que o
acto seja anulado pelos seus herdeiros, mas não que o seja pelas
entidades a que se refere a alínea a) do n.º 1 do artigo anterior. Os
herdeiros são continuadores do de cujus, devendo ser pautada pela
legitimidade deste a legitimidade daqueles. Quanto, porém, aos pais,
tutores ou administradores, não há razão para lhes coartar o direito à
anulação do acto do menor só porque este usou de dolo para se fazer
passar por maior. É a solução que resulta do texto deste artigo, já que
apenas se retira a legitimidade ao menor e não aos seus representantes
legais. Vide todavia em sentido contrário, Mário de Brito, Código Civil
Anotado, artigo 126.º»

Mário de Brito – Código Civil Anotado, 1967, p. 138-139

«Mas será apenas o menor que não tem esse direito [de invocar a
anulabilidade]? Ou deverá entender-se que também o pai, o tutor ou o
administrador de bens, ou qualquer herdeiro do menor, não pode invocar
a anulabilidade, no caso de ter havido dolo da parte deste?

No segundo sentido se pronunciava o Prof. Manuel de Andrade, à face de


preceito idêntico do Código de 1867 (art. 299.º, n.º 2), ao escrever que
“são válidos os negócios que ele (menor) tenha concluído... usando de
dolo para se fazer passar por maior, isto é, si malitia supleat aetem”. E
parece dever ser essa a orientação a seguir em face do novo preceito,
visto o pai, tutor ou administrador de bens, ou qualquer herdeiro do
menor, agir como representante deste».

Fernando Cunha de Sá – Abuso do Direito, Coimbra: Almedina,


Reimp., 1997, p. 158-162

Quanto à possibilidade de os representantes do menor poderem arguir a


anulabilidade do negócio, Cunha de Sá tem um entendimento diferente do
exposto em cima, distinguindo os casos em que a anulabilidade sirva
apenas os interesses do menor dos casos em que sirva não só estes, mas
também os interesses do próprio representante. O Autor dá como exemplo
a celebração pelo filho menor de um contrato de compra e venda relativo
a bens sobre os quais o pai tenha usufruto. Segundo o Autor, ao arguir a
anulabilidade deste negócio, o pai está a salvaguardar não só o interesse
do menor (proprietário do bens), mas também o seu interesse próprio
(decorrente do usufruto sobre esses mesmos bens).

Assim, defende Cunha de Sá que o pai pode arguir a anulabilidade do


negócio quando tenha nisso um interesse directo, mas já não quando
estejam em causa apenas os interesses do menor que actuou
dolosamente: «julgo que a proibição do acto abusivo (...) ou até a mera
interpretação extensiva do artigo 126.º devem levar a optar pela
verdadeira paralização (sic) da anulabilidade».

Por fim:

No sentido ainda de a anulabilidade não poder ser invocada nem pelos


herdeiros nem pelos representantes legais, vide o manual do Prof.
Carvalho Fernandes (p. 320-322, na 3.ª edição de 2001).
No sentido de tal limite não se repercutir sobre os representantes legais,
vide ainda Hörster – A parte geral do código civil português, 1992, p. 330-
331.

Você também pode gostar