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SALA DE ESTUDO - COMUNICAÇÃO EMPRESARIAL

10. Crise de Imagem

Administração de crises: a importância da comunicação

por Carolina Rodriguez é jornalista, mestranda em Comunicação Social na UMESP

Definindo Crise

Muito se fala sobre administração de crises hoje em dia, mas poucas organizações adotam os princípios
dessa prática, principalmente no que diz respeito à comunicação. Durante uma crise, a empresa deve
manter os colaboradores, clientes, acionistas, fornecedores, imprensa, grupos de pressão, sociedade e
governo informados sobre o problema ocorrido e as ações que estão sendo tomadas para solucioná-lo.
Qualquer falha nessa comunicação pode gerar novas crises ou destruir a imagem da corporação.

De acordo com Lopes (apud FORNI, 2002, p.363), "qualquer coisa negativa que escape ao controle da
empresa e ganhe visibilidade" pode se tornar uma crise. Em entrevista a jornalista Cynthia M. Luz, o
consultor norte-americano John Birch, que assessorou a Union Carbide no desastre de Bhopal, na Índia,
quando morreram milhares de pessoas, definiu crise como "um evento imprevisível, que, potencialmente,
provoca prejuízo significativo a uma organização ou empresa e, logicamente, a seus empregados, produtos,
condições financeiras, serviços e à sua reputação [...]" (LUZ, 1993, p.9-12).

Mitroff acrescenta o peso da falha humana em uma crise:

"Em contraste com os desastres naturais, sobre os quais freqüentemente temos pouco controle, falhas
humanas provocam crises em função de ações ou de inações impróprias [...]. Em princípio, falhas humanas
podem ser previstas e, exatamente por esse motivo, o público se sente escandalizado quando ocorrem [...]
(apud ROSA, 2001, p.21).

Caldini afirma que um simples boato pode se transformar em uma crise:

"No primeiro estágio da crise, acontece a simplificação do boato. Uma grande história resumida. No
segundo estágio ocorre o exagero. Os detalhes mais agudos são aumentados e a história ganha
dramaticidade. No terceiro estágio, a opinião pública interpreta o boato de acordo com a sua visão de
mundo, com os seus valores. Nesse momento, se não se gerenciou a crise, os efeitos podem ser
devastadores." (CALDINI, 2000, p.116-118).

Porque as crises acontecem

Todas as organizações estão vulneráveis a crises. A diferença é que algumas, mais preparadas,
principalmente do ponto de vista da comunicação, administram melhor os problemas. Outras deixam que os
fatos, ou boatos, destruam a sua reputação. "A maioria das crises de imagem, se bem administrada, pode
ser superada [...]" (FORNI, 2002, p.363).

Segundo Rosa (ROSA, 2001, p.132-134), as crises podem ser dos seguintes tipos:

" desastres industriais - explosões, incêndios, contaminações.


" desastres naturais - tempestades, enchentes, desmoronamentos.
" falhas em equipamentos ou construções - colapso na rede de computadores, queda de um edifício,
defeitos em produtos industriais.
" de origem criminosa - sabotagem, seqüestros, fraudes, vandalismo.
" de natureza econômica - boicotes, greves, desvalorização das ações.
" de informação - boatos, intrigas, acusações de concorrentes.
" de natureza legal - ações judiciais contra a empresa, pedidos de indenização.
" de reputação - denúncias de corrupção, vazamento de documentos internos.
" de relações humanas - sucessão no comando da organização, demissão de altos executivos, denúncias
de funcionários.
" que envolvem risco para a vida - acidentes de trabalho, grandes contaminações.
" regulatórias - criação de obstáculos fiscais, legislação.

Uma característica comum a todas essas crises é que elas não têm local fixo para acontecer. Um desastre
ambiental no Brasil, por exemplo, é noticiado também em outros países, e em tempo real. Como diz Mitroff,
no passado, as crises se limitavam ao âmbito da comunidade. Hoje, qualquer acidente interfere nas
condições ambientais, sociais ou econômicas do planeta (apud FORNI, 2002, p.367).
Para Rosa, "[...] as crises só existem porque vivemos num mundo tão interligado que um problema que, em
princípio, diria respeito apenas a uma empresa ou a uma comunidade distante pode adquirir imediatamente
uma dimensão muito maior [...]" (ROSA, 2001, p.24).

Por conta desse aspecto global das crises, as empresas devem preparar um plano de administração de
crises também global, que permita informar todos os públicos envolvidos em tempo real.

Outro fato comum às crises é que elas repercutem rapidamente na mídia, por conta do sensacionalismo
que podem representar para os veículos de comunicação e do espetáculo que podem se transformar para a
sociedade. Forni diz que as crises alimentam a pauta diária da mídia (FORNI, 2002, p.367-368).

As grandes crises de imagem oferecem a oportunidade para os veículos de informação travarem uma
batalha num campo comum (a crise), utilizando armas semelhantes (a capacidade de investigação, de
aprofundamento do tema), para que, ao final do desafio, o melhor acabe vencendo (ROSA, 2001, p.25).

Nessa corrida por uma informação nova, ou simplesmente pelo melhor ângulo do espetáculo, a imprensa
acaba cometendo alguns erros, como, por exemplo, o famoso caso da Escola Base, em 1994, e as
denúncias sobre a compra de bicicletas superfaturadas pelo ministro Alceny Guerra, no governo Collor.

Como administrar uma crise de imagem

Existe uma regra básica com a qual todos os autores concordam: prevenir ainda é a melhor forma de
administrar uma crise de imagem. O primeiro passo é criar um comitê de gerenciamento de crise, de
preferência antes que o problema aconteça. Esse comitê deverá apontar os possíveis problemas aos quais
a organização está vulnerável e as ações que deverão ser tomadas caso aconteçam.

O comitê de gerenciamento de crise deve ser composto por representantes de diferentes áreas da
organização, ligados diretamente à diretoria. Durante a crise, é importante que as decisões tomadas e,
conseqüentemente, as ações necessárias sejam repassadas aos responsáveis das áreas envolvidas
rapidamente. A comunicação também deve ser feita de forma ágil.

A escolha das pessoas que formarão o comitê depende do perfil da organização. Uma indústria química,
por exemplo, deve acionar a área de segurança ambiental para resolver problemas relacionados a
vazamentos ou contaminações, assim como uma construtora deve acionar o departamento de engenharia
no caso de falhas nos empreendimentos.

Caponigro (apud ROSA, 2002, p.135) diz que o comitê de gerenciamento de crise deve ser formado pelos
seguintes integrantes da organização: presidente; coordenador; diretor de relações públicas ou
comunicação; diretor de recursos humanos; diretores das divisões corporativas; representante da área de
operações; representante da área de segurança, segurança industrial ou segurança médica; representante
da área de qualidade; gerente industrial, e consultor externo.

Outro procedimento com o qual todos os autores concordam é a escolha de um porta-voz. O ideal é que
todas as informações sobre o problema sejam transmitidas à imprensa por uma única pessoa. Desta
maneira, a organização evita que informações incorretas ou desencontradas sejam repassadas para a
mídia. Falhas na comunicação durante esses processo podem gerar novas crises.

O porta-voz deve conhecer profundamente a empresa e o problema. Deve saber expressar-se, passar
credibilidade ao falar, manter-se calmo mesmo sob forte pressão e ter sido treinado para lidar com a
imprensa (FORNI, 2002, p.375).

O que fazer na Hora H

Caldini relaciona algumas posturas que devem ser tomadas pelo porta-voz durante a crise (CALDINI, 2000,
p.116-118):

" Não falar sem antes saber de fato o que aconteceu. Se for o caso, declare à imprensa que você vai se
informar e logo voltará a falar.
" Volte e fale. Se você não falar, alguém vai falar por você, só que não necessariamente a verdade.
" Efeito avestruz não ajuda. O que você prefere: um fim horroroso ou um horror sem fim?
" Nunca minta. Se você mentir e descobrirem que você mentiu, nada mais importa: você será o culpado.
" Não negligencie seu público, principalmente a imprensa. Respeitados e bem informados, eles podem ser
seus aliados.
" Assegure-se de estar sendo compreendido ao falar com a imprensa. Cuidado com termos técnicos e
evasivos.
" Não especule, não brinque, não subestime. Trate de ser identificado como uma pessoa honesta.
" Jamais diga "sem comentários", "nada a declarar", "estou sendo injustiçado", "não é problema meu" e "me
respeite". Isso só agrava a situação.
" Não ignore sinais de alerta. Resolva todos os problemas potencialmente graves antes de se tornarem
crises.
" Ter razão em crises não significa vencer. A questão é de imagem e não apenas de leis.

O papel da comunicação na administração de crises

O departamento de comunicação das organizações tem papel fundamental durante o processo de


administração de crises. Como falamos anteriormente, as empresas que transmitirem as informações sobre
o problema ocorrido e as ações tomadas pela empresa para resolvê-lo de forma correta e eficiente superam
as crises sem arranhar a sua imagem.

Em alguns casos, quando as organizações possuem várias plantas, é necessário montar uma redação -
com computador, fax, telefone, rádio, televisão - na diretoria onde as decisões estão sendo tomadas para
agilizar o processo de comunicação. Quando a empresa pertence ao setor de prestação de serviços e a
crise afeta o fornecimento, é conveniente contratar um call center para fazer o atendimento ao público.

A imprensa deve ser bem atendida e abastecida. O porta-voz deve, na medida do possível e dependendo
do tamanho da crise, atender às solicitações de entrevistas dos veículos. Os profissionais do departamento
de comunicação devem atualizar os boletins e divulgá-lo diariamente.

É importante monitorar a mídia e corrigir eventuais erros para que não haja novas crises. Os demais
públicos - colaboradores, clientes, acionistas, fornecedores, grupos de pressão, sociedade e governo -
também devem ser mantidos informados e suas reações, acompanhadas.

Cases

O caso Tylenol

O caso Tylenol, ocorrido em 1982, é um bom exemplo de administração de crises até hoje. O medicamento
foi adulterado com cianeto, matando sete pessoas nos Estados Unidos. Apesar do grave problema, a
imagem da Johnson & Johnson não foi afetada.
Birch (apud LUZ, 1993, p.9-12) diz que o modo como a crise foi administrada pela empresa é considerado
um modelo a ser seguido. A diretoria assumiu a responsabilidade, auxiliou as pessoas afetadas e não
sonegou informações à imprensa, pelo contrário, tratou-a como parceira na divulgação dos fatos.

O que a Johnson & Johnson fez:

" Foi à imprensa e divulgou que o medicamento foi adulterado.

" Solicitou à população que o uso do Tylenol em versão cápsulas fosse suspenso.

" Recolheu todo o estoque do medicamento dos hospitais, farmácias e demais pontos de venda.

" Deu subsídio aos hospitais caso algum caso de envenenamento fosse registrado.

" Ofereceu aos consumidores a opção de trocar o medicamento em cápsulas que tivessem em casa pela
versão em tabletes, que não podia sofrer sabotagem.

" Ofereceu prêmio em dinheiro a quem pudesse dar informações sobre o adulterador

Resultados: as explicações dadas pela empresa sobre o ocorrido foram bem aceitas pela imprensa.
"Comprovando a confiança que a Johnson & Johnson merecia, o setor de Relações Públicas da empresa
catalogou mais de 125 mil recortes de jornais, com notícias sobre o caso Tylenol, todos eles favoráveis"
(MORAES, s.d.).
Moraes lembra ainda que, na época do ocorrido, o Tylenol em versão cápsulas abastecia 35% do mercado
norte-americano de analgésicos vendidos em balcão. As vendas representavam US$ 450 milhões por ano e
15% dos lucros da Johnson & Johnson. Foram recolhidos 31 milhões de unidades, um prejuízo de US$ 50
milhões.
O caso TAM

Na manhã do dia 31 de outubro de 1996 uma pane elétrica derrubou um avião Fokker-100 da TAM
segundos depois de decolar do aeroporto de Congonhas, em São Paulo. A aeronave caiu a dois
quilômetros de distância da cabeceira da pista, atingindo 20 casas. O acidente resultou na morte de 99
pessoas, sendo 90 passageiros, sete tripulantes e duas pessoas que estavam em terra (FALCO, 2003,
p.35-68).

O que a TAM fez, segundo Falco:

" A empresa não parou de operar.

" Disponibilizou todas as linhas telefônicas da empresa, que geralmente recebiam reclamações e
sugestões, para atender as famílias das vítimas.

" Alugou um hotel próximo ao aeroporto para acomodar as famílias das vítimas, que receberam também
suporte emocional da companhia.

" Concedeu entrevista coletiva menos de quatro horas depois do acidente.

" Apurou rapidamente as causas do acidente: o problema foi detectado uma semana depois e o resultado
oficial, publicado um mês depois do acidente.

" A TAM não divulgou a lista com os nomes das vítimas, sem antes informar e confortar todos os familiares.

" Para conter os boatos, a empresa divulgou boletins oficiais a cada 12 horas, mesmo que tivesse que
repetir 100% o conteúdo do anterior.

" Apesar de toda a assistência oferecida pela TAM às famílias das vítimas, algumas ainda brigam na justiça
por uma indenização maior.

O que o departamento de comunicação da TAM fez:

" Tirou a empresa da mídia, suspendendo todas as peças publicitárias em veiculação.

" Participou da concorrência para a escolha da companhia aérea que transportaria do presidente da
República, Fernando Henrique Cardoso, como ação institucional ... e venceu.

Resultados: em julho de 1997, recebeu o prêmio "Melhores e Maiores", da revista Exame, pela habilidade
de lidar com a crise (FALCO, 2003, p.35-68).

Referências Bibliográficas

BREITINGER, Jacqueline. A arte de apagar incêndios. Exame. São Paulo, v.32, nº 15, p. 118-119, julho
1998. O texto, acessado em maio de 2005, está disponível em:
http://www.portal-rp.com.br/bibliotecavirtual/relacoespublicas/administracaodecrises/
0120.htm.

CALDINI, Alexandre. Como gerenciar a crise. Exame. São Paulo, v.34, nº2, p.116-18, janeiro 2000. O texto,
acessdado em maio de 2005, está disponível em:
http://www.portal-rp.com.br/bibliotecavirtual/relacoespublicas/administracaodecrises/
0087.htm.

CORREA, Cristiane. Para sair do pesadelo. Exame. São Paulo, v. 35, nº7, p.44-45, abril de 2001. O texto,
acessado em maio de 2005, está disponível em:
http://www.portal-rp.com.br/bibliotecavirtual/relacoespublicas/administracaodecrises/
0116.htm.

FALCO, Luiz Eduardo. Vencendo a turbulência. In: ROSA, Mário. A era do Escândalo - Lições, relatos e
bastidores de quem vivenciou as grandes crises de imagem. São Paulo, Geração, 2003, p.35-68.

FORNI, João José. Comunicação em tempo de crise. In: DUARTE, Jorge. Assessoria de imprensa e
relacionamento com a mídia - Teoria e técnica. 2a. ed. São Paulo, Atlas, 2003, p.363-388.

LUZ, Cynthia M. Como sobreviver na crise sem crise. Propaganda. São Paulo, nº 486, p.9-12, agosto de
1993. O texto, acessado em maio de 2005, está disponível em:
http://www.portal-rp.com.br/bibliotecavirtual/relacoespublicas/administracaodecrises/
0088.htm.

MOARES, Mario. Caso Tylenol: um bom exemplo de RP. Disponível em:


http://www.portal-rp.com.br/bibliotecavirtual/relacoespublicas/administracaodecrises/
0089.htm Texto acessado em maio de 2005.

ROSA, Mário. A Síndrome de Aquiles - Como lidar com as crises de imagem. São Paulo, Editora Gente,
2001.

TORQUATO, Gaudêncio. A tragédia de Bhopal. Revista ADM. São Paulo, p. 12, fevereiro de 1985. O texto,
acessado em maio de 2005, está disponível em:
http://www.portal-rp.com.br/bibliotecavirtual/relacoespublicas/administracaodecrises/
0041.htm.

Crises Empresariais

Prevenção, Administração e Recuperação


por Waltemir de Melo

Nem sempre cumprir todos os procedimentos legais evita as crises

Sempre que possível procuramos fazer uma distinção conceitual entre o trabalho
do comunicador e do advogado nos processos de administração de crises. Enquanto
os comunicadores fazem uma corrida de obstáculo de 100 metros, os advogados
praticam uma corrida de fundo de 10.000 metros. Enquanto este procura garantir, a
qualquer custo, a vitória da organização em uma demanda jurídica, os
comunicadores trabalham para manter a harmonia dos relacionamentos das
organizações com seus públicos preferenciais. Seu objetivo, nos momentos de crise,
é garantir o menor dano à imagem da empresa, evitando que aspectos negativos
possam ferir seus principais quesitos de sobrevivência que são a credibilidade, a
reputação e a confiabilidade.
Esta conduta dos comunicadores nos processos de administração de crises coloca em
dúvida a posição assumida por muitas organizações quanto à suficiência do
cumprimento dos procedimentos legais quando se deseja trabalhar preventivamente
para evitar ou reduzir os impactos das crises empresariais.
Certamente, o mínimo que se espera de qualquer organização é que ela cumpra
todos os procedimentos legais de sua esfera de negócio. Contudo, com a ampliação
da vulnerabilidade das empresas registradas nos últimos anos, isto já não basta. A
própria legislação, particularmente a ambiental, já não dá esta garantia. A Lei da
Política Nacional de Meio Ambiente, de número 6938-81, estabelece que mesmo
cumprindo os standards da utilização de produtos nocivos ao meio ambiente, caso
haja poluição, a empresa será responsabilizada civil e criminalmente, juntamente
com seus gestores.
Os exemplos de que não basta apenas "andar na linha" têm aparecido com
frequência. Um deles, que aconteceu no início de 2.003, foi o caso do Grupo Saint-
Gobain, o sócio majoritário da Eterbrás Tecnologia Industrial, "joint-venture" entre a
Brasilit e a Eternit, para a produção de caixas d'água e telhas de fibrocimento.
Com a proibição na Europa da utilização de amianto, produto altamente
cancerígeno, o Grupo Saint-Gobain deu início à substituição desta matéria-prima por
outras, descontinuando fábricas em várias partes do país. Uma delas, localizada em
um terreno de 300 mil m2, em Senador Camará, Zona Oeste da cidade do Rio de
Janeiro, teve sua produção paralisada em 1.992. Em 2.000, a empresa desenvolveu
um projeto de manuseio dos resíduos industriais, tendo contratado para isto a ERM
Alpha, empresa de reconhecida reputação internacional.
Este projeto, aprovado pela Feema (Fundação Estadual de Engenharia de Meio
Ambiente), consistiu na preparação de um aterro que ocupava 21 mil m2 para
armazenamento daqueles resíduos industriais. Uma vez terminado o trabalho, a área
foi coberta, ajardinada e protegida por seguranças da empresa. Tudo perfeito. Tudo
atendendo a boa técnica. E tudo ficaria assim, como acontece em outras unidades da
empresa, caso não ocorresse um desencontro entre as autoridades municipais do Rio
de Janeiro.
Com exceção da área do aterro de 21 mil m2, o terreno fora desapropriado pela
prefeitura carioca para a construção de uma área de lazer. Contudo, não se sabe
porque, a atual administração resolveu desapropriar toda a área. Denúncias
anônimas levaram policiais da DPMA (Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente) a
fiscalizar o local. Tudo o que aconteceu depois demonstrou o despreparo da empresa
em lidar com um problema que era de seu domínio desde 1.992. O primeiro erro foi
cometido pelos seguranças da empresa que não quiseram permitir o acesso dos
policiais do DPMA ao local. Eles foram algemados e imediatamente detidos. O
segundo foi marcado pelo estado de surpresa do gerente da empresa responsável
pelo local. Sem saber o que fazer, foi filmado pedindo instruções pelo telefone
celular. Deu entrevista para a TV demonstrando absoluta surpresa com tudo o que
estava acontecendo. Se não bastasse "atacou a Feema", como disse uma jornalista,
para se defender, sem apresentar qualquer prova que sustentasse sua correta
argumentação.
Informações internas dão conta que a empresa somente conseguiu reagir ao fato
organizadamente muito tempo depois quando encaminhou um "press-release" às
redações dos jornais do Rio de Janeiro. Esta ação, contudo, não teve a força
suficiente para evitar manchetes como: "Terreno tem 60 mil toneladas de lixo
tóxico" - O Globo, "Terreno tem material tóxico e cancerígeno" - Folha de São Paulo
e "Amianto é achado na Zona Oeste - Denúncia levou a material tóxico" - Jornal do
Brasil.
Se tudo foi feito corretamente, seguindo as normas da legislação ambiental, porque
tudo aconteceu como se a empresa fosse uma vilã?
As respostas estão em qualquer manual de crises minimamente bem preparado. A
empresa não levou em conta que um passivo ambiental, mesmo solucionado é como
um esqueleto no armário. Um dia ele vai aparecer. Também não considerou que
quem tem ou teve um passivo ambiental sempre terá que responder por ele ou
poderá ser refém de alguém se não tiver uma boa resposta corretamente elaborada e
ensaiada. E, por fim, não avaliou e não simulou, dentro de um cenário crítico, quais
os problemas que poderia enfrentar junto aos seus públicos preferenciais caso o seu
passivo ambiental ultrapassasse as fronteiras de seus domínios. Ou seja, não previu e
não preparou seus porta-vozes e outros profissionais, inclusive os de comunicação e
seus seguranças, para enfrentar uma crise junto a alguns de seus públicos
preferenciais (imprensa, autoridades ambientais e comunidade) de onde, certamente,
partiu a denúncia.
Assim, com este exemplo esperamos mais uma vez ter contribuído para alertar que a
administração de crises não é um evento, é um processo (tem começo, meio e fim)
que exige preparação prévia. Finalmente, é importante ressaltar, que muitas crises
têm origem em pressupostos errados ou no tratamento com displicência de assuntos
graves que se supõe ter controle absoluto. Apenas seguir as recomendações legais,
principalmente nos casos dos passivos ambientais, é como se instalar ou criar uma
zona de conforto sobre um vulcão. Certamente, um dia ele entrará em erupção

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