Você está na página 1de 6

Esporte dá a deficiente autonomia, além de

força
Avaliação prévia é necessária; prática ajuda corpo e mente,
dizem médicos

Estimulados pela prática de exercícios, ex-pacientes se


envolvem com os esportes e acabam se transformando até em
atletas profissionais

DA EDITORIA DE TREINAMENTO

Após três anos de exercícios de reabilitação,Thiago de Oliveira, 31,


soube, por uma amiga de sua mãe, do projeto de esportes
adaptados da Unicamp.

Sem movimentos do tórax para baixo, devido a uma lesão medular,


tentou natação e chegou a praticar seis meses de handebol, mas
sentiu mais afinidade com o basquete em cadeira de rodas.
Gostou tanto da modalidade que hoje é atleta profissional e até
representou o Brasil na Paraolimpíada de Atenas.

Mesmo que no primeiro momento o deficiente procure o exercício


físico por recreação ou como complemento a algum tratamento
médico, muitos se tornam atletas, afirma a professora Elisabeth de
Mattos, do Grupo de Estudos em Esporte para Pessoas Portadoras
de Deficiência da USP.

O professor José Irineu Gorla, do Departamento de Estudos da


Atividade Física Adaptada da Unicamp, afirma que a dificuldade em
encontrar academias adaptadas leva os deficientes a centros
específicos de treinamento. "Eles viram atletas, é inevitável."

Foi o que aconteceu com André Brasil, nadador que voltou da


Paraolimpíada de Pequim com cinco medalhas, sendo quatro de
ouro. André, que tem uma pequena seqüela de poliomielite na
perna esquerda, fez fisioterapia na piscina do prédio até os nove
anos.

Por essa época, começou a competir, sempre com atletas não-


deficientes. Somente em 2006, foi enquadrado na categoria S10,
para atletas com menor grau de deficiência física.

Para o atleta, a prática de esporte lhe rendeu mais que o ouro


olímpico. "Se eu não tivesse a natação hoje, talvez eu tivesse mais
problemas musculares, de coluna, de deslocamento. Se você me
comparar a pessoas que tiveram a mesma coisa que eu tive, eu sou
hoje uma das pessoas mais bem reabilitadas no nosso país."

Exemplos como o de André Brasil incentivam os deficientes a


praticar esportes. Para Eliane Miada, uma das fundadoras da ADD
(Associação Desportiva para Deficientes), o efeito da divulgação do
esporte durante as Paraolimpíadas é percebido nos meses
seguintes.

Após oito anos de sua fundação, em 1996, a associação tinha


apenas 140 atletas no basquete, natação e atletismo, modalidades
mais procuradas. Dois meses depois, após a 1ª Paraolimpíada, em
Atenas, esse número havia aumentado em 20%. Neste ano, antes
dos jogos na China, o número de inscritos era de 389. Até quinta
passada, apenas um mês e três dias depois, esse número já
cresceu 17%.

Livre para escolher

Qualquer pessoa com deficiência pode praticar esportes. "Para


experimentar, desde que não seja em nível competitivo, dá para
fazer tudo. Até para atividades de impacto já existem equipamentos
que diminuem os efeitos", explica a professora da USP. No caso do
atletismo, por exemplo, o deficiente pode usar próteses com silicone
para amortecer impactos.

É recomendada, antes de começar qualquer prática esportiva, a


realização de exames de rotina. Em segundo lugar, é indicada uma
avaliação com um médico do esporte, que poderá sugerir a
atividade mais adequada e informar sobre as adaptações
necessárias e os cuidados (veja quadro ao lado).

Para Beny Schmidt, chefe do laboratório de Patologia


Neuromuscular da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), "o
importante é que o próprio deficiente também diga para qual
esporte ele está mais bem adaptado de acordo com sua sensação
de bem-estar".
"Perdi a vergonha"

Vilma Miranda, 41, escutou os tiros e caiu no chão. Estava a


caminho de casa, no bairro Cachoeirinha (zona norte). Uma bala
perdida perfurou sua vértebra torácica T12 e a deixou sem os
movimentos das pernas.

Nos primeiros cinco anos após o acidente, fez apenas fisioterapia


de forma irregular. Dependia "dos outros" para se locomover. Da
Divisão de Medicina e Reabilitação do Hospital das Clínicas,
recebeu o convite: e se experimentasse jogar basquete?

Dezesseis anos depois das primeiras batidas de bola em quadra,


Miranda faz o balanço: com o basquete, aprendeu a "cair, levantar,
sair na rua". Voltou a trabalhar e a estudar. Especialistas ouvidos
pela Folha apontam o aumento da auto-estima e a melhoria da
coordenação motora como maiores benefícios dos esporte.

"Quando comecei a fazer basquete, pedia ajuda para passar de


uma cadeira para outra. Jogando, você começa a querer competir,
pega força no braço. A gente perde a vergonha de subir sozinha no
ônibus ou de pedir ajuda", conta Vilma.

José Irineu Gorla, autor de quatro livros sobre esporte adaptado -o


último lançado neste ano, "Educação Física Adaptada - O passo a
passo da avaliação"- aconselha que se comece o mais cedo
possível. O mais indicado seria realizar esporte todos os dias,
durante pelo menos uma hora.

Beny Schmidt, da Unifesp, exemplifica como uma pessoa com


poliomieliete pode somar à atrofia causada por danos nos nervos
uma atrofia por desuso: sem atividade física, começa a perder
massa muscular. A partir da inatividade, pode predispor várias
doenças secundárias, como as ligadas ao aparelho circulatório ou à
obesidade.

O professor Gorla ainda lista como benefícios a melhoria na postura


-especialmente para cegos, que costumam andar com a cabeça
baixa- e o ganho de independência. "Isso pode se traduzir em
visibilidade para o mercado de trabalho."
(NANCY DUTRA, NATÁLIA PAIVA e VANESSA CORREA)

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2410200829.htm

--------------------------------

Paraolimpíada faz procura crescer, mas sobram


vagas para deficientes atletas
DA EQUIPE DE TREINAMENTO

Após a Paraolimpíada de Pequim, na qual o país ganhou 16


medalhas de ouro, a busca pela prática de esportes teve de
aumento de até 40% em algumas instituições não-governamentais
de São Paulo que têm o esporte para deficientes como foco
principal.

Para o atleta Anderson Ferreira, do Grêmio Recreativo


Independente de São Paulo: Águias da Cadeira de Rodas, a
participação em Pequim de atletas da instituição no basquete em
cadeira de rodas atraiu outros atletas.

O aumento na procura foi de 40%, segundo Ferreira. "As pessoas


reconheceram que nós fazemos um trabalho sério e nos
procuraram. O que nós tentamos mesmo é que as pessoas sejam
mais felizes."

Segundo Helder Araújo, presidente do Centro de Emancipação


Social e Esportiva de Cegos, localizado na Vila Prudente (zona
leste), a Paraolimpíada serviu para divulgar a prática do esporte que
é desconhecida por muitos deficientes.

"Nós tivemos um aumento considerável de 20% na procura, mas


muitas pessoas ainda não sabem que podem praticar esportes". A
instituição oferece gratuitamente a prática de esportes como judô,
natação, atletismo, goalball (tipo de handball para deficientes
visuais) e futsal.

Sobram vagas

A falta de divulgação não é a única razão para a baixa procura da


prática de esportes por deficientes em São Paulo. Superproteção
das famílias com as pessoas com deficiência, dificuldade com
transporte até o clube e desilusão são algumas das causas,
segundo o presidente do Clube dos Paraplégicos de São Paulo,
João Antônio Bentim, que oferece dez modalidades de esportes
adaptados a 400 pessoas, mas apenas metade das vagas está
preenchida.

O clube completa 50 anos de fundação este ano e está localizado


na Vila Clementino (centro), onde oferece dez modalidades para
deficientes.

A 700 metros dali, a sede central da AACD (Associação de


Assistência à Criança Deficiente) utiliza o esporte como parte do
processo de tratamento do paciente, depois de triagem e
atendimento médico. O esporte é desenvolvido inicialmente como
uma terapia, mas, identificados os talentos, esses pacientes
passam a treinar como atletas e a participar de competições
paradesportivas.

Na associação, os deficientes precisam passar por uma fila de


espera que totaliza 32 mil pessoas nas oito unidades espalhadas
pelo país.

A ADD (Associação Desportiva para Deficientes) ensina esportes a


130 crianças e 60 adultos. As modalidades incluem basquete
adaptado, natação, atletismo e ciclismo para deficientes visuais,
praticado em bicicleta dupla com guia.

A entidade trabalha tanto com pessoas que buscam


condicionamento físico quanto com atletas, como é o caso do
nadador mineiro Daniel Dias, ganhador de nove medalhas na
Paraolimpíada de Pequim, sendo quatro de ouro.

A Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade


Reduzida tem em seu site (http://tinyurl.com/ 44rcgz) uma lista de
organizações que prestam serviço para deficientes. Segundo o
órgão, 20 organizações têm o esporte como foco principal.

Basquetebol sobre rodas, voleibol sentado, atletismo, tênis para


cadeirante, futebol, esgrima, natação, halterofilismo, tiro esportivo e
polybat (tênis de mesa lateral) são algumas das opções para quem
deseja se exercitar.
(GL, MM e RA)

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2410200831.htm

-----------------------------

Você também pode gostar