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DA CÚPULA DA TERRA AO FUTURO QUE QUEREMOS

UM PLANO DE VÔO ESTRATÉGICO PARA A RIO+20

Ely A. Oliveira 1
16 de junho de 2012 2

INTRODUÇÃO

Cúpula da Terra. Esse foi o mote orientadora dos trabalhos da II Conferência


das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em 1992 e
sediada no Rio de Janeiro-Brasil, e que personalizou-se como Rio-92 ou, também
conhecida, como ECO-92.
Passados 20 anos, a cidade do Rio de Janeiro mais uma vez sedia a
Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (CDS) que
apresenta seu leit motiv no slogan “O Futuro que queremos”.
Em meio à abundância de informações sobre os problemas ambientais por
vezes, no transcorrer da tentativa de compreensão de tão complexos problemas, o
agente passivo da informação ressente-se da falta de um fio condutor para o
entendimento dos problemas apresentados por esse capítulo da humanidade. Assim,
este artigo 3 se pretende à tentativa de ser de mais fácil digestão no que tange à
preparação prévia para os debates da Rio+20. Pretende contribuir, modestamente,
como um “plano de vôo” básico para a mais fácil circulação das idéias frente aos
problemas com que se defronta a sociedade humana em sua contemporaneidade. Teve
ainda, como princípio guia, o artigo de Ladislau Dowbor 4 . Fica claro, portanto, que o

1
O autor é economista e CFO na PS Sistemas, empresa de consultoria e gestão empresarial. Contato:
ely@pssistemas.com.
2
O trabalho Da cúpula da terra ao futuro que queremos de Ely Antonio de Oliveira foi
licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição - NãoComercial - CompartilhaIgual 3.0 Não
Adaptada.
3
O autor, convicto da necessidade de novos paradigmas de governança social – que inclui o livre acesso
ao conhecimento –, considera por bem tomar como base para esta pesquisa, exclusivamente, os
materiais disponibilizados por seus autores em seus sites oficiais.
4
Disponível em http://www.outraspalavras.net/2012/05/17/rio20-e-cupula-dos-povos-o-roteiro-de-ladislau-
dowbor/.
2

escopo deste artigo não abrange inovações de soluções e menos ainda esgota o
assunto, e sim, apenas entroniza o leitor nos caminhos dos problemas, idéias e
soluções já elaboradas e que irão percorrer a conferência.

PROBLEMAS AMBIENTAIS

Para situar o leitor que acaba de se defrontar com as questões ambientais é de


importância básica que seja informado sobre quais são essas “questões”. Não é intuito
aqui debruçar-se sobre cada assunto, nem tão pouco apresentar todas as questões,
mas explanar, de forma extremamente sucinta as de maior impacto.
O aquecimento global é o primeiro que se deve destacar. Basicamente, segundo
os pesquisadores, o aumento da temperatura do planeta, provocado pelo “efeito estufa”
dos gases emitidos através da produção baseada em carbono (CO2), pode provocar o
degelo das calotas polares. São as calotas gélidas, juntamente com a mais alta
temperatura no Equador, que regulam o clima na terra pela circulação das águas dos
oceanos. As águas são aquecidas no Equador, que sobem para a superfície e são
empurradas para os pólos, onde se resfriam e descem para o leito marinho
impulsionando as águas do leito em direção novamente ao Equador, onde o ciclo
recomeça. A variação da temperatura da água é que desloca as massas de ventos que
fazem circular o ar em torno do planeta estabelecendo temperaturas amenas e
controlando, basicamente, o ciclo agrícola. Sem essa movimentação, secas, furacões,
chuvas e enchentes e, fundamentalmente para a vida no planeta, os oceanos, as
florestas e a agricultura não teriam capacidade produtiva para a alimentar a
biodiversidade do planeta. Além disso, são as calotas polares que devolvem alto
percentual dos raios solares de volta ao espaço. Logo, com sua diminuição, o
aquecimento tende a aumentar e iniciar um ciclo irreversível de aquecimento e
derretimento. Outro dado que deve ser levado em conta é que a água salina (água dos
oceanos) é mais pesada que a água doce. O processo de circulação exige água salina
para poder, quando esfriada, descer ao fundo marinho. A água contida nas calotas
3

polares, ao contrário, é doce, e se misturada à água dos oceanos pode interromper o


processo das correntes marítimas por simples falta de peso da água. A estagnação
oceânica incorreria em extinção maciça da biodiversidade planetária.
O problema da liquidação das florestas originais se apresenta intrinsecamente
ligado ao problema da extinção da biodiversidade terrestre (e, talvez, até mesmo
marinha, dado o grau de interação entre os ecossistemas e biomas). Além de se saber
ainda muito pouco sobre a biodiversidade do planeta (plantas, animais e organismos
menores) já se sabe o suficiente para se ter a consciência de que existe uma ligação
extremamente forte e delicada entre cada espécie e, em particular, a espécie humana.
Com a extinção de um organismo do ecossistema pode-se criar um ciclo descontrolado
de extinção em cadeia que pode se ramificar até a espécie humana, ou, na melhor das
hipóteses, ter conseqüências tangentes da qualidade da vida humana no planeta.
Trata-se, portanto, de problema de primeira ordem.
A perda de solo agrícola pode, em princípio, apresentar-se como um problema
de menor importância solucionável pelas aplicações tecno-científicas em vigor no
plantio tradicional. Na verdade, o problema se estende a uma distância maior no
horizonte ambiental. Com o aumento da população mundial implanta-se a necessidade
de aumento de áreas para plantio e pastagens (além da impermeabilização do solo no
processo de ampliação das cidades – urbanização descontrolada). Com a dilapidação
das florestas para aumento de áreas de plantio e pastagens, áreas maiores de solo
estão sendo expostas a intempéries erosivas – basicamente, os ventos e as águas das
chuvas. O solo, que era protegido dessas agressões naturais pelas florestas de
entorno, que antes formavam paredões impedindo o aumento da velocidade dos ventos
e do próprio impacto das águas das chuvas, protegendo a fertilidade do solo e até
estimulando-a, passa agora a ser erodido com mais violência formando um circulo
vicioso funesto de aumento exponencial da destruição de solo fértil. Sabe-se que
somente os 15 centímetros da superfície do solo são férteis para a germinação e o
desenvolvimento das sementes que, mais tarde, se infiltrarão em solo mais profundo.
Com a erosão, perde-se exatamente essa camada, tornando a terra completamente
estéril. Daí, para a escassez alimentar se transformar em Estados falimentares (nações
falidas) é apenas um passo em efeito dominó. Com a escassez de alimentos a
4

tendência dos preços agrícolas (commodities) é de alta. Nações com capacidade menor
de produção agrícola (normalmente as nações mais pobres e, em geral, situadas no
continente africano, mas não só nele) iniciam a sua falência pela insegurança alimentar
na falta de capacidade de gerar outros excedentes para a troca com paises produtores
de excedentes agrícolas. Essas nações empobrecidas pela fome são desestabilizadas
com disputas políticas (falência institucional) que levam, geralmente, à guerra civil. Sua
população, na tentativa de escapar desses conflitos, se encaminham (por todos os
meios possíveis) para paises vizinhos tornando-se refugiados, e assim, incapacitam o já
combalido problema de escassez do país anfitrião, levando-o, em efeito cascata, a
entrar também em um processo falimentar. Ajudas internacionais acabam por desviar
recursos de projetos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) que poderiam auxiliar esses
países mas que, dialeticamente, o expõem a uma condição de dependência externa –
além de fomentar e ampliar o comércio de armas mundial através do tráfico
internacional de drogas. 5
Por fim, mas sem estabelecer uma hierarquia, dado que todos os problemas se
interpõem, se sobrepõem, se combinam e se ampliam mutuamente, tem-se a questão
do esgotamento dos chamados “recursos naturais críticos” como a água, as energias
não renováveis (petróleo, dentre outros), matérias-primas industriais (cobre, ferro, ouro,
etc), bem como alguns outros componentes do problema ambiental.
A modificação planetária perpetrada pela ação humana é de grau tão intenso,
profundo e complexo que, para alguns pesquisadores, o homem inaugurou uma nova
era geológica do planeta terra – o Antropoceno 6 .

5
Para um plano esquemático ver o apêndice A deste artigo. Para uma melhor compreensão e maior
aprofundamento nas questões levantadas pelo “Plano B”, recomenda-se o livro de origem da matéria do
Policy Earth Policy Institute do apêndice A, de Lester Brown, que pode ser encontrado em
http://www.wwiuma.org.br/plano_b.pdf.
6
Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Antropoceno, http://cienciahoje.uol.com.br/blogues/bussola/2012/04/bem-
vindo-ao-antropoceno, o artigo de Bruno Martini em
http://ufpr.academia.edu/BrunoMartini/Papers/970751/Antropoceno_A_epoca_da_humanidade e o artigo
de Fábio Feldman em http://www.brasileconomico.com.br/noticias/antropoceno-a-nova-era_108440.html.
5

OS PROBLEMAS SÓCIO-ECONÔMICOS CONTEMPORÂNEOS

Em 2011 a população mundial atingiu a marca dos 7 bilhões de indivíduos. No


primeiro dia da Rio+20 já serão 7.044.896.852 7 , no segundo, 7.045.108.232. Ou seja,
em um único dia, um incremento insuspeito de 0,003% e, no entanto, são mais 211.380
pessoas a habitar o planeta.
Segundo o Fundo de População da ONU (UNFPA), dos 7,044 bilhões de
pessoas, 14,2% (um bilhão) sofrem com a falta de acesso a alimentos (fome). Destes,
180 milhões são crianças. Destas, 11 milhões morrem por inanição ou por falta de
acesso à água limpa (potável). São incríveis 30 mil crianças POR DIA (!!), anualmente.
Porém, esses números não constam da programação dos meios de comunicações
midiáticos.
Ainda segundo a UNFPA, 2,3 bilhões (um terço) da população mundial se utiliza
da lenha como matriz energética para o preparo da sua alimentação (fogão a lenha),
população esta que ainda não tem acesso às benesses oriundas do sistema de
produção atual.
A produção mundial de grãos em 2011 (UNFPA, 2012) foi de aproximadamente 2
bilhões de toneladas. Se fossem distribuídos entre a população mundial atual, daria a
média de 789 gramas diária/ano para cada indivíduo. A referência, deve-se lembrar, é
somente para grãos, não computando, portanto, as outras produções alimentícias
(pecuária, piscicultura, etc).
O PIB Mundial em 2011 (FMI, 2011) foi de US$ 69,9 trilhões. Dividindo-se pela
mesma população mundial, daria direito a cada indivíduo um montante de US$
9.880,00. Dividindo-se por 12 meses, teríamos como resultado US$ 823,00 por mês ou,
em Reais, o montante de R$ 1.704,10 ao mês. Sabendo-se que a família média é
composta por quatro pessoas, ter-se-ia então, R$ 6.816,40. Os dados apontam sem
qualquer sombra de dúvidas de que não existe razão plausível para que uma parte
expressiva da população humana ainda careça de condições minimamente básicas de

7
Ver excelente gráfico interativo elaborado pela BBC, em português. Nele, o leitor poderá verificar a
evolução populacional desde o ano de 1500 e estabelecer o “seu número” pessoal a partir da data de seu
nascimento: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/10/111027_guia_populacao.shtml.
6

suporte à vida. Evidente lembrar que estes cálculos são superficiais e que não foram
computados aqui os custos com investimentos para a manutenção de tal patamar de
distribuição da renda no longo prazo. Mas, terminantemente frente aos números, é
evidente de que nada justifica a carência das condições de uma vida saudável, plena e
produtiva, de larga faixa da população mundial. O que se constata, na verdade e em
sentido oposto, é que, de fato, existe um movimento intenso, e mesmo, brutal, de
concentração da renda mundial.
Em um estudo inédito 8 , elaborado pelo Instituto Federal de Tecnologia de
Lausanne, na Suíça (ETH 9 na sigla em alemão), demonstrou a concentração do
controle corporativo – e, por consequência inevitável, do controle econômico, político e
social – por parte de 737 grupos corporativos, sendo que 75% deles são de
intermediação financeira (bancos, corretoras, fundos, etc). Esses rarefeitos grupos são
controladores de 80% do sistema corporativo mundial. Todos, evidentemente,
perseguindo a premissa neoclássica da maximização dos lucros e minimização dos
custos (lembrando-se de que “salário” é considerado um dos componentes dos custos
de produção), nem que isso enverede para uma crise econômica global (financeira e
produtiva) com custos sociais que chegam às raias da terrível desumanidade total com
populações de países inteiros (Islândia, Grécia, Irlanda, etc) ou que represente a
desestabilização completa das estruturas institucionais (Haiti, Somália, Congo, Uganda,
Ruanda, etc).
A conclusão inevitável e mais óbvia que se apresenta é a de que o sistema de
governança sócio-econômico atual sinaliza a depredação sistemática, planejada e
inconseqüente do sistema econômico, social, ambiental e institucional mundial e que,
deixado à sua própria governança levará a humanidade a seu termo para o benefício
estratégico de apenas 1% da população global.
Nas palavras do prof. Ladislau Dowbor (2012), vive-se hoje a “convergência de
processos críticos: o ambiental, o social e o econômico. E o denominador comum é o
problema da governança, de gestão da sociedade no sentido mais amplo”. Traduzindo-

8
Ver um resumo em português em
http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=rede-capitalista-domina-
mundo&id=010150111022&mid=50. A pesquisa original pode ser acessada em
http://arxiv.org/abs/1107.5728.
9
Instituto onde Albert Einstein obteve sua graduação.
7

se, é um problema de articulação da gestão dos bens comuns. Gostando ou não, é de


Política que se trata. Os problemas estão claramente expostos, trata-se agora de
estabelecer as estruturas de governança mundial concretas, que estipulem na ação
material as vias das soluções necessárias. À priori, este é o contexto em que se insere
a Rio+20.
Segue-se, como não poderia deixar de ser, a advertência necessária, de que a
ausência de países chave – que representam nada menos do que 30% da produção e
do consumo industrial (EUA, Alemanha e Reino Unido) – e o alinhamento contra
cláusulas de um acordo vinculante (China, Japão e França) – totalizando-se 55% dos
países produtores e consumidores industriais –, podem esvaziar por completo os
objetivos da conferência e, mesmo, anular qualquer projeto, sequer, de alternativas
para uma nova visão de governança global para o futuro. Na pauta das alegações de
ausência constam, naturalmente, a crise econômica global como mote para o
esvaziamento da conferência.
Por outro aspecto, a China virá à conferência como a maior investidora em
tecnologias renováveis (hidrelétrica, aeólica, solar, etc) 10 , o que eleva o seu peso no
contrapé de um acordo que vincule reduções de CO2 entre os participantes. “Mas o
consumo do carvão, o mais poluente dos combustíveis fósseis, segue alto”.
Outro motivo alegado para o esvaziamento é que “dados recentes indicam que a
emissão de gases de efeito estufa caiu, mas em consequência da crise econômica, não
de um esforço real” 11 dos países para uma nova governança.
Por último, deve-se deixar claro que o tripé fundamental que norteia a
conferência são os problemas ambientais, sociais e econômicos. É de consenso
também, que deverá ser incluso o problema institucional nas discussões, e que trata
das esferas políticas públicas e privadas para o monitoramento, acompanhamento e
gestão das outras questões.

10
http://jornal.ceiri.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2862:rio-20-servira-como-
vitrine-para-apresentar-uma-nova-china&catid=94:notas-analiticas&Itemid=656.
11
http://www.agrovalor.com.br/2011/edicoes-anteriores/3837-china-discutira-energia-renovavel-na-rio20.
8

DISCUSSÕES OFICIAIS PELOS DOCUMENTOS OFICIAIS

Os documentos oficiais padecem da energia necessária para fazer, aos gestores


e formuladores de políticas, crerem reais as urgências das medidas necessárias para,
no melhor dos casos, mitigarem os problemas ambientais, sociais e econômicos.
O primeiro documento que se eleva à categoria de oficial é o The Future we
Want (O Futuro que Queremos 12 – também chamado de Zero Draft – Projeto Zero ou
Projeto Base) base para as discussões da Rio+20 elaborado na última reunião do
Comitê Preparatório para a Rio+20 (PreCom2) que aconteceu entre 7 e 8 de março de
2011 e que, de lá para cá, a soma das várias reuniões totalizaram dois meses de
negociações para a sua formulação.
Os pontos chaves que são levantados no documento são, pela ordem,
segurança alimentar, água, energia, cidades (construções sustentáveis), inclusão social
através de empregos verdes, oceanos, desastres naturais, mudanças climáticas,
florestas e biodiversidade, degradação do solo e desertificação, montanhas, produtos
químicos e resíduos, produção e consumo sustentáveis, educação e, finalmente,
igualdade de gênero. Nota-se que se trata de uma pauta ampla, de difícil consenso e
que, certamente, levará a extensas discussões sobre os seus pontos.
As questões levantadas por esse documento base foram elaboradas a partir de
outro documento fundamental, e mais completo, chamado Panorama do Meio Ambiente
Global.
Em seu resumo, chamado de Resumo para Formuladores de Políticas (RFP) 13
do quinto relatório Panorama do Meio Ambiente Global (GEO-5) 14 , o texto delineia
todos os pontos essenciais das discussões do documento base.
O resumo (RFP, 2012, p. 6) deixa claro que

12
O documento base pode ser acessado em
http://www.uncsd2012.org/content/documents/370The%20Future%20We%20Want%2010Jan%20clean%
20_no%20brackets.pdf.
13
O documento RFP, em português, pode ser acessado em
http://www.pnuma.org.br/admin/publicacoes/texto/GEO5_RESUMO_FORMULADORES_POLITICAS.pdf.
14
O relatório completo GEO-5, em inglês, pode ser acessado em
http://www.unep.org/geo/pdfs/Keeping_Track.pdf.
9

Os esforços de desacelerar o ritmo ou tamanho das mudanças — inclusive


maior eficiência de recursos e medidas de mitigação — tiveram resultados
modestos, mas não lograram reverter as mudanças ambientais adversas. Nem
seu escopo nem sua velocidade diminuíram nos últimos cinco anos.
e aponta os prováveis elementos causais do agravamento da situação (RFT, 2012, p. 9)
O crescimento da população, o desenvolvimento econômico e os mercados
globais são importantes vetores de mudança que juntos intensificam as
pressões sobre o solo ao aumentarem as demandas por alimentos, ração,
energia e matérias-primas.

Figura 1: Alterações na população global e no


suprimento de carnes, peixes e mariscos
(1992-2007)

De 1992 a 2007 registrou-se um aumento populacional mundial da ordem de


22%. A pressão exercida por este incremento da população foi mais que proporcional,
tanto no consumo de carnes – registrando uma elevação na produção de 28% -, como
na produção de peixes e mariscos – pressão de aumento da ordem de 32% no mesmo
período (figura 1).
10

Reconhece-se (RFT, 2012, p. 9), ainda, que existem deficiências nas metas
acordadas até aqui e que
são necessárias metas acordadas no plano internacional mais claras e
praticáveis para o uso do solo, já que a maioria das metas existentes é
imprecisa e não quantificável.

Figura 2: Eficiências de irrigação no mundo, c. 2000

Fonte: Resumo para formadores de políticas (RFP), GEO-5, PNUMA, 2012.

Em específico, no capítulo dos recursos hídricos (água), o documento demonstra


que os problemas setoriais ambientais estão, na verdade, todos interligados. “Noventa
e dois por cento da pegada hídrica mundial total estão relacionados com a agricultura.”
(RFT, 2012, p. 10). A figura 2 destaca a eficiência hídrica global.
Outro fator importante destacado no documento base são os resíduos do
consumo e da produção. Embora seja o meio mais divulgado como a solução dos
problemas residuais, a reciclagem não se apresenta como solução definitiva. O
documento destaca que “os problemas do gerenciamento de resíduos estão fadados a
crescer, já que a reciclagem por si só não os resolverá, e que excedem a capacidade
dos países de lidar com eles” (RFT, 2012, p. 13).
11

Figura 3: Crescimento da população, PIB, comércio e CO2 (1990-2008)

Fonte: Resumo para formadores de políticas (RFP), GEO-5, PNUMA, 2012.

A agudização dos problemas apresentados pelos resíduos em geral, se


apresenta mais grave na medida em que esses resíduos são transferidos dos países
desenvolvidos para os em desenvolvimento impedindo não só ao país receptor atingir
as suas metas acordadas, mas provocando o descontrole da situação ambiental do
país.
Há indicações de que o destino final da maioria dos resíduos eletrônicos é o
mundo em desenvolvimento e que, na escala global, os países em
desenvolvimento podem gerar duas vezes mais resíduos eletrônicos do que os
países desenvolvidos até o ano de 2016 (RFT, 2012, p. 13).
A figura 3 apresenta as transferências, em termos de carbono, dos países
desenvolvidos para os países em desenvolvimento.
Dada a baixa capacidade de investimento e financiamento dos países em
desenvolvimento e frente à sua necessidade de crescimento econômico, impulsionado
pelo aumento populacional, esses países se vêm obrigados à utilização dos métodos
agrícolas e pecuários tradicionais que se utilizam, em larga medida, de produtos
químicos altamente nocivos e de, inclusive, produtos que de muito já foram
abandonados, seu uso, nos países desenvolvidos.
Isso é uma fonte de grande preocupação, já que há um deslocamento na
produção de substâncias químicas dos países desenvolvidos para os países
12

em desenvolvimento e o uso de produtos químicos nos países em


desenvolvimento está crescendo rapidamente (RFT, 2012, p. 13).
O maior obstáculo encontrado pelo GEO-5, no entanto, e que pauta o tom do
RFP, é a falta de indicadores e dados confiáveis e precisos que indiquem a evolução
das alterações ambientais nos âmbitos regionais e, principalmente, locais (intra-nações)
para que sirvam de embasamento para o direcionamento na alocação de recursos e na
adoção de políticas de Estado que melhorem, ou pelo menos corrijam, os índices e as
relações entre sociedade, meio ambiente e seus recursos naturais no curto, médio e no
longo prazos e que possibilitem, ainda, uma maior integração estratégica internacional.
A educação é um ponto crítico nas discussões já que, ao que parece, não será
um ponto forte do encontro. E a razão disso é que, por um lado, ela está no âmbito do
inconsciente coletivo das sociedades, mas, ao que se pode tirar dos discursos em
geral, como um instrumento conscientizador dos processos “metabólicos” dos
ecossistemas, biomas e recursos ambientais com enfoque na conservação e
preservação desses recursos já existentes. Por outro, embora também no âmbito ainda
do inconsciente geral, não parece que haverá discussões para um enfoque da
educação como agente criador, em última análise, de projetos, processos e produtos
inovadores que respondam adequadamente aos problemas ambientais. Se este fosse o
direcionamento, sabe-se que os objetivos só poderiam ser alcançados no longo prazo e
se se priorizar maciços investimentos nas estruturas do ensino com alta qualificação
desde a educação de base (infantil) até o livre acesso ao ensino superior (graduação,
especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado) dentro e fora do país. A china,
como já é sabido, está fazendo a “lição de casa” e já é o maior centro investidor em
educação no mundo, atualmente.
Outra inexplicável ausência nas discussões e documentos oficiais é a solução
oferecida pela Economia Solidária que, em seu cerne, pode se apresentar como o
“santo graal” das questões ambientais por ter uma melhor governança das questões
diretamente ligadas à pesquisa, desenvolvimento, produção e consumo, já que os
produtores diretos são, também, tomadores de decisões baseados na rotatividade do
poder em função da gestão e gerência serem baseadas no processo decisório
democrático intra-corporação.
13

Não visando especificamente a maximização dos lucros, e sim, a um padrão


socialmente aceitável da qualidade de vida de seus associados (cooperativados), pode
por bem, a Economia Solidária, estabelecer direcionamento e níveis produtivos e de
consumo compatíveis com o estágio das necessidades estruturais, sociais e
ambientais, dando enfim, respostas a manejos ecossistêmicos de preservação das
instituições humanas quanto das estruturas naturais do planeta. Neste contexto, deve-
se destacar a voz de Paul Singer presente na atividade "Desenvolvimento sustentável e
solidário nos territórios: estratégia de outra economia" que ocorrerá durante a Cúpula
dos Povos 15 .
O documento base é baseado, fundamentalmente, no conceito de “Economia
Verde”. Esse será um dos pontos altos das divergências, já que para o PNUMA, a
Economia Verde é uma economia “de baixo carbono e eficiente no uso de recursos no
contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza, com apoio
adequado para o desenvolvimento de inovação ambiental” (RTF, 2012, p.16). A
precisão e a qualificação dos termos abre margem para interpretações conflituosas,
principalmente entre países desenvolvidos e os países em desenvolvimento 16 .
Como país anfitrião e detentor dos recursos naturais mais abundantes, o Brasil,
através da Comissão Nacional para a Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável elaborou um documento com a sua contribuição 17 .
O que difere a contribuição brasileira do documento base é o acréscimo do
enfoque maior dado às questões sociais e nos projetos de financiamento para o
desenvolvimento sustentável. E este é um outro ponto de divergência entre os países
desenvolvidos e os em desenvolvimento.

15
http://www.fbes.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=6947&Itemid=62. É útil destacar
aqui, que o leitor interessado, pode acompanhar as notícias sobre Economia Solidária através do Fórum
Brasileiro de Economia Solidária no endereço http://www.fbes.org.br/, e no portal do Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE) http://portal.mte.gov.br/portal-mte/ acessando o link “Economia Solidária”.
16
http://www.portugues.rfi.fr/brasil/20120613-g. Outro artigo interessante para análise é
http://www.fpabramo.org.br/artigos-e-boletins/artigos/rio20-positividades-e-negatividades-da-economia-
verde.
17
Accessível em www.rio20.gov.br/documentos/contribuicao-brasileira-a-conferencia-rio-
20/at_download/file.
14

A criação de um fundo financeiro – sendo a sugestão de 2% do PIB mundial –


para os programas de desenvolvimento sustentável já aparece como um problema
frente à crise global em que os países desenvolvidos estão inseridos.
O documento, de 37 páginas apenas, trás um rápido histórico evolutivo dos
problemas e soluções desde a Rio-92 até a presente conferência, e avança em seus 25
pontos sugeridos:
1. Erradicação da pobreza extrema;
2. Segurança alimentar e nutricional;
3. Equidade;
4. Acesso à saúde;
5. Trabalho decente, emprego e responsabilidade social das empresas;
6. Educação;
7. Cultura;
8. Gênero e empoderamento das mulheres;
9. Promoção da igualdade racial;
10. Reforço do multilateralismo com participação da sociedade civil;
11. Papel do Estado;
12. Produção e consumo sustentáveis;
13. Energia;
14. Cidades e desenvolvimento urbano;
15. Transportes;
16. Agropecuária e desenvolvimento rural;
17. Promoção da inovação e acesso à tecnologia;
18. Financiamento para o desenvolvimento sustentável;
19. Mudança do clima;
20. Biodiversidade;
21. Combate à desertificação;
22. Água;
23. Oceanos, mares e zonas costeiras;
24. Pesca e aqüicultura; e,
25. Florestas.
15

Outro ponto que se diferencia do documento base é o enfoque incisivo dado


sobre a “Estrutura Institucional” para o desenvolvimento sustentável.
A compreensão da nova distribuição das estruturas de poder no mundo atual
aparece destacado no documento brasileiro. “O reconhecimento do reordenamento
internacional em curso e da mudança de patamar dos países, com seus reflexos na
estrutura de governança global” (2012, p. 4).
Como já se disse, um dos pontos de discórdia é a enfática do documento
brasileiro na chamada à responsabilidade histórica dos países desenvolvidos e, em
decorrência, a criação de canais de financiamento para programas voltados ao
desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento.
Os Princípios do Rio incluem a necessidade de que os países desenvolvidos
mantenham oferta adequada de recursos financeiros e de transferência de
tecnologia, de modo a auxiliar os países em desenvolvimento a alcançar os
objetivos do desenvolvimento sustentável (2012, p. 4).
Outro documento oficial interessante é “Gente resiliente en un planeta resiliente:
un futuro que vale la pena elegir” 18 elaborado pelo Alto Comissariado das Nações
Unidas para a Sustentabilidade Mundial.
Este documento trata dos mesmos pontos que o GEO-5, porém, mais focado
especificamente nos problemas e desafios a enfrentar. Direciona, sobretudo, a
argumentação para o marco institucional-político.
“La gobernanza democrática y el pleno respeto de los derechos humanos son
requisitos indispensables para empoderar a las personas y conseguir que elijan
opciones sostenibles. Los pueblos del mundo ya no tolerarán que continúe
devastándose el medio ambiente ni que persistan las desigualdades que
ofenden profundamente el arraigado principio universal de justicia social”
(2012, p. 3).
Em tempos de crises econômicas históricas em que se observam os fenômenos
de concentração de renda e, conseqüentemente, surgem as desigualdades sociais, o
chamamento à ética e à responsabilidade sobre a justiça social se torna um dos pontos
altos do exame de consciência social. É neste contexto que se inscreve a “Carta das
Responsabilidades Universais” 19 que será apresentada para compor quadro como
adendo à Declaração dos Direitos Humanos no Fórum Internacional da Ética e

18
Ver em http://www.un.org/gsp/sites/default/files/attachments/Overview%20-%20Spanish.pdf.
19
Ver o documento em http://www.world-
governance.org/IMG/pdf_801_Proposta_para_uma_Carta_das_Responsabilidades_Universais-2.pdf.
16

Responsabilidade 20 . Este documento conta com a assinatura dos “Representantes dos


Estados Membros das Nações Unidas”. Os signatários, deparando-se com elementos
aéticos, ou mesmo, antiéticos perpetrados pelos agentes sociais da atualidade,
constatam que existe a necessidade de uma mais forte regulação pró-ativa da
consciência ética social. A carta parece deixar claro o objetivo a que se propõe logo no
seu item segundo
que a busca infinita de modos de vida e de desenvolvimento atuais,
acompanhada de uma tendência a limitar suas próprias responsabilidades, é
incompatível com a harmonia entre as sociedades, a preservação da
integridade do planeta e a salvaguarda dos interesses das gerações futuras;
(2011, p. 1).
Com relação à ética corporativa, no seu item quarto, a carta informa
que as modalidades jurídicas, políticas e financeiras de direção e de controle
das instituições publicas e privadas, em particular aquelas cujo impacto é
mundial, não as incita [atualmente] a assumir plenamente suas
responsabilidades, e até as incita à irresponsabilidade; (2011, p. 1).
A cláusula quinta das disposições das responsabiliddes éticas, se adotada
efetivamente, bem poderia tirar o sono de alguns.
A responsabilidade das instituições, tanto públicas como privadas, quaisquer
que sejam as regras que as rejam, não exonerará de responsabilidade seus
dirigentes e reciprocamente.(2011, p. 3).
Por fim, em seu item oitavo, estabelece o princípio legal da aplicabilidade jurídica
sobre a alienação das responsabilidades sociais.
Ninguém pode se exonerar de sua responsabilidade em nome de sua
incapacidade se não tiver feito o esforço de se unir a outros, ou em nome de
sua ignorância, se não tiver feito o esforço de se informar. (2011, p. 3).
Os representantes do mercado financeiro se apresentam na defesa de suas
“funções” econômicas através do documento “The Natural Capital Declaration” 21 (em
uma tradução livre: Declaração do Capital Natural). Segundo Dowbor (2012),
O documento, de 3 páginas, constitui uma importante declaração de princípios
"demonstrando nosso compromisso na Rio+20 de trabalharmos para integrar
considerações sobre o capital natural nos nossos produtos e serviços
financeiros para o século 21". Comove sem dúvida, e naturalmente
esqueceram a dimensão social, e o fato de estarem servindo a mais
especulação e apropriação de recursos públicos do que fomento produtivo.
Vale lembrar que as corporações signatárias são componentes dos mesmos
conglomerados que levaram à crise financeira e a atual bancarrota dos estados
nacionais. Seus capitais especulativos estão em busca de liquidez e, como o momento
não é propício para investimentos em processos produtivos ou de infra-estrutura

20
http://www.ethica-respons.net/rubrique108.html?lang=fr.
21
Acesso à declaração em http://www.naturalcapitaldeclaration.org/wp-content/uploads/2012/05/NCD_leaflet.pdf.
17

nacionais, o investimento verde, especulativo, deve-se chamar a atenção, se apresenta


como um bom aporte de financiamento para o logo prazo em contraposição aos “sub
primes” (papeis “podres”) no qual esses capitais se valorizavam.

DOCUMENTOS NÃO OFICIAIS PARA SOLUÇÕES OFICIAIS

O artigo de Ignacy Sachs abre o encarte especial “Sustentabilidade e


Desenvolvimento: o que esperar da Rio+20” 22 do Jornal Lê Monde Diplomatique Brasil,
sugerindo que “mais do que nunca, devemos abandonar a ilusão de que os mercados,
deixados a si mesmos, sabem se autorregular. Na realidade, eles são míopes e
insensíveis à dimensão social” (2012, p. 4).
Esse abandono da autorregulação dos mercados leva Sachs ao caminho da
gestão administrável e democrática dos problemas ambientais, sociais e econômicos
pela ação cooperada quadripartite dos quadros internos dos estados nacionais formado
pelos “Estados orientados por uma visão desenvolvimentista, os empresários privados e
públicos, os trabalhadores e a sociedade civil organizada” (2012, p. 4).
Para Sachs a solução dos problemas ambientais deve passar por um novo
entendimento do que seja vizinhança. Agora o que realmente é importante para a
verificação de soluções para problemas semelhantes passa pela ótica de “vizinhaça
ecossistêmica”. Deve-se ver as soluções dos problemas “priorizando o intercâmbio
horizontal por paralelos, e não por meridianos” e exemplifica que “a experiência
adquirida no manejo sustentável dos recursos da floresta amazônica deve ser
confrontada com o que está ocorrendo nas florestas da Indonésia e da África central”
(p. 5). Ou seja, pela mesma linha meridiânica, ou mesma zona climática.
Sachs sugere, ainda, a forma de financiamento para o reordenamento dos
financiamentos para o intercâmbio do conhecimento lastreado em um grande fundo da
Organização das Nações Unidas (ONU) que seria a base para um modelo autoapliável.
O financiamento poderia ser realizado, para Sachs, através da

22
Acessar em http://pt.calameo.com/read/000958877ec38bd88e2d7.
18

reafirmação do compromisso várias vezes assumido e não honrado pela


maioria dos países mais desenvolvidos de destinar 0,7% de seu PIB
(inicialmente se falou até de 1%) como contribuição ao desenvolvimento dos
países menos ricos; instauração da taxa Tobin 23 para coibir as especulações
financeiras; criação de um novo tributo taxando as emissões de carbono; e, por
fim, pedágios sobre os ares e os oceanos, cobrados dos aviões e navios que
os atravessam e justificados pelo fato de que se trata do uso de bens comuns
da humanidade (2012, p. 5).
Como o próprio autor adimite, as suas proposições são de complexa implantação
para discussão no curto tempo da conferência. Sachs então sugere que as reuniões
deveriam se centrar em dois temas básicos e abrangentes
o reconhecimento tardio (mieux vaut tard que jamais) de nossa entrada numa
nova era – o Antropoceno –, que coloca sobre a humanidade, como seu nome
indica, responsabilidades acrescidas e duradouras; e, a preparação de um
roteiro para os próximos anos.
Contemplando o texto com varias outras medidas fundamentais, Sachs encerra
com o Yes, we can (de Barack Obama) alertando de que, “porém, o tempo urge”.
No mesmo encarte, o texto seguinte é de Cândido Grzybowski e centra-se no
caráter de urgência e, ao mesmo tempo, de inconformismo com a passividade com que
são tratados os problemas ambientais, sociais e econômicos pela sociedade em geral.
Nossos governantes estão mais preocupados com a queima de capital
especulativo nas bolsas e com a saúde dos bancos do que com as múltiplas
crises em que a humanidade afunda: climática, alimentar, das condições de
vida, da política e de valores éticos (2012, p.6).
Para Grzybowski, o seqüestro do sistema produtivo pelas corporações
econômico-financeiras com interesses próprios no “negócio do desenvolvimento”, leva a
interesses diversos dos das sociedades globais.
Com a globalização capitalista das últimas décadas, ela virou referência para
praticamente toda a humanidade. Pelo pior caminho, criamos as condições
para a emergência de uma comunidade planetária interdependente (2012, p.
6).
Salvo as sabidas exceções, Grzybowski não vê barreiras que limitem o
consumismo e produtivismo desenfreados.
Em meio à convivência de abundância extrema com a miséria extrema, a
civilização capitalista industrial produtivista e consumista exerce um fascínio
enorme, conquistando corações e mentes quase sem fronteiras (2012, p. 6).
O suporte para a continuidade deste sistema revela-se na “dominação, racismo,
discriminação, machismo, exclusão social e a destruição ambiental que compromete a
sustentabilidade da vida e do planeta” (2012, p. 6).

23
A taxa Tobin foi idealizada pelo economista James Tobin, ganhador do prêmio Nobel de 1981. Ela é
uma taxa (ou imposto) cobrada por movimentos de capitais financeiros de carater especulativos.
19

Como solução para o equilíbrio entre uma agenda de sustentabilidade e a justiça


social, fatores conflitantes, trata-se de exercer o sentido da cidadania e da democracia.
Para Grzybowski, a agenda da justiça social foi relegada a objetivos pouco
ambiciosos onde “se acorda fazer justiça sem mudar as causas da injustiça”.
Além dos outros textos do encarte, existem outros mais de idêntica importância
que, dado manter-se um limite de espaço razoável para o artigo espaço, mereceriam
uma leitura aprofundada. Destarte, fica abaixo, como proposta de leitura os seguintes
textos de interesse:

Crises e Oportunidades em Tempos de Mudanças


(http://dowbor.org/09fsmt7portuguespositionpaperldfinal(2).doc).
Acordo para o Desenvolvimento Sustentável - Rio+20
(http://www.cdes.gov.br/documento/3169562/acordo-para-o-desenvolvimento-
sustentavel-rio-20-102011.html).
Indicadores do Desenvolvimento Sustentável (IBGE)
(http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/recursosnaturais/ids/default_2010.shtm)

CONCLUSÃO

Aqueles que estão empenhados, engajados na luta e esperançosos por um


avanço profundo baseado na alteração do pensamento das cúpulas dirigentes, dos
formadores de opinião e de políticas globais, devem se resguardar de não obterem os
resultados esperados que sairão da Rio+20. Alías, muito provavelmente, deve-se
esperar mesmo, resultados inócuos do ponto de vista das ações efetivamente
necessárias e urgentes.
Frente a tantas propostas abertas, conflitantes e de sentido amplos, não é de
todo se estranhar que não hajam consensos expressivos. Além disso, o próprio
contexto em que a conferência é realizada não permite, estruturalmente, que se
consigam avanços significativos.
20

Alertados sobre os profundos problemas ambientais, sociais e econômicos – e


em algumas áreas do planeta já até irreversíveis, como afirma mesmo o documento
mais “suave” (RFT, GEO-5, 2012) –, os formuladores de políticas e líderes mundiais
nada mais refletem os pensamentos ambientais, sociais e econômicos pelo qual vive-se
hoje em todo o planeta.
A crise global em seu primeiro ciclo – financeira – de 2008, demonstrou o
caminho errôneo das teorias livre-cambistas do mainstream de que o mercado daria
respostas completas, positivas e cirúrgicas a todos os problemas que se
apresentassem à humanidade. Neste primeiro ciclo o que se observou foi que, a partir
da década de 1980, a dilapidação das riquezas do planeta em prol de uma
concentração de riqueza e renda, fizeram com que todo o sistema passasse muito perto
de entrar num colapso total. Alentadamente, preconizou-se que o perigo havia passado.
Porém o que se viu foi a dilapidação quase que completa das parcas riquezas e rendas
da maioria da população nos países desenvolvidos na tentativa, bem sucedida aliás, de
salvamento das riquezas e rendas dos poucos e concentrados detentores dos
conglomerados financeiros usando-se, para isso, o “mecanismo” da socialização dos
prejuízos por parte dos estados nacionais, transformando os prejuízos privados em
dívidas soberanas. Note-se que, com “soberano”, se quer dizer às custas do
pauperismo brutal da maioria da população nacional.
Vivi-se hoje o longo processo de pauperização alavancada, agora, pelas dívidas
nacional (ou soberanas), dado que o salvamento do primeiro ciclo já mencionado,
provocou o altíssimo endividamento dos estados nacionais. Esse processo de
“ajustamento”, calculasse, deve ter uma longuíssima duração (cerca de 10 a 15 anos,
ao que se conclui da análise de especialistas). Pasme-se que, com todos os processos
empíricos que essa crise demonstrou, com todas as iniqüidades infligidas à sociedade
humana, os formuladores de políticas públicas e líderes internacionais ainda mantém a
mesma estrutura teórica que levou à derrocada do sistema capitalista.
O capitalismo hoje já não angaria as simpatias de grande parcela da população
mundial. Como demonstrou a pesquisa de Vitali, Glattfelder e Battiston, a concentração
da riqueza e da renda através da concentração das corporações, atrai, cada vez mais,
para os beneficiários desse sistema, as antipatias da sociedade em função do
21

sentimento de injustiça que representa essa concentração. Sabendo-se ainda que, 75%
dessas corporações são de intermediação financeira, ou seja, que não produzem
valores concretos, mas especulação e, dada a sua estreita interconexão que leva a um
efeito dominó quando de crises, fica claro a tremenda força política e econômica
exercida, por parte desses conglomerados, sobre líderes mundiais, que foram eleitos,
tendo fundamentalmente como base de financiamento de campanhas eleitorais, os
fundos destinados por essas corporações.
Por isso é que se vê que, mesmo com todas as provas empíricas em contrário, a
“mentalidade” das lideranças mundiais se apresenta de acomodação decisória com os
desejos desses agentes econômico-financeiros que, como se sabe, tem por única
finalidade, a maximização dos lucros.
Nos países desenvolvidos, o pensamento que se apresenta é a tentativa do
pagamento das dívidas soberanas através das medidas de austeridade ditadas e
gestadas pelas mesmas corporações financeiras que criaram as condições que se
apresentam. Logo, as decisões público-privadas vão no sentido da ampliação, ou do
desemprego e da redução expressiva dos salários, ou de políticas que enfatizam o
crescimento produtivo – o que leva a mais consumo destrutivo dos recursos do planeta.
Nos países em desenvolvimento (pobres), marcadamente no continente africano,
a secundarização e o desleixo das políticas público-privadas nacionais e internacionais
continuam a enfatizar, fortemente, o discurso do crescimento a qualquer preço. Deve-se
esperar, inevitavelmente, a dilapidação dos recursos ambientais, sociais e econômicos
desses países, sem que nada de concreto se faça para mitigar a situação.
Já os países, dito, emergentes, estão fortemente imbuídos do crescimento,
mesmo que no discurso e, em certa maneira, apresentem-se na defesa dos itens
essenciais da conferência. Basta ver que as medidas anticíclicas no Brasil deram
prioridade à produção e consumo baseados em carbono (redução de IPI de
automóveis, por exemplo, sem qualquer contra-partida ambiental e social). Na China, o
compromisso é com a manutenção de seu crescimento insustentável, mesmo que seus
investimentos sejam para uma produção sustentável, porém, com efeitos sensíveis
somente de longo prazo. Já a África do Sul e Rússia, nem no discurso tendem a se
apresentarem à sociedade.
22

Como também se sabe, o sistema produtivo dominado pelo sistema financeiro,


não pode continuar indefinidamente, pois o sistema financeiro é um “canibal” do próprio
sistema produtivo. Logo, deteriora as funções internas do sistema produtivo levando-o a
um esgotamento em suas bases de investimento e crescimento. O sistema produtivo
entra, inevitavelmente, em falência generalizada (como se está vendo os países
desenvolvidos – em especial, na Zona do Euro) e, conseqüentemente não pode mais
servir ao seu princípio básico, que é a manutenção da vida, pelo menos, humana na
terra.
Necessário se faz recordar, mais uma vez, as efetivas possibilidades de soluções
apresentadas pela Economia Solidária como modelo alternativo e responsável para os
problemas de consumo e produção, bem como de gestão democrático-participativa nas
ações eletivas ambientais, sociais, econômicas e institucionais planetário.
No entanto, e frente a toda essa problemática, há uma resposta muito mais
efetiva em que se devem concentrar as “baterias” das lutas e das esperanças, que não
sairá da Rio+20. Dialeticamente, sairá da conscientização da sociedade global (das
pessoas comuns) provocada, em grande medida, pela interação dos (e com os)
problemas levantados e trazidos para a conferência.
Cabe a essas pessoas simples, encontrar as soluções para os problemas que se
apresentam. Embora a gestão da coisa pública, ou seja, daquilo que é de todos e que
afeta diretamente a cada um, esteja enfrentando uma crise de “identidade”, é nela que
deve-se conjurar todas as forças e soluções e fazer dela o norte aglutinador dos
desejos sociais. Evidentemente que se fala aqui do âmbito da Política e seus
instrumentos totalizantes da representação e das ações sociais. Quando se
fragmentam as soluções e as ações, estas perdem a força de pressão. Quando se
unem em torno do todo social, exercem função de vazão dos desejos sociais. Deve-se,
portanto, ao invés de rejeitá-la, credenciá-la em todos os seus aspectos. Participação
popular e democrática da coisa pública é onde se devem, além das soluções e ações
pontuais, se concentrar os esforços de todos e de cada um.
É nessa aposta que se devem voltar as esperanças de toda a verdadeira
sociedade “anônima”.
Democracia participativa.
23

Este é, enfim, o futuro que queremos.

ENDEREÇOS ELETRÔNICOS ÚTEIS DA RIO+20

Site “oficial” da Rio+20: http://www.onu.org.br/rio20/.


Outro site “oficial” da Rio+20: http://www.rio20.info/2012/.
Guia dos eventos da Rio+20: http://www.onu.org.br/rio20/eventos/.
Destaques da Rio+20: http://www.onu.org.br/rio20/.
Sala de imprensa da Rio+20: http://www.rio20.gov.br/sala_de_imprensa/.
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA):
http://www.pnuma.org.br/index.php.
24

REFERÊNCIAS

DOWBOR, Ladislaw. Rio+20: o roteiro de Ladislau Dowbor. Disponível em


http://www.outraspalavras.net/2012/05/17/rio20-e-cupula-dos-povos-o-roteiro-de-
ladislau-dowbor/. Acesso em: 14-06-2012.
FMI. Fundo Monetário Internacional. Disponível em
http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2012/01/weodata/download.aspx. Acesso em:
14-06-2012.
PNUMA. Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Disponível em:
http://www.pnuma.org.br/. Acesso em: 15-06-2012.
UNFPA. United Nations Population Fund. Disponivel em http://www.unfpa.org/public/.
Acesso em: 14-06-2012.
WIKIPÉDIA. Enciclopédia Digital Livre. Disponível em
http://pt.wikipedia.org/wiki/ECO-92. Acesso em: 14-06-2012.
25

Anexo A

ESCASSEZ DE ALIMENTOS E
AMEAÇAS À CIVILIZAÇÃO
(Artigo do Earth Policy Institute – Scientific American, Jun/2009 – nº 85)

Escassez de alimentos Causa central da falência dos Estados.

― Problema: Antecipar mudanças repentinas.


• Projetamos o futuro extrapolando tendências do passado.
Erro: Quebra da continuidade.

― Escassez de alimentos Colapso de governos e sociedades.


• Reiterado fracasso em lidar com os declínios ambientais queda na
produção de alimentos.

― Ciclo ambiental de problemas.


• Aumento populacional consumo e impermeabilização do solo.
• Escassez de água bombeamento de poços profundos.
• Aumento da energia combustíveis fósseis.
• Aquecimento global
Secas e inundações
Elevação do nível do mar
Salinização de aqüíferos costeiros
• Perda do solo arável.
• Falta de alimentos aumento nos preços.
26

O problema dos Estados falimentares

― Em 6 dos últimos 9 anos a produção de grãos declinou para níveis menores que o
consumo. Carryover soma de grãos nos silos no início da nova colheita: 62
dias.
• Conseqüência: Elevação dos preços internacionais pressão sobre
governos já instáveis (Somália, Haiti, Sudão, Bangladesh, Iraque, etc).

― Nos 70 países menos desenvolvidos

ANO SUB-NUTRIDOS POP.TOTAL ESTOQUE DA


SAFRA ANTERIOR
1997 775 milhões 2.550.000.000 108 dias

2007 980 milhões 3.080.000.000 62 dias

2017 1.200 milhões 3.650.000.000 ?

― Países falimentares Fracasso em reduzir suas populações.


― Inflação nos preços dos alimentos exerce pressão sobre governos falência
institucional falência do país caos.

― Estados falem por falta de:


Segurança pessoal
Segurança alimentar
Serviços sociais básicos
Perdem o controle de parte ou de todo o território nacional.

― Lei e ordem se desintegram porque os governos perdem o monopólio do poder.

― Estados falidos servem de fonte para: terrorismo, drogas, armas e refugiados


ameaçam a estabilidade dos países maior ameaça: desestabilizar países
vizinhos.
27

Somália: base para pirataria


Iraque: campo para treinamento terrorista
Afeganistão: maior fornecedor de heroína
Ruanda: desestabilizou a vizinha Rep. Dem. do Congo.

― A civilização depende de nações politicamente saudáveis para:


Controle das doenças infecciosas.
Gerenciar o sistema monetário internacional
Dominar o terrorismo
Alcançar resultados de objetivo comum

― Descontrole do Estado humanidade sob risco.

― Estados falidos não pagam suas dívidas desestabilizam os sistemas (internos


e externos).

Uma nova forma de escassez

― 2007/8 – Surto de escassez alimentar característica diferente.


1972
• Seca na Rússia
• Deficiência das monções na Índia
• Calor nos EUA
Encolhimento da safra do cinturão do milho nos EUA preços
após um tempo, normalizou-se.

Passado escassez conjuntural.


Presente escassez por tendência escassez progressiva
escassez estrutural.

― Motivos da tendência
Aumento da população
28

Aumento da renda média subida na cadeia alimentar produtos de


origem animal consomem grãos de produção intensiva.
Desvio de grãos para a produção de energia.

― Países periféricos 60 % dieta de grãos 0,5kg per capita


― Países de centro 2,0kg per capita
90 % por via indireta carne, leite e ovos.
animais alimentados com grãos.

― ¼ da colheita dos EUA combustível alimentaria 125 milhões de


americanos ou ½ bilhão de indianos.

― Se desvio total da produção para combustível (EUA) só 18 % da necessidade


americana (energia).

― 1 tanque de combustível alimenta 1 pessoa durante 1 ano.

― Preço mais alto para combustível


― Preço mais baixo para alimentos

Escassez de água 1ª tendência grave

― Irrigação consome 70 % da água potável


― Bombeamento > a chuva repõe no lençol freático bombeamento de
aqüíferos fósseis (não renováveis) Ponto final à agricultura.
• Queda nos níveis dos lençóis freáticos nos países com metade da pop.
mundial (China, Índia, EUA).
• de 8% na produção de trigo (China) desde 1997.
• de 4% na produção de arroz.
Obrigarão a China a importar grandes quantidades de arroz.
29

Menos solo, mais fome 2ª tendência grave

― A terra arável (camada de 15 cm nutrientes) está sendo erodida pela ação dos
ventos.
Ex: Haiti: era auto-suficiente em grãos a 40 anos atrás.
Hoje: Um Estado falimentar Importa 50% dos grãos.
Perda de quase todas as suas florestas.

Aquecimento Global 3ª tendência grave

― Afeta a agricultura Hoje: optimun termal


• Para cada 1°C Trigo, arroz e milho 10% na produção.

― Aumentos de produção no passado Tecnologia.


• Recursos tecnológicos e da terra, hoje, estão no limite. Plantas geneticamente
modificadas não melhoram o rendimento.
• Produtividade da terra reduzindo.
• Até 1990, crescimento da produção crescimento da população.
• De 1990 em diante 1% abaixo do crescimento da população.

Manobras pelo alimento

― Países exportadores diminuíram ou baniram as exportações (inicio: 2007) de trigo


(Rússia e Argentina), arroz (Vietnã) Pânico nos países importadores
aluguel de fazendas em países exportadores.

― Preços dos alimentos rompem a ordem social.


Tailândia: Vilas guardam grãos com armas.
Paquistão: Soldados escoltam cada caminhão de grãos.
Sudão: 83 caminhões de grãos seqüestrados.
30

― China x EUA: China busca alimentos nos EUA China investidor de destaque
do déficit fiscal americano EUA: impossível bloquear exportação para a China
Caos.

A SOLUÇÃO PLANO B: Nossa única opção

― Reverter as causas ambientais:

Plano B:
1. Cortar emissões de carbono 80% até 2020 (Parâmetro: 2006).
2. Estabilizar a pop. mundial 8 bilhões até 2040.
3. Erradicação da pobreza.
4. restauração das florestas, solos e aqüíferos.

Ponto 1:
• Investimentos em energias renováveis.
• Interrupção dos desmatamentos.
• Replantio de bilhões de arvores Captura do carbono.
• Taxação para emissão de carbono e IR para replantio.

Pontos 2 e 3:
• Educação fundamental para todos.
• Saúde básica nas pequenas cidades.
• Mulheres Saúde reprodutiva e planejamento familiar.
31

Ponto 4:
• Aumento da produtividade da água: a + útil atividade que puder extrair o
máximo de uma gota d´agua.
Sistema de irrigação + eficiente
Culturas + eficientes no uso da água comer + trigo do que arroz.
Reciclar água continuamente.
• Criar terraços, plantar arvores, para a proteção do solo contra os ventos
(erosão).
• Plantio direto Solo sempre coberto.

Aceitação do plano

• Ok, se não for muito caro.


• Ok, objetivos humanitários.
• Ok, prevenir o colapso da civilização (racionais).

― US$ 200 bilhões anuais 1/6 dos gastos com guerras globais.

“Plano B é o novo orçamento de segurança”

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