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Resumo
Introdução
Estudiosos como David Harvey (2001) e Moacir Gadotti (1997), os quais tomamos como
referência nessa discussão, compreendem o movimento histórico-social atual, denominado “pós-
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Aluna regular (Doutorado) do Programa de Pós-Graduação em Geografia – UNESP – Rio Claro (Bolsista CNPq)
Linha de Pesquisa: Território, Cultura, Ensino e Metodologias em Geografia.
2 Grupo de Pesquisa coordenado pela Profª Dra. Rosângela Doin de Almeida, com o objetivo de desenvolver
pesquisas que relacionem teorias e conceitos da Geografia e da Educação relacionados com a linguagem da
Cartografia.
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modernidade”, como um estágio marcado por improbabilidades e questionamentos acerca do futuro.
Esse movimento se define, entre outros aspectos, por mudanças estruturais em todos os setores da
sociedade como ciência, artes, economia, política, entre outros, e tem como um de seus elementos
reveladores a invasão da tecnologia eletrônica, da automação, e a utilização intensiva das tecnologias da
informação e da comunicação (TICs).
Essas tecnologias disponibilizam novos espaços e ambientes denominados também como
ciberespaço3 (LÉVY, 2008), que considera além da infra-estrutura informática, as relações entre as
pessoas que interagem nestes ambientes. Por conseguinte, essa interação interpessoal no ciberespaço
cria novas formas de comportamentos, de linguagem, de atitudes, de valores, de práticas e costumes, o
que faz com que o autor acima denomina de cibercultura.
No campo educacional as TIC estão modificando as formas de construir e comunicar o
conhecimento. O uso combinado das diversas mídias torna possível a construção do conhecimento
coletivo com sujeitos localizados em espaços e tempos distintos, integrados ao mesmo ambiente virtual
ou à mesma comunidade virtual de aprendizagem.
As formas de pesquisar informações e de divulgá-las a um número cada vez maior de pessoas
também se tem alterado a partir da disponibilização dessas tecnologias. Neste sentido, alteram-se,
também, os modos de ensinar-aprender. Assim sendo, temos percebido o surgimento de uma nova
relação entre alunos e professores, que não se centra mais num sistema hierárquico no qual o professor
tem a centralidade do saber, como predominantemente ocorria no processo ensino-aprendizagem.
Nesse contexto, interessa-nos, particularmente, nessa discussão, refletir sobre o papel do
ensino de Geografia frente a essa cultura da virtualidade, principalmente a partir desse movimento para
que se possa constituir como uma ciência fundamental para a construção e reprodução de uma política
em que o objeto principal seja o resgate dos valores sociais.
Sabemos, pois, que a educação escolar sempre se apresentou como um processo abstruso, no
qual o professor interagia pessoalmente e diretamente com os discentes, apoiado em algum meio como
complemento à sua ação pedagógica, tal como o quadro negro, o giz, o livro, dentre outros. Porém, com
o advento das novas mídias eletrônicas os espaços e tempos escolares têm se expandido para além dos
muros escolares e dos currículos e calendários rígidos. A comunicação entre os alunos e professores
pode ocorrer de modo indireto nos ambientes formais como também nos informais (à distância,
descontinuamente) e no tempo (comunicação diferida, não simultânea) (BELLONI, 2006; MORAN,
2007).
Entratanto, essa nova realidade conferida pelo acesso de um número cada vez maior de
pessoas aos meios de comunicação de massa, como o rádio, a televisão, o computador, o telefone
celular, a Internet, dentre outros, tem demudado densamente os ambientes de ensino-aprendizagem. A
“educação pós-moderna” tem, conseqüentemente, prestada maior importância ao processo do
conhecimento e suas finalidades, que com a apropriação de conteúdos, tornando-se assim o que Gadotti
(1997) nomeia de educação multicultural. Nesse sentido a educação, na contemporaneidade, tem
adquirido novos significados, tendo como princípio fundamental o desenvolvimento da autonomia do
aluno, a fim de que este, ao longo de sua formação, construa habilidades e competências para se
autogovernar, ou seja, um sujeito capaz de “fazer por si mesmo”.
Nesse movimento, exige-se que repensemos as nossas práticas comunicacionais em sala de
aula, intentando romper com a lógica na qual estamos acostumados, como a de “falar/ditar”, destacada
por Lévy (1993, p. 8) como “a escola é uma instituição que há cinco mil anos se baseia no falar/ditar do
mestre”. Por isso, entendemos que se faz necessário modificar as práticas docentes cristalizadas na
“emissão” para outras que considerem a participação efetiva do aluno no processo de construção do
conhecimento.
Desse modo, o ensino de Geografia se apresenta como um dos grandes desafios da profissão
docente, na medida em que se exige que os docentes não somente dominem os/aos conceitos/categorias
3
Pierre Levy (2008) considera o ciberespaço ou rede não apenas a infra-estrutura informática, mas também as
relações entre as pessoas que interagem neste ambiente. A interação entre as pessoas no ciberespaço cria novas
formas de comportamentos, de linguagem, de atitudes, de valores, de práticas e costumes que este autor denomina
de cibercultura.
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intrínsecos à instrução dessa disciplina, mas principalmente que saibam escolher e valer-se de diversas
linguagens4, adequadas para cada momento de ensino-aprendizagem. Nesse sentido, reconhecemos que
a linguagem cartográfica tem no mapa uma das formas de representação mais utilizadas no ensino de
Geografia, pois essa forma de representação, por meio de um conjunto de signos, permite uma
percepção imediata do espaço representado. A despeito disso Oliveira (2005, p. 31) afirma que,
Assim sendo, a linguagem dos mapas, desde que compreendida, favorece o entendimento da
organização sócio-espacial, na medida em que permite apreender as características físicas, econômicas,
sociais, ambientais do espaço e, sobretudo, realizar estudos comparativos das diferentes paisagens e
territórios representados em várias escalas.
Entretanto, os mapas em formato impresso não permitem qualquer possibilidade de
interatividade, pois sua apresentação é preestabelecida, linear e estática. Peterson (1999) alerta, para o
fato de as representações mentais derivadas dos mapas em papel restringirem a nossa interação com a
realidade, de modo que se limitam em representar um mundo estático e sem mudanças. Além disso,
esses modelos não podem ser usados eficazmente pela maioria das pessoas, deixando analfabeto ou
semianalfabetos um grande segmento da população no que diz respeito à leitura do mundo por meio de
mapas.
Todavia, as avançadas tecnologias da informação e comunicação e as redes telemáticas têm
permitido a produção e a distribuição de representações cartográficas cada vez mais elaboradas.
Podemos, por exemplo, obter uma multiplicidade de imagens de satélites do nosso planeta, por meio de
informações que, enviadas por redes mundiais de sensores e incorporadas a dados armazenados em
modelos informáticos ultramodernos, permitem realizar simulações e fazer previsões de diversos, de
eventos climáticos, por exemplo, que podem incidir sobre a Terra podendo, até mesmo, evitar algumas
catástrofes humanas e ambientais.
Temos visto que atualmente tem aumentado expressivamente o número de usuários que
buscam o auxílio de imagens de satélites e mapas em meio digital em alternativa aos mapas impressos.
Os recursos cartográficos disponíveis na internet estão crescendo rapidamente. Alguns desses recursos
oferecem uma poderosa ferramenta, denominada de recursos de multimídia, entendida como
combinação de diversas mídias, como textos, gráficos, som, vídeo e animações, que são modalidades
complementares as quais oferecem a oportunidade para o usuário obter um maior e melhor
entendimento dos assuntos de seu interesse ou do seu estudo, principalmente em termos de
representação espacial. (WIEGAND, 2005).
Esses recursos tecnológicos têm possibilitado novas relações entre as pessoas e os mapas na
medida em que a integração de recursos de multimídia à Cartografia favorece a interatividade5, ou seja,
4
A linguagem, nesta discussão, é entendida como sendo os diferentes modos que utilizamos para representar
nossa experiência: imagens, sons, palavras, sensações, sentimentos. Contudo, a linguagem é apenas uma
(re)apresentação da experiência, mas não a experiência propriamente dita, assim como um mapa não é o território
que ele representa.
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O conceito de interatividade tem sido utilizado de diversas formas por autores como Belloni (2001), Primo (1998),
Silva (2002) e Levy (2008) que o compreendem sob diferentes perspectivas. Acredita-se que a utilização da
interatividade se intensificou com o advento da rede telemática nos anos 1980 e no final dos anos 1990, com a
popularização da Internet, passaram a ser criados sites em HTML, contendo links que aumentam a comunicação
entre o indivíduo e o computador. Nesse sentido, Silva (2002, p. 20) conceitua a interatividade como sendo uma
4
o “diálogo” entre o leitor e o mapa, uma vez que torna possível selecionar as informações de acordo
com seus interesses e necessidades. Como exemplo, temos diversos Sites como o Google Maps, Google
Earth, dentre outros, que se dispõem como ferramentas de apresentação de dados em que os usuários
podem não somente visualizar o espaço de diferentes maneiras, como também acrescentar conteúdos
que podem ser somados à base de dados e interligados a outros elementos de multimídia, permitindo uma
“viagem pelo mundo”.
Essa nova forma de representação e de comunicação da informação espacial está se tornando
conhecida como Cartografia Multimídia, sendo que em alguns países essa discussão se encontra em
estágio bastante avançado. No Brasil seu conceito ainda é pouco compreendido, como também limitado
o conhecimento em como utilizá-la no ensino de Geografia visando a potencializar a construção de
conhecimentos sobre a organização espacial do mundo contemporâneo.
Frente a essa indefinição, intentamos, neste artigo, expressar algumas das preocupações que
vêm sendo partilhadas junto ao grupo pesquisa ‘Geografia e Cartografia Escolar’6, com o objetivo de
compreender as seguintes questões: quais são os princípios básicos da Cartografia Multimídia?; quais as
suas contribuições, os seus limites e as perspectivas para o uso dessa linguagem no ensino em
Geografia?; quais são os níveis de interatividade que essa nova linguagem pode proporcionar?; que
critérios devem ser considerados para a sua inserção como componente necessário na estrutura
curricular dos cursos de Licenciatura em Geografia?
Consideramos fundamental ampliar o debate a propósito da formação docente, especialmente
de professores de Geografia, a partir na nova realidade tecnológica em que estamos inseridos. Por isso,
destacamos a necessidade de considerar a Cartografia Multimídia como uma nova linguagem que, a
nosso ver, pode potencializar a compreensão dos conceitos/categorias geográficas, uma vez que permite
a interatividade e oferece meios para uma melhor compreensão do dinâmico processo de organização
espacial.
Esclarecemos, no entanto, que não há intenção, de nossa parte, da institucionalização da
Cartografia Multimídia como um conteúdo a mais nos currículos de licenciatura em Geografia, nem de
se propor metodologias como “receitas” de ensino-aprendizagem. No entanto, entendemos ser
necessário compreendê-la num sentido mais amplo, além de discutir suas limitações e potencialidades
nos cursos de formação de professores de Geografia.
Esse trabalho se insere numa abordagem qualitativa da pesquisa educacional. Assim,
contemplamos o entendimento da Cartografia Multimídia em outra dimensão, que vai além de seus
princípios, leis e generalizações, mas voltado para o entendimento das potencialidades que essa
linguagem pode representar no ensino em Geografia. Para tanto, desde o primeiro estágio da pesquisa
estamos em contato com bibliografias referentes à Cartografia Multimídia, Novas Tecnologias na
Educação, Ensino de Geografia e Formação de Professores, acompanhada de discussões e reflexões,
como auxílio para a fundamentação e elaboração dos instrumentos de investigação. Paralelamente
estamos definindo critérios para análise junto a alguns Websites, a fim de apresentar diretrizes para a
inserção dessa linguagem na estrutura curricular dos cursos de Licenciatura em Geografia.
A partir dessa analogia, podemos entender que o ciberespaço disposto pelas novas TICs pode
potencializar a construção de conhecimentos significativos, a partir do envolvimento de múltiplos
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autores, de maneira não linear, numa perspectiva de rede onde cada conexão pode permitir o enveredar
por outras redes que estão constantemente sendo alteradas de forma participativa.
Nessa perspectiva, a Cartografia Multimídia se mostra como uma nova mídia em que conduz a
um novo relacionamento entre pessoas e mapas, e entre pessoas e mundo real. Um simples “Clic” nos
elementos de um mapa em meio eletrônico, outros dados geográficos relacionados ao mapa podem ser
acessados, tais como número de população ou nomes geográficos para localidades ou áreas, nomes
geográficos ou volume de tráfego (fluxo) para características lineares, pontos de altitude, coordenadas,
distancia áreas de superfícies e mesmo hora local para um específico ponto, além de tantos outros temas
relacionados ao interesse do usuário. Concordamos com Ormeling (1999, p. 69) quando afirma que
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Tradução nossa. “The maps in multimedia cartographic products provide – through theis hotspots – the actual links
to the other multimedia elements, and thereby enable users to acess them. The maps are the most obvius carriers of
these hotspot as these would immediately indicate the geographical position (points, linear objects or areas) and
linked multimedia elements (texts, diagrams, images, drawings, shemes, videos, soun tracks, etc.).
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e) A obrigação moral da comunidade cartográfica: Peterson discorda da idéia difundida na
Cartografia, de que a maioria das pessoas não realiza nenhum tipo de análise espacial, portanto não
precisam de mapas. Ele acredita que os mapas facilitam a compreensão do mundo e oferecem
informações para tomada de decisões significativas, sendo especialmente importantes para a
participação democrática de todos.
Após análises prévias, realizadas nesta etapa de nossa pesquisa, verificamos que alguns dos
materiais cartográficos eletrônicos não apresentam qualidade, podendo inclusive ser pior que os mapas
tradicionais do Atlas. No entanto, outros podem favorecer, em aspectos diferenciados, estudos
significativos acerca de temas relevantes ao ensino da Geografia Escolar.
A seguir, destacamos alguns dos sites que estamos analisandos até o momento:
GEOVOL. http://www.vol.eti.br/geo/ - Este web site traz informações gerais sobre todos os países do
mundo. Assemelha-se a uma versão online de um atlas em papel, mas constitui fonte de informações.
Na opção jogos está disponível um jogo de localização de Estados ou países em suas respectivas
regiões.
DICKINSON, Emily. Como se o Mar se abrisse: Cinqüenta poemas. Trad. de Isa Mara Lando Rio de
Janeiro: Imago; São Paulo: Alumni, 1999. ()
DRANSCH, Doria. Theoretical questions about multimedia cartography. In: CARTWRIGHT, Willian;
PETERSON, Michael P.; GARTNER, Georg. (Org.) Multimedia Cartography. Berlin: Springer-
Verlag, 1999. p. 41-50.
GADOTTI, M. História das idéias pedagógicas. 5. ed. São Paulo: Ática, 1997.
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MOORE, Michael; KEARSLEY, Greg. Educação a distância: uma visão integrada. Trad. de Roberto
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MORAN, José Manuel; MASETTO, Marcos Tarciso; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas
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PETERSON, Michael P. The internet and multimedia cartography. In: CARTWRIGHT, Willian;
PETERSON, Michael P.; GARTNER, Georg. (Org.). Multimedia Cartography. 2. ed. Berlin:
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WIEGAND, P. The best of both worlds? Complementary in educational cartography. Joint ICA
Comissoins Seminar Internet-based cartographic teaching and learning: atlases, map use, and
analytics. Universidad Politécnica de Madrid. 6-8 jul. 2005. p. 149-154.