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DANIEL MAYERLE

O DIREITO ALIMENTAR NA
UNIÃO ESTÁVEL

RIO DO SUL
NOVEMBRO 2000
DANIEL MAYERLE

O DIREITO ALIMENTAR NA
UNIÃO ESTÁVEL

Trabalho de Conclusão de Curso,


apresentado como requisito parcial
para obtenção do título de bacharel no
Curso de Graduação em Direito,
oferecido pela Universidade para o
Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí
- UNIDAVI.

Professor Orientador: Fulvio César


Segundo

RIO DO SUL
III

NOVEMBRO 2000
UNIVERSIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO DO ALTO VALE DO ITAJAÍ
(em Acompanhamento)

FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS, SOCIAIS E LICENCIATURAS

CURSO DE DIREITO

O trabalho de conclusão de curso O DIREITO ALIMENTAR NA


UNIÃO ESTÁVEL, elaborado pelo acadêmico Daniel Mayerle, foi julgado
adequado por todos os membros da Banca Examinadora, para a obtenção
do grau de BACHAREL EM DIREITO e aprovado, em sua forma final, com
conceito _____ pelo Curso de Direito, através da Direção da Faculdade de
Ciências Humanas, Sociais e Licenciaturas da Universidade para o
Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí.

Rio do Sul, 29 de novembro de 2000

Prof. Msc. Fúlvio César Segundo


Orientador do Trabalho de Conclusão de Curso

Apresentado à Banca integrada pelos seguintes professores:

Presidente: Msc. Fúlvio César Segundo

Membro: Esp. Carlos Roberto Claudino dos Santos

Membro: Esp. Rodrigo Jacobsen Reiser

Suplente: Esp. Célio Simão Martignago


.
Sumário

Sumário...................................................................................................................................................................V
Dedicatória............................................................................................................................................................VII
Agradecimentos...................................................................................................................................................VIII
Introdução.................................................................................................................................................................2
Capítulo I - Considerações sobre o Direito Alimentar .............................................................................................4
I.1 Conceito de Alimentos ..................................................................................................................................4
I.2 Aspectos Gerais da Evolução Histórica..........................................................................................................6
I.3 Fontes do Direito Alimentar .........................................................................................................................7
I.3.1 Vontade.....................................................................................................................................................7
I.3.2 Delito ........................................................................................................................................................8
I.3.3 Lei.............................................................................................................................................................9
I.3.3.1 Direito à Alimentos pelo Grau de Parentesco....................................................................................9
I.3.3.2 Direito à Alimentos oriundo do Matrimônio ..................................................................................12
I.3.3.3 Situação dos Alimentos entre Pais e Filhos Maiores ......................................................................14
I.4 Espécies de alimentos...................................................................................................................................15
I.4.1 Quanto à natureza..................................................................................................................................15
I.4.2 De acordo com a finalidade....................................................................................................................16
I.4.3 Quanto à causa jurídica...........................................................................................................................17
I.5 O Dever Alimentar e a Obrigação Alimentar..............................................................................................17
I.6 Requisitos .....................................................................................................................................................19
I.7 Prescrição......................................................................................................................................................20
Capítulo II - Considerações sobre a União Estável ................................................................................................23
II.1 União Estável: Conceito..............................................................................................................................23
II.2 Evolução Histórica da União Estável..........................................................................................................27
II.3 A União Estável a partir Constituição de 1988 ..........................................................................................29
II.3.1 Formas para o reconhecimento da União Estável ................................................................................31
II.3.1.1 Existência de Relação Duradoura...................................................................................................32
II.3.1.2 Publicidade da Relação..................................................................................................................32
II.3.1.3 Continuidade da Relação................................................................................................................33
II.3.1.4 Ausência de Matrimônio Civil e Fidelidade Recíproca..................................................................33
II.3.1.5 União sob Forma de Concubinato..................................................................................................33
II.3.1.6 Constituição de Família..................................................................................................................33
II.4 Direitos decorrentes da União Estável........................................................................................................34
II.4.1 Averbação do Patronímico do Companheiro.........................................................................................34
II.4.2 Adoção pelos Concubinos ....................................................................................................................35
II.4.3 Indenização por Responsabilidade Civil ..............................................................................................35
II.4.4 Indenização pela Morte do Companheiro..............................................................................................36
II.4.5 Reconhecimento de Filhos.....................................................................................................................36
II.4.6 Benefícios Previdenciários....................................................................................................................36
II.4.7 Direito à Meação...................................................................................................................................37
II.4.8 Direito à Sucessão.................................................................................................................................38
Capítulo III - Relação entre o Direito Alimentar e a União Estável ......................................................................40
III.1 A Companheira e sua pretensão alimentar antes da CF de 1988...............................................................40
III.2 Aceitabilidade da Constituição ao Concubinato........................................................................................41
III.3 Alimentos após a Constituição...................................................................................................................42
III.4 Dos alimentos na União Estável.................................................................................................................43
III.5 Ações, ritos e competência.........................................................................................................................45
III.6 Circunstâncias a serem consideradas na interpretação da igualdade na sociedade de fato.......................46
III.6.1 Alimentos entre concubinos, após a Constituição Federal de 1988. ...................................................47
III.6.2 Responsabilidade Alimentar em decorrência da ruptura da União Estável ........................................49
Considerações Finais..............................................................................................................................................51
Referências Bibliográficas.....................................................................................................................................53
VI

Bibliografia Básica.................................................................................................................................................56
Dedicatória

Dedico este estudo a todos os meus


familiares. Mas especialmente ao meu
pai, Sérgio, que muitas vezes
questionou-me, e sem saber, tornava
imprescindível suas perguntas à
consecução deste. À minha mãe,
Iracema, que me chamava à realidade,
quando de meus devaneios.
Agradecimentos

Aproveito esta magnífica e ímpar oportunidade para


manifestar meus sinceros e profundos agradecimentos a todos os que,
direta ou indiretamente, e de diferentes formas, contribuíram para que
este momento fosse uma realidade feliz e, especialmente, ao Professor
Orientador Fúlvio César Segundo, pelo empenho dedicação e paciência,
aos meus professores Frederico Wolfgang Peplau, Carlos Roberto Claudino
dos Santos, Niladir Butzke, Walter Carlos Seyfferth, Marcos Aurélio
Zimmermann e Célio Simão Martignago, que fizeram dos seus escritórios,
laboratórios de estudo para a confecção deste, à Central de Livros,
especialmente a pessoa do Sr. Dickson, que sem o fornecimento de seu
material bibliográfico, impossível seria esta realização , e ao Sr. Willy
Hoffmann, do qual quase tornei-me “sócio” de sua cantina, aos amigos e
colegas de trabalho que tanto suportaram a pressão submetida e também
para aqueles, que não foram citados, mas que contribuíram de forma
decisiva, social e psicologicamente.

E, evidentemente, à Deus, que me permitiu continuar onde


outros pereceram.

Porque são estes os motivadores e animadores desse árduo


desafio.
Introdução

Tradicionalmente, no Direito Brasileiro, sempre se entendeu


que somente a esposa legítima teria direito de reclamar pensão
alimentícia, vez que o dever de mútua assistência do Art. 231, Inciso III 1, e
de manutenção da família do Art. 233, inciso IV 2, ambos do Código Civil,
representam efeito específico do casamento.

Tendo, porém, a Constituição da República Federativa do


Brasil, de 05 de outubro de 1988, em seu Artigo 226, § 3.º reconhecido,
para efeito da proteção do Estado, "a união estável entre o homem e a
mulher como entidade familiar", renovam-se agora as digressões
doutrinárias e jurisprudenciais no sentido de saber se, no elastério da
norma constitucional, teria sido instituído o direito de alimentos entre
“concubinos”.

No direito anterior, exauria-se a pretensão da companheira


à simples partilha dos bens havidos em razão da "sociedade de fato".
Nesta linha, tranqüila jurisprudência vinha decidindo reiteradamente pela
inexistência de obrigação legal de alimentos em favor da companheira. A
doutrina manifestava-se uniforme neste sentido. Discutia-se, apenas,
quanto à eficácia dos alimentos prometidos ou convencionados quando da
dissolução da sociedade de fato.

Destaca-se que a união estável vêm ocorrendo em toda a


população e não apenas na de baixo nível cultural, sendo exemplo claro
disso as inúmeras situações de fato existentes entre homem e mulher,

1
“Art. 231. São deveres de ambos os cônjuges: (...) III - Mútua assistência.”
(Brasil, 1999, p. 99).
2
“Art. 233. O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que exerce com a
colaboração da mulher, no interesse comum do casal e dos filhos (artigos 240, 247 e
251).Compete-lhe: (...) IV - Prover a manutenção da família, guardadas as disposições dos
artigos 275 e 277” (Brasil, 1999, p. 100).
3

sendo assim necessário conferir e mensurar os diretos e deveres dela


decorrentes.

Contudo, enorme celeuma existe em torno do tema, vez que


como anteriormente esposado, houve o reconhecimento, assegurando a
nova Constituição a proteção do Estado à união estável, daí exsurge-se o
questionamento acerca da obrigação alimentar entre companheiros.

Objetiva-se verificar a possibilidade ou não da aplicabilidade


da concessão de alimentos à companheira ou o companheiro necessitado,
ante a nova Carta Magna, buscando coletar em renomados juristas e
doutrinados, bem como os julgados dos tribunais pátrios, considerando
circunstâncias e avaliando as produções literárias até agora existentes.

Devido ao parco e, no mínimo, absurdo tempo para a


elaboração, bem como a insuficiência total das referências bibliográficas
existentes junto ao acervo da Universidade para o Desenvolvimento do
Alto Vale do Itajaí, das quais somente poderiam ser retiradas três obras
por vez, limita-se esta trabalho àquilo constante em bilbiotecas de outros
educandários, bem como no acervo particular de muitos professores, que
gentilmente, auxiliaram neste ínterim.

Assim, o estudo ora apresentado tece, inicialmente,


caracteres próprios sobre o Direito Alimentar, especificamente situando a
correta acepção jurídica do vocábulo “alimentos”, explanando de forma
breve suas caraterísticas. O mesmo ocorre com a união estável, que
também deve ser conceituada e contextualizada, no afã de possibilitar
esclarecimentos acerca da possibilidade ou não de existir obrigação
alimentar no concubinato, verificando assim a relação existente entre o
Direito Alimentar e a União Estável.
Capítulo I - Considerações sobre o Direito Alimentar

I.1 Conceito de Alimentos

Os alimentos estão relacionados com o sagrado direito à


vida, e representam dever de subsistência que os parentes têm, uns em
relação aos outros, para suprir necessidades decorrentes de deficiência
etária; incapacidade laborativa; enfermidade grave e outras adversidades
da vida.

Assim, no entender de Viana (1993, p. 201), “os alimentos


constituem as prestações em dinheiro ou espécie, fornecidas a uma
pessoa para que ela possa viver.”

Inicialmente, o assunto faz menção à família. Com relação à


prole, respeite ela à filiação natural, biológica ou civil, fruto da adoção, os
alimentos são devidos por intransponível presunção dos alimentários
necessitarem suplantar seu natural processo fisiológico de formação e
preparo à vida profissional.

Das relações de parentesco decorrem muitas obrigações


para as pessoas ligadas entre si pelo vínculo familiar. Assim, nesta
concepção, faz-se necessária a correta conceituação do que vem a ser
alimentos. Primordialmente, busca-se no escólio de Náufel (1984, p. 116),
a sua compreensão da acepção jurídica do vocábulo:

“O termo serve para designar as necessidades primárias do alimentando,


isto é, as primeiras necessidades que a vida reclama, imprescindíveis a
qualquer ser humano, assim se compreendendo o sustento, a habitação,
o vestuário, assistência médica no caso de enfermidade, remédios e tudo
aquilo que for indispensável à vida ordinária.”
5

Colhendo o que foi acima esposado, de pronto pode ser


verificada a complexidade do assunto, onde permanece claro que o
sentido jurídico do termo deve ser entendido com amplitude muito maior
do que a simples interpretação gramatical.

Aprofundando a questão, Gusmão (1987, p. 33), traça outros


caracteres da prestação alimentar, ao conceituar os alimentos como
sendo:

“Prestação, irrenunciável e impenhorável, temporariamente fixa, sujeita a


reajustamentos por acordo ou por decisão judicial, em regra em dinheiro,
destinada a satisfazer necessidades existenciais do alimentando, dentro
das possibilidades do alimentante, tendo por fonte parentesco ou
casamento.”

Embora muito bem destacada, cabe elucidar que os


alimentos podem decorrer também, de ato ilícito ou de testamento.
Evidente que a finalidade testamentária vem contida no próprio
instrumento e interpretado como obrigação ao legatário. Já no
concernente aos alimentos que tem por fonte o ato ilícito, constituem na
realidade forma de reparação ao dano causado. Além disso, menciona o
caráter irrenunciável e impenhorável dos alimentos, extremamente
importante para assegurar a condição de vida do alimentado.

Wald (2000, p. 40), tecendo considerações sobre a


irrenunciabilidade e imperabilidade dos alimentos, muito acresce ao
mencionar:

“O caráter imperativo das normas sobre alimentos tem como corolários


serem estes irrenunciáveis, como o próprio direito à vida. O necessitado
pode deixar de exercer o direito de exigir alimentos, mas a eles não pode
renunciar (art. 404 do CC). São ainda os alimentos impenhoráveis (art.
649, VII, do CPC), atendendo a sua própria finalidade, que consiste em
assegurar a manutenção do alimentando e não em pagar as suas
dívidas.”

Resta assim, evidenciada a finalidade alimentar, como


sendo a manutenção das necessidades básicas do alimentado e não o seu
locupletamento ilícito.
6

I.2 Aspectos Gerais da Evolução Histórica

O instituto trazido à baila, remonta tempo antigos. Em


verdade, Cahali (1994, p. 37) reconhece que “não há uma determinação
precisa do momento histórico a partir do qual essa estrutura foi se
permeabilizando no sentido do reconhecimento da obrigação alimentar no
contexto da família”.

Existem suposições no sentido de afirmar que, inicialmente,


restou consubstanciado o reconhecimento da obrigação alimentar como
em decorrência da própria formação da família, onde o ser humano
primitivo caçava para alimentar a prole.

Na história, especificamente na época de Justiniano, restou


reconhecida a obrigação recíproca entre descendentes e ascendentes, em
linha reta e ao infinito, paternos e maternos na família legítima e na linha
colateral até a primeira casa. Deixou de ser dever moral, para
transformar-se em obrigação jurídica em decorrência de vários fatores
(Cahali, 1994, p. 38-9).

O Código Civil, de 1.º de janeiro de 1916, mencionou a


existência da obrigação alimentar, contudo seu enfoque foi extremamente
disperso e difuso, eis que sua sistematização não vinha preconizada,
sendo necessário a criação de precedentes jurisprudenciais, afim de
orientar de forma clara referido instituto.

Aproveita-se a orientação, acerca da evolução história do


Direito Alimentar, da obra de Cahali (1994, p. 94), que segue transcrita:

“Tivemos assim, o Dec.-lei 3.200, de 19.4.41 (Lei de Proteção à Família),


preconizando em seu art. 7.º, o desconto em folha da pensão alimentícia;
igualmente desse desconto em folha, cuidaram o Estatuto dos
Funcionários Públicos Civis (Lei 1.711/52, art. 126) e o Estatuto dos
Funcionários Públicos Militares (Dec.-lei 9.698/46, art. 40) a Lei 968, de
10.12.49, instituindo a tentativa de acordo nas causas de desquite
litigioso e alimentos, inclusive os provisionais (art. 1.º); a Lei 883, de
21.10.49, cuidando de alimentos provisionais em favor do filho ilegítimo
reconhecido pela sentença de primeira instância; a Lei 5.478, de 25.7.68,
que dipõe sobre a ação de alimentos; o novo Código de Processo Civil,
que, em seus arts. 732 a 735, disciplina a execução da prestação
7

alimentícia; e, finalmente, a Lei do Divórcio que, confusamente,


introduziu substanciais modificações em matéria de alimentos.”

Inobstante, a própria evolução história do Direito Alimentar


poderia servir de base a uma monografia inteira, contudo, por não ser este
o objetivo do trabalho, atem-se as linhas levemente traçadas, afim de que
seja dado maior enfoque a questões mais relevantes para este estudo.

I.3 Fontes do Direito Alimentar

Como se sabe, três são as fontes da obrigação alimentar,


quanto a causa jurídica: a) a lei, quando a obrigação decorre de texto ou
determinação legal; b) a vontade, quando ocorre o pagamento de verba
alimentar por faculdade do alimentante; c) o delito, em sentido amplo, aí
compreendido o ato ilícito. Não existe dúvida no que pese a natureza
jurídica da indenização aí referida. Trata-se, evidentemente, de natureza
alimentar.

Sobre este assunto Wald (1998, p. 81) indica que “Temos


pois, atualmente, como fonte das obrigações, no direito civil brasileiro, os
atos jurídicos (unilaterais ou bilaterais), os atos ilícitos que geram a
responsabilidade civil e a lei.”

Destarte, resultam as fontes do Direito Alimentar, como


sendo os atos jurídicos, entendidos aqui como a declaração de vontade, os
atos ilícito e a lei, que passam a ser abordados.

I.3.1 Vontade

No entender de Guimarães (1990, p. 548), a vontade vem a


ser a “Faculdade que o homem possui de determinar, orientar a sua
conduta , de optar livremente, pela ação ou pela omissão. Exercício dessa
faculdade. Livre disposição para agir e decidir por si próprio."
8

A própria Lei 5.478, de 25 de julho de 1968, prevê, em seu


Art. 243, que a parte, responsável pelo sustento da família, sair da
residência comum, por motivos que não necessita declarar, têm
legitimidade para declarar ao juízo, seus rendimentos e a partir de então
requer a citação outro interessado para ser verificada possibilidade de
conciliação, resultando em posterior acordo de pagamento de pensão
alimentícia.

Sobre o tema discorre Cahali (1994, p. 19):

“A aquisição do direito resulta de ato voluntário sempre que os sujeitos


pretendem a criação de uma pretensão alimentícia; a obrigação assim
estatuída pode sê-lo em benefício do próprio sujeito da relação jurídica
ou a benefício de terceiro; se se pretendeu a constituição de um direito
de alimentos em favor de terceiro, o ato jurídico toma a forma de ato
jurídico a título gratuito quanto àquele que institui o benefício, com a
outra parte assumindo o encargo de prestar alimentos ao terceiro
necessitado, ao qual se obrigou a socorrer; se, ao contrário, mediante o
ato jurídico, o necessitado visou constituir para si um direito alimentar, o
ato jurídico, criador da obrigação de prestar, assume o caráter de ato
jurídico oneroso.”

Da brilhante exposição, observa-se que pode muito bem a


vontade também ser elemento considerado como fonte da obrigação do
direito alimentar.

I.3.2 Delito

Outra fonte do Direito Alimentar decorrente de norma legal,


sucede quando a obrigação vem a ser conseqüente da prática de ato
ilícito, representado esta, forma de indenização do dano advindo do delito.

Assim, cuidando o Código Civil da liquidação das obrigações


resultantes de atos ilícitos, dispõe o seu Art. 1.537, Inciso II, que a
indenização, no caso de homicídio, consiste em assumir a condição
daquele que por sua causa pereceu.

3
“Art. 24. A parte responsável pelo sustento da família, e que deixar a residência
comum por motivo, que não necessitará declarar, poderá tomar a iniciativa de comunicar
ao juízo os rendimentos de que dispõe e de pedir a citação do credor, para comparecer à
audiência de conciliação e julgamento destinada à fixação dos alimentos a que está
obrigado.” (Brasil, 2000a, p. 1074).
9

“Art. 1537. A indenização, no caso de homicídio, consiste:


I - No pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral
e o luto da família.
II - Na prestação de alimentos às pessoas a quem o defunto os devia.”

Adiante, no Art. 1.539 do mesmo cânon colhe-se:

“Art. 1539. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa
exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua o valor do trabalho, a
indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao
fim da convalescença, incluirá uma pensão correspondente à importância
do trabalho, para que se inabilitou, ou da depreciação, que ele sofreu.”

Dessa forma existe transmissão da responsabilidade sobre o


pensionamento, onde inclusive a vítima passa a ser credor do causador
do dano. Caso resulte na morte da vítima, o agente causador do dano,
ocupa-lhe o lugar na obrigação alimentar perante seu dependente,
ocorrendo substituição do devedor de alimentos, mas daí também por
disposição legal, que será vista à seguir.

I.3.3 Lei

Discussão havida no Direito Civil, sobre se, em razão da


diversidade de causas geradoras do direito a alimentos, no concernente a
sua origem legal, onde seriam também distintas as obrigações daí
decorrentes. Assim, passa-se ao estudo de algumas dessas
circunstâncias.

I.3.3.1 Direito à Alimentos pelo Grau de Parentesco

Os alimentos estão relacionados com o sagrado direito à


vida, e representam dever de subsistência que os parentes têm, uns em
relação aos outros, para suprir necessidades decorrentes de deficiência
etária; incapacidade laborativa; enfermidade grave e outras adversidades
da vida. Com relação à prole, respeite ela à filiação natural, biológica ou
civil, fruto da adoção, os alimentos são devidos por intransponível
presunção dos alimentários necessitarem suplantar seu natural processo
fisiológico de formação e preparo à vida profissional.
10

Bittar (1994, p. 1.168) aduz que por preceito constitucional


do art. 229, da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de
outubro de 19884, e com escora na posterior Lei 8.648, de 20 de abril de
1993, os filhos também devem alimentos aos pais, na velhice, carência e
enfermidade, e não obstante já fosse obrigação decorrente das relações
de parentesco, ela restou reforçada pela Carta Magna em vigor, no
capítulo pertinente à família, da criança, do adolescente e do idoso.

Por sinal, a Constituição da República Federativa do Brasil,


de 5 de outubro de 1988, bem separa no seu Art. 227, caput,5 ser dever
da família, em primeiro plano, assegurar à criança e ao adolescente, com
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
ao lazer, à profissionalização.

Esclarece Viana (1993, p. 20) que o Estado toma a si a


assistência social, respondendo e sabido que com grande deficiência, pelo
serviço de saúde e velando também pela administração política, para que
não falte trabalho e meio de vida para todos.

Contudo, o dever de solidariedade entre os seres humanos


trafega pelo círculo familiar e comete aos parentes o dever de socorro que
se devem entre si, nas contingências da vida, pois no dizer de Monteiro
(1994, p. 289) “o direito à existência é o primeiro dentre os direitos
congênitos.”

Na esteira desta linha de argumentação, nota-se que nem o


devedor pensional resta desprotegido da sua própria subsistência, no
exato instante em que a legislação pátria lhe veda a possibilidade de doar
todos os seus bens, já que precisa preservá-los no montante suficiente

4
“Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os
filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou
enfermidade.” (Brasil, 2000, p. 127).
5
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e
à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.” (Brasil, 2000, p.
125).
11

para sua manutenção pessoal6, e assim, também assegura o crédito


alimentar dos seus dependentes, objetivando a lei a hipótese de isenção
pelo devedor de pensão, sob a alegação de completa insolvência, corolário
de integral doação patrimonial.

O parentesco distribui-se em classes, de acordo com os


diversos aspectos de vinculação e se define como sendo o vínculo
existente entre as pessoas em decorrência da consangüinidade, da
afinidade e da adoção.

Roque (1994, p. 133) ressalta que: “Não é tão simples dizer


quem é parente, pois há muitas ligações de parentesco e vários graus de
ligação. O parentesco é um vínculo familiar; é o elo que une os
componentes de uma família”.

Deve, portanto, resultar esclarecida a igualdade na filiação


alcançada pelo Art. 227, § 6.º da Constituição da República Federativa do
Brasil, de 5 de outubro de 19887, desenhando já sem tempo, um novo
perfil no Direito de Família brasileiro, exatamente no encalço da tendência
mundial de igualização da prole.

Explica Bittar (1994, p. 1.134-6) que o parentesco produz no


âmbito jurídico, efeitos básicos, pessoais e patrimoniais, dentre eles, a
geração da obrigação de prestar alimentos, quer na linha reta, como na
transversal, não devendo ser olvidado que não são parentes, um do outro,
marido e a mulher, mas sim pólos da relação conjugal.

O Código Civil indica quais os parentes obrigados à tutela


alimentar, que como referido, existe reciprocamente entre pais e filhos 8 e
6
Previsto no Art. 1.174, do Código Civil Brasileiro, de onde colhe-se o seguinte:
“Art. 1174. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se
sobreviver ao donatário.”(Brasil, 1999, p. 234).
7
“Art. 227. (...) § 6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por
adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações
discriminatórias relativas à filiação.”(Brasil, 2000, p. 127).
8
Conforme assegurado no Art. 397, do Código Civil Brasileiro, de onde colhe-se
“Art. 397. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a
todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de
outros.” (Brasil, 1999, p. 125).
12

na falta destes, os demais ascendentes, na ordem de proximidade do grau


de parentesco, assim como na falta dos ascendentes, emana dos
descendentes tal dever, observada a ordem de sucessão e por último, os
irmãos, germanos ou unilaterais.

Importante se faz a lição de Monteiro (1994, p. 291):

“Acentue-se, desde logo, o cunho tipicamente familiar do instituto que se


funda, exclusivamente, no vínculo de parentesco, no jus sanguinis. Só os
parentes, isto é, as pessoas que procedem de um mesmo tronco
ancestral, devem alimentos. Não existe semelhante obrigação entre
afins, por mais próximos que seja o grau de afinidade.”

Inexiste obrigação alimentar entre os afins e entre os


parentes, ligados por laços de sangue ou oriundos da adoção, ficam
circunscritos ao segundo grau, na linha colateral.

I.3.3.2 Direito à Alimentos oriundo do Matrimônio

Pela relação conjugal também existe o dever alimentar


advindo do dever de mútua assistência, preconizado pelo Art. 231, Inciso
III, do Código Civil9 e principalmente, do Art. 19, da Lei do Divórcio 10, a
ostentar que o consorte responsável pela separação, deve ao outro, se
deles necessitar, alimentos para sua subsistência.

Assim, na constância do casamento, a mútua assistência


reserva em si, sentido muito mais amplo, do que o significado alimentar,
porquanto, sua interpretação literal abarca os cuidados devotados por um
esposo ao outro, em todas as necessidades e adversidades da vida,
lastreado na comunidade de interesses e identidade de afeições,
presentes no campo material, moral, afetivo e nos aspectos da saúde.

Relacionada a mútua assistência dentre um dos deveres do


casamento, fica fácil compreender o traço distintivo entre o direito

9
“Art. 231. São deveres de ambos os cônjuges: (...) III - Mútua assistência.” (Brasil,
1999, p. 99).
10
“Art. 19. O cônjuge responsável pela separação judicial prestará ao outro, se
dela necessitar, a pensão que o juiz fixar.” (Brasil, 1999, p. 743).
13

pensional das pessoas ligadas por graus de parentesco e entre os


cônjuges, que não são parentes e se devem alimentos de forma recíproca.

Esta vem a ser a expressão da verdade, eis que no Código


Civil, os alimentos regulados pelos Arts. 396 a 40511, se encontram
insertos no título V - Das Relações de Parentesco, do qual os alimentos são
subtítulo, inexistindo naqueles dispositivos qualquer referência à
alimentos conjugais e iniciando o art. 396 do Código Civil, com a
inequívoca assertiva, dos parentes poderem exigir uns dos outros os
alimentos de que necessitem para subsistir.

11
“Art. 396. De acordo com o prescrito neste capítulo podem os parentes exigir
uns dos outros os alimentos, de que necessitem para subsistir.
Art. 397. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e
extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns
em falta de outros.
Art. 398. Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada
a ordem da sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos, como unilaterais.
Art. 399. São devidos os alimentos quando o parente, que os pretende, não tem
bens, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e o de quem se
reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.
Parágrafo único. No caso de pais que, na velhice, carência ou enfermidade,
ficaram sem condições de prover o próprio sustento, principalmente quando se
despojaram de bens em favor da prole, cabe, sem perda de tempo e até em caráter
provisional, aos filhos maiores e capazes, o dever de ajudá-los e ampará-los, com a
obrigação irrenunciável de assisti-los e alimentá-los até o final de suas vidas. (Parágrafo
acrescentado pela Lei 8.648, de 20.04.1993)
Art. 400. Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do
reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
Art. 401. Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na fortuna de quem os
supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar do juiz, conforme as
circunstâncias, exoneração, redução, ou agravação do encargo.
Art. 402. A obrigação de prestar alimentos não se transmite aos herdeiros do
devedor. (Revogado implicitamente pela Lei nº 6.515, de 26.12.1977)
Art. 403. A pessoa obrigada a suprir alimentos poderá pensionar o alimentando,
ou dar-lhe em casa, hospedagem e sustento.
Parágrafo único. Compete, porém, ao juiz, se as circunstâncias exigirem, fixar a
maneira da prestação devida.
Art. 404. Pode-se deixar de exercer, mas não se pode renunciar o direito a
alimentos.
Art. 405. O casamento, embora nulo, e a filiação espúria, provada quer por
sentença irrecorrível, não provocada pelo filho, quer por confissão, ou declaração escrita
do pai, fazem certa a paternidade, somente para o efeito da prestação de alimentos.”
(Brasil, 1999, p. 125-7).
14

I.3.3.3 Situação dos Alimentos entre Pais e Filhos Maiores

Já foi mencionado existir ilimitada obrigação alimentar


endereçada aos filhos menores e incapazes, deles dimanando inclusive, a
presunção absoluta da necessidade pensional, conseqüência natural do
pátrio poder, a envolver a esfera material, moral, afetiva e profissional,
pois engloba amplamente, o dever de sustento, criação e educação. Com
a maioridade civil o pátrio-poder desaparece e com ela, a presunção legal
e absoluta da necessidade alimentícia dos descendentes.

Ascendendo à adultíce, comete aos próprios filhos se auto-


sustentarem e o crédito pensional passa a ser verdadeira exceção. Sucede
nesse caso, a cessação do que era obrigação alimentar absoluta, arbitrada
por presunção natural de necessidade, para dar lugar excepcional, ao
dever de alimentos, conquanto que o filho já maior, demonstre seu estado
de miserabilidade.

A matéria sempre mostra-se delicada aos juízos familiares


que podem, numa ação exoneratória, desonerar o devedor liminarmente,
provado o mero implemento da maioridade civil, muitas vezes já
motivados por prova antecipada de exercício de alguma atividade laboral
pelo alimentando, livrando o obrigado alimentar destarte, do encargo
irrestituível de uma demorada ação de exoneração de pensão, que se
agrava pela continuação de uma obrigação alimentícia que a própria lei
presume extinta com o fim do pátrio poder.

Gusmão (1987, p. 36) manifesta-se sobre o tema:

“A maioridade pode não ser causa da extinção da obrigação se houver


necessidade dos mesmos, seja por motivo de estudo, seja por
desemprego ou subemprego e seja por doença do descendente ou de
pessoa de sua família (esposa ou filho), desde que sem recursos para
atender as despesas no último caso e, em todos, desde que o ascendente
esteja em condições de dar alimentos.”

Buscando a solução processual mais apropriada, capaz de


impedir lesões pecuniárias do devedor ou do credor alimentar em ação
exoneratória de alimentos, enquanto o decisor apura aonde reside o
15

direito, está na proposição de ação de exoneração cumulada com pedido


expresso de restituição das pensões pagas a contar da citação, com fulcro
no enriquecimento sem causa, caso seja admissível tal possibilidade.

Destarte, não se descuidará o alimentante de levantar a fiel


correspondência dos requisitos autorizadores da cessação da obrigação
pensional e nem olvidará o credor de lançar mão das prestações que lhe
deixaram de ser devidas com a assunção da sua auto-suficiência
financeira.

I.4 Espécies de alimentos

A doutrina, de forma geral, classifica os alimentos segundo


critérios próprios. Assim, concentrar-se-à o presente estudo naquelas
consideradas principais por Diniz (1998, p. 399), sendo estas quanto a
finalidade, à natureza e a causa jurídica.

I.4.1 Quanto à natureza

No concernente à natureza, os alimentos podem ser


classificados como naturais e civis. Naturais são aqueles que
compreendem o estritamente necessário à subsistência do alimentando,
enquanto que os civis, preenchem outras necessidades, como as
intelectuais e morais.

“Chamam-se alimentos civis os alimentos que incluem as despesas com


educação e instrução do alimentado. Têm igual denominação os que são
determinados por meios judiciais, antendendo-se às disposições legais.
(...) Alimentos naturais, quando se destinam a prover à necessidades
primárias do alimentário, ou sejam, despesas com alimentação,
habitação, vestuário e enfermidades.” (Náufel, 1984, p. 117)

Assim, todo gasto que compreender o desenvolvimento


intelectual, bem como lazer, esporte e outras atividades com o mesmo
cunho, qual seja a melhoria do alimentado como ser humano tem o cunho
civil.
16

Quando se tratar de prover o sustento do alimentado,


entendido o provento e condições mínimas de vida, como alimentação,
estar-se-à falando dos alimentos naturais.

Restando clara esta diferenciação, passa-se à próxima.

I.4.2 De acordo com a finalidade

Acerca da finalidade, os alimentos, segundo Cahali (1994, p.


23) classificam-se em provisionais e regulares. Explica adiante suas
características:

“Dizem-se provisionais, provisórios ou in litem, os alimentos que,


precedendo ou concomitantemente à ação de separação judicial, de
divórcio, de nulidade ou anulação do casamento, ou ainda à própria ação
de alimentos, são concedidos para a manutenção do suplicante ou desde
e de sua prole, na pendência do processo, compreendendo também o
necessário para cobrir as despesas da lide.”

Antes de tecer considerações mais profundas sobre os


alimentos regulares, faz-se necessário esclarecer, que conforme Negrão,
em comentários ao Código Processual Civil (2000, p. 1065), os alimentos
provisionais e provisórios são diferentes, vez que enquanto os primeiros
são estabelecidos como medida cautelar nas ações de separação
contenciosa e de anulação de casamento, bem como nas de divórcio e na
sentença da ação de investigação de paternidade; os segundos são os
fixados nas ações de alimentos que seguem o rito prescrito na Lei
5.478/68, em conformidade com o seu Art. 4.º. Em síntese, os alimentos
provisionais tem natureza cautelar e os provisórios são aqueles fixados in
initio litis12.

Mais adiante, Negrão, em comentários ao Código Processual


Civil (2000, p. 1065) acaba por definir também os alimentos definitivos,
também chamados de regulares, veja-se: “definitivos são os alimentos
que decorrem de sentença transitada em julgado e que, por isso mesmo,
substituem os provisionais e os provisórios”, não permitindo assim que
fosse instaurada qualquer celeuma.

12
“No início da lide, ao ser intentada a demanda.” (Náufel, 1984, p. 627).
17

I.4.3 Quanto à causa jurídica

No entender de Diniz (1998, p. 399), a obrigação alimentar


pode vir em decorrência da vontade, sendo assim chamada de voluntária.
Também pode ser legítima, se imposta por lei, em virtude do fato de
existir entre as pessoas vínculo de família ou de parentesco. Ainda pode
ser entendida como ressarcitória, destinada a indenizar a vítima em
decorrência de ato ilícito.

Especial característica esta no apontamento da obrigação


alimentar em decorrência de ato ilícito que leva a refletir, que se o credor
dos alimentos tem a prestação interrompida por ato do agente que, com
seu atuar culposo, tirou a vida ao devedor de tais alimentos.

Tal raciocínio se aplica à hipótese prevista no artigo 1.539,


do Código Civil13, onde a própria vítima passa a ser credora de um
pensionamento, revestido da mesma natureza alimentar, em face do
causador do dano.

O que se dá, em sede de ato ilícito, vem a ser o caso onde o


agente causador do dano, ao tirar a vida do prestador de alimentos,
ocupa-lhe o lugar na obrigação alimentar perante seu dependente. Existe
substituição do devedor de alimentos, por disposição legal.

I.5 O Dever Alimentar e a Obrigação Alimentar

A fim de poder aprender com maior clareza a distinção entre


obrigação alimentar e dever de prestar alimentos, faz-se necessário ter
presente a noção de família nuclear, formada basicamente, pelo par
andrógino e seus filhos, evidentemente, quando existentes.

13
“Art. 1539. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer
o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua o valor do trabalho, a indenização, além das
despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá uma
pensão correspondente à importância do trabalho, para que se inabilitou, ou da
depreciação, que ele sofreu.” (Brasil, 1999, p. 283).
18

A este núcleo familiar, segundo Viana (1993, p. 22-25) deita


obrigação de alimentos calcada no vínculo de solidariedade que se mostra
muito mais intenso e significativo. Já no respeitante ao dever pensional
parental, devem ser enquadrados os parentes de graus mais distantes,
como avós e irmãos, sobre os quais pesa igualmente dever de
solidariedade, no entanto, sem lhes impor sacrifícios, pois atrelados à
assistência nos limites das forças de seus recursos.

Conforme Bittar (1994, p. 1.169), a obrigação alimentar


entre pais e filhos pode ser considerada como ilimitada e vai ao extremo
de exigir a venda de bens para cumprimento da obrigação filiada ao
princípio constitucional do direito à vida, dentro da dignidade da pessoa
humana, conforme preceituam os Art. 1.º14 e 5.º15 da Constituição da
República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988.

Em nada diverge o entendimento de Cahali (1994, p. 400),


ao mencionar:

“Todos os esforços dos pais devem ser orientados no sentido do filho


por eles gerado, um ser em condições de viver por si mesmo, de
desenvolver-se e sobreviver sem o auxílio de terceiros, tornando à sua
vez capaz de ter filhos, em condições de criá-los.”

Nem leva à ilação distinta a regra inserta no Art. 21 da Lei


do Divórcio16, que assegura com a implemantação de garantia real ou
fidejussória, o pagamento da pensão alimentícia, como conseqüência do
pátrio-dever, conforme moderna e majoritária corrente doutrinária, a
defesa dos interesses da prole pelos pais, como se casados estivessem,
14
“Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito
e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana;” (Brasil, 2000, p. 03).
15
“Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes: (...)” (Brasil, 2000, p. 05).
16
“Art. 21. Para assegurar o pagamento da pensão alimentícia, o juiz poderá
determinar a constituição de garantia real ou fidejussória.
§ 1º. Se o cônjuge credor preferir, o juiz poderá determinar que a pensão consista
no usufruto de determinados bens do cônjuge devedor.
§ 2º. Aplica-se, também, o disposto no parágrafo anterior, se o cônjuge credor
justificar a possibilidade do não recebimento regular da pensão.” (Brasil, 1999, p. 743)
19

sobrepondo inclusive, seus interesses pessoais, se em confronto com as


necessidades dos descendentes menores, ou incapazes de por si
buscarem seu efetivo sustento.

Assim, a obrigação alimentar resta incondicionada, dos pais


em relação aos filhos, enquanto menores ou incapazes, sofrendo limites e
restrições no âmbito do vínculo conjugal e do parentesco existente fora do
pátrio poder.

Em linhas gerais, existe dever alimentar relativo também


entre cônjuges e de parentes distanciados em grau da sociedade
doméstica e viceja obrigação alimentar irrestrita, quando cuida de dar
sustento, educação, saúde, lazer e formação aos descendentes, enquanto
sob o pálio do pátrio poder.

I.6 Requisitos

Os requisitos indispensáveis à obrigação alimentar,


entendidos como sendo a carência do alimentado e a possibilidade do
alimentante, encontram-se presentes no Art. 39917, do Código Civil
Brasileiro. Da simples leitura do referido instituto, observa-se que não
existe permissivo legal para aquele que dispõe de bens ou então que está
em condições de subsistir com seu próprio labor, requerer alimentos de
outrem.

Na maioria das situações, entende-se que o adulto são deve


ser capaz de desempenhar atividade laboral, afim de prover seu próprio
sustento. Caso o requerente encontre-se em estado de penúria, não se
encaixando nas excludentes acima mencionadas, faz jus à verba
alimentar. Cahali (1994, p. 549) explica que:

“O pressuposto da necessidade do alimentando somente se descarateriza


se referidos bens de que é titular se mostram hábeis para ministrar-lhe
rendimento suficiente a sua mantença: ou não se mostra razoável exigir-

17
“Art. 399. São devidos os alimentos quando o parente, que os pretende, não tem
bens, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e o de quem se
reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.” (Brasil, 1999,
p. 125).
20

lhe a conversão de tais bens em valores monetário capazes de atender


aos reclamos vitais do possuidor.”

No Art. 40018, do Código Civil Brasileiro, encontram-se


apontados os critérios para a fixação da pensão alimentícia como sendo as
necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante.

Sobreleva, portanto, nesta matéria, a importância da prova,


a ser sopesada caso por caso com a infinita gama de diversidades
ocorrentes, exigindo por parte do Juiz uma criteriosa avaliação, para que
não resulte desarrazoadamente beneficiada uma das partes em
insuportável detrimento de outra, lembrando-se sempre que a pensão
vem concedida de acordo com a necessidade e não de acordo com a
vontade do requerente.

Há bens, mesmo de valor, que dão pouco ou nenhum


rendimento, podendo até mesmo ocasionar apenas despesas, de maneira
que não será esse elemento que poderá servir de padrão de referência.

Viana (1993, p. 208), acerca dos critérios de fixação e dos


requisitos dos alimentos, assim esclarece:

“O exame da necessidade de quem pede e a fortuna de quem fornece é


imperativo em cada caso concreto, em decorrência do princípio da
proporcionalidade. Eles não se aplica em havendo dever familiar, pois
seu cumprimento se faz incondicionalmente.”

Importa entender que a sentença fixadora pensão


alimentícia não faz coisa julgada, podendo ser aumentada se ocorrer
aumento nas possibilidades de quem a presta, ou diminuída na
eventualidade contrária.

I.7 Prescrição

Inicialmente, faz-se necessária a definição do termo


prescrição, que para Bevilaqua apud Náufel (1984, p. 751):

18
“Art. 400. Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do
reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.” (Brasil, 1999, p. 126).
21

“É a perda da ação atribuída a um direito, de toda a sua capacidade


defensiva, em conseqüência do não uso dela, durante um determinado
espaço de tempo. Não é a falto do exercício do direito, que lhe tira o
vigor; o direito pode conservar-se inativo, por longo tempo, sem perder a
sua eficácia. É o não uso da ação que lhe atrofia a capacidade de reagir.”

Conforme sobejamente acima demonstrado, a prescrição


não vem a ser a perda do direito, e sim a falta de aplicação da ação
correta em tempo hábil que impossibilita a condição de revidar ou
revigorar o posicionamento.

Diante disto, cumpre esclarecer que o Direito Alimentar


deve ser considerado como imprescritível. Existe prementemente na
ordem legal brasileira a prescrição sim, mas das prestações vencidas e
não satisfeitas. Monteiro (1994, p. 300) esclarece que:

“O direito a alimentos é imprescritível. Enquanto vivo, o alimentado tem


direito a demandar do alimentante recursos que o habilitem a subsistir.
Mas, fixado judicialmente seu quantum, prescrevem num qüinqüênio as
respectivas prestações. A prescrição consuma-se paulatinamente, à
medida que vai decorrendo cada lapso de cinco anos.”

Cahali (1994, p. 105) delimita o âmbito da prescrição


qüinqüenal, quando afirma que esta:

“só alcança a prestação periódica de pensões alimentícias, fixadas em


sentença ou convencionada mediante acordo, operando-se, nesse caso,
com relação a cada prestação atrasada que se for tornando exigível; o
inadimplemento do devedor e a falta de reclamação do credor, durante
aquele período, faz perecer paulatinamente a pretensão àquelas
parcelas.”

O referido na doutrina, restou corroborado pelo Art. 23 da


Lei 5.478, de 25 de julho de 196819. Não pode ser outro o entendimento
dos tribunais pátrios. Veja-se o seguinte julgado:

“ALIMENTOS – Prescrição – Inteligência do artigo 23 da Lei nº 5.478, de


1.968, conjugado com os artigos 168, II e 169, I, do Código Civil –
Prescrição qüinqüenal que embora atinja as prestações vencidas e não
satisfeitas, não afeta direito de credor absolutamente incapaz – Recurso
provido.” (TJSP – AC 97.922-4 – Sorocaba – 6ª CDPriv. – Rel. Des. Antonio
Carlos Marcato – 11.02.1999)

19
“Art. 23. A prescrição qüinqüenal referida no artigo 178, § 10, I, do Código Civil
só alcança as prestações mensais e não o direito a alimentos, que, embora irrenunciável,
pode ser provisoriamente dispensado.”(Brasil, 2000a, p. 1074).
22

Do contido no referido, resta evidenciada a prescrição das


prestações vencidas em cinco anos, mas não do direito alimentar.
Capítulo II - Considerações sobre a União Estável

II.1 União Estável: Conceito

Para que se possa tratar do assunto em pauta com maior


clareza, torna-se necessário tecer breves considerações sobre os termos
utilizados atualmente para definir a relação duradoura entre homem e
mulher, distinta do casamento formalmente conhecido.

O conceito que aponta o norte balizador vem de Francisco José


Cahali apud Rosa (1999, p. 22) dizendo que a união estável “é o vínculo
afetivo entre homem e mulher, como se casados fossem, com as
características inerentes

A nova ordem jurídica instaurada pela Constituição da


República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, em seu artigo
22620, atribui à denominada união estável o status de entidade familiar,
com a proteção do Estado, o que acabou por representar tratamento
completamente distinto daquele que vinha sendo dado pelo direito pátrio
à constituição da família.

Advindos dessa nova tendência têm aflorado muitos


20
“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º. O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º. O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o
homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento.
§ 4º. Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por
qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º. Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos
igualmente pelo homem e pela mulher.
Ver Jurisprudência
§ 6º. O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação
judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de
fato por mais de dois anos.
§ 7º. Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade
responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado
propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada
qualquer forma coercitiva por parte de instituição oficiais ou privadas.
§ 8º. O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.”
(Brasil, 2000b, 125-7)
24

equívocos, entre os quais destaca-se um de grande importância: o fato de


considerar-se qualquer união duradoura entre um homem e uma mulher
como uma união estável, provocando desta forma uma enorme confusão
entre a significação dos termos "união estável" e "concubinato".

Utilizando-se do escólio de Busarello (1998, p. 51) interessante


delimitar o conceito de concubinato que, proveniente do latim
concubinatus ou concubantis, significa " dormir com", partindo do sentido
do verbo concuborae ou concuboere, de "deitar-se", "encostar-se
juntamente ao pé de".

No mesmo sentido define Ferreira (1986, p. 448), “ (...) assim


se diz da união ilegítima do homem e da mulher. É, segundo o sentido de
concubinatus, o estado de mancebia, sem aprovação legal”.

Alguns autores, no entanto, consideram o concubinato sob


dois aspectos. Neste sentido leciona Bittencourt (1980, p. 14-15) ao
afirmar que " sua conceituação no direito varia segundo as situações que
se apresentam como fato jurídico", tornando-se necessário "examinar-se
uma a uma dessas circunstâncias, para se ter idéia do concubinato como
fato jurídico em face das obrigações e dos direitos que acarreta".
Em nada difere o entendimento de Azevedo (1994, p. 08), que
segue transcrito:

“(...) apresenta-se esse vocábulo, atualmente, com dois sentidos: amplo


e estrito. Pelo sentido amplo ou lato, significa todo e qualquer
relacionamento sexual livre; pelo sentido estrito, é a união duradoura,
constituindo a sociedade familiar de fato, com affectio societatis, respeito
e lealdade recíprocos.”

Diante dos posicionamentos acima destacados, tem-se que a


união entre um homem e uma mulher fora do casamento recebe o nome
de concubinato. Todavia, pode o concubinato ser puro ou impuro, de
acordo com a situação.

Sobre a temática, Oliveira (2000, p. 20) esclarece:

“Alguns autores adotam denominações específicas, de concubinato puro


e concubinato impuro, para distinguir as duas situações da vida em
25

comum. O primeiro corresponde à convivência duradoura de homem e


mulher, como uma família de fato, sem impedimentos decorrentes de
outra união. (...) O concubinato se diz ‘impuro’ quando adulterino,
envolvendo pessoa casada em ligação amorosa com terceiro, ou com
outros impedimentos matrimoniais absolutos, como no caso de uniões
incestuosas.”

Conforme consta do transcrito acima, o concubinato impuro


pode ser entendido como aquele em que um dos participantes 21 encontra-
se impedido de contrair matrimônio, como ocorre, verbi grafia, quando
casado, conforme preleciona o Art. 183, inciso VI, do Código Civil
Brasileiro22 em vigor este seria o concubinato adulterino, não protegido
pelo preceito constitucional, que reconhece a união estável como entidade
familiar protegida pelo Estado23.

Dando vazão ao estudo, denota-se que o concubinato puro


seria a união estável, definida na Constituição da República Federativa do
Brasil, de 5 de outubro de 1988, especificamente em seu art. 226, § 3º,
ocorrido entre um homem e uma mulher, desimpedidos, e que possam, a
qualquer tempo, sendo de sua vontade, transformar essa união em
casamento24.

O concubinato somente pode ser reconhecido se não houver


impedimentos ao vínculo e, mais do que isso, que exista entre os
consortes o animus da permanência duradoura, não sendo aceita a ligação
puramente transitória e insignificante.

Outros requisitos necessários são que estejam presentes a


notoriedade da afeição recíproca, a fidelidade, a assistência material,
moral e afetiva recíproca entre os conviventes, bem como o respeito e a
consideração mútuos, a guarda o sustento e a coabitação, muito embora

21
O impedimento pode ocorrer para ambos, como por exemplo, homem casado
que mantém relacionamentos com mulher também casada.
22
Art. 183. Não podem casar (artigos 207 e 209): (...) VI - As pessoas casadas
(artigo 203).” (Brasil, 1999, p. 90).
23
Este seria o concubinato adulterino, não protegido pelo preceito constitucional,
que reconhece a união estável como entidade familiar protegida pelo Estado.
24
Ou seja, como foi ela juridicamente equiparada ao instituto do casamento, resta
pacífico que, para que a união estável possa ser validamente configurada, deve
necessariamente observar os requisitos que validam o próprio casamento.
26

a Súmula 382 do STF tenha considerado este último como não sendo
"indispensável à caracterização do concubinato" (Brasil, 1999, p. 120).
Todos estes requisitos serão estudados mais adiante.

São muitos os termos utilizados, além de união estável e


concubinato, de forma distinta entre os mais diversos autores, e também
nas legislações que tratam do assunto.

A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de


outubro de 1988 utiliza a expressão “união estável” e a Lei n.º 9.278/96
usa a palavra “conviventes”. A Lei n.º 6.015/73, Lei dos Registros Públicos,
bem como a Lei n.º 8.971/94, trazem o termo “companheiro (a)”. Todas
designando as pessoas que se relacionam através de uma união estável.

Não obstante, Neumann (1998, p. 122), assim conceitua


concubinato:

“Concubinato é a união estável entre homem e mulher, com o fim de


desenvolver uma comunhão de vida (vida em comum), criar e educar a
prole (a que já existia de cada um ou a que lhes sobrevir), legalizando
suas relações sexuais, sem contudo, estarem ligados pelo vínculo do
casamento.”

No contexto geral, não existe uniformidade dos doutrinadores,


entendendo alguns que a concubina vem a ser considerada amante e
utiliza-se do vocábulo companheira para a caracterização da união
estável. Existe outros que consideram os termos como sob o mesmo
significado.

Portanto, para efeito desse trabalho de pesquisa, quando


eventualmente a expressão concubinato for utilizada sem qualquer
adjetivação, estar-se-á fazendo referência à união estável devidamente
amparada pela Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de
outubro de 1988 e regulada pelas Leis posteriores. Da mesma forma,
também serão utilizados os termos companheiro, conviventes e
concubinos. Porém, sempre que for necessário referir-se às relações
adulterinas, utilizar-se-á o termo concubinato impuro, expressamente.
27

II.2 Evolução Histórica da União Estável

Antes da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5


de outubro de 1988, o termo concubinato muitas vezes era utilizado para
designar o relacionamento esporádico do homem com a mulher que não
caracterizava uma entidade familiar.

Contudo, muita confusão quanto às denominações mais


adequadas para referir-se às pessoas que viviam numa união fora do
casamento se estabeleceram na doutrina e até mesmo na jurisprudência.
Na verdade o que alguns procuram alguns autores distinguir as
expressões concubino ou concubina de companheiro ou companheira
afirmando estar aquelas ligadas às relações tipicamente adulterinas e,
estas às uniões estáveis que se formam entre pessoas desimpedidas para
matrimônio, ou ainda às uniões em que um dos membros encontra-se
separado de fato e, portanto, legalmente casado, mas formou nova
família.

Segundo Bittencourt (1980, p. 04), o concubinato ingressou no


Direito Pátrio no século XX, com o advento do Código Civil Brasileiro.
Surgiu, porém, ainda estigmatizado pelo pensamento católico
predominante à época.

O Código de 1916 dava por irreconhecíveis os filhos frutos de


relações adulterinas ou incestuosas, estabelecendo uma hierarquia entre
as formas de filiação. Seriam legítimas apenas aquelas havidas na
constância do casamento. As resultantes de relações entre pessoas não
casadas, porém totalmente desimpedidas para o matrimônio, seriam
ilegítimas; espúrias seriam as resultantes de relações incestuosas ou
adúlteras.

Muito ocorreu com o advento da Constituição da República


Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 as questões relativas à
sociedade de fato, denominação também utilizada à época para identificar
28

as relações entre pessoas do mesmo sexo unidas fora do matrimônio,


eram resolvidas basicamente com esteio em construções jurisprudenciais.

Com o tempo, leis esparsas também trouxeram tímidos


avanços. Isso veio a remediar a situação, vez que a simples aplicação do
Código Civil dava margem a injustiças. O processo transformador da união
estável continua agindo, criando novos precedentes, principalmente no
reconhecimento da convivência entre pessoas do mesmo sexo.

“EMENTA: HOMOSSEXUAIS. UNIAO ESTAVEL. POSSIBILIDADE JURIDICA DO


PEDIDO. É possível o processamento e reconhecimento de união estável
entre homossexuais, ante princípios fundamentais insculpidos na
Constituição Federal que vedam qualquer discriminação, inclusive quanto
ao sexo, sendo descabida discriminação quanto a união homossexual, e
justamente agora, quando uma onda renovadora se estende pelo mundo,
com reflexos acentuados em nosso País, destruindo preceitos arcaicos,
modificando conceitos e impondo a serenidade científica da modernidade
no trato das relações humanas, que as posições devem ser marcadas e
amadurecidas, para que os avanços não sofram retrocesso e para que as
individualidades e coletividades possam andar seguras na tão almejada
busca da felicidade, direito fundamental de todos. Sentença
desconstituída para que seja instruído o feito. Apelação provida.(9 fl. s)”
Apelação Cível n.º 598362655, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul: DES. José Ataides Siqueira Trindade, julgado em
01/03/2000.

Num primeiro entendimento, que hoje já se encontra


superado, a companheira não tinha direito à meação, visto não ter o
casal legalmente oficializado sua relação, tendo apenas direito àquilo que
havia ajudado a construir e, desde que pudesse comprovar tal fato.

Os direitos que foram sendo salvaguardados aos concubinos,


após a dissolução dessa relação, eram regulados pelo Direito Obrigacional,
vez que somente a partir da Constituição da República Federativa do
Brasil, de 5 de outubro de 1988, passou-se a incluir tais relacionamentos
no Direito de Família.

Foi também assegurado à companheira o direito de receber


indenização, por ocasião da morte de seu companheiro, em determinadas
situações. A matéria começou a ser sumulada pelo Superior Tribunal
Federal, à partir da Súmula n.º 35 e posteriormente com a Súmula n.º
380:
29

Súmula 35 do STF: “Em caso de acidente do trabalho ou de transporte, a


concubina tem direito a ser indenizada pela morte do amásio, se entre
eles não havia impedimento para o matrimônio.” (Brasil, 1999, p. 280).

Súmula 380 do STF: “ Comprovada a existência de sociedade de fato


entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do
patrimônio adquirido pelo esforço comum.” (Brasil, 1999, p. 258).

Existe entendimentos acerca da revogação destes dispositivos


pelo disposto na Lei 8.971, de 29 de dezembro de 1994, e pela Lei 9.278,
de 10 de maio de 1996, que deram maior extensão a sociedade de fato
entre os companheiros.

Não obstante, o que procurou fazer a nova ordem jurídica


instaurada pela Constituição Federal de 1988, ao utilizar, em seu artigo
226, parágrafo 3º, novas expressões para se referir às relações informais
estáveis, foi fugir das denominações até então utilizadas, já muito
desgastadas pelo tempo e, de certa forma, ligadas às incidências
negativas do Código Civil e de leis anteriores.

II.3 A União Estável a partir Constituição de 1988

O Direito de Família foi dos ramo do Direito que sofreu muitas


modificações. São as novas características do Direito de Família, dentre
as quais a preocupação com a realidade social do fenômeno familiar, com
a pesquisa dos verdadeiros valores vivenciados pelo povo, com a verdade
e autenticidade das relações humanas.

Acerca dessas modificações, especialmente sobre a união


estável, assim se refere Czajkowski (1997, p. 13):

“De um lado, consagrou uma lúcida orientação jurisprudencial


sedimentada ao longo dos anos, de reconhecer em tais uniões inúmeros
reflexos jurídicos positivos, aproximando-as - implícita ou
deliberadamente - do direito de família. De outro, provocou algumas
reações contrárias de setores vinculados a concepções mais
conservadoras da família, e que anteviam na disposição constitucional
um sério perigo aos alicerces morais da sociedade.”

Através da família que o indivíduo se insere na sociedade,


adquirindo as condições necessárias ao convívio harmonioso em seu
grupo. Destes organismos familiares dependem, em muito, a ordem social
30

e o desenvolvimento do Estado. Por isso compromete-se ele a prestar-lhe


assistência e proteção.

Por oportuno menciona-se Parizatto (1998, p. 19):

“A sustentação de que o concubinato não poderia ser admitido porque o


casamento seria a única entidade familiar, não mais persiste. Não há
dúvida de que o casamento continua sendo a base da constituição da
família, ou seja, sua viga-mestra. O que não poderia se admitir é que o
concubinato continuasse a ser considerado como sendo uma relação
proibida e condenável, quando tal relacionamento vem ocorrendo em
todas as camadas sociais e de há muito tempo.”

Conforme colhe-se do excerto acima, deve ser regularizado o


modo de vida que por muito tempo recebeu tratamento diferenciado e
incerto, fazendo-se assim nova acepção de família aflorar.

O reconhecimento do concubinato, tratado propositadamente


na Carta Constitucional de “união estável”, em virtude do desgaste que
aquele outro termo adquiriu, não conseguiu pôr fim às discussões
doutrinárias envolvendo o tema.

O legislador percebeu a necessidade de regulamentar tal


dispositivo, criando leis infra-constitucionais que melhor regulassem o
assunto, tão polêmico, procurando estabelecer precisamente a noção de
união estável, a forma de reconhecimento e fixar os efeitos dela
decorrentes no âmbito do Direito de Família.

Desta forma surgiram as Leis 8.97125, de 29 de dezembro de


1994, e a pela Lei 9.27826, de 10 de maio de 1996.

Foram inúmeras as dúvidas provocadas pela legislação


constitucional e infra-constitucional acerca do assunto, sendo necessário

25
Esta lei pouco contribuiu para aclarar a situação, em virtude de seus artigos mal
redigidos, além de apresentar falhas em diversos aspectos, o que dava margem a
diferentes interpretações.
26
Esta lei foi sancionada quase dois anos após a primeira, e depois de muitas
dúvidas e discussões, apareceu com a intenção de complementar e esclarecer assuntos
que a anterior não havia regulamentado com clareza. Todavia, não esgotou as dúvidas
existentes acerca da matéria, e ainda foi considerada, principalmente no meio jurídico,
como uma lei igualmente incoerente e mal formulada.
31

tentar caracterizar o mais precisamente possível tais entidades familiares,


à luz do direito vigente.

II.3.1 Formas para o reconhecimento da União Estável

Necessário se faz tecer considerações, que visam aprofundar


conhecimentos, sobre o disposto na Constituição da República Federativa
do Brasil, de 5 de outubro de 1988 e na legislação infraconstitucional
sobre o assunto.

O já mencionado Artigo 226, § 3º da Carta Magna, dispõe


sobre a proteção estatal da família e o reconhecimento das uniões
estáveis como entidades familiares, dispensando a estas a mesma
proteção guardada às famílias constituídas através do casamento.

Sobre esta superficialidade do artigo supra citado, Oliveira


(2000, p. 28) aduz que “O que se entende por união estável? A
Constituição não diz, relegando a solução para lei que disponha sobre o
modo de conversão da união em casamento”. Nota-se então a
necessidade de alçar mão de leis ordinárias para que tal dispositivo
pudesse ser aclarado.

Como complemento, surge a Lei 8.971, de 29 de dezembro de


1994, que, na tentativa de criar condições para o reconhecimento da
união estável, fixa, em seu Artigo 1º,27 requisitos indispensáveis à sua
configuração, limitando sua aplicação e, consequentemente, o
reconhecimento das relações havidas entre muitos casais como sendo
“união estável”.

Ainda assim, ante as inúmeras dúvidas surgidas da


interpretação de tais dispositivos, além das diversas críticas de muitos
juristas acerca desta lei, mais uma norma infra-constitucional foi criada: a
27
“Art. 1º. A companheira comprovada de um homem solteiro, separado
judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele
tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968,
enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade.
Parágrafo único. Igual direito e nas mesmas condições é reconhecido ao
companheiro de mulher solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva.”
(Czajkowski, 1997, p. 195).
32

pela Lei 9.278, de 10 de maio de 1996, que também em seu Artigo 1º,28
tenta estabelecer requisitos para que se reconheça união como sendo
estável e, em conseqüência, designada como entidade familiar.

Passa-se agora, ao estudo de certos requisitos, que objetivam


chegar ao mais próximo possível do reconhecimento da união estável, e
por analogia, como entidade familiar protegida e amparada pelo Estado.

II.3.1.1 Existência de Relação Duradoura

Esta característica faz menção a existência ininterrupta, com


sentimento de amor e afeição entre os companheiros. Apesar de tratar-se
de tema muito polêmico, claro está que não pode ser considerado
qualquer relacionamento temporário ou passageiro, mesmo que sexual,
existente entre homem e mulher, que caracterizará a união estável.

Referido contato deve ser significativo, contínuo e


representando situação que demonstre existir o objetivo de constituição
de família entre os conviventes.

A relação pode ser considerada estável, independentemente


do tempo de permanência, desde que sejam apreciados todos os demais
elementos caracterizados do vínculo, eis que alguns entendem como lapso
temporal, o mínimo de dois anos.

II.3.1.2 Publicidade da Relação

O contato mantido deve ser público, onde o casal não precise


viver clandestinamente e, que toda a sociedade possa tomar
conhecimento da relação entre ambos existente, o que já descarta
totalmente o relacionamento adulterino.

Sobre a publicidade, Czajkowski (1997, p. 73) afirma: “a


exigência, nitidamente, pretende afastar a idéia de família informal as

28
“Art. 1º. É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública
e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de
família.” (Czajkowski, 1997, p. 196).
33

uniões ilícitas e mais especificamente, as adulterinas”, restando assim


fundamentada a sua importância.

II.3.1.3 Continuidade da Relação

Outro fator importante a caracterização da união estável, vez


que o relacionamento ininterrupto, firmemente sedimentado, constitui
elemento que não pode ser verificado naqueles encontros esporádicos,
eventuais, havidos entre um homem e uma mulher, sem a finalidade de
obtenção de vínculo.

II.3.1.4 Ausência de Matrimônio Civil e Fidelidade Recíproca

Caracteres de suma importância pois com a ausência do


casamento válido entre os parceiros, salvo os casos das pessoas
separadas de fato e que estabeleceram novo relacionamento, com a
intenção de formar família, como já foi esclarecido anteriormente, inexiste
qualquer impedimento.

Deve ser levado em conta a seriedade do compromisso


concubinário, ou seja, respeito mútuo, havendo exclusividade de
relacionamento amoroso.

II.3.1.5 União sob Forma de Concubinato

Deve existir a vontade de unir-se sob a forma de concubinato


sem a qual estaria descaracterizada a vida em comum como uma união
estável. A coação29 desvirtua a união livre.

II.3.1.6 Constituição de Família

Quiçá seja este o mais imprescindível de todos os requisitos já


aqui elencados. Necessário se faz que o casal se una com o animus de
constituição de família, ou seja, que o objetivo de formação de família
esteja claramente presente no relacionamento.

29
“Pressão psicológica ou constrangimento que se exerce sobre o indivíduo para
levá-lo a pratica, omissiva ou comissivamente, ato definido em lei como
delito.”(Guimarães, 1990, p. 170)
34

Desta forma, cabe novamente esclarecer que o concubinato


adulterino, mencionado diversas vezes pelo Código Civil Brasileiro 30, não
se confunde com as uniões estáveis, apreciadas pela Constituição Federal
de 1988, e que objetivam, antes de tudo a formação de entidade familiar.

II.4 Direitos decorrentes da União Estável

Entendendo a união estável um fato jurídico, não poderia o


direito positivo ignorar sua existência. Deste modo, ao instituí-la como
entidade familiar, a Constituição da República Federativa do Brasil, de 5
de outubro de 1988, determinou que lhe fosse garantida a proteção do
Estado.

Dentre os direitos que foram sendo, ao longo dos anos,


assegurados aos companheiros, enumera-se alguns, quiçá os mais
importantes, para que se possa ter uma noção geral da evolução da
legislação e da jurisprudência com relação ao assunto.

Antes de entrar no estudo específico da questão alimentar,


importante ressaltar os principais direitos decorrentes da união estável,
que possibilitarão melhor compreensão do esposado no Capítulo seguinte.

II.4.1 Averbação do Patronímico do Companheiro

Tal direito foi adquirido, mas deve-se atentar a concordância


do companheiro. Sobre o tema, importantes lições colhem-se do exposto
por Oliveira (2000, p. 80):

“Mulher solteira, desquitada (separada judicialmente) ou viúva, que viva


com homem nas mesmas condições, pode adotar o patronímico de seu
companheiro.

(...) Vai um reparo quanto ao requisito de prazo mínimo de convivência


por 5 anos. Ainda que tratada em lei especial, a adoção do patronímico
pressupõe o fato da união estável, que, nos termos da Lei nº 9.278/96
prescinde daquele requisito temporal. Se a união estável, assim
conceituada, possibilita mais extensos direitos (alimentos, herança e
meação), além de permitir conversão em casamento, resulta claro que

30
. Conforme preceituado nos Arts. 1.719, III; 1.177 e 1.474 do Código Civil
Brasileiro.
35

poderá, também, ensejar requerimento de acréscimo do nome do


companheiro, ainda que não comprovada vida em comum por 5 anos.
Faz lembrar o adágio - “quem pode o mais pode o menos”.

A Lei dos Registro Públicos, possui em seu artigo 57, §§ 2º a


4º31, disposição sobre a possibilidade de averbação do patronímico do
companheiro à companheira, desde que satisfeitos os requisitos para o
reconhecimento da união estável, incluindo-se aí o período mínimo de
convivência para caracterização do vínculo.

II.4.2 Adoção pelos Concubinos

O direito dos concubinos à adoção, desde que um deles tenha


completado vinte e um anos de idade e comprovada a estabilidade da
família, ou melhor, da respectiva entidade familiar, além de respeitada a
diferença de 16 anos entre o adotante e o adotado, como determina o
Artigo 42, § 2º, da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 199032, chamado de
Estatuto da Criança e do Adolescente.

II.4.3 Indenização por Responsabilidade Civil

Ao concubino supérstite assiste legitimidade para pleitear ação


de indenização por responsabilidade civil, nos termos do artigo 1.537,
inciso II, do Código Civil33, incluindo-se também os danos morais, visto não

31
“Art. 57. Qualquer alteração posterior de nomes, somente por exceção e
motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz
a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandato e publicando-se a alteração
pela imprensa. (....)
§ 2º. A mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com homem, solteiro,
desquitado ou viúvo, excepcionalmente e havendo motivo ponderável, poderá requerer
ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o patronímico de seu
companheiro, sem prejuízo dos apelidos próprios, de família, desde que haja
impedimento legal para o casamento, decorrente do estado civil de qualquer das partes
ou de ambas.
§ 3º. O juiz competente somente processará o pedido, se tiver expressa
concordância do companheiro, e se da vida em comum houverem decorrido, no mínimo,
cinco anos ou existirem filhos da união.
§ 4º. O pedido de averbação só terá curso, quando desquitado o companheiro, se
a ex-exposa houver sido condenada ou tiver renunciado ao uso dos apelidos do marido,
ainda que dele receba pensão alimentícia.” (Brasil, 1999, 961-2)
32
“Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de
estado civil. (...)
§ 2º. A adoção por ambos os cônjuges ou concubinos poderá ser formalizada,
desde que um deles tenha completado vinte e um anos de idade, comprovada a
estabilidade da família.” (Brasil, 1999, p. 608).
33
“Art. 1537. A indenização, no caso de homicídio, consiste: (...)
36

ser necessário para tal ação a legitimidade parental, podendo a prova da


união estável se fazer durante a própria ação de indenização.

II.4.4 Indenização pela Morte do Companheiro

O direito de pleitear em juízo, conforme o Decreto nº 2.681 de


07 de dezembro de 1912, que trata da responsabilidade civil das estradas
de ferro e transportadores, visando indenização pela morte do
companheiro, desde que atendendo as circunstâncias do ocorrido.

II.4.5 Reconhecimento de Filhos

O reconhecimento de filhos, independente de sua origem,


encontra supedâneo legal no Estatuto da Criança e do Adolescente, não
podendo mais ser proibida, conforme havia sido feita inicialmente pelo
Código Civil Brasileiro, em seu artigo 358, expressamente revogado pela
Lei n.º 7.841, de 17 de outubro de 1989, eis que o filho vem considerado
em si mesmo, independentemente da relação que o originou.

II.4.6 Benefícios Previdenciários

São beneficiários do Regime Geral da Previdência Social, na


condição de dependentes do segurado, assim como o cônjuge e os filhos,
o companheiro ou a companheira, conforme disposto no Artigo 16, da Lei

II - Na prestação de alimentos às pessoas a quem o defunto os devia.” (Brasil,


1999, p. 283).
37

n.º 8.213, de 24 de julho de 199134, que dispõe sobre a plano de


benefícios da previdência social e dá outras providências.

II.4.7 Direito à Meação

A sociedade de fato tem significação muito mais abrangente


do que a reunião de esforços nas uniões concubinárias. Pode ela existir
entre quaisquer pessoas, sem que se pressuponha um relacionamento
prolongado, estável ou mesmo sem que se fale em entidade familiar.

No entanto, esta sociedade de fato, que se rege pelas regras


do direito obrigacional, não interessa a este estudo. A sociedade de fato
que realmente importa aqui vem a ser aquela existente entre os
companheiros de uma união estável.

Como se sabe, na união estável, não existe regime de bens,


como ocorre com o casamento. Então, o que costumava ocorrer era que,
após anos de convivência e divisão de esforços para amealhar um
patrimônio, sobrevindo o fim da união estável, por desentendimento ou
por morte do companheiro, o supérstite ficava em situação econômica
extremamente difícil, vez que os bens acabavam por ficar apenas com um
dos companheiros.

Com o fito de acabar com tais injustiças, a jurisprudência


acabou criando o instituto da sociedade de fato entre os companheiros,

34
“Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição
de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de
qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um)
anos ou inválido; IV – revogado
§ 1º. A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do
direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º. O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do
segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no
Regulamento.
§ 3º. Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada,
mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do
artigo 226 da Constituição Federal.
§ 4º. A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a
das demais deve ser comprovada.” (Brasil, 1991, p. 5.929).
38

que foi consagrado pela já citada Súmula 380 do Superior Tribunal


Federal.

A administração do patrimônio comum dos conviventes


compete a ambos, salvo estipulação contrária em contrato escrito. Assim,
resta a presunção de condomínio dos bens entre os companheiros, que
acaba por ter efeitos similares aos da comunhão parcial de bens do
casamento.

De clareza meridiana a explicação de Czajkowski (1997, p.


110) sobre o assunto:

“Na união livre estável, quando o homem e a mulher juntam esforços,


dinheiro ou trabalho, para a aquisição de um bem, já caracterizam
sociedade de fato. Se ambos se tornam titulares deste bem, o
condomínio é o resultado da sociedade de fato havida. Mas se somente
um deles se torna titular do bem, sociedade de fato continuou existindo,
só que o efeito jurídico, condomínio, não foi alcançado.”

Existem várias condições que devem ser obedecidas no


concernente a verificação da meação, contudo, abandona-se aludida
matéria ante a falta de importância ao tema deste estudo.

II.4.8 Direito à Sucessão

Segundo Oliveira (2000, p. 64), com a aplicabilidade do


companheiro na sucessão foi “(...) uma alteração na ordem da vocação
hereditária para a inclusão do companheiro sobrevivente, na falta de
descendentes, ascendentes ou cônjuge do falecido”.

Não pode ser outro o entendimento dos tribunais pátrios,


conforme denota-se na julgado transcrito:

SUCESSÃO – HERANÇA DISPUTADA ENTRE O COMPANHEIRO E OS


COLATERAIS – APLICAÇÃO DA LEI Nº 8.971/94 – União estável
prolongada, admitida pelas partes, e que se extinguiu com a morte da
companheira, na vigência da Lei nº 8.971/94. Aplicação do art. 1.577, do
Código Civil, estabelecendo que a capacidade sucessória é regida pela lei
vigente ao tempo da abertura da sucessão. Incidência da Lei nº 8.971/94,
que contempla o companheiro como herdeiro ante a ausência de
herdeiros necessários. Observância da ordem legal de preferência.
39

Recurso desprovido. (TJRS – AC 599.192.390 – 7ª C.Cív. – Rel. Des. Sérgio


Fernando de Vasconcellos Chaves – DOERS 20.08.199908.20.1999)

Assim, resta claro do julgado acima, a possibilidade do


companheiro supérstite fazer parte da sucessão dos bens do finado.
Capítulo III - Relação entre o Direito Alimentar e a
União Estável

O concubinato, conforme já mencionado, mereceu


consagração constitucional, sob a denominação de "união estável".
Evidente, não precisa o Judiciário aguardar lei regulamentadora para
definir os requisitos da união estável, como nunca esperou para elaborar a
sistemática do concubinato. Se a lei vier a divergir em certos critérios,
será levada em conta quando editada. Outrossim, posta a união estável no
nível de entidade familiar, sem dúvida, a competência para resolver
litígios dela oriundos passa às Varas de Família.

Já assentados anteriormente estes pontos básicos, cogita-se


de saber se concubinos podem agora pleitear alimentos. Deve ser
afirmativa a resposta. Com efeito, se o concubinato, cognominado união
estável, guindado ao prestígio da normatividade constitucional, se deve
ser protegido pelo Estado, se considerado como entidade familiar, se a lei
deve facilitar sua conversão em casamento, logo razoável e coerente não
se negue ao concubino a possibilidade de postular alimentos,
relevantíssimos que são à vida e à vida com dignidade.

III.1 A Companheira e sua pretensão alimentar antes da


CF de 1988

Conforme já mencionado, antes do advento da nova


Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988,
inexistia qualquer dúvida em torno da eventual pretensão alimentar por
concubina, vez que a orientação esposada pela jurisprudência era
dedeclará-la carecedora de ação, por impossibilidade jurídica do pedido,
pois, segundo tal entendimento, a obrigação alimentar pressupunha a
existência de determinado vínculo familiar não presente nas chamadas
uniões livres.
41

Conforme mencionado por Bittencourt (1980, p. 88),


existem aqueles que “partindo do pressuposto que o concubinato é torpe,
dizem os opositores que qualquer indenização à concubina esbarraria com
a regra moral que o direito acolhe: nemo auditur propriam turpitudinem
allegans.”35

Reconhece a jurisprudência tão-somente o direito à partilha


ou à indenização, por serviços prestados, à concubina, afastando, por
decorrência, qualquer insinuação de direito a alimentos. Adota tal
orientação sob o argumento de que ‘o concubinato é um estado de fato,
insusceptível de equiparação ao casamento e só reconhecível no campo
jurídico para efeitos restritos, em que não se incluíam os alimentos, não
obstante, situação não mais existente.

III.2 Aceitabilidade da Constituição ao Concubinato

A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de


outubro de 1988, traçou um novo perfil constitucional ao Direito de
Família, impondo assim, novos rumos e novas indagações.

Da leitura do texto fundamental emergem princípios que


preponderam no mundo de hoje, tais como: a) igualdade de direitos entre
o homem e a mulher; b) paridade absoluta entre os filhos,
independentemente da origem destes; c) prevalência da afeição mútua
nas relações de caráter pessoal e d) o da aceitação da união estável como
entidade familiar.

Neste último princípio encontra-se o cerne deste estudo,


especialmente por ter sido ele consagrado expressamente no § 3º do art.
226 da atual Constituição, quando estabelece que: ‘Para efeito da
proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a
mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento’.

35
Logo na seqüência, Bittencourt (1980, p. 88) explica que a frase latina nada
mais é senão “A regra de que ninguém será ouvido quando alega a sua própria torpeza”.
42

III.3 Alimentos após a Constituição

Surge, como premissa necessária à afirmação de que a


concubina tem direito a alimentos, face ao novo regimento constitucional,
o enfrentamento dos seguintes pontos: a) necessidade de
regulamentação; b) deveres do concubinato e a mútua assistência.

Tais aspectos, por estarem interligados e por aparecerem


como suporte da posição que se pretende defender, serão analiticamente
considerados e, um a um, debatidos.

A regulamentação acima apregoada diz respeito aos direitos


e deveres dos concubinos. Com a proposta da esquematização legal dos
direitos e deveres não se está a sustentar tenha sido a união estável
equiparada ao casamento, mas, sim e apenas, que há necessidade de
regulação do instituto e que esta disciplina não constitui tarefa da
jurisprudência, e, sim, do legislador ordinário, pois a natureza do princípio
e a forma como se encontra estatuído na Constituição, requer a ação
legislativa para tornar efetivo o preceito em toda sua extensão e
profundidade.

Não se afirme que, com isto, se estaria esvaziando o


casamento, até mesmo porque o legislador constituinte fez clara opção
pelo casamento como forma preferencial de constituição da família.
Apenas não desconheceu a realidade social e, levando em conta que o
direito serve a esta, e não esta àquele, jurisdicizou o instituto.

Assim, justifica-se a necessidade de disciplina não somente


pelos argumentos legais antes invocados, mas também pelos fáticos,
decorrentes da responsabilidade advinda da união estável, não
outorgando a esta privilégios em detrimento ao casamento e ao rumo
estabelecido na Carta.

Entre os deveres a serem incluídos no regramento da união


estável, necessariamente deverá constar o da mútua assistência, vez ser
componente essencial das relações pessoais.
43

No dever de mútua assistência, conforme já exposto


anteriormente, está embutido o direito a alimentos e, portanto, a partir de
sua imposição legal, legitimados estarão os concubinos a postularem, um
contra o outro, alimentos, respeitados os parâmetros integrantes do
binômio necessidade possibilidade.

Sem ele, inviável se torna a pretensão alimentar, e,


novamente, a jurisprudência passará a reconhecer o que até aqui admitia
à concubina, sedimentando de vez por todas a obrigação alimentar.

III.4 Dos alimentos na União Estável

Segundo o determinado na Lei 8.971, de 29 de dezembro de


1994, posteriormente ratificada pela Lei 9.278, de 10 de maio de 1996,
que explicitamente expõe o dever mútuo de assistência entre os
conviventes bem como o da prestação àquele que dela necessitar em caso
de rescisão da união.

Anteriormente à 1994, ano em que se iniciou a


regulamentação dos direitos decorrentes da união estável, a obrigação de
prestar alimentos restringia-se apenas às hipóteses de parentesco ou de
casamento, como encontra-se disposto no Código Civil Brasileiro 36. Desta
forma nota-se estar claro que o direito a alimentos entre pessoas unidas
informalmente, ressalvando-se os casos de assistência material por via
indenizatória e as possíveis obrigações decorrentes de contrato, não
existia.

No entanto, resta esclarecer que a prestação alimentícia não


constitui encargo obrigatório, mas sujeito à condição da necessidade
daquele que a requer, cuja prova será de responsabilidade do
demandante. Também tal direito estará atrelado aos recursos econômicos
da pessoa obrigada, conforme determina o artigo 400 do Código Civil.

36
Conforme disposto nos Artigos 231, III e 369 e seguintes do Código Civil
Brasileiro.
44

A concessão de alimentos aos companheiros, com o advento


das leis que regularam os direitos dos concubinos, resultou, como afirma
Oliveira (2000, p. 56) “de uma evolução natural do pagamento pecuniário
que os tribunais vinham reconhecendo, a título de indenização por
serviços prestados”.

Em nada difere o entendimento de Czajkowski (1997, p. 127)


quando explicita que:

“Com o advento da Lei 8.971/94 e, principalmente, da Lei 9.278/96, a


indenização por serviços prestados perdeu quase toda a sua significação.
Existem, agora, os alimentos entre os parceiros. O art. 7º do diploma de
96, fala em ruptura da união (dissolução por rescisão) e necessidade de
um dos parceiros.”

Ante a omissão da Lei 8.971, de 29 de dezembro de 1994, a


Lei 9.278, de 10 de maio de 1996, determina ainda, que aquele
responsável pela dissolução da união estável, infringindo alguns dos
deveres elencados em seu artigo 2º, não tem direito à pensão alimentícia.

Azevedo (1996, p. 22) assim se posiciona sobre o assunto:

“(...) durante a união, os concubinos devem-se mutuamente, alimentos.


Após a ruptura da sociedade concubinária, serão eles devidos, se houver
culpa, devendo o culpado pagar ao inocente alimentos, se deste
necessitar. É expresso o art. 7º ao assentar que cuida de dissolução da
união estável, por rescisão, que não existe sem culpa.”

Novamente, importante lição colhe-se de Czajkowski (1997, p.


133) :

“Embora a Lei 9.278 não tenha feito uma relação entre o art. 7º e o art.
2º, que trata dos direitos e deveres recíprocos entre os parceiros, a
simples confrontação de ambos conduz a algumas evidências. Não basta,
por si só, a demonstração de que houve união estável e de que há
necessidade material. O parceiro que dá causa ao rompimento da união,
infringindo algum dos deveres elencados no art. 2º, não deve ter a
pretensão alimentar acolhida. Entender o inverso seria fomentar a
irresponsabilidade e a má-fé.”

Por fim, cabe esclarecer que , conforme a lei e o


entendimento de diversos, juristas, a obrigação de prestar alimentos
extingue-se caso aquele que o recebe case com outro ou constitua nova
união estável.
45

III.5 Ações, ritos e competência

Admitida a idéia de que o legislador deverá regular o


concubinato e nesta esquematização incluir o dever de mútua assistência,
impõe-se a legítima preocupação com a forma pela qual deverá ser
canalizada eventual pretensão alimentar.

Assim, pois, inicialmente deveremos distinguir situações que


envolvam ações de alimentos e concubinato.

Quando o concubinato for declarado por sentença não existe


motivo para ser expressada resistência à idéia de adotar o procedimento
comum, face à definição da relação pré-processual; efetivamente, vez
que tornado indiscutido pelo legislador o direito a alimento, e reconhecida
por sentença a situação fática, a demanda ficará reduzida à apuração da
necessidade de um e a possibilidade de outro, com a fixação do quantum
debeatur; daí a pertinência da aplicação da Lei de Alimentos.

No que tange ao concubinato ainda não reconhecido por


sentença, o objeto litigioso envolve a pretensão declaratória de
reconhecimento da existência do concubinato e, posterior, postulação a
alimentos; como a matéria fática será exaustivamente debatida, a adoção
do rito ordinário impõe-se, pois se trata de ação de cognição plenária, e
não sumária.

No que diz com a competência para processar e julgar os


efeitos afora dos, especialmente nas comarcas cujas Varas sejam
especializadas, importante destacar que, com o reconhecimento da união
estável como forma legítima de constituição da família, as questões daí
decorrentes foram deslocadas da órbita do Direito Obrigacional para a
seara do Direito de Família, e, por conseqüência, passam a ser da
competência das Varas de Família, e não mais Varas Cíveis.
46

III.6 Circunstâncias a serem consideradas na


interpretação da igualdade na sociedade de fato

O art. 226, § 5º, da Constituição da República Federativa do


Brasil, de 5 de outubro de 1988, contém pauta normativa magnífica ao
impor a igualdade de direitos e deveres entre homem e mulher no
referente à sociedade conjugal.

Todos os dispositivos legais que contemplam normas


capazes de colocar a mulher em situação de subordinação ou inferioridade
tornaram-se inconstitucionais. Vale o mesmo para o homem. Destarte: não
há mais falar em "chefe da sociedade conjugal". Existem vário artigos do
Código Civil Brasileiro que conflitam com Constituição da República
Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Vejam-se os exemplos: a)
não mais é privilégio do marido a instituição do bem de família (art. 70); b)
não mais prevalece a vontade paterna na anuência para o casamento (art.
186); c) o marido não é mais o representante legal da família (art. 233, I) -
função, aliás, que já se encontrava totalmente esvaziada; d) o marido não
mais é o administrador dos bens comuns (art. 233, II); e) não é só do
marido o direito de fixar o domicílio da família (art. 233, III); f) o exercício
do pátrio poder não é mais só do pai (art. 380); g) pai e mãe passam a ser
administradores dos bens dos filhos (art. 385); h) a preferência de nomear
tutor não é mais do pai, no pertinente à mãe (art. 407); i) na falta de
cônjuge do interdito, pai e mãe do mesmo estão em igualdade de
condições para serem nomeados curadores (art. 454, § 1º), valendo
idêntico critério para a situação de ausência (art. 467).

A toda evidência, não violam a norma constitucional as


hipóteses em que a lei civil põe igualdade de exigências entre os
cônjuges, como nos arts. 235 e 242 do Código respectivo.

No respeitante ao bem reservado, observe-se que não


subsiste, pois significa desigualdade de direitos no âmbito da sociedade
conjugal.
47

Cumpre acautelar-se. Com o excesso de abrangência da


regra constitucional, pretendendo aplicá-la para casos em que diversos
são os pressupostos.

III.6.1 Alimentos entre concubinos, após a Constituição Federal de 1988.

O desenvolvimento a seguir, constitui-se de argumentos


levam a convencer da admissibilidade de alimentos entre os concubinos
no Brasil, a partir da Constituição da República Federativa do Brasil, de 5
de outubro de 1988.

a) A Constituição consagrou juridicamente o concubinato,


elevando-o ao nível de ser nela abordado explicitamente,

b) A Carta Magna, enquadrando o concubinato como


entidade familiar e sobre ele cogitando em dispositivo pertinente à
família, considerou-o como uma for-ma de família e de família legítima37.

c) A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de


outubro de 1988, quer que o Estado proteja a união estável. Ora, o
Judiciário vem a ser igualmente Estado.

d) Como ensina Cahali (1994, p. 113-15), o dever de


alimentos tem como fundamento a obrigação de caridade e solidariedade
familiares. Está em sua base um dever ético de assistência e socorro
resultante do vínculo familiar.

Se a Constituição passou a considerar o concubinato como


entidade familiar, como forma de família, não há por que este dever de
solidariedade não atue igualmente entre os concubinos.

e) O direito a alimentos diz com o direito mais fundamental


e essencial de todos, que é o direito à vida e à vida com dignidade
Estamos aí diante de princípio universal não apenas moral, mas jurídico.

37
Ainda que, é evidente, sem a igualdade com a família advinda do casamento,
tanto que o referido § 3° prevê conversão do concubinato em casamento.
48

As leis concretas e os acordos sociais são válidos se


repousarem sobre tais princípios, que são os princípios universais de
justiça: a igualdade de direitos humanos e o respeito pela dignidade dos
seres humanos enquanto indivíduos.

f) Se o concubinato passou a ser entendido como entidade


familiar, seria profundamente contraditório continuar assegurando direito
alimentar entre irmãos, que muitas vezes se afastam totalmente em ter-
mos de convivência, para negá-lo aos concubinos que viveram em estreita
e íntima relação, talvez por longo tempo.

g) Se a relação concubinária provoca perda de alimentos


percebidos em decorrência de anterior casamento, comumente aceito e
aplicado pelos tribunais pátrios38, obviamente esta linha de pensamento
só pode partir do pressuposto da existência de dever alimentar entre os
concubinos.

h) Sustentam alguns que a Constituição dependeria de


regulamentação, sendo indevido, antes disso, pensar em alimentos entre
concubinos, que apenas poderiam existir se contemplados expressamente
em texto legislativo.

Desde logo se observa que esta asserção entra em conflito


com os oito argumentos antes enunciados. Outrossim, faz com que o
Poder Judiciário abdique de seu papel de Poder do Estado, impondo-se-lhe
limites absolutamente dispensáveis e nocivos em sua possibilidade de
atuação.

38
“UNIÃO ESTÁVEL À LUZ DA LEI Nº 8.971/94 – O DEVER ALIMENTAR ENTRE
COMPANHEIROS – A concubina só faz jus à pensão alimentícia se comprovar dela
necessitar e ser companheira de um homem desimpedido para se casar, que com ele
viva há mais de cinco anos.” (TJBA – AC 44.081-3 – 1ª C.Cív. – Rel. Des. Raymundo de
Souza Carvalho – J. 24.02.199902.24.1999)
49

III.6.2 Responsabilidade Alimentar em decorrência da ruptura da União


Estável

Posta a matéria na disciplina do divórcio, até certo ponto


simplifica-se o equacionamento da responsabilidade alimentar no
concubinato ou união estável.

A solução está em aplicar, analogicamente, o tratamento


conferido ao divórcio. Isto significa condicionar o pagamento dos
alimentos, em termos de obrigação alimentar, a que o concubino não seja
o responsável pela ruptura da união concubinária.

Se no casamento, dissolvido pelo divórcio, não se pode


cogitar dos alimentos independentemente de responsabilidade, também
assim não será viável na dissolução do concubinato, sob pena de os
concubinos ficarem em melhor posição do que os casados.

Alem disso, não pode se considerada correta o


dimensionamento da obrigação alimentar pela responsabilidade objetiva.
Sucede ser descabido pensar em responsabilidade alimentar de quem
pediu a ruptura da união estável, pela singela razão de que não existe
formalização desta espécie de comportamento que leva à ruptura.

Não poderá pedir alimentos quem provocou a ruptura do


concubinato, em termos fáticos, ou quem nele se conduziu mal. Em
contrapartida, está autorizado a postulá-los quem não pode ser acusado
de atos daquela espécie.

No tocante à necessidade, cumpre conduzir o assunto


segundo as novas diretrizes para os alimentos no divórcio, ou seja, para os
alimentos entre cônjuges.

Deve haver rigor na avaliação da necessidade. Os alimentos


existirão quando o concubino não puder manter-se com seus próprios
recursos, aqui incluídos não só os que já têm, mas os que devem buscar
conseguir com seu trabalho, se tiver idade e saúde para tal.
50
Considerações Finais

A Constituição revolucionou o Direito de Família.


Imprescindível assumir esta revolucionariedade, a nível exegético,
colimando evitar se tolham e minimizem as conquistas.

A família deve ser estruturada sobre os alicerces do afeto,


da verdade e da não opressão. As relações saudáveis no plano familiar são
passo incomensurável visando a corrigir as distorções sociais.

Correu-se o risco de errar, contudo valeu pela intenção de


colaborar e pela humildade em expor à crítica sólida e severa, suscitando
o debate sempre esclarecedor e produtivo. Muito e muito há para meditar
e refletir, acerca da obrigação alimentar na união estável.

Com o advento da atual Carta Magna, a união estável entre


homem e mulher, não unidos pelo matrimônio, passou a ser reconhecida
como entidade familiar, para efeito de proteção do Estado.

Assim, o Direito Alimentar, apresentado como grande


temática do presente, restou devidamente comprovado.

Entretanto, não pode qualquer ligação amorosa caracterizar


a entidade familiar, consoante a símile do cânon constitucional, mas
somente aquela em que ambos parceiros estiverem imbuídos do animus
de viverem como se casados fossem.

Depois de vários pontos de vista apresentados, resta


profundamente clara a relação alimentar entre concubinos; portanto,
houve profunda modificação no direito anterior pela pretendida
transformação da união estável do homem e da mulher em "entidade
familiar".

Importante instrumento para a obtenção desta conclusão, a


jurisprudência que se vem consolidando no sentido da existência da
52

obrigação alimentar entre concubinos. No estágio atual do Direito


Brasileiro, a obrigação alimentar decorre não somente da relação de
parentesco ou do casamento, mas também da união estável, conforme
preceituado e amplamente debatido § 3º do Art. 226 da Constituição da
República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, quando
equiparou a entidade familiar ao casamento, prestando-se assim para
criar, a benefício da companheira, direito de alimentos.

Isto porque, a companheira tem direitos de esposa, mesma


que não instruída em qualquer declaração do companheiro, assim fazendo
jus, indiscutivelmente, pelos motivos exaustivamente apresentados,
direito de receber alimentos, ainda que em nenhum momento houvesse
ocorrido relação de parentesco ou de afinidade.

Sugere-se a continuidade do estudo, eis que as obras


existentes na biblioteca local não foram suficiente para esgotar a matéria
e o tempo esvaiu-se rapidamente, impedindo maior aprofundamento
acerca do assunto.
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8. BRASIL. Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a plano


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União Estável. Possibilidade Jurídica do Pedido. Oitava Câmara
Cível. Apelação Cível n.º 598362655. Relator: Des. José Ataides
Siqueira Andrade. Data: 1.º de março de 2000.

10. BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Sucessão –


Herança disputada entre o companheiro e os colaterais –
Aplicação da Lei n.º 8.971/94. Sétima Câmara Cível. Apelação
Cível n.º 599.192.390. Relator: Des. Sérgio Fernando de
Vasconcellos Chaves. Data: 20 de agosto de 1999.

11. BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. ALIMENTOS – Prescrição –


Inteligência do artigo 23 da Lei nº 5.478, de 1.968, conjugado
54

com os artigos 168, II e 169, I, do Código Civil – Prescrição


qüinqüenal que embora atinja as prestações vencidas e não
satisfeitas, não afeta direito de credor absolutamente incapaz –
Recurso provido. Sexta Câmara de Direito Privado. Apelação
Cível n.º 97.922-4. Relator: Des. Antonio Carlos Marcato. Data:
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