Você está na página 1de 1

Revolução Francesa, Iluminismo e Nada Mais

No passado, o que vinha da França nos inspirava. Nossa Semana de 22 foi


fortemente influenciada pelas idéias francesas. Essa parceria é um de nossos maiores
orgulhos históricos. No entanto, atualmente, essa lógica de admiração e cumplicidade
intelectual parece estar sendo subvertida por articulações no mínimo constrangedoras.
Octavio Paz, é um escritor mexicano e um dos maiores pensadores latino-
americanos. Recorremos a um texto seu como o faz um jogador que apela à intercessão de
um terceiro que observa à distância o tabuleiro. O autor nos diz (O Arco e a Lira, 1982, p.
270), ao observar as características da sociedade moderna, que valores como a pátria, que
representava para as comunidades do passado algo concreto, palpável e desfrutável
coletivamente, converteu-se numa idéia em função da qual todos, ao invés de desfrutar, têm
de sacrificar-se: a nação. Complementa o autor, que a natureza reverte-se num complexo
sistema de relações causais no qual as qualidades desaparecem e se transformam em puras
quantidades. Conclui o autor sua linha de raciocínio, asseverando que os seres humanos
deixaram, assim, de ser pessoas e se transformaram em utensílios do sistema social.
Vejamos, então, o seguinte caso.
Tempos atrás troquei meu carro nacional por um importado marca Renault, um
modelo com seis anos de uso. Estou com o carro há uns quinze meses. Agora quero trocá-
lo. É notória, no entanto, a apatia do mercado ao veículo importado. Os revendedores e o
mercado em geral alegam mil e um defeitos ao importado que, em alguns casos, entretanto,
é visivelmente mais sofisticado e confortável. Ao mesmo tempo, tentam salientar que o
similar brasileiro na mesma faixa de preço e torque que querem nos vender é melhor,
apesar de seu péssimo estado de conservação e do total desconforto e rusticidade,
principalmente se colocados frente a frente ao concorrente importado.
Quando essa repulsa ao importado ocorre no mercado particular, é compreensível,
afinal as concessionárias estão abarrotadas de modelos nacionais e têm de vendê-los a
qualquer custo, mesmo que para isso seja necessário depreciar o concorrente internacional.
Mas o que dizer quando a própria fabricante Renault se nega a efetuar a recompra de um de
seus modelos alegando os mesmos motivos do mercado? Ou faz proposta de recompra
depreciando o valor do seu próprio produto a um nível de preço que fica mais barato e
menos constrangedor jogar o veículo no lixo?
Na condição de consumidor, quando levei meu carro por várias vezes à
concessionária Renault de Rio Preto, e lá nem quiseram ver meu veículo, senti-me
profundamente enganado. Diante de tal situação, não deixei de perguntar-me, que
confiabilidade essa empresa deve ter ao expôr em suas vitrines veículos novos importados
de sua própria lavra? O que dizer aos consumidores de seus modelos importados, daqui a
seis anos, já que nem mesmo a representante brasileira da fabricante dará respaldo de
recompra e crédito de qualidade ao produto que ela própria pôs no mercado?
Nossa advertência, aqui, visa chamar a atenção para essa tentativa de transformação
do homem no que Octávio Paz chamou de “utensílios do sistema”. Parece que servimos
bem ao sistema como “máquinas de comprar”. Nos prometem uma felicidade eterna
quando compramos seus carros e, em seis anos, ganhamos de brinde um purgatório
orientado pelos interesses unilaterais da indústria. Nessa prática, que desconsidera a
manutenção do índice de satisfação histórica do cliente, destrói-se a credibilidade da
Renault. E ninguém quer isso, uma vez que o se deseja, em qualquer nação, é o respeito à
pátria e ao povo acolhedor que somos e nada mais.

Você também pode gostar