Você está na página 1de 215

ISSN:

ESTUDOS
DO

INSTITUTO SUPERIOR DE CONTABILIDADE


E ADMINISTRAÇÃO

1998
Estudos do I.S.C.A.A II Série • N° 3 e 4 • 1997/98
Revista de Publicação Anual

Direcção: Joaquim José da Cunha

Coordenação: José Fernandes de Sousa


Virginia Maria Granate Costa e Sousa

Conselho Consultivo: Professores Coordenadores das Áreas


Científicas do I.S.C.A.A.

Edição e Propriedade: Instituto Superior de Contabilidade e


Administração de Aveiro

Apoio Administrativo e Assinaturas: Biblioteca do I.S.C.A.A.


R. Associação Humanitária dos Bombeiros Velhos de Aveiro
Apartado 58 - 3811/953 - Aveiro
Tel.: (034) 381977 - 381911; Fax: (034) 28975

Preço: 1.500$00

ISSN: 0873-2019

Depósito legal n°: 922 54/95


Capa: Design. Francisco Espindola
Trat. de texto: apoio técnico de Maximina Gonçalves Marieiro
Impressão: Tipografia Minerva Central, Lda./1998
Estatuto Editorial
1. Carácter da Revista
1.1. A Revista Estudos do I.S.C.A.A. será publicada anualmente, preven-
do-se a sua distribuição para o mês de Outubro.

1.2. Objectivos

1.2.1. Reforçar a identidade do I.S.C.A.A. no espaço técnico,


científico e cultural das Escolas de Ensino Superior.

1.2.2. Criar um espaço de reflexão interdisciplinar de acordo com


as exigências de uma abordagem científica da complexa
realidade empresarial e seus enquadramentos.

1.2.3. Dinamizar a análise crítica de experiências concretas no


interior das empresas com base na observação, em estudos
empíricos e em dados estatísticos.

1.2.4. Acompanhar, na medida do possível, os resultados da


pesquisa e da reflexão científica no interior da Escola - e,
quanto possível, no país e no estrangeiro - nos domínios
relevantes para a actualização dos profissionais diplomados
e formados no I.S.C.A.A..

1.2.5. Promover a criação de um Centro do Património


Contabilístico Português que permita enraizar as soluções
criativas para os desafios actuais na tradição técnico-
científica e cultural dos estudiosos portugueses da
Contabilidade e conexas Ciências empresariais.

2. Colaboradores
2.1. A Revista Estudos está aberta a todos os estudiosos e profissionais
dispostos a reflectir sobre quaisquer questões e experiências que
reforcem os valores humanos, aprofundem conhecimentos e
promovam a eficácia no desempenho das múltiplas tarefas exigidas
ao profissional saído do I.S.C.A.A., sem discriminação de
paradigmas teóricos ou de correntes de pensamento.
2.2. Os colaboradores naturais da Revista Estudos do I.S.C.A.A. são os
Docentes da Escola e seus diplomados, cujas páginas se podem
constituir em espaço privilegiado de divulgação dos seus trabalhos
académicos, após adaptação ao seu modelo editorial.

2.3. Não sendo uma revista para consagrados, acolherá, com gosto,
trabalhos de personalidades com prestígio no mundo da
contabilidade e vizinhos domínios científicos - podendo mesmo
solicitar a sua colaboração.

2.4. Toda a colaboração não solicitada deverá ser acompanhada de uma


síntese do curriculum vitae.

2.5. A colaboração dá direito a seis exemplares da Revista Estudos do


I.S.C.A.A., podendo o autor solicitar algumas separatas, sem
qualquer encargo adicional para a Revista, cujo número não poderá
ultrapassar 10% da edição.

3. Responsabilidade dos artigos


3.1. Os textos publicados são da total responsabilidade dos seus autores.

3.2. A Revista não se responsabiliza pela devolução do material enviado


para publicação.

4. Reprodução dos artigos


4.1. A reprodução integral ou parcial dos textos publicados fica
dependente de autorização da Revista, sendo sempre exigida a
indicação da origem.

4.2. Esta limitação não abrange a pequena citação indispensável ao


comentário crítico.

4.3. Os autores dos trabalhos não abdicam do natural direito de


propriedade em relação aos mesmos, mas a sua publicação pela
Revista dispensa esta de lhes solicitar autorização para satisafazer os
pedidos abrangidos pelo n°. 4.1. deste Estatuto.
APRESENTAÇÃO

Esta publicação corresponde ao n° 3/4 da II série da Revista


Estudos do ISCAA.
A consecução dos objectivos editoriais que nos propusemos
alcançar não tem sido facilitada pelos acrescidos compromissos
cientifico-pedagógicos que a dinâmica funcional da Escola tem
exigido dos seus docentes. Contudo, incluímos na presente edição dois
artigos que derivam directamente de provas académicas: "EXTENSÕES
DE UM ANEL. CORPO DE QUOCIENTES Q", construído a partir da
pesquisa efectuada para o concurso de provas públicas para
Professores Adjuntos de Matemática, e " CONTRIBUTOS PARA A TESE DA
CONTABILIDADE-CIÊNCIA", intimamente ligado a um "Trabalho de fim
de Curso", realizado no âmbito do Curso de Estudos Superiores
Especializados em Auditoria.

"O ESTADO Novo EA CONTABILIDADE" conduz-nos ao interior de


um Projecto, centrado no "mundo da contabilidade", cujo
desenvolvimento impõe uma perspectiva diacrónica mais ampla e uma
abordagem global dessa tripla realidade mutante, que é a
Contabilidade, o seu ensino e o multifacetado comportamento social
dos seus profissionais, no interior do processo histórico português.

O acolhimento dado aos artigos do Professor A. Lopes de Sá,


bem nosso conhecido, que do Brasil nos brinda com uma reflexão
sobre o "VALOR SOCIAL DA CONTABILIDADE SOB UMA ÓTICA DE
HARMONIA PARA A GLOBALIZAÇÃO", e do Professor Pantelis F.
Kyrmizoglov, PARTICULARITIES OF THE GREEK BANKING SYSTE
(G.B.S.), que evoca as singularidades do sistema bancário na Grécia,
reflecte uma atitude cultural que recusa o isolamento e promove a
inserção das preocupações científicas da Escola no intercâmbio
planetário - de problemáticas, métodos, técnicas e resultados - ,
indispensável ao avanço do conhecimento.

Esta revista continua aberta a todos os esforços científicos em


torno da Contabilidade, sem distinção de quadrantes ideológicos ou de
Escolas de pensamento, seja qual fôr o espaço onde a inteligência
contabilística prossiga os tentames de inúmeros avoengos, tais como
Luca Pacioli, Ricardo de Sá ou Lopes Amorim.
Se "Estudos do ISCAA" não pretende afirmar-se como revista
de Escola, não pode olvidar que nasceu, essencialmente, para ser uma
revista da Escola.
J.F.S.
V A L O R S O C I A L D A C O N T A B I L I D A D E S O B U M A O T I C A

DE HARMONIA PARA A GLOBALIZAÇÃO

ANTONIO LOPES DE SA
Professor Catedrático, Reitor do Centro de Estudos
Superiores de Contabilidade do Conselho Regional
de Contabilidade de Minas Gerais - Brasil.
Membro correspondente da Académie des Sciences
Commmerciales, de Paris, no Brasil
SUMÁRIO

• RESUMO
• PRESSÕES SOCIAIS E DESARMONIA INFORMATIVA NA
CONTABILIDADE
• VALOR DA CIÊNCIA E DA INTELECTUALIDADE CONTÁBIL NOS
ESFORÇOS NORMATIVOS
• ESPAÇOS DE INFORMAÇÃO E CONTABILIDADE
• CONCLUSÕES
• BIBLIOGRAFIA
RESUMO

A Globalização harmónica da informação depende de uma


globalização harmónica de conceitos científicos.
A harmonização demonstrativa, pois, em Contabilidade depende
daquela conceptual.
Necessário se faz uma forma racional de observação e
entendimento dos fenómenos da riqueza nas células sociais para que
se encontrem os verdadeiros conceitos, de modo a facilitar o
entendimento sobre tudo o que ocorre nas entidades.
É preciso o apoio de uma vigorosa doutrina, erguida, sobre
teorias confiáveis para que se oriente como evidenciar os fatos
ocorridos com o capital das empresas.
Só a ciência pode guiar tais entendimentos, sendo ela a porta
única para que a informação seja verdadeira.
Como a tendência mundial parece ser a da dilatação das áreas de
mercado, a sociedade tende para uma sociedade global, exigindo que a
validade das demonstrações contábeis seja compreendida da mesma
forma em todas as partes.
Como a ciência é um conhecimento do universal ela é, também,
o veículo natural para sustentar informes contábeis universais.

9
PRESSÕES SOCIAIS E DESARMONIA INFORMATIVA NA
CONTABILIDADE

A importante empresa EDP - Eletricidade de Portugal, em


recente balanço publicado, apresentou lucros de 66,268 milhões de
contos, segundo as Normas de Contabilidade daquele País.
Nos Estados Unidos, o mesmo balanço, dessa mesma empresa,
apresentou lucros de 110,684 milhões de contos.
Isto foi o que a imprensa portuguesa fez editar com destaque,
em fins de Abril de 1997.
O lucro daquela empresa, segundo as normas estadunidenses,
quase dobrou.
Tal discrepância já havia sido percebida antes, no caso da
Daimler-Benz, no balanço do primeiro semestre de 1993 e que
apresentou nos Estados Unidos uma perda líquida de 949 milhões de
marcos e na Alemanha um lucro de 168 milhões de marcos, segundo o
que publicou a FEE - Federação Europeia de Contadores, em trabalho
de Chris Nobes, Jens Reoder e Saskia Slomp, sob o titulo "Are
Consolidated accounts the route to harmonisations?".
Um profundo estudioso da matéria, o Prof. José Antonio Lainez
Gadea, da Universidade de Saragoça, já havia denunciado essa
discrepância expressiva de tratamento das normas em suas palestras,
especialmente nas que realizou no Brasil em 1993, nos encontros
Iberoamericanos em Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro.
No mesmo ano de 1993, editado pelo ICAC - Instituto de
Contabilidad y Auditoria de Cuentas, do Ministério de Economia e
Fazenda da Espanha, o Dr. Lainez Gadea denunciou amplamente essa
falta de harmonia das normas e a debilidade delas diante das
necessidades sociais e económicas das diversas Nações.
Ninguém hoje coloca em dúvida que existem Normas Europeias,
Normas Estadunidenses, Normas Brasileiras, Normas Argentinas etc.
etc. em desencontros expressivos.
Critérios alternativos empregados já haviam levado o Senado
dos Estados Unidos a requerer mudanças de comportamentos e a
desacreditar nos trabalhos contábeis naquela Nação (publicação do

10
Senado sob o título The Accounting Establishement, editado em
1976).
Ilustres professores universitários protestaram conta a debilidade
e a falsidade das normas empregadas nos Estados Unidos dentre eles
Abraham Briloff (obras diversas, bastando referirmo-nos a More Debt
than Credits, editora Harper & Row, Nova York, 1976), Taylor e
Turley (The Regulation of Accounting, edição Basil Blackwell, Nova
York, 1986). Robert N. Anthony (trabalho We don't have the
accounting concepts we need), Hendriksen e Van Breda (Accounting
Theory, 5a edição, editora Irwin, Homewood, 1992), etc. etc.
Essas singelas citações, de nomes expressivos, da cultura
estadunidense, mostra-nos que a questão não está em um modelo do
País, mas, dos que se dizem representantes da cultura contábil no País,
através das associações de classe, tal como denunciou o senado norte
americano.
Logo, devemos falar de Normas dos Institutos ou Associações
dos Estados Unidos mas que não representam o pensamento de muitos
dos insignes intelectuais da Contabilidade daquela Nação.

São essas normas que foram acusadas de falsas ou


pejorativamente de "criativas" pelo Poder Legislativo, evidenciando
que tais instituições produziram as regulações contábeis ao sabor dos
interesses dos grupos dominantes sem preocupação com a verdade.
Seria, pois, leviano e enganoso alegar que há uma escola
intelectual que governa tais Normas, sendo preferível reconhecer,
como denuncia o Senado, que existem interesses poderosos em jogo
que se utilizam da Contabilidade para adulterar as demonstrações dos
fatos (assim consta do relatório ao qual nos referimos).
Além desses interesses e que representam a força do poder
económico deturpando a Contabilidade, existe também aqueles do
Estado e que através de regulações contábeis deformam os balanços e
resultados para auferir maiores arrecadações tributárias ou para ceder,
em alguns casos, privilégios a grupos favorecidos pelo Poder.

U
Encontramos essas realidades em diversos países, chegando-se,
por exemplo, no Brasil ao absurdo de se considerar, a um só tempo,
regimes contábeis absolutamente opostos.

A Espanha, por exemplo, entretanto, conseguiu libertar-se do


regime fiscal para fins da informação contábil que deve ser publicada
para servir a terceiros.
Naquele País hoje buscam-se normalizações cada vez mais
aperfeiçoadas através da intervenção de muitos intelectuais de valor
arregimentados pela AECA e pelo ICAC, especialmente.
Na maior parte dos países que pesquisamos, entretanto, forte é
ainda a ação do Estado, no sentido de resolver seus problemas de
Caixa, realizando, para tanto, adulterações da realidade, através de
artifícios contábeis compulsórios para conseguir maiores resultados
em suas arrecadações.
Sofre, pois, a informação contábil a dupla pressão social - do
Estado e de Grupos Económicos.
De acordo com essas influências, transmitidas a diversas
entidades de classe, procura-se dar um cunho de verdade ao que de
fato está fora da realidade, utilizando-se tais forças sociais, da
Contabilidade, para produzir os efeitos que cada uma deseja dentro de
suas próprias conveniências.
Nesse mar tormentoso navega a Normalização Contábil de
nossos dias, sendo natural que as deformações ocorram ao sabor de
cada região e onde as referidas influências mais se fazem destacar.
Inequívoco se torna, pois, diante dessa realidade atual de
desarmonia que necessário se faz encontrar um caminho único,
comprometido apenas com a fidelidade, com a sinceridade da
informação sobre a riqueza das entidades e que deve emergir de
harmonias conceptuais que sejam aceitas e reconhecidas pela
globalidade das sociedades humanas onde tais informes são
requeridos.

12
V A L O R DA CIÊNCIA E DA INTELECTUALIDADE CONTÁBIL
NOS ESFORÇOS NORMATIVOS

O caminho para uma harmonia das regulações da Contabilidade


só pode ser encontrado através de poderosos marcos conceptuais, tal
como da doutrina científica, pois, só estes possuem o poder da
universalidade.
Um elenco de Princípios lastrados em bases doutrinárias, será
sempre competente para ensejar normas igualmente competentes
Nenhum ramo do saber humano adquire consistência se não está
fundamentado em uma filosofia, ou seja, em diretrizes do
«conhecimento sobre o conhecimento».
Os conceitos nascem sob tal orientação, ou seja, no encontro de
uma expressão competente para significar uma série de raciocínios
que se derivaram de percepções sobre acontecimentos.
Se não é possível dar-se a uma palavra um sentido inequívoco
que deve ter; ela poderá servir para muitos fins, sendo, portanto, débil
e motivadora de enganos.
De nada vale normalizar sobre avaliação se não definimos
perfeitamente o que seja valor e nem utilizar essa expressão se não
estabelecemos raciocínios inequívocos sobre o que deve representar.
Só o método científico pode oferecer tais condições.
Antes que se estabeleçam regulações é preciso situar nosso
conhecimento dentro do que ele mesmo deve representar e o que com
ele desejamos, assim como a que se aplica.
Nesse sentido, no Brasil, o Conselho Federal de Contabilidade,
através da Resolução de número 774, de 1995, traçou conceitos
básicos e apresentou os alicerces de todo o conhecimento contábil.
Não conhecemos outra, instituição que tivesse tido tal cuidado ;
em verdade, as Normas, em nosso campo, surgiram do emprirismo, do
hábito de fazer; da prática de grupos, do interesse em se fazer desta ou
daquela forma, sem maiores compromissos com a ciência.
Insistiu-se, inclusive, em desconsiderar a Contabilidade como
ciência, pois, se assim fosse aceita estaria ela seriamente

13
comprometida com a verdade e esta não interessava a alguns que
produziam as normas referidas ao sabor de suas conveniências.
Na atualidade é evidente o grande valor da intelectualidade
contábil em todas as partes do mundo e avançada já vai a pesquisa em
nosso território, como, recentemente descreveu em importante
trabalho, publicado em Hong Kong, o emérito professor triestino
Richard Mattessich.
A força cultural de nosso ramo é expressiva e nossa organização
social muito definida e forte.
A sociedade depende dos Contadores, como estes cada vez mais
se conscientizam do seu papel social.
Não há, pois, razão para temer sobre o futuro de tal
conhecimento e nem para deixar de congregar essa força no sentido
de que, através da ciência, seja possível encontrar-se o caminho da
harmonia das normas, pois, repito, o científico se fundamenta na
universalidade.

ESPAÇOS DE INFORMAÇÃO E CONTABILIDADE

Os espaços sociais e económicos, ampliados pela dilatação dos


mercados, com a constituição de autênticas unidades comerciais entre
Nações, exige das demonstrações contábeis a qualidade de serem estas
entendidas em todos os lugares da mesma forma.
Uma linguagem contábil uniforme passa a ser requerida nos
espaços que pretendem, também, a uniformidade no trato e na
compreensão dos fatos ocorridos com a riqueza.
Se existem interesses comuns, se o pretendido é que tudo se
considere como se uma só Nação fosse, em termos económicos,
necessário se faz que a linguagem da riqueza também se uniformize,
ou seja, a Contabilidade precisa ser ampla e geralmente entendida por
todos, dentro dos mesmos Princípios e Regulações.
Mas não apenas entendida, como, também, confiavelmente
transmitida a todos.
A informação por si só nada vale se não corresponde à
realidade.

14
Em matéria de fenómenos da riqueza das entidades não se pode
falar em diversidade de tratamento, pois, se assim fosse não haveria
esperanças para uma harmonização contábil.
Cada espaço pode ter sua peculiaridade, mas, é axiomático que
os fenómenos empresariais são uniformes em suas naturezas, ainda
que não o sejam em valor e em outros aspectos.
Uma compra será sempre uma compra, quer na França, quer no
Brasil ; um financiaamento será sempre um financiamento, quer no
México, quer na Alemanha; uma despesa será sempre uma despesa
quer na Itália, quer em Portugal.
Seria utópico admitir-se, todavia, que, de imediato, todos os
costumes e legislações desses espaços se adaptassem à unidade de
mercados globalizados.
O que cada povo cria como defesa de sua nacionalidade, como
garantia de sua terra, também cria como raízes, e, estas dificilmente se
extirpam.
A própria Comunidade Europeia, com sua já consagrada
experiência, ao estabelecer suas diretrizes gerais, deixou margens a
flexibilidade e só dentro de mais alguns anos terá sua medida
monetária uniformizada.
Entendo, entretanto, que na medida em que a difusão das
doutrinas contábeis, das teorias mais avançadas se operarem, com
mudanças no ensino universitário contábil para mais forte natureza
científica, as divergências tenderão a se dissolver.
A globalização é uma visão demasiadamente ampla para que o
imediatismo se opere logo.
Só uma universalidade conceptual poderá resolver o problema
da universalização de entendimentos ou seja, enquanto não ocorrer o
domínio da ciência não ocorrerá o domínio da verdade, na fidelidade
dos informes contábeis, nos diversos espaços.
Os registros, as demonstrações, são apenas memórias
organizadas de acontecimentos, devendo seguir, na sua forma, o que
lhes dita a essência, ou seja, não é útil evidenciar o que não tem base
em uma orientação para a verdade.

15
Entretanto, só mesmo o futuro, o progresso, à custa de muitas
experiências amargas (como a evidenciada pelos inúmeros processos
na Justiça contra os erros de informação e que hoje somam bilhões de
dólares), poderá conduzir a uma consciência global de adesão
completa aos domínios da ciência.
O pragmatismo ainda tem sua influência, especialmente entre os
que se acomodam em experiências particulares de determinados
espaços, sem a preocupação da indagação sob a ótica do universal,
sem preocupação com a ciência.
Tão poderoso é o valor do informe contábil que ele continuará a
ser disputado como propriedade de grupos, tal como tem ocorrido em
qualquer área onde o Poder é instrumento de satisfação de minorias.
Diante de tal fim, muitos intelectuais continuarão marginali-
zados no processo e, enquanto isto prevalecer, prevalecerá, também a
deformação sobre a realidade dos fenómenos da riqueza nas entidades.
O tempo, todavia, especialmente o domínio do maior acesso à
informação pelos meios da Telemática, da Informática, incumbir-se-á
de transformar esse quadro.
O que na atualidade tanto mal causa e que faz conflitantes os
dados contábeis entre os espaços sociais e conómicos e nestes entre o
que é divulgado e o que é utilizado para fins administrativos internos
das empresas, haverá de terminar.
A plena utilidade social da Contabilidade dependerá sempre da
plenitude da verdade que ela venha a defender, ou seja, de seu
exercício científico perante a humanidade e em qualquer espaço onde
seja exercida.

CONCLUSÕES

A globalização da informação contábil dependerá sempre de


uma sustentação doutrinária científica que garanta em todas as partes
um teor universal de entendimentos.
Enquanto as Normas se produzirem ao sabor de consensos
apenas, sem apoio em arcabouço teórico, continuarão a falhar e a
provocarem desarmonias de tratamentos.

16
A Contabilidade perderá, na desarmonia, o seu poder de servir
a sociedade e de ser acreditada como conhecimento útil
Básica, portanto, é a universalidade dos científicos na
sustentação de regulações que venham a ser válidas em todos os
espaços e em todos os tempos.
Para que tal fim seja alcançado é preciso introduzir mudanças
no ensino universitário, unir as forças da classe contábil e também
arregimentar as intelectualidades notórias, sem influências de grupos
de interesses secundários.
A imagem fiel dos fenómenos da riqueza deve ser a
preocupação fundamental e esta deve emergir de metodologias
científicas da Contabilidade.
Enquanto prelavecer o empirismo também prevalecerá o risco
da infidelidade informativa.
A intelectualidade contábil precisa estar arregimentada com
seriedade e livre de influências políticas, tendo por base, apenas, o
valor do saber e por objectivo único servir a sociedade através de
informações confiáveis e da explicação destas como fator orientador
das riquezas na satisfação das necessidades lícitas humanas.

17
BIBLIOGRAFIA

AECA, Princípios Contables, edição AECA Madri, 1996;


BALADA, Tomás e RIPOLL Vicente, Contabilidad Global:
estratégia Ford 2000, in Boletim AECA n° 40, Madri, Fevereiro-Junho
de 1996;
BENAU, Maria Antónia Garcia, Relación entre, teoria y práctica
contable, in Boletim AECA n° 40, Madri, Fevereiro-Junho de 1996;
BIONDI, Mario, Comentes de opinion - in Contabilidad y
Auditoria, numero extraordinário, ed. Instituto de Investigaciones
Contables Professor Juan Alberto Arevalo, BuenosAires, Novembro
de 1996;
BRAVO, Lúcio E. Gonzalez e MARQUES, Gustavo -
Metodologia de la investigación, ciência y tecnologia en acción su
aplicación a las ciências económica, edição do Editorial de Belgrano,
Buenos Aires, 1996;
BRILOFF, Abraham J., More debts than credits, editor Harper
& Row, Nova York, 1976;
BRUNET, André A, La normalisation comptable au service de
l'entreprise, de la science et de la Nation, edição Dunod, Paris, 1951;
CANIBANO LEANDRO, Princípios contables AECA, 1980-
1995, in Nuevas tendências en Contabilidad Administración de
empresas, edição AECA, Madri, Novembro de 1996;
CAMARGO, Ynel Alves de, em Normas Brasileiras de
Contabilidade, edição do Conselho Federal de Contabilidade, 2a
edição, Brasilia, 1991;
CHAKRAVARTY, Subrata N., Unreal Accounting, Readings
and Notes of Financial Accounting, editor Stephen Zeef e Bala G.
Dharan, Mcgraw Hill, 4a. edição, Nova York, 1994;
CIRIA, Antonio Gomez, Situación actual y perspectiva de la
regulación contable en Espana, in Nuevas tendências en Contabilidad
y Administración de empresas, edição AECA Madri, Novembro de
1996

18
CRUZ NETO, João Lopes da, Sistema padrão para globalização
da Contabilidade Pública e Privada, in Boletim IP AT número 12, Belo
Horizonte, Fevereiro de 1997;
DEEZ, Julita Garcia e ARIAS, Antonio Martinez, Contabilidad
General, edição Civitas, Madri, 1995;
FERREIRA, Rogério Fernandes, Panorama da harmonização
contabilística em Portugal, in Revista de Contabilidade e Comércio n°
210 , Porto, 2o semestre de 1996;
IBRACON, São Paulo, Novembro de 1996;
FRONT1, Inês Mercedes Garcia, Armonización, in Contabilidad
y Auditoria, numero extraordinário, ed Instituto de Investigaciones
Contables Professor Juan Alberto Arevalo, Buenos Aires, Novembro
de 1996;
GABAS, Francisco e PINA, Vicente, Estúdio sobre la
implantación de los Princípios Contables de AECA en el nuevo marco
normativo contable, in Nuevas tendências en Contabilidad y
Administración de empresas, edição AECA, Madri, Novembro de
1996;
GADEA, José Antonio Lainez, Comparabilidad internacional de
la información ftnanciera, analisis y posicion de Ia normativa
espanola, edição Instituto de Contabilidad y Auditoria de Cuentas,
Ministério de Economia y Hacienda, Madrid, 1993
GADEA, José Antonio Lainez , GASTON, Suzana Callao e
JARNE, José Ignacio Jarne, La diversidad contable y su armonización
- la experiência de Ia union europea, in Boletim IP AT número 12,
Belo Horizonte, Fevereiro de 1997;
GASTON, Susana Callao, Analisis internacional de estados
contables, tese doutoral, Zaragoza, 1996;
HENDRIKSEN, Eldon e BREDA, Michael F. Van, Acounting
Theory, 5a edição, editor Irwin, Boston, 1992;
IFAC. , Normas Internacionales de Auditoria de la IFAC, edição
Instituto de Auditores Censores Jurados de Cuentas de Espana, Madri,
1993;

19
JARNE, José Ignacio Jaime, Clasificación, evolución y
armonización internacional de los sistemas contables, un analisis
conceptual y empírico, tese doutoral, Zaragoza,1996;
MASI, Vincenzo, Filosofia delia Ragioneria, edição Tamari,
Bolonha, 1961;
MATTESSICH, Richard, Academic Research in Accounting,
the last 50 years, in Asia-Pacific Journal of Accounting, volume 3, n°
1, Hong Kong, Junho de 1996;
MOAMMEN, Marcel HE.R., Le plan comptable selons
diferentes formes d'expressions et son aboutissement International
volumes I e II, edição CAMBEI, Bruxelas, 1957;
PALAU, J. Xirau, O sentido da verdade, edição Atlântida,
Coimbra, 1973;
PENA, Enrique Fernandez e RODRIGUEZ, Carlos Mallo , Plan
General Frances de Contabilidad, edição ICAC, Madri, 1992;
PEREDA, Jorge Tua, Ampliar el marco conceptual de la
información financiera, in Boletim AECA, n° 40, Fevereiro-Junho,
Madri, 1996;
PEREDA, Jorge Tua, El marco conceptual de la información
financiera, edição do Instituto de Auditores Censores Jurados de
Cuentas de Espana, Madri, 1996;
PEREDA, Jorge Tua, Necesitamos un marco conceptual ?, in
Revista de Contabilidade e Comércio, n° 213, Porto, I o trimestre de
1997;
PULIDO, Antonio, La necesidad de un marco conceptual como
fundamento teórico de la información financiera, in Nuevas
tendências en Contabilidad y Administración de empresas, edição
AECA, Madri, Novembro de 1996;
REIS, José Vieira dos, Os documentos de prestação de contas na
CEE e a legislação portuguesa, edição Rei dos Livros, Lisboa, sem
menção de data de edição;
SÁ, Antonio Lopes de, Normas Técnicas em Contabilidade,
edição APEC, Rio de Janeiro, 1975;
SÁ, Antonio Lopes de, Planos de Contas, 8a edição, Editora
Atlas, São Paulo, 1994;

20
SA, Nuevos Rumbos Científicos en la Contabilidad, em Suma,
n° 41, Maryland, USA, Junho de 1996;
SCARANO, Eduardo R., La Contabilidad y la aparición de la
Tecnologia. Una involución?, in Boletim IPAT número 12, Belo
Horizonte, Fevereiro de 1997;
TAYLOR, Peter e TURLEY, Stuart, The regulation of
Accounting, editor Basil Blackwell, Oxford, 1986;
VALVERDE, Carlos Cubillo, Quince anos de normalización
contable espanola, in La Contabilidad en Espana en la segunda mitad
dei siglo XX, edição Técnica Contable, comemorativa dos 40 anos da
editora, Madri, 1989;
VAZQUEZ, Luis Pablo Cortês, Contabilidad Internacional, in
SUMA, vol. IX, n° 42, Rockville, Setembro 1996;
VIDAL, Caetano Leglise da Cruz, Ensaio sobre um
planejamento contabilístico nacional, edição do autor, Lisboa, 1956

21
CONTRIBUTOS PARA A TESE
CONTABILIDADE- CIÊNCIA

GILBERTO DE CARVALHO FERNANDES


Licenciado em Auditoria Contabilística
SUMÁRIO

• INTRODUÇÃO
• CAPÍTULO I - NOÇÃO CIÊNCIA TÉCNICA E ARTE
• CAPÍTULO II - CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CONTABEJDADE-
-CJÊNCIA
• CAPÍTULO III - CONSIDERAÇÕES ACERCA DA NATUREZA E DAS
DIVISÕES DA CONTABILIDADE
• CAPÍTULO IV - A PREVISÃO NO CONHECIMENTO CONTABILÍSTICO
• CAPÍTULO V - CONCLUSÕES FINAIS
• ANEXOS
• BIBLIOGRAFIA

24
INTRODUÇÃO

Este trabalho resulta da compilação e reestruturação da


dissertação exigida ao autor para a conclusão da sua licenciatura em
Auditoria Contabilística, ministrada pelo Instituto Superior de
Contabilidade e Administração de Aveiro.
A escolha do tema "Contributos para a Tese da Contabilidadt-
-Ciência", entre os inúmeros possíveis, surge como tentativa,
fundamentada e sistematizada, de oposição e contestação à "teoria do
reducionismo" da Contabilidade a mero conjunto de técnicas, por um
lado, e, portanto, à afirmação da Contabilidade como disciplina
científica, por outro.
Em suma, os argumentos invocados pelos defensores dessa teoria
resumem-se à presunção de excessivas doses de subjectividade
incorporadas no processo contabilístico, negando-lhe, assim, qualquer
possibilidade deste se assumir científico e, portanto, não admitindo,
como "verdadeira e apropriada" a imagem que é (deve ser) inscrita
nas Demonstrações Financeiras.
Assim, no primeiro capítulo, apresentam-se algumas definições,
tais como: ciência, método científico, técnica e arte, e outras que,
obviamente, servirão de linha de orientação e de delimitação desta
exposição.
No segundo capítulo invoca-se, ainda que sucintamente, a
evolução da Contabilidade, desde os tempos em que se resumia à
escrituração, até aos nossos dias, ou seja, até à afirmação da
Contabilidade-Ciência.
Envereda-se, depois, pela análise crítica comparativa das
posições (definições e outras considerações) de vários autores,
chegando-se à conclusão que a maioria defende a Contabilidade como
disciplina científica, de natureza predominantemente económica.
Na posse de definições apresentadas, parte-se para a afirmação da
Contabilidade como disciplina científica autónoma, com objecto
formal definido e delimitado e com método científico próprio;
verificando-se que obedece aos requisitos do conhecimento científico.
O método contabilístico (científico) é analisado pormenorizadamente.

25
No terceiro capítulo aborda-se, com maior profundidade, a
temática da natureza da Contabilidade. Parte-se, em seguida, para a
tentativa de apresentação e explicação das divisões da Contabilidade.
O estudo recai com especial incidência no campo de actuação da
Contabilidade da Empresa. Apresenta-se, por fim, um exemplo
(académico) tendente à consolidação de conhecimentos e à
compreensão da articulação e relacionamento entre os vários ramos da
Contabilidade da Empresa.
Receando não termos ressaltado anteriormente, com o relevo que
merece, a problemática da previsão do conhecimento contabilístico,
optou-se por, no quarto capítulo, apresentar, numa primeira parte,
alguns exemplos de perspicácia contabilística na interpretação das
Demonstrações Financeiras. Abordou-se, depois, necessariamente, a
problemática das leis e previsões contabilísticas. Comprovou-se que a
sua admissão é um passo significativo e decisivo para a afirmação da
Contabilidade-Ciência.
Por último, o quinto capítulo fica reservado para as conclusões
finais do trabalho.
Não se pretende, nem tal seria possível, rotular este trabalho de
definitivo, acabado ou indiscutível. É nosso ensejo proporcionar
subsídios para o aprofundamento de uma temática cujo interesse
julgamos ser decisivo para a afirmação do prestígio da Profissão
Contabilística.

26
CAPÍTULO I

NOÇÃO DE CIÊNCIA, TÉCNICA E ARTE

1. CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

Apesar de o objectivo fulcral deste trabalho não constituir o


estudo da historial, da metodologia e da epistemologia, quer da
ciência, no geral, quer da Contabilidade, em particular, tentámos a
utilização da terminologia adequada e rigorosa que o tema exige.
Consequentemente, excluiu-se deste estudo a história da ciência,
ou seja, a evolução do conhecimento científico, desde a coexistência
pacífica da "ciência" e da teologia, passando pela ruptura e
autonomização de ambas, até à afirmação da ciência moderna. Será
apenas esta última o objecto do nosso estudo.
Não será dada qualquer relevância à questão do "sujeito" como
interveniente e elemento imprescindível para a produção de
conhecimentos, uma vez que o que está em causa neste trabalho não é,
jamais, a qualificação do Contabilista, Auditor e, ou, ROC (o(s)
sujeito(s) do processo contabilístico), mas o próprio processo de
tratamento da informação histórica ou previsional; logo o método
contabilístico.
A matéria explanada neste capítulo servirá apenas de base para o
estudo e análise, nos capítulos seguintes, da obediência dos requisitos
do conhecimento contabilístico às características do conhecimento
científico, com o intuito de lhe atribuir ou destituir carácter científico
e, no primeiro caso, afirmar a Contabilidade como ciência, ou, ao
invés, reduzi-la a um mero conjunto de técnicas.

Existem várias obras importantes sobre esta temática. Ousamos propor, entre
outros, COLLINGWOOD (1986).

27
2. NOÇÃO DE CIÊNCIA

De entre as inúmeras definições de ciência seleccionámos


algumas, no intuito de obtermos uma outra, também imperfeita e
inacabada, mas abrangendo os elementos caracterizadores
imprescindíveis.
Recorrendo a um dicionário que nos define ciência como um
"conjunto organizado de conhecimentos relativos a certas categorias
de factos ou fenómenos"?- ou ainda a um dicionário de filosofia que a
define como: "conjunto de conhecimentos e de pesquisas metódicas
cujo fim é a descoberta das leis dos fenómenos"-1, somos conduzidos
às seguintes conclusões:
A ideia de "conjunto organizado de conhecimentos" ou "conjunto
de conhecimentos e pesquisas metódicas" é comum a ambas as
definições e, em termos semânticos, uma análise extensiva conduzir-
nos-ia a significações semelhantes.
Também o objecto de estudo: certas categorias de "fenómenos"
ou de "factos" está patente em ambas as definições. Contudo, o
acréscimo à primeira definição reside na existência de um fim que é "a
descoberta das leis dos fenómenos".
Consequentemente, podemos, muito rudimentarmente, definir
ciência como sendo o conjunto sistematizado de conhecimentos de
factos e, ou, de fenómenos que permitem estabelecer leis. Assim,
suscita-se, desde já, uma questão: tratando-se de um conjunto
organizado de conhecimentos, como se procedeu à aquisição dos
mesmos e à sua organização?. Mais, não poderia o senso comum
proceder à apreensão e organização da realidade observada,
formando, por essa via, uma disciplina científica?.

1
Cf. Dicionário Enciclopédico Koogan-Larousse-Selecções, Volume I - Léxico
Comum, 3a Edição, Lisboa, 1980.
•* Cf. CUVILIER (1960). De realçar que apesar de a fonte ter sensivelmente
quarenta anos, a definição apresentada continua actual. Vd., por exemplo,
"Dicionário de Filosofia" de José Ferrater Mora, Publicações D. Quixote, Lisboa,
1991.

28
A resposta a estas duas questões obriga-nos a efectuar a distinção
entre objecto material e objecto formal. Sendo o senso comum e o
conhecimento científico conjuntos de conhecimentos e podendo
ambos observar os mesmos fenómenos, poderíamos concluir tratar-se
de uma única forma de conhecimento.
De facto, se reduzirmos a realidade total a um simples fenómeno
e o designarmos de objecto material, o objecto formal refere-se a
um aspecto particular dessa totalidade. Melhor dizendo: o objecto
formal é uma parcela do objecto material. Não será difícil deduzir, a
partir daqui, que as várias perspectivas da realidade (os vários
objectos formais) são os responsáveis pela criação das várias
disciplinas científicas.
Por outras palavras: embora as várias disciplinas científicas
tenham como objectivo comum o conhecimento da realidade, sabemos
que não existe rigorosamente traçada uma "realidade biológica", uma
" realidade física", uma "realidade económica", etc, distintas umas das
outras. Existe, sim, a mesma "realidade", captada sob diferentes
formas. Podemos, pois, adiantar que o elemento diferenciador das
várias disciplinas é o próprio objecto.
Após estas considerações, cabe-nos reformular a questão inicial.
Será possível um cidadão vulgar observar com o mesmo grau de rigor
e objectividade um objecto observado por um investigador
especializado?. A resposta encontra-se já embuída na exposição
anterior e a questão serve-nos apenas para procedermos, em termos
muito gerais, à diferenciação entre conhecimento do senso comum e
conhecimento científico.
Para o efeito recorremos a VILHENA (1977, p. 46-60), que
caracteriza o conhecimento do senso comum, ou espontâneo, como
geral, superficial, diverso, fruto das experiências pessoais e contínuas
vividas; ou seja, é empírico, com predomínio de elementos não
intelectuais.
Relativamente ao conhecimento científico, o mesmo autor
caracteriza-o como sistematizado, disciplinado, especializado, crítico,
obtido pela persistência, metódico, pois assenta na clara consciência
dos fins e dos meios para o atingir. Sinteticamente, podemos dizer que

29
o conhecimento científico procura relações de causa-efeito, não se
limitando à contemplação dos factos.
Do exposto, a principal diferença entre os dois tipos de
conhecimento situa-se ao nível da objectividade e subjectividade.
Quer isto dizer que o conhecimento do senso comum é, em princípio,
subjectivo, na medida em que resulta de uma observação pessoal; o
conhecimento científico tende, por seu turno, a eliminar essa
subjectividade, embora nem sempre o cientista/investigador a consiga
reduzir a níveis aceitáveis. E, a diferenciação opera-se, desde logo, no
início da produção dos conhecimentos, isto é, na observação, pelo
facto de o senso comum apenas captar a "aparência" da realidade,
enquanto que o conhecimento científico vai mais além, em busca da
"essência" dessa mesma realidade 4.
Vem assim a propósito a definição de THOMPSON: "A ciência é
um sistema de conhecimento construído em bases de observação e
experiência, e unificado pela reflexão sobre os dados que aquelas
proporcionam. O conhecimento científico caracteriza-se tipicamente
por poder ser verificado por qualquer investigador competente que
registe as observações e as experiências anteriores e que racicione
cautelosamente sobre os resultados obtidos. A ciência é conhecimento
verificável, comunicável, impessoal e não-emotivo" $.
Retirando da definição acabada de referir algumas ideias,
podemos sintetizar:

- A Ciência é sistema, o que faz transparecer a ideia de


organização, de conjunto estruturado;
- Pressupõe a Ciência um sujeito que observa, que estuda, que
verifica e um objecto que é observado e estudado;

Para um maior aprofundamento desta matéria indica-se a obra: Conhecer o


Conhecimento, de Armando Castro (cf. CASTRO, 1989).
THOMPSON, J.A. "Ciência e Pensamento Moderno", in Panorama da Ciência
Contemporânea, vol. I, Edições Cosmos, Lisboa, 1947, cit. por VILHENA (1977).

30
- O conhecimento científico utiliza um método racional para a
compreensão da realidade;
- O conhecimento científico pode ser verificado por qualquer
investigador competente;
- A verificação opera-se através do método científico;
- Por fim, a verificação faz ressaltar a ideia de necessidade de
controlo.
Contudo, parece-nos faltar na definição anterior um elemento
deveras importante, que é a capacidade de previsão da ciência, o
estabelecer de leis. Sabe-se que a generalização favorece a
determinação e estabelecimento de leis, deixando para o conhecimento
empírico os factos isolados. Da generalização metodicamente
elaborada e verificada passar-se-á de factos observados à previsão
rigorosa de outros.
Estamos, agora, aptos a intentar uma definição que nos
acompanhará ao longo deste trabalho e que servirá de base a novas
reflexões. Assim, Ciência é um sistema de conhecimentos metódicos e
universalmente verificáveis, produzidos a partir da observação
cuidada e rigorosa da realidade, sobre os quais se opera e exerce
controlo no sentido de se descobrir as leis dos fenómenos, as quais
proporcionam a generalização e consequentemente, a previsão 6 .

3. CARACTERÍSTICAS DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO

Embora tenhamos já referido as características do conhecimento


científico, não o fizemos com a sistematização desejada. Assim, de
modo sistematizado e servindo-nos da proposta de PINTO DA
ROCHA e MAGALHÃES (1981), salientamos os seguintes traços
caracterizadores:

6
Poderíamos invocar muitas outras definições, mais simples ou mais complexas,
mas, estamos convictos que pouco conteúdo relevante seria acrescentado à acabada
de apresentar.

31
- Objectividade - A ciência procura afastar todo o elemento
afectivo e subjectivo;
- Universalidade - Os resultados da ciência impõem-se por si, e
não em função do gosto ou tendências pessoais; daí qualquer
investigador competente poder verificar conhecimentos, anteriormente
comprovados;
- Operatividade - Os resultados da ciência permitem a previsão, o
que resulta da capacidade de generalização do conhecimento
científico;
- Racionalidade - Partindo dos dados empíricos, o cientista vai
fazendo sínteses cada vez mais vastas, até construir num sistema
racional os conhecimentos científicos;
- Revisibilidade (ou Provisoriedade) - A verdade científica é, de
certo modo, provisória, porque é susceptível de revisão e, ou, de
aperfeiçoamentos;
- Carácter Dialéctico - A evolução da ciência opera-se pela
ultrapassagem de limites impostos por diversos condicionalismos
histórico-económico-sociais e até políticos, inerentes à produção de
conhecimentos científicos 7;
- Carácter Aproximativo - Resultante da imperfeição (no sentido
de inacabamento) do conhecimento científico, e de as suas verdades
estarem indexadas a um sistema de axiomas anteriormente
estabelecidos;
- Autonomia Relativa - Porque apesar de a ciência ter o seu
próprio campo de estudo está balizada pelas condições teóricas e
sócio-políticas da produção científica.

Veja-se a propósito "dos obstáculos à produção do conhecimento cientifico",


concretamente, ao nível das Ciências Sociais, FERREIRA DE ALMEIDA e
MADUREIRA PINTO (1990, p. 17 e segs).

32
4. MÉTODO CIENTÍFICO

4.1. Noção e Outras Considerações

4.1.1. Noção

A construção do conhecimento científico depende, antes de mais,


de uma metodologia adequada, que, de uma forma geral, constitui o
que se designa de método científico. Anteriormente, por tal se mostrar
imprescindível à definição de Ciência, referimo-nos a "método
racional", "método científico" ou, simplesmente, ao termo "método",
entendido como o processo de obtenção credível e verificável do
conhecimento.
Por isso, antes de prosseguirmos, importa diferenciar "método
científico" de "método" em acepção comum. Consiste este último num
conjunto de procedimentos adequados para obter determinados fins,
sendo, consequentemente, aplicável quer no conhecimento empírico,
quer no conhecimento científico. O "método científico", por sua vez,
abarca um significado mais lato e simultaneamente mais conciso e
delimitado. De uma forma simplista, utilizando as palavras de
SCHWEZ (1994, p. 26), é "o conjunto dos processos utilizados na
investigação e demonstração da verdade ".
Outra ideia fundamental a reter é que, sendo o conhecimento
científico universal, composto pelo somatório sinérgico" dos
conhecimentos e suas relações das várias disciplinas científicas
autónomas, deve verificar-se a unidade do método, a fim de se

8 Com esta associação de termos "somatório sinérgico" pretende-se realçar duas


ideias fundamentais: a primeira está estritamente relacionadada com a
interdiscisplinaridade de que gozam as diversas disciplinas científicas; a segunda,
prende-se com o facto de se considerar a ciência como um sistema aberto, portanto
beneficiário da energia sinérgica que caracteriza este tipo de sistemas. Assim, o
somatório não resultará da "soma algébrica" dos conhecimentos, mas, além dessa,
das relações entre eles.

33
credibilizar o processo científico e se garantir a unidade da ciência.
Caso contrário, cada disciplina científica autónoma optaria por um
método próprio, diferente do das demais, cortando as possibilidades
de existência de características comuns, bases da unidade científica.
Reconhecemos a impossibilidade de aplicação de um método-
modelo irrefutável, inalterável e imutável nas várias disciplinas, tendo
estas características diferenciadas, decorrentes dos diferentes objectos
formais; atente-se nas ciências exactas, nas da natureza e nas sociais.
Terá, no entanto, que existir um corpo, um núcleo mais ou menos fixo,
mais ou menos delimitado, de fases caracterizadoras do método, que
corporizem o método experimental propriamente dito. Temos, assim,
as seguintes fases:

- recolha de dados,
- observação,
- formulação de hipóteses,
- experimentação, e
- apresentação de modelos.

Consequentemente, o método das várias disciplinas científicas


terá de obedecer à linha mestra traçada, que é o método "científico
conceptual" 9; sem prejuízo de cada disciplina proceder a adaptações
adequadas, em função da natureza do objecto e do fim que tem em
vista, ou seja, das designadas condições externas, para, dessa forma,
definir o seu "próprio método".
Segundo VILHENA (1977, p. 454), por conveniências
metodológicas distingue-se métodos gerais da ciência, aplicáveis a
todas as modalidades do conhecimento científico e métodos
especiais, requeridos pela natureza particular de cada um dos ramos
da ciência. Os primeiros correspondem, na íntegra, ao núcleo por nós
definido; os segundos resultam de adaptações devidamente
fundamentadas, sem contudo, desrespeitarem a linha mestra traçada.
J
Com esta expressão pretendemos diferenciar o corpo do método científico modelo
das várias adaptações do mesmo aos objectos formais das várias disciplinas
científicas.

34
Convém ainda frisar que o método científico recorre, ao longo das
fases enunciadas, a técnicas de investigação, ora simples, ora
complexas e elaboradas, as quais frequentemente, (erradamente) se
confundem com o próprio método de que fazem parte ou auxiliam.
Torna-se, pois, necessário definir técnicas de investigação, que são,
segundo FERREIRA DE ALMEIDA e MADUREIRA PINTO (1990,
p. 78): "conjuntos de procedimentos definidos e transmissíveis,
destinados a produzir certos resultados na recolha e tratamento da
informação requerida pela actividade de pesquisa".
Em suma, os contornos que o método científico adquire em cada
disciplina específica revelam-se muito aproximados, quando
examinados de perto. "É tão só a adaptação aos seus objectos
especiais que leva a parecerem a manifestação de actividades
diferentes" 1 0 . Em termos pedagógicos é usual dividir-se a realidade
apreensível e cognoscível em três grandes grupos de objectos formais:
matemáticos (dos números e figuras), fisico-químicos (dos
fenómenos dos materiais) e sociais (dos homens e dos
acontecimentos da vida humana em grupo).
Daqui resulta a delimitação de três categorias de ciências, que, no
seu conjunto, estudam a totalidade, sendo elas:

- Ciências da Matemática;
- Ciências da Natureza; e
- Ciências Sociais (das Sociedades ou Humanas).

4.1.2. Aplicação do Método nas Ciências Matemáticas

Como temos vindo a referir, a Matemática, sendo uma ciência


pura, trata das relações de quantidade, constituindo estas o seu objecto
próprio. O objecto, constitui, por si só, a razão da adaptação do

10
MAX PLANCK, "Initiations à la Phisique", trad., Paris, 1941, p. 253, cit. por
VILHENA (1977, p. 459).

35
método científico. E praticamente impossível que a matemática siga
escrupulosamente as cinco fases do método, acima enumeradas.
Com algum esforço conseguir-se-ia transpor as fases do método
conceptual para as ciências matemáticas, sendo sabido que a maior
dificuldade surgiria na experimentação. A "experiência" matemática,
na grande maioria dos casos, resume-se à demonstração teórica,
operada pelo processo dedutivo, por via de regra, e indutivo,
excepcionalmente.
Logo, a ideia generalizada de experiência relacionada com meios
instrumentais adequados, com a existência física, palpável e
observável é aqui inoperante, porque a matemática, "experimentando"
por outro processo, obtém verdades universais, como acontece nos
outros ramos do saber.

4.1.3. Aplicação do Método nas Ciências da Natureza

Nas ciências da natureza só a experiência fornece segurança à


investigação. As relações uma vez comprovadas passam a constituir
leis físicas. E se a partir destas leis se deduzirem previsões
respeitantes a um fenómeno em particular é, também, através da
experiência que se podem comprovar as previsões. Assim, segundo
VILHENA (1977, p. 495), "toda a generalização assenta na
experiência, e só após verificação experimental pode ser aceite".
Generalizar é, portanto, estabelecer "fórmulas", tais que delas se
possam deduzir consequências e previsões respeitantes a todo um
conjunto de fenómenos.
É usual demarcar-se três etapas interligadas e complementares
que definem, nas ciências da natureza, a estrutura do método.
Segundo PINTO DA ROCHA e MAGALHÃES (1981, p. 33-4) são
as seguintes:

- Observação/Pesquisa;
- Formulação da Hipótese;
- Verificação de Leis ou Experimentação.

36
Com efeito, enquanto que nas ciências matemáticas a hipótese
constitui um princípio já estabelecido, ou antes, definitivo, nas
ciências experimentais é um princípio provisório, cuja verdade decorre
da verificação experimental.

4.1.4. Aplicação do Método nas Ciências Sociais

As ciências sociais têm por fim o conhecimento das leis da vida


humana em grupo. Ora, a complexidade do objecto condiciona a
aplicação do método "científico conceptual". Logo, seria de deduzir
que a aplicabilidade do método experimental a este grupo de ciências
fosse relativamente restrita, mesmo considerando, para o efeito, os
fenómenos sociais como coisas, e como tal, tratando­os como coisas
11
Apesar disso, repare­se que FERREIRA DE ALMEIDA e
MADUREIRA PINTO (1990, p. 98) consideram que nas ciências
sociais as diferentes formas de observação sistemática e controlada
assumem um papel idêntico ao da experimentação nas ciências da
natureza. Por isso, em bom rigor, a experimentação é possível nas
ciências sociais.

4.1.5. Relação Entre o Método Científico e o Obj ecto


Formal

Apresentámos breves noções sobre o conteúdo do método


científico e sobre a necessidade da sua adaptação, como resposta
adequada às características diferenciadas do objecto das várias
disciplinas científicas. A título de síntese, devemos reter três ideias:

'■'■ Ideia que Emile Durkheim desenvolve na sua obra "As Regras do Método
Sociológico". Vd. DURKHEIM (1990).

37
I a - o método não é o elemento diferenciador nem delimitador das
várias disciplinas científicas; esse papel está reservado ao objecto
formal das mesmas;
2a - só existe um método científico (conceptual), embora
adaptável às diversas exigências das várias disciplinas, permanecendo,
contudo, o seu núcleo sempre intacto; ou seja, a essência do método
mantém-se.
3 a - em suma, todos os ramos do conhecimento científico
recorrem ao método científico para produzirem os respectivos
conhecimentos.

4.1.6. Conhecimento Científico e Previsão

Esclarecemos, desde já, que o conceito "previsão" (que


exploraremos) não se identifica (nem poderia) com outros termos,
não poucas vezes considerados seus sinónimos, concretamente com
"prognóstico" e, ou, "profecia".
Ora, se tivemos o cuidado de qualificar "previsão" como
científica é porque reconhecemos a existência de, pelo menos, outra
forma de previsão: aquela que designamos de "empírica". Em traços
gerais, esta acaba por se identificar com o "prognóstico", consistindo
na observação da vida (conjunto de fenómenos), não se baseando,
portanto, no conhecimento das causas dos fenómenos, mas sim, na
observação de manifestações concomitantes.
Porém, o facto de muitos fenómenos (sobretudo da natureza) se
produzirem e repetirem ao mesmo tempo não nos permite deduzir que
uns sejam as causas dos outros. É neste sentido que este tipo de
"previsão" (empírica) denota insuficiências para alcançar o estatuto de
previsão científica. A maior insuficiência resume-se ao
desconhecimento das leis e das causas dos fenómenos.
Estamos aptos, neste momento, a explicar em que consiste a
"previsão científica". Para o efeito, recorremos a VILHENA (1977, p.
445), que tece as seguintes considerações:
"A previsão científica distingue-se do prognóstico empírico,
baseado no hábito, pelo facto de assentar no conhecimento das leis e

38
das causas. Só quando conhecemos as causas e as consequências dos
fenómenos podemos prever verdadeiramente, e de um modo positivo,
o curso dos acontecimentos. Só seguindo a cadeia das causas
principais e das consequências mais importantes se pode
compreender porquê a dado fenómeno se segue necessariamente
outro fenómeno, porquê tal acontecimento provoca necessariamente
tal outro acontecimento. "
Concluindo, podemos afirmar que o verdadeiro conhecimento
científico permite estabelecer leis a partir da análise da realidade. O
conhecimento das leis, por sua vez, oferece ao Homem a possibilidade
de se orientar (com maior segurança) nessa mesma realidade, porque,
então, consegue prever.

5. LIMITAÇÕES DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO

Ao propormo-nos abordar a problemática das limitações do


conhecimento científico, somos conduzidos a analisar a possibilidade
de incorporação da subjectividade no processo de produção daquele
conhecimento. A apresentação dos limites à produção de
conhecimentos científicos supõe, portanto, inventariar as fases nas
quais pode não estar, inteiramente, presente a objectividade, ou
determinar as fases do processo mais permeáveis à subjectividade.
Parece-nos plausível afirmar a impossibilidade da objectividade
pura; quer por motivos inerentes ao sujeito, quer pela insuficiência ou
ineficácia da observação, quer ainda por quaisquer outras razões.
Apesar disso, não se deve colocar em causa o valor universal do
conhecimento científico. Admitir o contrário equivale a negar todo o
conhecimento científico e, portanto, a reduzi-lo ao nível do
conhecimento espontâneo, não sistematizado e empírico.
Após esta breve exposição, cabe-nos apresentar as limitações,
normalmente invocadas, do conhecimento científico 12:

Segue-se, de perto, a exposição de VILHENA (1977, p. 441-3).

39
Isolamento do Objecto, ou seja, por vezes, o sujeito ao
delimitar e particularizar o objecto (de estudo) abstrai-o da
realidade; isto é, considera-o isolado e, portanto,
independente das suas relações com outros seres ou factos;
- Ausência de clareza quanto a certos conceitos, por exemplo;
"hereditariedade", "energia", "matéria", "inércia", etc, que
nem sempre se apresentam claros e indiscutíveis;
Relações de Causalidade, isto é, nem sempre a causa explica
completamente o efeito;

As Origens, equivale a dizer que existe sempre qualquer coisa


antes do começo. Por exemplo, o biólogo estuda "os primeiros
organismos", mas a dúvida subsiste: donde vieram eles?.

As limitações acima referidas podemos designá-las de "naturais"


13. Além daquelas, existem outras de tipo diferente, que nos são
impostas pela imperfeição dos nossos sentidos, mesmo quando
auxiliados por instrumentos tecnicamente aperfeiçoados, e pela
exiguidade de dados exactos em relação ao passado.

6. TENTATIVA DE DIFERENCIAÇÃO: CIÊNCIA, TÉCNICA E


ARTE

Cabe-nos agora definir dois outros conceitos: técnica e arte, a fim


de discernirmos as principais diferenças entre as três noções em causa
(ciência, técnica e arte).
Para SCHWEZ (1991 p. 20) "técnica é o conjunto de
procedimentos ordenados e concretos aplicáveis à realização de
objectivos específicos". Esta definição, desprovida de explicações

13 A terminologia é a do autor (cf. VILHENA, 1977, p. 442). Porém, defendemos


que mais lógico seria designar por "naturais" as segundas; ou seja, as decorrentes
das limitações do sujeito. Nesta perspectiva, as primeiras poder-se-iam denominar
de "inerentes ao processo científico".

40
complementares, pode, à primeira vista, confundir-se com a
apresentada para ciência. Mas o autor continua a caracterização, com a
atribuição de um campo de aplicação duplo: o "campo material" e o
"campo mental" (ou intelectual). Mesmo assim, parece-nos, poder
continuar a confundir-se técnica com ciência, embora na técnica se
destaquem procedimentos, mais do que conhecimentos.
Explicitemos: o fim da técnica não é só atingir objectivos
específicos, mas atingi-los com a máxima eficiência possível.
Também na ciência se pode falar de eficiência; mas, em nosso
entender, na ciência sobreleva a eficácia (os fins últimos): verificar
determinada hipótese, descobrir uma nova vacina, etc. Entendemos,
portanto, que ciência e técnica se distinguem em dois planos:

conhecimentos versus procedimentos,


- descoberta de leis (e eficácia) versus resolução de problemas
ou consecução de objectivos específicos (com eficiência).

Examinadas as diferenças entre técnica e ciência, passemos às


diferenças entre ciência e arte. Podemos diferenciar a arte da ciência
recorrendo às dicotomias clássicas entre, por exemplo, o mundo dos
valores e o mundo dos factos, entre o subjectivo e o objectivo, entre o
intuitivo e o indutivo ou o dedutivo. Contudo, optámos pela
exposição de SCHWEZ enriquecida pelos contributos de KUHN
(1977, p. 409-17) 1 4 . Assim,
"Arte é a manifestação do belo, produto de intensas emoções
estéticas do artista, ligado a condições diversas da época, do povo e
da cultura." (cf. SCHWEZ, 1991, p. 21).
Infere-se, pois, que a arte é determinada por emoções e pela
criatividade. Seguindo o raciocínio de Kunh, mas ampliando para

A ideia desta análise comparativa, aparentemente inovadora, não pertence ao


autor da obra, pois ele baseou-se nos ensinamentos de Hafner sobre os "paralelos
próximos epersistentes".

41
cinco em vez de três as áreas de comparação, e, portanto, de
diferenciação, temos:

1a- Ao nível dos produtos do cientista e do artista

Para o artista o seu produto é um fim, é um produto final, é aquilo


que pretendeu criar, fazer ou construir. Por seu turno, para o cientista
o seu produto é um subproduto da actividade científica e, uma vez
publicados os resultados, as imagens originais podem ser destruídas,
porque pouco interessam ao estádio seguinte do conhecimento,
excepto ao nível da "história da ciência".

2 a - Ao nível das actividades de onde resultam esses produtos

Diremos que na arte a estética é o objectivo do trabalho, enquanto


que na ciência funciona, no máximo, como ferramenta. Na ciência a
estética raramente é um fim, e a sê-lo nunca é o principal. Vejamos a
opinião de KUHN (1977, p. 411):
"Seja qual for o significado do termo "estética" o objectivo do
artista é a produção de objectos estéticos, enigmas técnicos são o que
ele deve resolver em ordem a produzir tais objectos. Para o cientista,
por outro lado, o enigma técnico resolvido é o objectivo, e a estética é
- quando muito - uma ferramenta para a sua obtenção.".

3 a - Ao nível da resposta do público

Compete-nos referir que a ciência têm como audiência pública


um número restrito de pessoas, quase exclusivamente os cientistas. E,
quanto maior for a sua especialização menor é público. Quanto ao
artista, o seu trabalho e a sua carreira dependem do exame de um
público mais vasto, das críticas, das galerias, dos museus, nenhum dos
quais tem paralelo com a ciência.

42
4a - Correlação Tempo-Conhecimento

Podemos afirmar que, ao contrário da arte, a ciência destrói,


substitui, o seu passado. Já vimos que cada descoberta científica é um
subproduto do processo contínuo da produção e aquisição de
conhecimentos; no caso da arte, ao invés, o passado persiste e é
continuamente vivido, usufruído e avaliado.

5a - Inovação Versus Tradição

Um outro aspecto a considerar na diferenciação arte/ciência


prende—se com a controvérsia no tempo de passagem da tradição à
inovação. Na arte, o fim da controvérsia significa, apenas, a aceitação
de nova tradição, não o fim da anterior, ou da velha, se quisermos.
Por seu turno, na ciência, a vitória ou derrota não é adiada por tanto
tempo: o lado que perde é banido, ou seja, regista-se uma ruptura nos
conhecimentos ou no paradigma dominante em favor dos
conhecimentos novos ou do paradigma emergente.

43
CAPÍTULO II

CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA
CONTABILIDADE-CIÊNCIA

1. CONTABILIDADE: UMA DISCIPLINA CIENTÍFICA

1.1. Considerações Introdutórias

Propusemo-nos, desde o início, defender a Contabilidade como


disciplina científica autónoma, isto é, com objecto formal específico,
munida de método científico próprio, recorrendo a diversas técnicas,
quer de cálculo, quer de registo.
A exclusão do âmbito deste trabalho da análise da evolução
histórica da Contabilidade nos períodos empírico e metódico justifica-
se pelo facto de naqueles períodos a nossa disciplina não apresentar
características científicas; aquela temática não tem, portanto, interesse
para os nossos ensejos. Não é, consequentemente, objecto deste estudo
qualquer definição de Contabilidade que a reduza a mero conjunto de
técnicas ou à "arte do registo"
Uma outra consideração prévia tem a ver com a divergência
entre a Investigação e Prática Contabilísticas 1 5 ; o u s e j a ; e n t r e a

A este propósito estude-se atentamente o artigo "La Relación Entre Investigación


y Prática En Contabilidad", de autoria de Manuel Garcia-Ayuso e Guilhermo Sierra
Molina (cf. GARCIA-AYUSO e SIERRA MOLINA, 1994, p. 235-87).
O estudo revela que não existe em Espanha uma divergência significativa entre a
área de investigação e os interesses dos Profissionais ("práticos") da Contabilidade.
Apontam-se como causas directas de tal facto as seguintes:
a) Muitos professores universitários compatibilizam o ensino com o exercício da
função contabilística, e

b) O período em causa (1982-1991) correspondeu, na União Europeia, a época


de imposições legais tendentes à uniformização, o que implicou uma maior procura

44
investigação (usualmente exercida por académicos, ou por "teóricos")
e os interesses e necessidades dos Profissionais da Contabilidade (que
amiúde são designados por "práticos"). Na verdade, quando
defendemos a Contabilidade como disciplina científica autónoma
pensamos no sistema de conhecimentos e não na actividade dos
"práticos": esta resume-se a uma técnica ou a um conjunto de técnicas.
Relevante é, também, assinalar a utilização de termos
diferenciados para designar as mesmas realidades, por exemplo,
"Contabilidade Financeira", por um lado, e "Contabilidade Interna",
por outro, termos que adoptamos em detrimento dos demais 1".

de informação por parte dos "práticos", à qual correspondeu também uma resposta
dos investigadores.

Alguns autores utilizam indistintamente os termos "Contabilidade de Custos",


"Contabilidade Industrial" ou "Contabilidade Analítica", ao referirem-se à
Contabilidade que, em nossa opinião, é melhor designada por "Interna".
A nossa opção não é acidental. Resulta de uma reflexão ponderada, que permitiu
algumas exclusões baseadas nos seguintes raciocínios:
- Optou-se por "Contabilidade Interna" pelo facto de, em termos imediatos, os
destinatários da sua informação serem internos, ou seja, elementos da própria
empresa ou entidade emitente;
- Rejeitou-se "Contabilidade de Custos" por estar implícito no termo uma restrição,
ou seja, a designação reduz o conteúdo à análise dos custos, o que não é verdade,
visto que na "Contabilidade Interna" também se discriminam proveitos;
- Rejeitou-se "Contabilidade Industrial" porque, à semelhança do caso anterior,
trata-se de uma redução do âmbito de aplicação, fazendo crer a não possibilidade de
implantação de "Contabilidade Interna" em outros sectores de empresas ou de
entidades;
- Rejeitou-se "Contabilidade Analítica" porque o carácter analítico aplica-se não só
à Contabilidade Interna como à Contabilidade em geral.
Ao nível da "Contabilidade Financeira" não se nos afigura necessário tecer qualquer
comentário, porque a preferência pelo termo tem sido quase unânime. É, pois,
usual utilizar além da nossa opção, outras, concretamente: "Contabilidade Externa"
e "Contabilidade Geral". Contudo, repare-se que, em bom rigor, a "Contabilidade
Financeira (ou Externa)" é a "Contabilidade Geral" dominada pela normalização,
tendo em vista os utilizadores externos.

45
A preocupação fulcral, neste capítulo, não é definir os vários
ramos da Contabilidade partindo, por exemplo, de uma classificação
já conhecida, pois, por essa via, correríamos o risco de não
alcançarmos os nossos propósitos. Contudo, teremos que, em devido
tempo, analisar alguns conceitos, bem como abordar a questão da
classificação. A exposição que prosseguimos incide,
predominantemente, sobre a Microcontabilidade e, dentro desta,
sobre a Contabilidade da Empresa, que é o núcleo da disciplina.
No presente capítulo, não está apenas em causa a demonstração
de que a Contabilidade é uma ciência: também o enquadramento da
disciplina na árvore do conhecimento nos preocupa, uma vez que, em
torno deste problema, existem divergências muito significativas. É
bastante usual a inclusão da Contabilidade nas ciências económicas,
menos frequentemente nas ciências matemáticas, e, mais
recentemente, nas ciências de informação. O nosso papel é, pois, o de
analisarmos com a profundidade adequada as duas questões acabadas
de mencionar, fundamentando devidamente as nossas opções.

1.2. Factores Modificativos da Contabilidade

Verifica-se na Contabilidade um processo evolutivo motivado por


factores análogos aos de outras disciplinas, ou seja, uma evolução
fruto de necessidades emergentes, de constantes modificações no
contexto social, político, económico e cultural. À medida que se
desenvolvem os operadores e as transacções económico-financeiras
exige-se informação mais rápida e relevante, o que acarreta o
tratamento de uma massa de dados cada vez maior, e dificulta a
delimitação do objecto da Contabilidade.
A exigência dessa informação (mais rápida e relevante) sentiu-se,
sobremaneira, a partir da Época dos Descobrimentos: a troca directa
cedeu, ainda mais, o lugar à troca indirecta (com intervenção de
moeda), "floresceu o comércio transnacional, e aperfeiçoou-se a
actividade bancária e seguradora. A Contabilidade correspondeu a
essas mudanças (com repercussões económicas), adoptando técnicas

46
mais eficazes, com o intuito de melhor relevar não só o património
mas as operações com ele relacionadas.
Se, por um lado, é verdade que o desenvolvimento do comércio
transnacional exigiu (e exige ainda) a intercomunicabilidade a todos
os níveis, com especial relevo ao nível económico, também o é, por
outro, que a internacionalização da economia (proporcionada pelo
aparecimento de multinacionais, pelo desenvolvimento da actividade
bolsista e, especialmente, pela criação de grandes espaços económicos
(v.g., OCDE, EFTA, União Europeia, etc.) tem inerente o aumento
significativo do número e da heterogeneidade dos sujeitos
económicos.
A Contabilidade depara, assim, com dificuldades de
harmonização e normalização. Acresce ainda o facto de, não poucas
vezes, os sistemas contabilísticos utilizados (nos vários países) serem
diferenciados, agravando-se a dificuldade de se estabelecer uma
linguagem comum a todos os intervenientes. Por isso, a informação
económico-financeira, além de mais rápida e relevante, tem que ser
também (mais) normalizada. Esse papel está reservado à fixação de
Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites (PCGA) e, também, de
normas generalizadamente aplicadas.
Em consequência da mudança e, sobretudo, do crescente volume
de dados a tratar e de informações relevantes a fornecer
tempestivamente, a Contabilidade sente necessidade de recorrer a
processos de registo múltiplos e até a subsistemas independentes e
extradigráficos
Conforme explica Rogério Ferreira (vd. FERNANDES
FERREIRA, 1984), num passado não muito distante a Contabilidade

17
Vd. FERNANDES FERREIRA (1984, p. 15-21). Recorde-se que Rogério
Ferreira é um dos autores, na área económico-financeira, que maior rigor
terminológico utiliza nas suas obras e comunicações. Por isso, chamamos a atenção
para a utilização do termo "extradigráfico" e não, como é habitual ver,
"extracontabilístico". O âmbito de exclusão do último é menor do que o do primeiro.

47
confinava-se à relevação do património e das operações de cada um
dos organismos económicos.
Porém, hoje, as suas funções são cada vez mais de previsão e
controlo entre o que se executou e o que se previu, acompanhando
assim, mais de perto, a gestão. Denota-se um alargamento iniludível
do campo de actuação da disciplina, o que, por sua vez, requer uma
reformulação da sua própria definição, trabalho que desenvolveremos
no ponto seguinte (1.3.).

1.3. Fundamentação e Defesa da Contabilidade-Ciência

Antes de outras considerações, convém referir que a apresentação


de uma definição de Contabilidade adequada a considerá-la disciplina
científica autónoma, não é difícil de arquitectar. Todavia, a
apresentação pura e simples de uma definição, desprovida de
comentários complementares, não é nem suficiente, nem convincente,
uma vez que qualquer definição, por si só, nada prova.
Reconhecemos que, por mais objectividade que se pretenda,
qualquer definição apresentada acaba por reflectir o cunho pessoal do
autor, sem ter que perder, apesar disso, aderência à realidade.
Portanto, para satisfazermos plenamente o nosso intuito inicial,
recorremos à análise comparativa18 de considerações, definições e
métodos de diversos autores, tendentes à obtenção de uma definição
de Contabilidade.
Da análise (sucinta), ressaltam as seguintes leituras:
a) De entre os autores estudados, apenas Rogério Ferreira não
considera a Contabilidade como uma ciência, mas, antes, como "uma

18
Concretamente procedeu-se ao estudo comparativo dos seguintes autores e obras:
Rogério F. Ferreira - "Normalização Contabilística";
Fernandez Pirla - "Teoria Económica de la Contabilidad';
F. Martin Lamourox - "Contabilidad";
Leandro Cafiibano - "Contabilidad: Analisis Contable de la Realidad
Económica".

48
função instrumental de natureza económica, financeira e jurídica",
logo, predominantemente técnica.

Com efeito, a definição apresentada por Rogério Ferreira


ultrapassa o âmbito da "arte do registo" e, ou, a do "mero conjunto de
técnicas". Contudo, também não considera a Contabilidade como
disciplina científica, apesar de a interpretação extensiva do termo
"disciplina" (utilizado na sua definição) poder aparentemente indiciar
essa possibilidade (remota para o autor).
Com efeito, aquela possibilidade pode apenas concretizar-se a
partir da utilização de critérios (sobretudo de valorização) mais
objectivos (o que é difícil face ao objecto da Contabilidade) ou, em
alternativa (de preferência), através de a apresentação de "soluções
em que se configure mais de uma apreciação 1°" (cf. FERNANDES
FERREIRA, 1984, p. 17).
Pretendemos salientar ainda que a razão do estudo da definição
apresentada por Rogério Ferreira fica a dever-se, quase
exclusivamente, ao facto de aquele autor defender a existência
inequívoca de duas ópticas (perspectivas) de apreciação e tratamento
do "todo contabilístico": a da "Contabilidade Jurídico-Patrimonial" e a
da "Contabilidade de Gestão".
A primeira pretende evidenciar a situação da empresa perante o
exterior (daí falar-se em Contabilidade Externa), menosprezando as
operações que só afectem, de modo directo, a exploração. Ao invés, a
segunda óptica só processa considerações de carácter gestivo que se
reputem de úteis e vantajosas para o conhecimento dos diversos

ÍJ
Repare-se no exemplo que o autor apresenta (1984, p. 16-7): "se é um facto que
uma dívida a pagar de x unidades monetárias ao fim de n anos é efectivamente uma
dívida a pagar de x u.m., não pode deixar de observar-se que se aparecer no mesmo
balanço outra dívida, de x' u.m., a pagar ao fim de n anos, mas contraída a taxa de
juro diferente, a prática habitual de somar tais dívidas a pagar como se fossem
homogéneas não pode aceitar-se quando se pretendem soluções cientificamente
válidas". E neste sentido que o autor defende que a apreciação do "valor da dívida"
deve ser efectuada em termos nominais e "não nominais".

49
custeios de produção e cálculo de resultados funcionais e sectoriais
(cf. FERNANDES FERREIRA, 1984, p. 19-20).
Ao nível da "objectividade" a diferença opera-se nos princípios
em que assenta. Se na "Contabilidade Jurídico-Patrimonial" a
objectividade se alicerça nas "normas jurídicas" e nos "Princípios
Contabilísticos Geralmente Aceites", na "Contabilidade de Gestão"
assenta nos "princípios de Economia e de Gestão" e ainda em regras
gestivas (cf. FERNANDES FERREIRA, 1984, p. 20);
b) Já os autores espanhóis (estudados) atribuem à Contabilidade a
natureza de ciência económica. Pirla e Canibano, directa e
taxativamente, enquanto Lamouroux toma essa posição
indirectamente, entendendo a Contabilidade como pertencente ao
ramo das ciências sociais, onde se encontra a Economia;
c) No que se refere à capacidade de previsão, apenas Rogério
Ferreira e Canibano, ainda que implicitamente, referem essa
característica do conhecimento contabilístico, quando atribuem à
Contabilidade a possibilidade de prever.
A capacidade de previsão sobressai mais ao nível da
"Contabilidade de Gestão" e da "Contabilidade Previsional" 2 0 . A este
propósito, Rogério Ferreira ao caracterizar a perspectiva da
"Contabilidade de Gestão" afirma que "as suas preocupações
centram-se na previsão do que acontecerá; é apriorística, ou seja,
trabalha a partir de orçamentos, controla a execução; apura
desvios..:' (cf. FERNANDES FERREIRA, 1984, p. 20);
d) E também salientada a utilidade e o auxílio da Contabilidade
na tomada de decisões, ou seja, o auxílio à gestão; isto está patente
em todas as definições, e, portanto, entendemos não ser necessário
um estudo mais pormenorizado nesta matéria;
e) Por fim, cremos que as definições defendidas pelos autores
estudados cingem-se, em grande parte, à Contabilidade da Empresa,

zu
Em bom rigor, a "Contabilidade de Gestão" e a "Contabilidade Previsional" não
são a mesma realidade. A diferenciação é apresentada no capítulo seguinte (III).
Por seu turno, a problemática da "capacidade de previsão" e das "leis" do processo
contabilístico é explanada no Capítulo IV.

50
ou seja, ao processamento contabilístico com vista a apreciar as
situações (activas, passivas e de situação líquida) e os resultados das
operações referentes a determinado momento e período.
Contudo, ao nível do Sector Público, Estado 2 1 e Associações
Sem Fins Lucrativos as preocupações podem ser diferentes; i.e., não
serem as de evidenciar situações e resultados mas, sim, as de
demonstrarem o excedente ou a necessidade de meios monetários
(para a prossecução dos seus objectivos); concretamente nos casos em
que a Contabilidade é processada em "base caixa", ou seja, quando se
registam e comparam pagamentos e recebimentos 22, Apesar de tudo,
quer operando no "regime do acréscimo", quer no "regime de caixa",
processar, interpretar e comunicar informação económico-
financeira (ou só financeira) é sempre elemento fundamental no
processo contabilístico.
Por uma questão de complementaridade, e, sobretudo, com o
intuito de invocarmos o caso português, que se nos apresenta mais
familiar, procurámos no POC - Plano Oficial de Contabilidade -
principal instrumento orientador da prática contabilística em Portugal
- uma definição, directa ou indirecta, explícita ou implícita, de
Contabilidade.
Tendo em consideração as funções reservadas àquele
instrumento, essencialmente vocacionado para a normalização da
prática contabilística, e tendo em atenção os princípios, normas e
políticas contabilísticos nele regulados, não se nos afigura anormal a
não inclusão de qualquer definição de Contabilidade no POC. Em boa


De realçar que já foi publicado o Plano Oficial de Contabilidade Pública (DL
232/97, de 03 de Setembro). Trata-se, de facto, de uma reforma da administração
financeira e contabilística do Estado. Tudo aponta que tal Plano venha a constituir
um verdadeiro instrumento de apoio aos gestores (públicos).
22
Não se confunda "pagamento" com "despesa", nem "recebimento" com "receita".
Todas as despesas se traduzem por uma saída de valores activos ou pela criação de
dívidas passivas. Por seu turno, os pagamentos e os recebimentos podem ser
antecipados, imediatos (situação em que despesa se identifica com o pagamento ou
a receita com o recebimento) e diferidos (cf. GONÇALVES DA SILVA, rev. por
Rogério Fernandes, 1991, p. 101-10).

51
verdade, os objectivos da normalização do POC não requerem a
apresentação de uma definição de Contabilidade.
Tentámos, também, encontrar uma definição de Contabilidade na
"Estrutura Conceptual para a Preparação e Apresentação das
Demonstrações Financeiras" da IASC - Internacional Accounting
Standards Committee 23 Obtivemos, como esperávamos, não uma
definição concreta, mas, à semelhança do POC, a possibilidade de
construção dessa definição, partindo dos objectivos das
Demonstrações Financeiras (cf. pontos 12-21) e das necessidades de
informação dos utilizadores (cf. pontos 9-11).
A título de conclusão mencionamos "os sete atributos" que
CANIBANO CALVO (1991) destaca no percurso tendente à sua
definição de Contabilidade. São eles:
- a sua natureza económica;
- o carácter eminentemente quantitativo da informação
contabilística;
- o facto de a mesma poder referir-se às diferentes unidades em
que se organiza a realidade económica: empresas, associações,
organismos do sector público, Estado, actividade económica nacional,
etc;
- a informação poder reportar-se ao passado, ao presente e ao
futuro (relacionada com a capacidade de previsão);
- o facto de utilizar para a captação e tratamento de dados um
método específico e caracterizador da disciplina, o qual se apoia em
bases suficientemente testadas (logo, científico);
- a informação ter utilidade para a adopção de decisões por parte
dos diferentes utilizadores/destinatários;
- algumas parcelas da informação proporcionada pela
Contabilidade terem especial utilidade para os gestores das unidades
económicas que a emitem, uma vez que servem para satisfazer as suas
necessidades de planeamento e de controlo.

l i
Cf. Parte C - Normas de Contabilidade, Divisão 2, Ponto 2.01. do Manual do
ROC.

52
2. TENTATIVA DE DELIMITAÇÃO DO OBJECTO
CONTABILÍSTICO

Anteriormente referenciámos que o objecto de cada disciplina


científica constitui, por si só, a razão da(s) adaptação(ões) do método
científico conceptual. Por outras palavras, cada disciplina científica
adapta e adopta o método conceptual, sem o descaracterizar, ou seja,
mantendo a sua essência, em função do seu objecto e do fim que tem
em vista.
Deduz-se, assim, que o método contabilístico científico está
também intrinsecamente condicionado pelo objecto formal da
Contabilidade. Desta feita, somos conduzidos a encetar uma tentativa
de delimitação desse objecto.
Não é fácil definir concisamente o objecto da Contabilidade. Esta
dificuldade deriva, por um lado, da interdisciplinariedade que
caracteriza a ciência, e, por outro lado, da rápida evolução do meio
económico.
Em termos pedagógicos, podemos circunscrevê-lo a oito
categorias e suas relações: activos, passivos, situação líquida, custos,
proveitos, perdas, ganhos e resultados. No entanto, de uma forma
mais simplista, podemos afirmar que o objecto da Contabilidade se
circunscreve ao estudo de três tipos de situações e evoluções: activas,
passivas e de situação líquida. Em síntese, o objecto contabilístico
circunscreve-se, assim, a três categorias e suas relações, que as DF
compreendem.
Todavia, parece-nos que a aplicação da análise acima exposta se
confina à Contabilidade da Empresa, logo à Microcontabilidade. Em
termos macroeconómicos (v.g., ao nível da Contabilidade Nacional)
não nos parece plausível que o objecto se identifique com o
anteriormente analisado.
Estão em causa outras contas, outros agregados e outras
demonstrações. Entenda-se Contabilidade Nacional como "uma
técnica de síntese estatística que tem objecto fornecer uma
representação quantificada e coerente da actividade económica de um
pais "(cf. GOMES FRANCISCO, 1990, p. 20).

53
Devemos, pois, intentar uma delimitação do objecto que sirva
simultaneamente os fins da Micro e da Macrocontabilidade. Para o
efeito, recorremos a CANIBANO CALVO (1975, p. 31) que
circunscreve o campo de actuação da Contabilidade à medição e
comunicação de informação reveladora do passado, presente e futuro
das actividades sócio­económicas.
Porém, é essencial acrescentar àquelas funções duas outras: o
registo e a interpretação. Assim, segundo a nossa perspectiva, o
campo de actuação da Contabilidade expande­se e passa a ser:
registo, medição, interpretação e comunicação de informação
económica­financeira (passada, presente e futura) a interessados.
O importante a reter é que o objecto (formal) da Contabilidade é
o estudo (registo, medição, interpretação), em termos quantitativos
(predominantemente) e qualitativos 24 ^a realidade económica
(passada, presente e da prevista para o futuro), e a comunicação de
informação(ões) útil(eis) e tempestiva(s) 25 a todos os níveis:
internos e externos.

/4
Embora a Contabilidade revista carácter com predominância quantitativa,
fornece, também, informações qualitativas (talvez "qualificativas") importantes. Por
exemplo, da análise das DF dos três (ou mais) últimos exercícios de determinada
empresa (ou sector) podemos retirar informações qualitativas bastante válidas e
úteis. Concretamente, as tendências de evolução do volume de negócios (a partir da
Demonstração de Resultados); a estrutura dos capitais (a partir do Balanço); o
respeito ou, ao invés, o desrespeito do princípio do equilíbrio financeiro mínimo (a
partir da Demonstração da Origem e da Aplicação de Fundos); a justificação dos
fluxos monetários (a partir da Demonstração dos Fluxos de Caixa); etc.
No entanto, sublinhe­se, a título de síntese: a informação contabilística é, em
qualquer situação, predominantemente quantitativa, mas pode qualificar, com base
nela, dada entidade.
■" A tempestividade é uma característica da informação financeira. Embora não
seja considerada principal ou primária (v.g., segundo o POC) não deixa de ser
importante. Repare­se que a ausência de tempestividade pode transformar
informação relevante, se oportunamente fornecida/conhecida, em informação de
interesse reduzido ou sem interesse, mas, ao invés, informação irrelevante não passa
a ser útil pelo simples facto de ser tempestivamente fornecida/conhecida.

54
3. MÉTODO CONTABILÍSTICO

Uma vez que o objecto formal é o responsável pela delimitação


de cada disciplina e, portanto, em última análise, pela(s)
adaptação(ões) que o método científico conceptual se vê obrigado a
efectuar, urge, desde já, demonstrar a aplicação do método
contabilístico científico, elemento adicional do carácter científico da
Contabilidade.
Uma das opções seria enveredar por um estudo comparativo,
hipótese que, à partida, se rejeita, não por demérito dos ensinamentos
dos autores, mas, tão só porque, em nossa opinião, Canibano Calvo 26
expõe esta matéria de forma extremamente clara e precisa.
Segundo o autor (cf. CANIBANO CALVO, 1991. p. 55) método
contabilístico é "um conjunto de postulados e premissas subsidiárias
que permite submeter a observação a realidade económica, expressar
numa linguagem apropriada os aspectos qualitativos e quantitativos
da referida observação conforme regras que garantem um
determinado grau de objectividade, e processar a informação
resultante seguindo critérios que permitam obter demonstrações
financeiras sintéticas que contenham agregados relevantes.".
Convém, desde já, apresentar uma definição de "postulado".
Entende-se postulado como um princípio cuja a admissão e, ou,
aceitação se torna necessária para determinada demonstração. Em
suma, trata-se de um ponto de partida, cuja demonstração se torna
dispensável em virtude da sua evidência.
Assim sendo, a preocupação imediata resume-se à necessidade
de apresentação e estudo dos vários postulados que permitem passar
da observação da realidade económica às DF, as quais, de forma
sintetizada, sistematizada e agregada, devem representar a realidade
observada.

Vd. CANIBANO CALVO (1975 e 1991), em ambas as obras, no Capítulo III.

55
Para o efeito, recordamos os aspectos 27 apresentados por
CANIBANO CALVO (1991, p. 55-76), que desenvolveremos
autonomamente, com a profundidade julgada adequada:

- Princípio da Dualidade;
- Medição e Valorização;
- Formas de Representação; e
- Agregação.

Princípio da Dualidade

De uma forma simplista, o princípio da dualidade é o eixo com


base no qual se exerce a observação contabilística, isto é, pelo qual
se procede à captação dos dados. Estes, após tratamento adequado,
transformam-se em informação contabilística.
Este princípio deriva das partidas dobradas, de Luca Pacioli. Ou
melhor: as partidas dobradas, ou digrafia, consistem numa simples
técnica de contraposição, em cada movimentação contabilística, de
débitos e de créditos, que se igualam. O princípio da dualidade vai
mais longe: assenta na clara consciência de que qualquer operação
económica ou financeira se decompõe numa fonte de financiamento
(origem, recurso) e num elemento financiado (aplicação, emprego).
A partida dobrada é uma simples técnica. O princípio da
dualidade é um modo de encarar a realidade, uma visão sobre as
operações económico-financeiras, modo esse desenvolvido
(consciencializado) a partir daquela técnica 28, Evidencia, pois, uma

27
O autor designa-os por "extremos" (cf. CANIBANO CALVO, 1991, p. 55).
Reconhecemos que o vocábulo "aspecto" não traduz, de facto, a ideia que
pretendemos transmitir, uma vez que, concretamente, referimo-nos a postulados,
premissas, regras e técnicas.
2
° O princípio da dualidade é que está na base da técnica digráfica, o que,
frequentemente não é percebido, por exemplo: muitos "práticos" que não têm
dificuldades em proceder a escriturações digráficas, são incapazes de construir e de
interpretar Demonstrações de Origens e de Aplicações de Fundos.

56
dicotomia empregos/recursos. As transacções são encaradas como
duas categorias antagónicas e isto é que fundamenta a técnica
di gráfica.
Para registar as transacções não basta, porém, identificar as
componentes antagónicas, é necessário a quantificação das mesmas,
partindo da quantificação individual de cada elemento interveniente -
atributo quantitativo. Por norma, a unidade de quantificação adoptada
é monetária.
Outro aspecto deveras importante da dualidade relaciona-se com a
coexistência de uma dicotomia entre as entidades económicas, já que
a mesma transacção origina, nas diversas entidades intervenientes,
contabilizações obrigatoriamente diferentes, diríamos mesmo,
simétricas, ou antagónicas; ou seja, os custos de uma entidade são os
proveitos de uma outra, aos activos de uma dada empresa contrapõem-
se passivos de uma outra, etc, gerados pelas mesmas operações.
Da exposição resulta que o princípio da dualidade não é nem um
postulado matemático, nem sequer um princípio económico, mas sim
um autêntico instrumento do método contabilístico tendente à
captação da informação sobre uma realidade económica-financeira.

Medição e Valorização

Ora, se o princípio da dualidade representasse, numa concepção


formalizada da Contabilidade, um postulado ou um axioma (verdades
aceites sem demonstração), a medição e a valorização
corresponderiam a meras premissas subsidiárias, pois estas consistem
em regras alternativas cuja aplicação se submete a objectivo(s)
concreto(s). Trata-se agora, portanto, de proposições cujas verdades (e
validade) carecem de demonstração.
Assim sendo, o nível de objectividade do processo contabilístico
pode ser questionável devido, fundamentalmente, a duas razões:
- objectivo(s) diferente(s) suscitam aplicação díspar das mesmas
regras; e
- as regras (de medição e valorização) podem ser mal
interpretadas pelos Profissionais da Contabilidade.

57
Contudo, não esqueçamos que o nível de objectividade exigido
pelo conhecimento contabilístico só pode ser mensurado (avaliado)
relativamente a determinado referencial (ou paradigma), ou seja, tendo
em consideração os objectivos das Demonstrações Financeiras.
Neste momento, a questão fulcral reside em averiguar se, para as
fases cujos níveis de objectividade podem ser questionáveis, é, ou
não, possível manter a objectividade contabilística em níveis
aceitáveis, ou seja, em níveis reconhecidamente científicos.
CANIBANO CALVO (1991, p. 62) defende que o
estabelecimento de um sistema de medição composto por um conjunto
de regras específicas e de fácil interpretação (e aplicação) favorece a
afirmação da objectividade no processo contabilístico. Desta forma
reduzem-se ao máximo as aplicações discricionárias ainda verificadas.
Acrescenta ainda que só quando vários Profissionais, aplicando as
mesmas regras, chegarem a resultados idênticos, podemos concluir
que nos encontramos perante um sistema de medição objectivo. Tem-
se caminhado nesse sentido, sobretudo através da aceitação (cada vez)
mais generalizada dos PCGA e da maior extensão e profundidade dos
aspectos regulados.
Ao nível da Contabilidade da Empresa, as regras de medição e
valorização estão subordinadas ao princípio da continuidade, ou seja,
ao pressuposto de que a empresa não tem intenção nem necessidade
de entrar em liquidação nem de reduzir significativamente o volume
das suas operações (cf. Parte 4 - Princípios Contabilísticos - POC). Ao
invés, em situações de liquidação, aquelas regras são de aplicação
menos adequada.
Como vimos, não só para objectivos diferentes, como também em
função das condições de funcionamento (normal, de redução
significativa do volume de actividade, de inactividade, ou de
liquidação) as regras de medição e valorização aplicáveis são também
diferentes.
Vejamos, agora, a forma de ultrapassar situações menos comuns,
ou aparentemente não tipificadas. Apesar da existência e
reconhecimento de regras específicas, torna-se necessário, não poucas
vezes, ainda que sem carácter universal (de aceitação generalizada),

58
estabelecer a hierarquização dessas regras, cujo critério base deve ser
o da prudência valorativa.
Não é descabido, neste momento, afirmar que a objectividade
está estritamente ligada ao princípio da prudência. Este, por seu turno,
aconselha o Profissional da Contabilidade a ter cuidado redobrado por
forma a evitar a utilização de cálculos valorativos por excesso e de
preços potenciais. Em suma, por norma, deve-se utilizar o princípio do
custo histórico (de aquisição ou de produção) e, por vezes, o "justo
valor".
Para terminar esta reflexão, resta-nos referir dificuldades na
objectividade ao longo do tempo, durante o qual as entidades se
propõem produzir, e, ou, prestar serviços.
As dificuldades podem minimizar-se através da aplicação
consistente (uniforme) das regras (de medição e valorização), desde
que estas se mostrem adequadas. Ao invés, se se revelarem
inadequadas podem (devem) ser rejeitadas, desde que as substitutas
contribuam decisivamente para a objectividade da informação
contabilística 29

30
Formas de Representação

A representação contabilística de factos e transacções pode


processar-se seguindo diversas técnicas, constituindo uma espécie de
subproduto de investigações contabilísticas formalizadas (cf.
CANIBANO CALVO, 1991, p. 64).

Esta faculdade é permitida no actual sistema contabilístico português, pois o


POC, nestes casos, recomenda a indicação e justificação (no Anexo, Nota 1) das
situações que, em casos excepcionais, tenham sido derrogadas. Aliás, o mesmo
acontece na maioria dos Estados-membros da União Europeia, ao invocar-se para
as derrogações o "macro-princípio da imagem fiel".
Em nossa opinião não se mostra imprescindível explanar pormenorizadamente
esta temática. Por issso desenvolveremos apenas, ainda que não exaustivamente, a
representação convencional. Aconselha-se, no entanto, a leitura de CANIBANO
CALVO (1991, p. 62-75).

59
Existem (pelo menos) quatro tipos de formas de representação:

- Convencional;
- Matricial;
- Sagital; e
- Vectorial.

A representação convencional assenta na técnica das "partidas


dobradas" (de Pacioli) e "consiste numa dupla ordem de registos: um
cronológico por operações e outro sintético por conceitos que agrupa
em cada conta todas as operações relativas a cada um dos conceitos
ou elementos." (cf. CANIBANO CALVO, 1991, p. 64).
O registo cronológico por operações é usualmente conhecido por
"Diário". O fundamento de tal denominação advém do facto dos
comerciantes assentarem (escriturarem) diariamente as operações
realizadas. O registo sintético por conceitos efectiva-se, em regra, por
seu turno, no livro "Razão".
Com o intuito de se garantir a correcção (quantitativa) dos
registos, esta forma de representação exige que periodicamente (por
regra, mensalmente) se verifiquem os acumulados e os saldos das
contas, através da elaboração de balancetes de verificação 31.
E, pois, fácil de concluir que se trata, sem quaisquer dúvidas, da
forma de representação mais utilizada ao longo do tempo.

A representação matricial, tal como a designação indicia,


consiste em associar a uma matriz quadrada 32 0 conjunto das contas
(definidas pelo sistema contabilístico em análise).

Embora, nos dias de hoje, os programas informáticos possam garantir (e


frequentemente garantem) a igualdade de débitos e créditos.
32
Canibano (cf. CANIBANO CALVO, 1991, p. 67, em roda-pé) explica em que
consiste a matriz quadrada: "uma matriz de ordem m x n é um conjunto de m x n
elementos do domínio dos números reais, dispostos em forma rectangular em m
filas e n colunas . Quando m = n, diz-se que a matriz é quadrada.".

60
Também este tipo de representação permite a verificação de
acumulados e de saldos.

A representação sagital está intimamente ligada à anterior


(matricial), uma vez que todo o gráfico tem associado uma matriz.
Neste sistema de representação, cada conta constitui um vértice do
gráfico, estando unidos por segmentos de recta ■" aqueles entre os
quais existam relações, cujo fluxo é igual ao valor da transacção.
Este tipo de representação encontra um campo propício à sua
aplicação nas empresas que têm centros (ou secções) de produção para
consumo interno (noutros centros ou secções), sobretudo quando
existem entre eles prestações recíprocas.

Por fim, existe a representação vectorial. Esta consiste na


expressão formal do princípio da dualidade através de vectores. Em
termos genéricos, a transacção (a registar) é traduzida por uma função
F(x,y,t)=V, em que x e y representam o débito e o crédito,
respectivamente; t representa a data da transacção e V representa o
valor da transacção.
Segundo Canibano, a principal vantagem deste tipo de
representação é a sua economia de linguagem; aspecto de grande
importância para o tratamento informático dos dados.

À laia de conclusão, parece evidente que a técnica de


representação formal mais utilizada foi e é a convencional (a que se
baseia na técnica das partidas dobradas). Diremos mesmo que se trata
da forma de representação de menor dificuldade de aplicação, embora
as outras tenham muito maiores potencialidades na investigação
formalizada da Contabilidade.

■" O autor designa o elo de ligação (representado por um segmento de recta) por
"arco" (vd. CANIBANO CALVO, 1991, p. 72­4).

61
Agregação

Até aqui examinámos apenas os aspectos e as fases do método


contabilístico circunscritos à captação, quantificação e registo de
factos e operações. Falta-nos analisar a etapa da sumarização
(agregação), selecção e interpretação da informação fornecida pelo
processo contabilístico.
A última etapa do método contabilístico resulta da necessidade de
se passar de um vasto conjunto de dados (já ordenados e organizados
sob o ponto de vista técnico) a sínteses mais compreensíveis e com
maior utilidade, ou seja, a agregados (expressos, sobremaneira, nas
Demonstrações Financeiras), imprescindíveis à tomada de decisões
Ressalta, desde já, uma dúvida: como se processa a construção
dos agregados, partindo dos dados captados e registados?. Para
responder a esta questão, CANIBANO CALVO (1991, p. 76) explica
a coexistência de dois tipos de operações: as reais e as formais.
Atribui carácter de "real" às transacções económico-financeiras que
se vão efectivando e registando (se necessário). Contudo, repare-se
que a captação, a quantificação e o registo das transacções, por si só
(sem tratamento de síntese adequado), não proporcionam informação
útil aos destinatários
Por isso, exige-se o tratamento desses dados acumulados, a fim
de poder colher-se utilidade do seu registo, ou seja, obter-se uma visão
mais agregrada e, simultaneamente, mais compreensível,
facilitando, por seu turno, a análise da situação económico-
financeira das entidades.
São estas novas operações que Canibano designa por "formais",
por se relacionarem apenas com o próprio sistema instituído
(contabilístico) e por serem isentas de qualquer abstração. O objectivo
fundamental das operações formais é elaborar Demonstrações
Financeiras que evidenciem a informação de forma sintética, que
ponham em relevo magnitudes (grandezas, volumes, importâncias)
económicas de interesse, e que proporcionem utilidade aos
destinatários (internos e externos) no processo de tomada de
decisões.

62
Para terminar, resta-nos referir que as DF podem assumir várias
formas e prestar tipos diferentes de informações, dependendo da
estrutura das próprias unidades económicas, dos agregados que se
pretendem evidenciar e dos objectivos das próprias DF.
Em termos muito gerais, podemos dizer que as DF podem
referir-se a situações (ou posições) ou a fluxos (ou correntes). Nesta
perspectiva, o Balanço constitui o exemplo de uma peça contabilística
representativa de situações de uma entidade económica. A
Demonstração de Resultados, a Demonstração da Origem e da
Aplicação de Fundos e a Demonstração de Fluxos de Caixa são, por
sua vez, exemplos de peças contabilísticas representativas de fluxos
ou de correntes.

63
CAPÍTULO III

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA NATUREZA E


DAS DIVISÕES DA CONTABILIDADE

1. NATUREZA DO CONHECIMNETO CONTABILÍSTICO

Neste capítulo, a questão fulcral não consiste em aceitar ou


refutar esta ou aquela tipologia de classificação. O importante reside
na necessidade de determinar uma posição (a melhor fundamentada)
da Contabilidade na organização do conhecimento científico.
Não obstante não poucas vezes atribuir-se à Contabilidade
características predominantemente matemáticas, excluímos, desde já,
essa hipótese. Uma primeira razão relacionada com o facto de a
Contabilidade estabelecer apenas relações indirectas com a
Matemática e, um segundo argumento, devido ao facto de as soluções
contabilísticas não serem obrigatoriamente rígidas e inflexíveis (não
deixando de ser válidas), contrariamente à generalidade das soluções
matemáticas.
Existem também defensores, baseados nas relações biunívocas ou
essenciais entre a Contabilidade e o Direito, que atribuem à
Contabilidade carácter predominantemente jurídico 34.

34 O estreitamento das relações entre o Direito e a Contabilidade atingiu o seu


auge no paradigma legalista. Nos dias de hoje (predominância do paradigma da
utilidade) essas relações estão atenuadas. Mesmo assim, defendemos que a
Contabilidade e o Direito são, indubitavelmente, duas disciplinas autónomas.
Contudo, não deixa de ser interessante a abordagem que Françoise Rey desenvolve
na sua obra "Développements Récents de la Comptabilité", concretamente no Ponto
3 da Introdução - "Le Droit Contable" - a propósito da possibilidade de construção
de um "Direito Contabilístico" (vd. REY, 1979, p. 11-21).
Também Fernandez Pirla na obra "Una Aportacion a la Construccion dei Derecho
Contable" desenvolve aquela ideia, com uma exposição mais profunda. O autor
invoca a "origem (histórica) jurídica" da Contabilidade para fundamentar a sua
posição. Realça, depois, que o alargamento do "facto económico" (em virtude da
evolução e da mudança do contexto sócio-económico-político) proporciona, ao

64
Apesar do iniludível relacionamento, não nos parece plausível
afirmar a Contabilidade como disciplina jurídica, até porque o seu
âmbito de aplicação ultrapassa a necessidade de estabelecimento e de
definição das responsabilidades patrimoniais, que são objecto de
estudo do Direito, além de que, nas últimas décadas, a Contabilidade
tem-se autonomizado, mais ainda, do Direito.
A Contabilidade é uma disciplina económica; quer devido à
natureza dos elementos com que opera; quer devido ao seu objecto de
estudo: registo, medição, interpretação e comunicação, aos
interessados, de informação económica (passada, presente ou futura);
quer ainda em virtude da peculiaridade do seu método científico; quer,
por fim, devido às características das técnicas de observação,
captação, tratamento e apresentação da informação aos potenciais
destinatários.
A medida que o contorno económico evolui, cresce a necessidade
de informação económico-financeira. Para satisfazer esta necessidade
exige—se o estabelecimento de canais veiculadores fidedignos, por
forma a obter-se mais informação útil, no momento ideal
(tempestivamente), tentando-se, assim, maximizar a satisfação das
necessidades dos destinatários.
Uma vez que os destinatários exigem mais e melhores "outputs"
da Contabilidade ("inputs" dos destinatários), numa cadência cada vez
maior, afiguram-se duas hipóteses de resposta àquelas pretensões.
Uma é aumentar os "inputs" do sistema de informação, o que, perante
a inadequação do sistema de tratamento (ou de transformação) pode
resultar em fracasso. Outra hipótese, possivelmente a mais correcta,

Direito, imiscuir-se no objecto (tradicional) da Contabilidade. Por fim, considera


fontes do "Direito Contabilístico" os "usos" e a "jurisprudência" contabilísticos (cf.
FERNANDEZ PIRLA, 1986).
O "Direito Contabilístico" apresentado, quer por Rey, quer por Pirla, ainda não se
afirmou completamente. Mas, pode adiantar-se que o "Direito Contabilístico" tende
a ter muito de "não-Direito", ou melhor, no "Direito Contabilístico" podem
prevalecer muitos conceitos de origem extra-jurídica, cabendo ao Direito, apenas, o
papel de formalização.

65
reside na manutenção do volume de dados recolhidos e,
obrigatoriamente, na adaptação do processo de tratamento às
necessidades dos destinatários.
Em consequência das necessidades crescentes dos operadores
económicos vão surgindo, com alguma fundamentação, tendências
para a defesa da Contabilidade como "Ciência de Informação". Nesta
perspectiva, a Contabilidade é, como define a AAA 3 5 , "o processo de
identificação, medição e comunicação da informação económica
capaz de permitir juízos e decisões informadas aos seus
destinatários.".
Não é descabido, portanto, falar de Contabilidade como "sistema
de informação". Todavia, tem-se ido mais além, reputando-se a
Contabilidade como "Ciência de Informação", embora tal posição não
seja pacífica. Pensamos que a aceitação da Contabilidade como tal
("Ciência de Informação") dificulta ainda mais a demonstração do
carácter científico do conhecimento contabilístico. E isto por uma
razão simples: se uma disciplina, para constituir ciência, tem que
estabelecer leis (relações de causa-efeito entre os fenómenos), onde
estão as leis da Contabilidade-"Ciência de Informação"?. Onde está,
pois, o seu carácter científico?.
Acresce que no processo contabilístico o que é recolhido ou
identificado não é informação, mas sim "dados", melhor dizendo,
"factos económicos". Só após o tratamento desses dados (sujeição ao
método contabilístico) e quando apresentados de forma metódica,
sintetizada e agregada constituem, então sim, informação, ou
melhor informação económico-financeira. Só que as potencialidades
da Contabilidade não se esgotam no momento do fornecimento da
informação: estendem-se à interpretação e formulação de leis.

" Cf. AMERICAN ACCOUNTING ASSOCIATION: A Statement of Basic


Accounting Theory, 1966 (cit. por TUA PEREDA, 1989).

66
2. DIVISÕES DA CONTABILIDADE

Relativamente a esta matéria, não é necessário recorrer a este ou


aquele autor para procedermos à subdivisão da Contabilidade em
Microcontabilidade e, logicamente, em Macrocontabilidade. Interessa,
neste momento, relembrar que o nosso estudo incide mais
profundamente na Microcontabilidade e, no seio desta, na
Contabilidade da Empresa ->6; s e m qualquer desprimor para os
restantes campos daquela e, ou, para a Macrocontabilidade.
Em poucas palavras, a diferença entre os dois macroconjuntos
verifica-se ao nível do objecto. Enquanto a Microcontabilidade tem o
seu campo de actuação circunscrito à Contabilidade da Empresa, à
Contabilidade do Sector Público (totalmente diferenciada da
Contabilidade Nacional), e à Contabilidade das Entidades Sem Fins
Lucrativos (associações, fundações, outros organismos, etc.); a
Macrocontabilidade abarca a Contabilidade Nacional, a Contabilidade
da Balança de Pagamentos e a Contabilidade das Transacções
Interindustriais.
Refutamos, desde já, a ideia (impensada) de incluir a
Contabilidade (escrituração) das designadas "macroempresas" ou
"macrounidades" no campo de actuação da Macrocontabilidade. Esta
confusão advém geralmente das dimensões normalmente maiores que
caracterizam aquele tipo de unidades económicas (grupos económicos
e multinacionais, por exemplo).
Segundo CANIBANO CALVO (1991, p. 42-54), as diferenças
substanciais entre os referidos macroconjuntos evidenciam-se a dois
níveis:

ib
Como é óbvio, Microcontabilidade e a Contabilidade da Empresa não são
expressões sinónimas. A primeira circunscreve o seu campo de actuação a todas as
unidades económicas (não só empresas com fins lucrativos, mas também
cooperativas, instituições, associações, etc.); a segunda, incide exclusivamente
sobre as unidades de produção e as de prestação de serviços (com fins lucrativos).

67
- Por um lado, a recolha de dados, na Macrocontabilidade, recorre
com maior frequência a estimações estatísticas, em virtude de se
tornar praticamente impossível a recompilação da globalidade das
transacções ocorridas e, ou, registadas;
- Por outro, a concepção do sistema "macrocontabilístico" não
tem um carácter integral, uma vez que é composto por vários modelos
que tratam problemas diferenciados. No fundo, resume-se à integração
de todos aqueles modelos num único sistema capaz de produzir
paralelamente os dois tipos de informação (ao nível de cada modelo
macroeconómico e ao nível do resultante da integração).
Expostas as diferenças essenciais entre os dois macroconjuntos,
passemos à análise mais pormenorizada da Contabilidade da Empresa.
Esta "constitui o sistema contabilístico por excelência", como afirma
Canibano; ou, por outras palavras, trata-se do sistema contabilístico
mais pormenorizado e desenvolvido, quenTrars atenção tem merecido
ao longo dos tempos, quer sob o ponto de vista da prática
profissional, quer sob o ponto de vista teórico.
Como é evidente, a empresa assume um papel imprescindível de
base ou pilar de todo o sistema económico, através das suas operações
(relações). A medida que a exigência de informação é maior, quer ao
nível interno, quer ao nível externo, surge a necessidade de maximizar
as potencialidades do "sistema de informação", ou seja, de a empresa
produzir e transmitir informação mais útil e relevante.
As referências até aqui efectuadas situam-se apenas no contexto
das economias de mercado. No entanto, a Contabilidade da Empresa
assume especial importância quer nestes sistemas, quer nos sistemas
de economias de planificação centralizadas, porque, em ambos os
casos, a informação relativa a tais unidades é primordial 37 Sucede,

A temática não é tão linear como, ao princípio, se possa pensar. Da leitura do


livro "La Réforme Comptable dans les Pays D'Europe Centrale et Orientale",
editado pela OCDE (vd. OCDE, 1991) - que analisa, de forma bastante rigorosa, as
implicações das transposições dos sistemas das economias planificadas para os
sistemas de economias de mercado, verifica-se que o risco e a complexidade
associados requerem prudência e ponderação.

68
apenas, que nas economias planificadas, a Contabilidade da Empresa
destina(va)—se, sobretudo, a dar informação para a elaboração e
execução do Plano.
Devido à importância da Contabilidade da Empresa - por esta
constituir o campo de actuação de grande parte dos Profissionais da
Contabilidade e por representar o núcleo de incidência reiterada da
investigação contabilística -, partimos para a delimitação do seu
conceito e conteúdo.
Para o efeito, recorremos aos ensinamentos de Canibano. Cremos
não subsistirem dúvidas de que a hipótese de divisão (e análise) mais
adequada aos nossos intentos é a que se obtém em função dos
destinatários da informação económico-financeira (cf. CANIBANO
CALVO, 1991, p. 48).
Assim, se a informação é vocacionada e direccionada para o
exterior (da empresa emissora) encontramo-nos perante a
Contabilidade Financeira ou Externa 38 Ao invés, quando a
informação é preparada predominantemente para utilização interna,
isto é, da própria empresa, nos e para os diferentes níveis
organizativos, encontramo-nos no campo da Contabilidade de Custos;
e, surge, noutra perspectiva, a Contabilidade Previsional, que tanto
pode destinar-se ao exterior, como, sobretudo, a utilizadores internos.
A Contabilidade Financeira restringe-se à preparação das DF, que
por norma, devem traduzir a situação financeira e o resultado das

38
Vd. REQUENA RODRIGUEZ (1994). O autor, embora utilizando um método de
exposição distinto do de Canibano (cf. CANIBANO CALVO, 1991), optando,
inclusive, por designar a Contabilidade Financeira por Contabilidade Externa,
chega às mesmas conclusões, que traduzimos na seguinte transcrição:
"Na realidade os modelos de Contabilidade Externa e Contabilidade Interna não
podem ser considerados como dois instrumentos diferentes, mas sim como duas
partes ou peças complementares do mesmo instrumento, do mesmo modelo, que
representam dois subsistemas complementares do sistema único da circulação do
valor", e continua: "A informação que ambas produzem submete-se ao processo
contabilístico para que seja útil à Direcção empresarial, nos seus diferentes níveis
orgânicos,...".

69
operações, relativos a determinado momento e período, definidos e
delimitados. Os PCGA ocupam um lugar de destaque na sua
preparação e apresentação. Aliás, a objectividade contabilística
(distinta, naturalmente, da "exactidão") só é conseguida através deles.
Só dessa forma é possível a comparabilidade intertemporal
(consistência) e interempresarial (normalização).
No caso de grandes unidades económicas a Contabilidade
Financeira, para atingir os seus objectivos mais facilmente, mune-se
de técnicas como, por exemplo, a Consolidação Contabilística, para
através de um só conjunto de DF evidenciar a situação financeira e o
resultado do grupo, referentes a determinado momento e período.
Verifica-se, portanto, que a complexidade das empresas é cada
vez maior, consequência das necessidades de adaptação ao meio
envolvente (não só económico). Por isso, os destinatários requerem
técnicas que lhes garantam informação mais útil e mais relevante e,
também, fiável. É neste contexto que surge e se desenvolve a
actividade da Auditoria, quer Interna, quer Externa (Legal ou
Contratual), no intuito de se obter informação credível 39
Não obstante da imposição da Auditoria de Fonte Legal,
commumente designada por "Revisão Legal" 40( assiste-se, sobretudo

39
A Auditoria tem, segundo FERNANDEZ PENA (1983, p. 177), uma função
profilática (de prevenção), ou seja, assegura, a priori, que se observem determinados
princípios e regras contabilísticos. O autor afirma: "o conhecimento da existência da
Auditoria por parte do pessoal faz com que em muitas ocasiões tudo aconteça
conforme os princípios estabelecidos". Tua Pereda reforça a função de
credibilização ao escrever: "a Informação Financeira é um bem público, pelo que o
Auditor garante fiabilidade a toda a comunidade".
A obrigatoriedade da Revisão Legal de Empresas para uma sociedade por quotas
decorre do n° 2 do art°. 262 do CSC, isto é, quando aquela ultrapassar, durante dois
anos consecutivos, dois dos três limites expressos nas alíneas a) a c):
a) Total de balanço: 350.000 contos;
b) Total das vendas líquidas e outros proveitos: 600.000 contos;
c) Número de trabalhadores empregados em média durante o ano: 50.
De realçar que o DL 343/98, de 06 de Novembro, vem "alterar" os dois primeiros
limites, a partir de 01/01/1999, estabelecendo para a alínea a) 1.500.000 Euros

70
ao nível das empresas de média e grande dimensões, ao recrutamento
de Auditores Internos para os seus quadros.
Constata-se também, cada vez mais, o recurso à Auditoria de
Fonte Contratual, sobretudo para estudar e avaliar o funcionamento e
a eficácia do Sistema Contabilístico, do SCI - Sistema de Controlo
Interno, e, por vezes, para a determinar o "valor da empresa" com o
intuito de suportar operação(ões) futura(s) (v.g., aquisição, alienação,
transformação, etc.).
Mostra-se necessário, a partir daqui, analisar as definições de
Contabilidade de Custos (Interna) e de Contabilidade Previsional.
Quanto à primeira, podemos dizer que os seus objectivos se centram
na elaboração de informação útil e relevante para a adopção de
decisões de exploração e de gestão.
Vimos que a Contabilidade Financeira privilegia os destinatários
externos e que a preparação e apresentação das suas sínteses (DF)
obedece aos PCGA. Ao invés, a Contabilidade de Custos produz
informação para os diferentes níveis organizativos internos (consoante
as necessidades).
Neste ramo da Contabilidade, a aplicação dos PCGA é reduzida.
Podemos dizer até que, em vez de princípios contabilísticos, estão em
causa peculiaridades técnicas dos vários processos produtivos (v.g.,
composição dos produtos, horas -homem ou máquina- despendidas,
capacidade de produção, tempos por função ou centro de custo, etc.) e
necessidades específicas de gestão, que podem conduzir à aplicação
de regras muito próprias.
Por seu turno, a Contabilidade Previsional resulta da utilização
do método contabilístico na produção (necessária) de informação
relativa ao futuro. Porém, a preparação e a apresentação de DF
Previsionais exige que, antes, se definam objectivos específicos (v.g.,
preços de vendas, volume de negócios, "mix" de produtos, nível de
custos e outros), ou seja, metas prováveis e desejáveis 41 ( c u j a

(cerca de 300.000 contos) e para a alínea b) 3.000.000 Euros (cerca de 600.000


contos). Nesta data desconhece-se a taxa de conversão fixa e irrevogável.

71
realização depende da verificação das condições (internas e externas)
consideradas.
No fundo, a Contabilidade Previsional resulta do processo de
planeamento da empresa quer a curto, quer a médio e longo prazo. O
planeamento depende dos objectivos traçados. Por sua vez, os
objectivos devem derivar da evolução da empresa, conjugada com
estudos e análises sistematizados das tendências, comportamentos
sócio-económicos e metas estratégicas.
O bom conhecimento das condições externas (meio envolvente,
evolução dos consumos, preços, inflação, etc.) e a previsão da
evolução das mesmas são elementos que o planeamento não pode
nunca negligenciar. De realçar, ainda, que intrinsecamente ligado às
DF Previsionais está a necessidade do posterior controlo, isto é,
apurar, analisar e justificar desvios entre o previsto e o realizado.
Na prática, a elaboração e apresentação de DF Previsionais está
(geralmente) associada a situações excepcionais (v.g., avaliações de
empresas, projectos de investimentos, transformações de sociedades,
etc.); quando, em nosso entender, deveriam constituir a regra, não por
imposição legal ou de terceiros externos às empresas, mas para serem
utilizadas (constantemente) na tomada de decisões internas.
CANIBANO CALVO (1991, p. 51) afirma: "pode dizer-se que uma
empresa alcançou o grau de organização aceitável quando é capaz de
basear as suas decisões no processo contabilístico previsional,
realizado deforma regular.".
Por fim, cabe-nos referir que ao nível da Contabilidade
Previsional os PCGA desempenham um papel importantíssimo,
análogo ao do das DF Históricas. Apenas quanto ao "princípio do
custo histórico" se poderão suscitar dúvidas, mas, mesmo assim, o

41
Na prática, não poucas vezes, verifica-se que a técnica utilizada para a
preparação das Demonstrações Financeiras Previsionais consiste em sujeitar todo o
processo de construção à (máxima) capacidade produtiva da empresa. Por outras
palavras, parte-se (incorrectamente) da premissa: vamos vender o que produzimos.
Contudo, o bom Planeamento deve rejeitar aquela fórmula e utilizar uma outra,
bem distinta: vamos produzir o que se vender, ou seja, deve partir-se das
orientações e metas do Departamento Comercial (conhecedor do mercado e suas
necessidades) para a valorização e fixação das outras metas.

72
Profissional da Contabilidade procurará estimar (passe o absurdo da
expressão) um "custo histórico previsional", isto é, um custo de
aquisição, ou de produção previsível para o exercício n+1, n+2, etc.
É comum, nos tempos que correm, ouvirmos falar de
Contabilidade de Direcção (tradução da denominação original
inglesa: "Management Accounting"). Muito sucintamente,
Contabilidade de Direcção pode entender-se como o sistema de
informação construído para servir as necessidades específicas da
gestão de dada entidade. E isto exige recolha de informações e
adaptações a partir de sistemas existentes (e, ou, a criação de novos).
Tratando-se de um sistema de informação, pergunta-se: quais são
os "inputs" do sistema?. Mais ainda: a recolha de informação (para
tratamento) poderá limitar-se apenas a algum dos tipos de
Contabilidade (anteriormente apresentados)?.
A Contabilidade de Direcção recolhe (selecciona) informação em
cada um dos vários tipos de Contabilidade da Empresa (Financeira, de
Custos, Previsional) para a prossecução dos seus fins: proporcionar a
tomada de decisões de gestão. A recolha não se limita, em exclusivo, a
nenhum tipo de Contabilidade, mas, ao invés, a todos. Porém, a
Contabilidade de Direcção, recolhendo informação daqueles ramos, é
mais do que a simples soma deles, visto que os trata, ou reelabora, de
acordo com necessidades específicas de gestão.
Após esta breve exposição, parece-nos, à primeira vista, que o
campo de actuação da Contabilidade de Direcção, sendo "interno",
amplia-se (para o exterior), por um lado, e reduz-se, por outro. A
ampliação reside no facto de a Contabilidade Financeira lhe
proporcionar (através de sínteses - DF - e da construção de rácios)
juízos acerca da rendibilidade e da situação financeira da empresa.
Também a Auditoria proporciona à Direcção melhorar o seu sistema
contabilístico e o SCI - Sistema de Controlo Interno 42.

O ROC, no exercício normal das suas funções, pode (deve), após o estudo dos
sistemas referidos, emitir relatório (v.g., intitulado "Propostas para a Melhoria do
Sistema de Controlo Interno"), no qual comunica à Direcção os "pontos fracos"

73
A redução do âmbito explica-se pelo facto de nem toda
informação contabilística previsional e de custos interessar à
Contabilidade de Direcção. Concretamente, a Contabilidade de Custos
fornece a possibilidade de a Contabilidade de Direcção conhecer a
relação entre o volume de produção e os respectivos custos e
resultados e possibilita também o cálculo de preços contabilísticos de
operações (transferências) intergrupos. Por seu turno, a Contabilidade
Previsional proporciona a análise e a determinação de desvios (entre o
previsto e o realizado) e permite, ainda, avaliar (v.g., por centro de
custos) o grau de cumprimento dos objectivos estabelecidos.
A laia de conclusão, transcrevemos a definição apresentada por
CANIBANO CALVO (1989, p. 9):
"A Contabilidade Directiva (ou de Direcção) processa, analisa e
interpreta informação relevante e oportuna para a adopção de
decisões, especialmente, com carácter estratégico; intervém
prioritariamente, de forma pluridisciplinar, nos três processos
básicos das funções directivas:

- diagnóstico da empresa (interno e externo);


- planeamento estratégico (e táctico);
- controlo estratégico (e de gestão).".

Convém, por fim, tecer alguns comentários acerca das restantes


divisões da microcontabilidade, uma vez que, relativamente à
Contabilidade da Empresa, pensamos ter explanado o essencial.
Existem diferenças significativas entre a Contabilidade da Empresa, a
Contabilidade do Sector Público e a Contabilidade dos Organismos
Sem Fins Lucrativos.
Explicitando, o ramo da Contabilidade da Empresa direccionado
para o exterior (Contabilidade Financeira/Externa) preocupa-se com a
elaboração e a apresentação de sínteses de informações (expressas nas
DF, com especial destaque para o Balanço, a Demonstração de
Resultados - demonstrações de alterações da posição financeira - e o

detectados e, como é lógico, apresenta propostas de medidas tendentes à eliminação


dos mesmos.

74
Anexo), por forma a evidenciar a posição financeira, suas alterações
e o resultado das operações da empresa.
Por seu turno, a Contabilidade do Sector Público é,
frequentemente, desenvolvida em "base caixa" e, inclusivamente,
pode não ser digráfica (v.g., o caso português que utiliza o "método de
acumulação"). Também a Contabilidade dos Organismos Sem Fins
Lucrativos é, em regra, simplificada, isto é, menos desenvolvida,
podendo satisfazer os seus destinatários com informações sobre a
origem e a aplicação (discriminada) de recebimentos e de pagamentos
43
Atendendo, sobremaneira, às vicissitudes do meio económico e,
portanto, às consequentes adaptações do sistema contabilístico,
defendemos que qualquer média e grande empresa deve possuir
Contabilidade Previsional e desenvolver também Contabilidade
Directiva, a fim de menos dificilmente atingir os seus objectivos 44 Ê;
em última análise, melhor assegurar a sua continuidade.

Vd. Nota (21). De realçar que, não poucas vezes, a simplificação (facultativa)
prevista para a elaboração e apresentação das DF não significa, de forma alguma,
redução do tratamento contabilístico. Basta invocar a obrigatoriedade das
Associações e Outros Organismos (e empresas) que desenvolvem simultaneamente
várias actividades (isentas, ou não, ao nível de IRC e de IVA) de possuírem
contabilidade que abranja, inequivocamente, todas as suas actividades (cf. alínea c)
do n°. 3 do art°. 10°. do CIRC). Por sua vez, o CIVA estabelece que "a contabilidade
deve ser organizada de forma a possibilitar o conhecimento claro e inequívoco dos
elementos necessários ao cálculo do imposto, bem como a permitir o seu controle..."
(cf. n°. 1 do art° 44°. do CIVA).
44
Não referimos a Contabilidade Interna porque consideramos óbvio que é difícil a
sobrevivência da empresa sem o recurso a este tipo de Contabilidade (pouco ou
suficientemente desenvolvida, optando pela digrafia ou não, interessando
primordialmente que forneça informação útil relevante). Contudo, recorde-se que a
implementação de qualquer sistema contabilístico deverá ser analisado à luz da
dicotomia custo/beneficio.

75
3. EXEMPLO DA ARTICULAÇÃO E DO RELACIONAMENTO
DOS VÁRIOS RAMOS DA CONTABILIDADE DA EMPRESA

Para compreendermos melhor a articulação e o relacionamento


dos vários ramos da Contabilidade da Empresa consideramos útil,
após a exposição teórica efectuada, a apresentação de um exemplo
elucidativo.
Suponhamos que determinada empresa industrial, sujeita a
revisão legal, dispõe (além da Contabilidade Externa, obrigatória) de
um sistema de Contabilidade Interna e um outro de Contabilidade
Previsional.
A gestão da empresa, no fim do ano n-1, reestruturou o plano
estratégico (política de actuação a médio prazo que segue há alguns
anos), introduzindo os ajustamentos julgados necessários, tendo em
atenção, sobremaneira, uma nova meta: a reestruturação do "mix" de
produtos comercializados. Com efeito, a empresa pretende, a partir do
ano n, iniciar a comercialização de um novo produto, cuja margem
bruta 45 rondará os 40 % (cf. informações da Contabilidade Interna e
Previsional).
A reestruturação do plano tomou em consideração, em primeiro
lugar, o Plano de Comercialização, o Plano de Produção e o Plano do
Pessoal, ou seja, seguiu a filosofia do princípio "vamos produzir o
que se vende".
No final dos trabalhos contabilísticos referidos ao exercício n
(antes do "fecho" definitivo, isto é, antes de o ROC ter efectuado todo
o seu trabalho), verificou-se que o volume das vendas previsto
(quantidades e valores) foi atingido. Contudo, apesar do plano ter sido
meticulosamente reestruturado, a margem bruta do produto novo
atingiu apenas os 25 %, o que causou um ligeiro agravamento na
margem bruta global e, consequentemente, no resultado líquido do
exercício.

43
Considera-se neste exemplo a margem bruta como sendo a diferença entre o
preço de venda e o custo industrial (matérias + mão de obra + gastos gerais de
fabrico).

76
No exercício normal das suas funções, o ROC detectou, através
do "teste às rubricas e flutuações não usuais", alguns comportamentos
de evolução nalgumas contas de custos que analisou
pormenorizadamente, concretamente nas contas de "Conservação e
Reparação", "Custos com o Pessoal" e "Amortizações do Exercício".
Os serviços da empresa e o ROC analisaram em conjunto as
razões de tais variações anormais, chegando às seguintes conclusões:
- o acréscimo significativo dos custos de "conservação e
reparação" ficou a dever-se à necessidade de alteração de vários
mecanismos e "ferramentas e utensílios". Na opinião do ROC alguns
desses custos deveriam ser capitalizados, e diferidos;
- o acréscimo anormal registado na conta de "despesas com o
pessoal" ficou a dever-se à admissão de um técnico do produto
(previsto no plano) e, sobretudo, ao aumento significativo de horas de
formação remuneradas (aos formadores e aos formandos) que
ultrapassaram largamente o número de horas previstas. Na opinião do
ROC, o custo de algumas dessas horas deveriam ser diferidas tendo
em atenção o ciclo de vida do produto;
- o acréscimo verificado ao nível das "amortizações do exercício"
explicou-se pelo investimento efectuado nos finais do ano n-1 (com
entrada em funcionamento no ano n) e no ano n para produzir o novo
produto. A taxa de amortização utilizada foi 20 % (critério fiscal -
método das quotas constantes - taxa máxima).
Apesar da explicação aparentemente satisfatória, o órgão de
gestão da empresa pretende saber em qual daqueles custos o desvio
foi maior. Para o efeito, recorre à Contabilidade Previsional
comparada com a Contabilidade Interna. Esta, por seu turno,
proporciona as seguintes informações:
- os desvios nos custos de "conservação e reparação" não são
materialmente relevantes;
- o desvio apurado nos "custos com o pessoal" é significativo
porque, apesar de se prever a admissão do técnico do produto e a
formação dos trabalhadores, o número de horas previstas mostrou-se
manifestamente insuficiente. Por outro lado, também não se tomou em

77
consideração a agravante da contribuição para a segurança social das
horas extras;
- Ao nível das "amortizações do exercício", não se verificou
qualquer desvio digno de referência.
Conhecendo-se, então, que o principal desvio se verificou ao
nível dos "custos com o pessoal", pretende o órgão de gestão saber em
que secção(ões) foi mais acentuado. Para o efeito, recorre às
informações da Contabilidade Interna.
Após todo esse processo contínuo de rectificação e
aperfeiçoamento (Contabilidade de Direcção), partindo da "análise das
rubricas e variações não usuais" (Contabilidade Financeira) e da
análise de desvios (Contabilidade Previsional, comparada com outra),
determinando e imputando responsabilidades (Contabilidade Interna),
eventualmente com a colaboração do ROC (Auditoria Contabilística),
pode o órgão de gestão reelaborar, mais rigorosamente, o plano para o
ano n+1 e seguintes.
Recorde-se, por fim, que o exemplo apresentado (meramente
académico) serve apenas para melhor evidenciar as relações que se
estabelecem entre os vários ramos da Contabilidade da Empresa e o
consequente processo de reestruturação do plano.

78
CAPÍTULO IV

A PREVISÃO DO CONHECIMENTO CONTABILÍSTICO

1. INTERPRETAÇÃO DAS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS

1.1. Considerações Introdutórias

Apesar de entendermos a Contabilidade como disciplina


científica, admitimos, obviamente, que a sua aceitação como tal não é
pacífica. Alguns defensores da Contabilidade como mero conjunto de
técnicas, ou como a "arte do registo" invocam, não poucas vezes, a
incapacidade de generalização da disciplina, e, consequentemente, de
previsão. Contudo, os argumentos por eles utilizados só
aparentemente são convincentes, por três ordens de razões:
a) - Considerando a Contabilidade como registo, medição,
interpretação e comunicação de informação económica, pode deduzir-
se que a(s) operação(ões) de interpretação, ainda que considerada(s)
isoladamente, representa(m) uma parte significativa do objecto
contabilístico.
Todavia, suscitam-se, desde já, algumas questões, por exemplo: a
Contabilidade interpreta o quê?; com que obiectivo(s)?; e, como (de
que forma)?. Não poucas vezes, afirma-se que a interpretação incide
apenas sobre os documentos de suporte (nem sempre justificativos) de
operações, factos e circunstâncias que modificam (quantitativa e
qualitativamente) a situação das empresas. Essa afirmação
corresponde só em parte à verdade. Pois, se é um facto que o
Contabilista examina pormenorizadamente cada documento 46 c o m 0

46
Sabemos que na maior parte dos casos de médias e grandes empresas raras
vezes é o Contabilista quem executa essas tarefas. As suas funções são mais de
supervisão do que de execução propriamente dita. Por outro lado, cada vez mais,
assistimos à implantação de subsistemas diversos dentro de um sistema relevação
geral digráfica e, inclusive, de subsistemas independentes e extradigráficos (cf.

79
intuito de avaliar e verificar a sua adequação legal, os valores nele
inscritos, e a correspondência com a(s) operação(ões) que traduz,
também não é menos verdade que desse exame (imprescindível)
pouca informação resulta com utilidade para o órgão de gestão.
Com efeito, a interpretação a que inicialmente nos referimos é
aquela que incide sobre as DF. Estas sintetizam o conjunto de
operações, factos e circunstâncias, respeitantes a vários exercícios
económicos. Por sua vez, a interpretação da informação nelas contida
proporciona o conhecimento da situação financeira e sua evolução,
bem como dos resultados das operações da empresa.
O principal interessado no conhecimento da evolução da situação
económico-financeira de determinada empresa é (deve ser) o seu
próprio órgão de gestão. Com efeito, compete-lhe obter essa
informação, podendo enveredar pela sua análise ou pelo recurso ao
trabalho de profissionais especializados (vg., Contabilistas, TOC's e
Consultores). As exigências informativas do órgão de gestão são cada
vez maiores, o que, em certa medida, vem contribuir para o
desenvolvimento de técnicas de análise e interpretação das DF, as
quais normalmente são designadas de Análise Financeira. Todavia, a
análise das DF é, ou é sobretudo, Contabilidade, do mesmo modo que
a análise especializada de informação económica é Economia (isto é,
aplicação de ensinamentos da Economia).
Sucede, aliás, que a Contabilidade prestou e presta ainda
contributos irrecusáveis e imprescindíveis na fixação de noções e
conceitos (agora) reclamados como seus pela Análise Financeira 41\
tais como: capital fixo, capitais permanentes, capitais circulantes,
capitais próprios, fundo de maneio (líquido e reduzido),

FERNANDES FERREIRA, 1984, p. 13). Nestes casos, e após a comprovação da


eficácia do funcionamento do subsistema (v.g., o de facturação) o exame aos
documentos ("n/ facturas") quase não é accionado.
Não está em causa demonstrar que os referidos conceitos e noções têm, ou não,
as suas origens na Contabilidade. O importante é reconhecer que a Análise das
Demonstrações Financeiras é também Contabilidade. Assim sendo, pensamos que a
referida análise deve ser feita por Contabilistas e, ou, por outros analistas com
formação predominantemente de natureza contabilística.

80
financiamento, autofinanciamento, etc. Mais, refira-se que a formação
(académica e prática) de qualquer analista de DF deve ser
predominantemente de natureza contabilística.
b) A segunda está relacionada com a formação do actual
Profissional da Contabilidade. Este já não é (nem pode ser)
identificado com a pessoa que se limita a juntar metodicamente os
documentos contabilísticos (e outros), e que os classifica, lança e
arquiva. Eventualmente poderá desenvolver essas tarefas, mas as suas
funções não se devem circunscrever àquelas.
O Contabilista, cada vez mais, terá que analisar e comunicar
(mensal e anualmente), ao órgão de gestão, a evolução económico-
financeira da empresa; com base, naturalmente, em balancetes
mensais e nas peças finais obtidas pelo processo contabilístico. É
óbvio que a Análise das Demonstrações Financeiras é Contabilidade,
como já frisámos.
c) Por fim, entendemos que deve existir uma relação de
colaboração recíproca muito estreita entre o Contabilista e o Analista
Financeiro (sobretudo, o externo à empresa) - nos casos em que não
são a única e mesma pessoa - porque efectivamente só quem processa
e interpreta os dados contabilísticos e, ou, quem elabora as peças
finais conhece (deve conhecer) o conteúdo e peculiaridades de cada
conta e agregado; bem como as alterações de políticas contabilísticas e
seus efeitos nas Demonstrações Financeiras.
Observe-se, no entanto, que os aspectos anteriormente referidos
têm que ver com a aplicação da Contabilidade, não com o corpo
teórico da disciplina.

81
1.2. Alguns Exemplos de Perspicácia Contabilística

A não tomada em consideração de certos pormenores


(contabilísticos) pode deturpar significativamente a Análise das
Demonstrações Financeiras. Vejamos alguns exemplos:

CASO I - O desconhecimento do montante real 48 das dívidas


incobráveis e de cobrança duvidosa pode desvirtuar não só os rácios
de liquidez (geral e reduzida) como também não permitir o cálculo
correcto do prazo médio de recebimento 49

Apresentamos, seguidamente, um exemplo numérico


demonstrativo (vd. Quadro I e II) dos efeitos que a consideração da
premissa (Caso I) têm na determinação da liquidez (geral e reduzida).

Escrevemos "real" porque acontece na prática, não poucas vezes, a conta "218 -
Clientes de Cobrança Duvidosa" não evidenciar a totalidade dos valores
considerados (pelo gestor ou analista de crédito) incobráveis ou de cobrança
duvidosa. Acresce ainda o facto de, frequentemente, a "Provisão para Cobranças
Duvidosas" ser movimentada atendendo apenas a critérios fiscais. Assim sendo (a
nossa prática de Auditoria confirma-o), raramente a provisão é adequada à
contigência real de incobrabilidade.
Tanto o prazo médio de recebimento como os rácios de liquidez têm no
numerador o valor da dívida dos clientes, quer isoladamente (no primeiro caso),
quer integrados no conceito de activo circulante (no caso dos rácios da liquidez).
Assim sendo, a consideração de valores incorrectos podem adulterar os rácios em
causa, negativa ou positivamente. A versão original deste trabalho contém um
exemplo elucidativo dos efeitos no PMR. No presente limitar-nos-emos a apresentar
exemplo para os rácios da liquidez.

82
DADOS REFERENTES À ACTIVIDADE DA EMPRESA
"SOCIEDADE EXEMPLO, LDA"

(em contos)
Agregados/Informações Cálculos 31/12/97 31/12/96 31/12/95
(1) Disponibilidades 110.000 130.000 95.000

(2) Clientes (C/C.+ Tít) 50


450.000 385.000 310.000

(3) Clientes de Cobrança


75.000 45.000 35.000
Duvidosa 51
(4) Vai. Líquido Clientes (4)=(2)-(3) 375.000 340.000 275.000

(5) Outros Créditos Curto


Prazo 120.000 150.000 65.000
(6) Existências 420.000 470.000 540.000

(7) Débitos Curto Prazo 700.000 750.000 570.000

QUADRO I

Vejamos agora como se comportam os indicadores da liquidez.


Consideramos, no primeiro caso, valores brutos de clientes; no
segundo, valores líquidos (excluindo os saldos de "clientes de
cobrança duvidosa") e, por fim, introduz-se, no segundo caso, o efeito
dos saldos de "clientes de cobrança duvidosa" considerados pelo ROC
(vd. Ponto (8) do Quadro II).

5° Inclui os saldos dos "Clientes de Cobrança Duvidosa" (evidenciados na conta


"218 - Clientes de Cobrança Duvidosa" ou na Nota 23 do Anexo).
51 Trata-se, neste caso, de valores apresentados pelo órgão de gestão. Pressupomos
que os saldos considerados decorrem da correcta aplicação dos PCGA, dos critérios
valorimétricos e das políticas contabilísticos. Poderíamos, desde já, introduzir uma
linha com os valores "reais" dos saldos de "Clientes de Cobrança Duvidosa" (v.g., a
partir do cálculo efectuado pelo ROC da empresa).

83
MAPA DE CÁLCULO DA LIQUIDEZ
(GERAL E REDUZIDA)

(em
contos/percentagem)
Agregados/Rácios Cálculos 31/12/97 31/12/96 31/12/95
(8) Clientes de Cobrança
Duvidosa(cf. opinião ROC) 80.000 45.000 60.000
(9) Cálculo da Liquidez
(9.1.) Considerando o Valor
Bruto de Clientes:
(9.1.1.) Geral (9.1.1)=((D+(2)+(5)+(6))/ 157,1 % 151,3 % 177,2 %
/(7)*100
(9.1.2.) Reduzida (9.1.2)=((l)+(2)+(5))/(7)*
100 97,1 % 88,7 % 82,5 %

(9.2.) Considerando o
Valor Líquido de Clientes:
(9.2.1.) Geral (9.2.1)=((l)+(4)+(5)+(6))/ 146,4 % 145,3 % 171,0 %
(7)*100
(9.2.2.) Reduzida (9.2.2)=((l)+(4)+(5))/(7)*
100 86,4 % 82,7 % 76,3 %

(9.3.) Considerando 9.2.


e o Valor dos Clientes de
Cob. Duvidosa (cf. ROC):
(9.3.1.) Geral (9.3.1H(D+(2)-(8)+(5) 145,7 % 145,3 % 166,7 %
+(6))/(7)*100
(9.3.2.) Reduzida (9.3.2)=((l)+(2)-(8)+(5))/
(7)*100 85,7 % 82,7 % 71,9 %

QUADRO II

Sintetizando, as variações ocorridas nos indicadores da liquidez


(geral e reduzida) estão estritamente relacionadas com o montante
considerado adequado para representar o saldo de "clientes de
cobrança duvidosa". Não esqueçamos, porém, que deve ser utilizado
um critério consistente de cálculo.

84
CASO II - Um outro aspecto que o Analista não deve
negligenciar relaciona-se com os efeitos 52 j a contabilização
preconizada pelo POC para os "Subsídios para Investimentos",
sobretudo, ao nível do rácio da autonomia financeira (capitais
próprios/activo total líquido).
Vejamos, pois, o que o POC preceitua a propósito da sua
contabilização:
"Incluem-se nesta conta os subsídios associados com activos que
deverão ser transferidos, numa base sistemática, para 7983
"Proveitos e Ganhos Extraordinários - Outros Proveitos e Ganhos
Extraordinários - Em Subsídios para Investimentos" à medida que
forem contabilizadas as amortizações do imobilizado a que
respeitem." (cf. Parte 12 - Notas Explicativas, concretamente da conta
2745 "Proveitos Diferidos - Subsídios para Investimentos").
Sintetizando, a contabilização, grosso modo, resume-se a:

- pelo recebimento do "subsídio para investimentos "

- Débito : Disponibilidades
- Crédito : "2745 - Proveitos Diferidos -
Subsídios Para Investimentos"

- pelo processamento das amortizações do equipamento


subsidiado (e do outro)

- Débito : Amortizações do Exercício


- Crédito : Amortizações Acumuladas

->^ A nossa análise desenvolve-se apenas na óptica contabilística. Não é, portanto,


abordada a vertente fiscal. De igual forma, não é objecto do nosso estudo a análise
dos diversos tipos de subsídios existentes no nosso país, nem a respectiva legislação
específica.

85
- pela "transferência numa base sistemática "

- Débito : "2745 - Proveitos Diferidos -


Subsídios Para Investimentos"
- Crédito : "7983 - Outros Proveitos e
Ganhos Extraordinários - Em Subsídios para Investimentos"

No intuito de melhor alcançarmos os objectivos a que nos


propomos, suponhamos o seguinte exemplo:
A "Sociedade de Calçado do Norte, Lda" 53} n 0 exercício de
1993, adquiriu equipamento básico (linha de montagem) no valor de
200.000 contos para o qual recebeu, também nesse exercício, um
subsídio de 100.000 contos. A empresa procede à amortização do
equipamento de acordo com o método das quotas constantes, sendo o
período de vida útil estimado de oito anos. De realçar ainda que o
subsídio para o investimento é a fundo perdido, sem vinculação de
metas a atingir pela empresa e que não gera custos associados.
O Contabilista da empresa seguiu as normas do POC 54 p a r a a
contabilização das operações supra referidas (cf. ANEXOS I, II e III
- valores em contos). Assim, no exercício de 1993, a conta "2745 -
Proveitos Diferidos - Subsídios para Investimentos" registou a crédito
uma importância de 100.000 contos (pelo recebimento do subsídio) e,
ainda nesse exercício, uma redução de 12.500 contos (a débito)
respeitante à transferência, numa base sistemática, para a conta "7983
- Outros Proveitos e Ganhos Extraordinários - Em Subsídios para

A firma da empresa que utilizámos não corresponde à verdadeira, embora não


escondamos tratar-se de uma empresa de fabricação de calçado. Também os valores
foram alterados, através do produto dos valores reais por um número inteiro.
54
Algumas vezes (já o detectámos na nossa prática de auditoria) os contratos de
concessões dos subsídios impunham aos beneficiários a contabilização do montante
recebido em contas de "reservas", contraditando, desse modo, o estabelecido pelo
POC.

86
Investimentos" de 50 % do valor das amortizações do exercício
correspondentes ao imobilizado comparticipado.
Analisamos, agora, a forma de cálculo (numa base sistemática)
do valor a debitar na conta "2745 - Proveitos Diferidos - Subsídios
para Investimentos" (no exercício de 1993 e seguintes):

Cálculo:

MAPA DOS MOVIMENTOS DA CONTA 2745

Valor do Amortização Comparticipação Valor a Debitar


Exercícios Investimento do Exercício Subsídio/Invest. na Conta 2745
12,5*200.000 c. 100.000/200.000 c. 25.000 c.*0,5
1993 200.000 c. 25.000 c. 50% 12.500 c.

1994 25.000 c. 50% 12.500 c.

2000 25.000 c. 50% 12.500 c.

QUADRO III

Resta-nos apreciar o comportamento dos vários agregados que


directamente provoquem modificações no rácio da autonomia
financeira. Para o efeito, elaborámos o Quadro IV:

87
MAPA DE AUTONOMIA FINANCEIRA POTENCIAL

(em contos/percentagens)
Agregados/Rácios 1994 1993 1992
(1) Activo Líquido 1.464.938 1.507.470 1.266.024

(2) Capitais Próprios 491.598 456.196 423.400

(3) Subsídios Para Investimentos 75.000 87.500

(4) Autonomia Financeira (2)/(l) 33,6 % 30,3 % 33,4 %

55
(5) Aut. Financeira Potencial
38,7 % 36,1 % 33,4 %
((2)+(3))/(l)

QUADRO IV

Da análise do Quadro IV ressalta que, no exercício de 1993, em


consequência do aumento do imobilizado (quase exclusivamente
relacionado com o investimento comparticipado) o activo líquido
sofreu um acréscimo de 19,1 %. Por seu turno, os capitais próprios
aumentaram apenas 7,7 % (fruto do resultado do exercício e de

55 Neste caso concreto, pretendemos com a utilização do termo "potencial"


ressaltar a possibilidade de a autonomia financeira (dita tradicional) ser corrigida
com o intuito de melhor informar internamente (no seio da empresa). Ao nível
externo a informação deve, em princípio, ser normalizada; embora, em nossa
opinião, a evidência dessa correcção possa (deva) ser feita no Relatório de Gestão
(cf. alínea a) - "Evolução da Gestão" -, n°. 2 do art0. 66°. do CSC - Código das
Sociedades Comerciais).

88
resultados transitados). Desta feita, a evolução mais significativa
verificada no denominador do rácio (capitais próprios/activo líquido)
provocou uma pioria na autonomia financeira;
No exercício de 1994 é notória uma melhoria no rácio da
autonomia financeira à custa da diminuição do activo líquido (em
virtude da redução do valor nominal das existências (vd. Anexo I) e
do incremento do valor dos capitais próprios (vd. Anexo II).
Em termos globais, regista-se uma quebra em 1993 de 3,1 pontos
percentuais (relativamente a 1992). Contudo, tomando em
consideração o rácio da autonomia financeira potencial (raramente
considerado) deparamos com uma evolução positiva gradual 5í>: 33,4
%, em 1992; 36,1 %, em 1993; e 38,7 %, em 1994.
Em suma, podemos afirmar que a utilização pouco
frequentemente (mesmo a nível interno) do conceito de autonomia
financeira potencial (por nós definido) demonstra bem a necessidade
da relação que (já) existe (e deve existir) entre a Contabilidade e a
Análise das Demonstrações Financeiras, ou melhor, de que só pode
ser bom Analista das Demonstrações quem dominar o conteúdo e a
movimentação das contas.
Quer isto dizer que o normativo contabilístico impõe e
condiciona valores que vão ser objecto de Análise das DF. É nesta
perspectiva que (reafirme-se) a análise das Demonstrações
Financeiras é Contabilidade.
Ora, a partir do momento em que a Análise das DF faz parte
integrante do objecto (formal) da Contabilidade, é-nos permitido
concluir que a nossa disciplina pode estabelecer leis e,
consequentemente, prever.

Mesmo que entrássemos em linha de conta com o acréscimo de imposto sobre o


rendimento das pessoas colectivas - IRC -, que estimamos, em termos práticos, em
40 % (a incidir sobre o Subsídio Para Investimentos - Linha 3 do Quadro IV), a
evolução do rácio da autonomia potencial seria gradualmente crescente: 33,4 %, em
1992; 33,7 %, em 1993; e 36,6 %, em 1994.

89
C A S O I I I - Não nos esqueçamos também dos efeitos
contabilísticos^ (sobremaneira dos considerados materialmente
relevantes) decorrentes das imposições (contabilísticas) da Directriz
Contabilística n°. 10 - Regime Transitório da Contabilização da
Locação Financeira -, de Novembro de 1992 -, uma vez que, também
estes, devem ser tomados em consideração pelo Analista,
relativamente ao exercício de 1994 e seguintes.
Muito sucintamente, podemos dizer que os ajustamentos
contabililísticos preconizados pela DC n°. 10 são susceptíveis de
revestir um carácter de regularizações (não frequentes) sem
significado (material) ou, ao invés, de grande significado 5 8 ,
reconhecendo-se (o ganho ou a perda) e contabilizando-se, no
primeiro caso, em contas de "outros ganhos" ou "outras perdas"
extraordinários, ou, em alternativa, em contas de "resultados
transitados".
Com efeito, no exercício de 1994 (e seguintes), as empresas
locatárias cujos ajustamentos preconizados pela DC n°. 10 originaram
regularizações não frequentes de grande significado, ou seja,

^ 7 A vertente fiscal não merece, da nossa parte, quaisquer comentários.


Relativamente ao regime de transição (contratos (ainda) em vigor em 01/01/94 com
início anterior a essa data) os ajustamentos contabilísticos não podem determinar um
resultado fiscal diferente do que resultaria se não se procedesse àqueles
ajustamentos. Tal significa que, em 1994, se dos ajustamentos de transição tiverem
resultado perdas ou ganhos, o resultado contabilístico deve ter sido corrigido,
acrescendo-se ou deduzindo-se, consoante se tratasse de perdas ou ganhos,
respectivamente. Também, se contabilizados na conta "59 - Resultados Transitados
", as variações patrimoniais não deveriam ter sido consideradas para efeitos fiscais
(cf. DL 420/93, de 28 de Dezembro).
5 8 De realçar que é a própria DC n°. 10 (cf. alínea d) do Ponto 3) que remete para a
DC n°. 8 - Clarificação da Expressão "Regularizações não Frequentes e de Grande
Significado", Relativamente à Conta 59 -"Resultados Transitados" - a clarificação da
expressão "regularização de grande significado".
No entanto, pensamos que a interpretação (e clarificação) deve fazer-se recorrendo
também ao exposto nos Pontos 29 e 30 - Materialidade - na "Estrutura Conceptual
para a Preparação e Apresentação das Demonstrações Financeiras", da IASC (cf.
Parte C, Divisão 2, Ponto 2.01 do Manual do ROC).

90
materialmente relevantes, viram os seus capitais próprios alterados.
Consequentemente, essas variações (positivas ou negativas) tiveram
(continuam a ter no futuro) efeitos imediatos no rácio da autonomia
financeira (não só, v.g. no da cobertura do imobilizado, no da
solvabilidade, etc)59.
Conclui-se, portanto, que o Analista deve estar atento aos
aspectos contabilísticos em que baseia a sua análise. Tratando-se de
um Analista Externo (à empresa), este deve, se assim o entender,
solicitar esclarecimentos ao Contabilista, por forma a adequar a sua
análise à realidade da empresa examinada. Deste modo, na maior parte
das vezes, justificam-se algumas (aparentes) variações e evoluções
não usuais ou de grande significado nos rácios e em outros
indicadores.
Para terminar esta temática sublinhamos a necessidade da relação
de auxílio e complementaridade que deve existir entre o Contabilista e
o Analista, quando não identificados na mesma e única pessoa.
Atente-se ao que Arlindo F. Santos diz a este propósito:
"Os rácios proporcionam uma base para emitir um juízo ou um
diagnóstico. São um simples instrumento, que não substitui a
apreciação do analista "^ e não um mecanismo automático de valor
absoluto. Há que considerar em cada caso a sua importância e peso
relativo. Pretender que cada rácio deva alcançar um valor concreto e
determinado, para ter certa significação, sem ter em consideração as
circunstâncias do caso concreto, conduz geralmente a conclusões
erradas (não condizentes com a prática do funcionamento da
empresa)." (cf. SANTOS, 1991, p. 121-2).
Entende-se, pois, que o Contabilista/Analista deve ponderar caso
a caso o valor dos rácios e de outros indicadores; deve, por regra, ter
em consideração as circunstâncias do caso concreto (v.g., sector de
actividade, forma jurídica da entidade, alterações de políticas
contabilísticas por opção (nível interno) ou por imposição (normativo,

No texto original existe um exemplo demonstrativo.


O sombreado é do autor.

91
geralmente externo), etc.), e não se deve inibir, nunca, de solicitar
esclarecimentos ao órgão de gestão.
Essa forma de actuação não coloca, jamais, em causa a sua
competência profissional e técnica. Também não se opõe,
naturalmente, a quaisquer normas de ética ou deontologia; visa apenas
o ajustamento (aperfeiçoamento) da sua análise à realidade do
funcionamento da empresa sob exame.
Nos casos em que o Analista é um profissional externo (à
empresa), o Contabilista não deve considerar aqueles procedimentos
como acto de intromissão no seu domínio de actividade. Tão pouco
deve temer a perda ou a redução do seu papel no processo
contabilístico.

2. LEIS E PREVISÕES DA CONTABILIDADE

Uma vez demonstrado que a Análise das Demonstrações


Financeiras é Contabilidade, cabe-nos, neste momento, analisar a(s)
possibilidade(s) de estabelecimento de leis e previsões. Contudo, antes
de outras considerações, pretendemos evidenciar que "Demonstrações
Financeiras Prospectivas" 61 e "Leis e Previsões" são expressões que
designam realidades diferenciadas. Com efeito, as primeiras resultam
da prática contabilística (prospectiva ou previsional), "Leis e
Previsões" são, por seu turno, frutos da investigação contabilística.
Muito resumidamente, a elaboração das DF Prospectivas não
deve negligenciar nenhum dos seguintes aspectos e cada decisão deve
ter subjacente razões tecnicamente fundamentadas:

- os preços de venda a praticar;

01
Utilizámos a terminologia da Recomendação Técnica (RT) n°. 11 - Revisão da
Informação Financeira Prospectiva-, revista em Agosto de 1994 (cf. Parte B, Ponto
1.2. - Recomendações Técnicas -, Manual do ROC). É também usual designar
aquelas demonstrações por "previsionais" (vd. v.g., BAPTISTA DA COSTA 1994
p. 35).

92
- o volume de vendas esperado;
- o "mix" dos bens e, ou, dos serviços; e
- o nível de custos esperado.

Qualquer alteração significativa nas condições (internas ou


externas) é susceptível de provocar desvios que, a posteriori, têm de
ser estudados e justificados.
Assim, para a elaboração das DF Prospectivas não está tanto em
causa conhecer as leis (previsões) contabilísticas, mas antes a
aplicação adequada de princípios e técnicas contabilísticos, bem como
a capacidade de assentar em premissas que espelham, geralmente, a
qualificação e a experiência do Profissional que as formula.
Sintetizando, as DF Prospectivas mesmo quando correctamente
elaboradas (sob o ponto de vista técnico e à luz dos princípios
contabilísticos aplicáveis) têm, na maior parte dos casos, uma
validade bastante limitada: até à primeira alteração significativa nas
condições, que pode revogar toda a utilidade (inicial) das referidas
DF. Por seu turno, as Leis permanecem válidas e actuais.
Tecidas considerações introdutórias, partimos para a
demonstração da existência de leis contabilísticas, recorrendo para o
efeito a Joaquim Ferreira Ribeiro. O autor para estudar a "dinâmica
patrimonial" 62 distingue duas vertentes: a dinâmica quantitativa e a
dinâmica qualitativa, conseguindo evidenciar, em ambos os casos, a
existência de leis.
Vejamos, pois, de que forma o fenómeno quantitativo pode
traduzir-se em lei, através da seguinte relação: "O equilíbrio
quantitativo de qualquer unidade económica, num certo intervalo,

"^ Atente-se que "património" é conceito muito marcado por aspectos jurídicos.
Como tal, não é o mais adequado para tratar da Contabilidade no Geral, embora o
possa ser em abordagens dentro de determinados "paradigmas" ou "programas de
investigação".
Sucede, porém, que as leis que Ferreira Ribeiro apresenta são aplicáveis ao
"património" da empresa ou aos seus activos e passivos. Acresce-se que razões de
fidelidade ao pensamento do citado autor obrigam-nos a manter o termo
"património".

93
torna-se tanto mais estável, quanto maiores forem as variações
devedoras do Activo e do Passivo, e tanto menos estável, quanto
maiores forem as variações credoras do Activo e do Passivo, nesse
intervalo." (cf. FERREIRA RIBEIRO, 1985, p. 191).

Estamos, neste momento, perante uma lei contabilística que,


como qualquer lei, estabelece uma relação constante entre variáveis
(variações activas e passivas e seus efeitos na estabilidade).
No que se refere ao fenómeno dinâmico qualitativo, o autor parte
da premissa que todos os elementos do activo tendem a transformar-se
em dinheiro (meios líquidos); uns de um modo imediato ou quase
(activo realizável); outros de modo mediato (activo permutável), e, um
terceiro tipo, que pode respeitar a longo prazo (activo imobilizado).
Contudo, em condições normais, o objectivo da actividade
desenvolvida pela empresa não se pode reduzir à conversão de todos
os seus activos com certo grau de realização noutros de grau de
realização maior, procurando, assim, obter a máxima liquidez. Essa
situação extrema acabaria por paralisar a empresa.
No entanto, pode afirmar-se que em cada tipo de empresa existe
um ponto óptimo, aquém do qual não haverá meios líquidos
suficientes para a realização dos seus objectivos e além do qual
poderão existir meios líquidos em excesso. Terá, pois, de encontrar-se
esse ponto óptimo. É neste sentido que surge uma nova lei:
"A conversão de um elemento Activo de um certo grau de
realização noutro de grau maior coloca o património numa posição
de equilíbrio financeiro qualitativo melhor do que a que possuía
anteriormente; inversamente a conversão de um elemento Activo de
um certo grau de realização noutro de grau menor, coloca o
património numa posição de equilíbrio financeiro qualitativo pior do
que a que possuía anteriormente" (cf. FERREIRA RIBEIRO, 1985,
p. 193).
No que diz respeito aos elementos passivos, é também possível a
apresentação de uma lei análoga à anterior, mas tendo em
consideração o grau de exigibilidade (e não o de realização). Assim, o
equilíbrio financeiro qualitativo será tanto melhor quanto menor for o

94
grau de exigibilidade; inversamente o equilíbrio financeiro degradar-
se-á se aumentar o grau da exigibilidade dos Passivos.
Na posse das leis anteriores, podemos agora estabelecer uma lei
mais geral. Para o efeito, consideramos que a realização dos activos
deve, por norma, satisfazer a exigibilidade dos passivos. Recordemos
que a realização de activos traduz-se na fórmula: "passar da iliquidez à
liquidez" (cf. FERREIRA RIBEIRO, 1985, p. 195), decorrendo essa
passagem da actividade normal da empresa. Daqui resulta o seguinte
corolário:
"As vendas e, ou, as prestações de serviços com lucro "3 dão ao
património um equilíbrio qualitativo melhor do que aquele que
anteriormente possuía, porque aumentam o Activo Circulante
Realizável, quando realizadas a prazo ou o Activo Circulante Líquido,
quando efectuadas a pronto pagamento." (cf. FERREIRA RIBEIRO,
1985, p. 195).
De forma análoga, podemos também deduzir um corolário para as
compras efectuadas com vista a permitir a reposição do Activo
Circulante Permutável "4 :
"As compras colocam o património numa posição de equilíbrio
financeiro qualitativo pior do que possuía anteriormente, visto
diminuírem imediatamente o Activo Circulante Líquido quando
efectuadas a pronto pagamento, ou mediatamente quando realizadas
a crédito; por vezes provocam o aumento imediato do passivo." (cf.
FERREIRA RIBEIRO, 1985, p. 196).

63 Acrescentámos às vendas as "prestações de serviços" não por considerarmos


incorrecto o corolário, mas tão só para estendermos (explicitamente) a sua
aplicação às empresas cuja actividade é, também ou só, a prestação de serviços.
64 Excluímos deste estudo as aquisições de imobilizados uma vez que estas não se
destinam (imediatamente) a repor o Activo Circulante Permutável e porque, por
regra, aquele tipo de aquisições deve ser financiado por capitais (próprios ou
alheios) de médio e longo prazo, para que se respeite o princípio do equilíbrio
financeiro mínimo. Este, em síntese, exige que se financie um activo com um capital
de maturidade (ou exigibilidade) compatível com a vida económica desse activo e
respectiva capacidade de geração de meios monetários. E claro que, daqui, se
poderia deduzir uma lei.

95
Continuando a explanação, ressalta que sendo a empresa um
sistema (um todo sinérgico) parece-nos pouco razoável a consideração
em separado dos dois corolários. Com efeito, uma empresa não se
limita nem só a comprar, nem só a vender. Desenvolve, normalmente,
(pelo menos) essas duas funções para que possa operar continuamente.
Assim, o facto de a empresa ser considerada sistema, e em virtude
de a mesma ter necessidade de dispor, regra geral, de Activos
Circulantes Permutáveis, Realizáveis e Líquidos e de os converter em
meios líquidos, conduz-nos a analisar, agora, a possibilidade de
existência de uma lei definidora da proporção que deve verificar-se
entre aqueles três tipos de activos.
Logo à partida, face às peculiaridades de cada sector de
actividade, será difícil estabelecer-se uma proporção adequada de
aplicação generalizada, ou seja, que satisfaça todas e quaisquer
empresas. Apesar de tudo, é possível enunciar uma lei orientadora do
equilíbrio qualitativo do património:
"O Activo Circulante Permutável, por um lado, e os Activos
Circulantes Líquidos e Realizáveis, por outro, acomodam-se na razão
inversa da velocidade de circulação entre si e na directa dos volumes
que os constituem." (cf. FERREIRA RIBEIRO, 1985, p. 197).
A explicação desta lei resume-se nos quadros seguintes (V e VI).
a) Vejamos o porquê de "...acomodam-se na razão inversa da
velocidade de circulação entre si..." (Quadro V):

96
QUADRO DA PROPORÇÃO ENTRE ACTIVOS
CIRCULANTES

Velocidade de Volume do Activo Necessidade de


Circulação do Permutável Activos
Activo Circulante (Existências) Realizáveis e
Líquidos
- Quanto maior for a - Para um maior - Menor é a
velocidade de volume de Activo necessidade de
circulação Permutável Activos Realizáveis
e Líquidos
- Quanto menor for a - Para um maior - Maior é a
velocidade de volume de Activo necessidade de
circulação Permutável Activos Realizáveis
e Líquidos
QUADRO V

b) Analisemos agora a segunda parte da lei: "...e na directa dos


volumes que os constituem..." (Quadro VI):

QUADRO DA RAZÃO DIRECTA DOS VOLUMES DO


ACTIVO CIRCULANTE

Volume do Activo Volume dos Activos


Permutável Realizáveis e
Líquidos
- Quanto Maior - Maior

- Quanto Menor - Menor

QUADRO VI

97
Finalmente estamos aptos a apresentar uma lei contabilística mais
global, uma vez que sintetiza a exposição que temos vindo a encetar.
Assim:
"O avigoramento da estabilidade do equilíbrio qualitativo do
património de qualquer empresa, através da sucessão dos instantes,
está na razão directa da aceleração da realização do seu Activo e na
inversa da aceleração da exigibilidade do seu Passivo." (cf.
FERREIRA RIBEIRO, 1985, p. 198).
A laia de conclusão, podemos afirmar que as leis contabilísticas,
como quaisquer leis científicas, assentam em vários pressupostos
(verificação de certas condições) e obtêm-se a partir do estudo e
análise das relações que se estabelecem entre diferentes grandezas das
Demonstrações Financeiras.
Resta-nos, por fim, concluir que a Contabilidade a partir das
(suas) leis (algumas das quais enunciadas) pode, à semelhança de
outras disciplinas científicas, prever. Por outras palavras, não só as
leis como as previsões contabilísticas obedecem aos requisitos do
conhecimento científico.

98
CAPÍTULO V

CONCLUSÕES FINAIS

Da exposição e análises apresentadas e retendo apenas os


aspectos que consideramos de maior relevância, resulta que:
- A delimitação do conceito "ciência", por mais elaborada que
seja, origina, não poucas vezes, algumas reticências. Esta constatação
é visível nas divergências que surgem entre os vários autores
estudados.
- De facto, tivemos que assentar numa definição-base. Em
síntese, definimos ciência como sendo um sistema de conhecimentos
metódicos e universalmente verificáveis, produzidos a partir da
observação cuidada e rigorosa da realidade, sobre os quais se opera e
exerce controlo, no sentido de se descobrirem as leis dos fenómenos,
as quais proporcionam a generalização e, consequentemente, a
previsão.
- A observação da realidade (objecto formal) é a responsável
primeira pela criação das várias disciplinas científicas (ciências
matemáticas, da natureza e sociais) e não o "método" como, por vezes,
se insinua.
- A construção do conhecimento científico depende, antes de
mais, de uma metodologia adequada, que, de uma forma geral,
constitui o que se designa de "método científico", cujo núcleo (ou
essência) permanece mais ou menos fixo nas adaptações que os vários
ramos do saber encetam. Esse núcleo designámo-lo de "método
conceptual".
- Da análise das diversas formas que o método científico assume
sem se descaracterizar, verifica-se que não se põe em causa a
universalidade do conhecimento científico.
- Do estudo mais pormenorizado da problemática da previsão,
explicitada na definição-base seleccionada, conclui-se que a previsão
científica decorre de se ter compreendido as causas, as consequências
e, logo, as leis dos fenómenos. Ao invés, a "previsão empírica carece
dessas origens.

99
- A defesa da Contabilidade como ciência e não como técnica e,
ou, arte exige a análise comparativa de tais conceitos. A maior
controvérsia reside na ciência e na técnica, uma vez que "arte" se
relaciona mais intensamente com as emoções e a subjectividade do
sujeito (artista). Com efeito, a ciência mune-se de técnicas para
prosseguir na aquisição de conhecimentos, mas não se limita às
técnicas: ultrapassa-as, estabelecendo leis. Outro aspecto diferenciador
é o facto de a técnica visar a eficiência e a optimização de recursos, o
que não é primordial na ciência.
- Do estudo comparativo e crítico de várias definições de
Contabilidade conclui-se que se trata de uma disciplina científica, com
objecto e método científico próprios, que recorre a um vasto conjunto
de técnicas contabilísticas (sobremaneira técnica da digrafia e da
representação convencional), e com capacidade de previsão.
- O seu objecto formal circunscreve-se à identificação,
classificação, medição, registo, interpretação e comunicação de
informação económico-financeira (passada, presente e futura) aos
interessados (internos e, ou, externos).
- Uma vez que o objecto formal condiciona a adaptação do
método conceptual sem, contudo, o descaracterizar, houve
necessidade de analisar as especificidades do método contabilístico.
Vimos que consiste na articulação e conjugação de vários aspectos
(postulados, premissas, regras e técnicas, concretamente: princípio da
dualidade; regras de medição e valorização; formas de representação e
agregação) que permitem passar da observação da realidade
económica às demonstrações financeiras.
- Da análise do princípio da dualidade resulta que as "partidas
dobradas" não podem ser consideradas postulado ou princípio
contabilísticos. O princípio da dualidade é muito mais do que uma
simples técnica: assenta na clara consciência de que qualquer
operação económica ou financeira se decompõe numa fonte de
financiamento (origens, recursos) e num elemento financiado
(aplicação, emprego); portanto transcende a simples técnica de
contraposição de débitos e créditos e fundamenta registos que
decompõem as operações em fontes de financiamento e aplicações.

100
- Conclui-se, portanto, que: a Contabilidade não pode ser
exclusiva nem predominantemente técnica, nem, tão pouco, limitar-se
à "arte do registo". É algo mais, em virtude das suas características e
requisitos marcadamente científicos; do seu objecto de estudo
delimitado e definido; do seu método científico de tratamento e
produção de conhecimentos; da sua faculdade de estabelecer leis e,
consequentemente, da possibilidade de previsão. Nesta perspectiva, a
Contabilidade é ciência.
- Acerca da sua natureza, rejeita-se a possibilidade de a
Contabilidade ser uma disciplina matemática e, ou, uma disciplina
jurídica. De facto, a Contabilidade não apresenta soluções rígidas
(exactas) e irrefutáveis, como a Matemática nem o seu objecto, nem o
seu método são o da Matemática; por outro lado, apesar de o Direito
exercer uma influência (limitação) significativa sobre a prática
contabilística, jamais se poderá identificar a Contabilidade como
disciplina jurídica, pois o seu objecto é específico e o seu método
único. Acresce que a noção da Contabilidade como subsidiária
("Álgebra") do Direito está, em definitivo, ultrapassada.
- Atendendo ao objecto e aos fins que tem em vista: identificar,
registar, medir, interpretar e comunicar (aos interessados) informação
económico-financeira, a Contabilidade afirma-se como disciplina de
natureza económica.
- Para realçar que as considerações anteriormente tecidas são
aplicáveis quer à Micro quer à Macrocontabilidade analisaram-se as
diferenças mais relevantes entre estes dois macro-conjuntos. A
diferenciação reside no método de recolha de dados. Com efeito, a
Macrocontabilidade recorre com frequência a estimações estatísticas;
por seu turno, a Microcontabilidade assenta na sistemática captação e
registo directo de factos e transacções (uma a uma).
- Definidos tais macro-conjuntos, fez-se centrar a análise na
Microcontabilidade e muito particularmente na Contabilidade da
Empresa (Contabilidade Financeira, Interna e Previsional). Vimos que
a Contabilidade Financeira (ou Externa) deve proporcionar aos
destinatários (externos) a imagem verdadeira e apropriada da situação
financeira e dos resultados das operações da empresa. Ao invés, a

101
Contabilidade Interna (ou de "Custos") deve proporcionar, aos
destinatários internos (órgãos de gestão e directivos), informações dos
custos e proveitos inerentes às actividades de exploração.
- Verifica-se que a evolução do meio sócio-económico (não raras
vezes, imprevista) exige da Contabilidade novas técnicas; novas
respostas (v.g., Consolidação de Contas, Auditoria e Revisão Legal)
para fazer face às exigências cada vez maiores dos destinatários: mais
utilidade, mais relevância e mais fiabilidade (v.g., avalizada pelo
parecer do ROC).
- A Contabilidade Previsional surge como ferramenta
imprescindível para minimizar as consequências que as vicissitudes do
meio envolvente podem trazer. A actuação deste ramo da
Contabilidade acompanha o planeamento da empresa a curto e a
médio e longo prazos.
- Constata-se, na prática, que a implementação de um sistema
contabilístico previsional resulta, por norma, de imposições legais (ou
de terceiros externos à empresa) para suportar operações excepcionais
(v.g., avaliações, projectos de investimentos, transformação de
sociedades, etc) e não da vontade própria do órgão de gestão.
- Para completar o estudo dos ramos da Contabilidade da
Empresa, abordou-se, por fim, a Contabilidade de Direcção. Esta
resulta de necessidades informativas específicas da gestão; recolhe
informações nos outros ramos de Contabilidade da Empresa sem,
contudo, ser a sua simples soma: é algo mais amplo e diferenciado.
Em suma, é o ramo da Contabilidade que proporciona à Direcção a
adopção de decisões estratégicas.
- Defende-se, ao terminar o capítulo III, que qualquer empresa de
média e grande dimensões deve ter implementado (e em
funcionamento), além dos sistemas obrigatórios (de Contabilidade
Externa e Interna), um sistema contabilístico previsional razoável.
Com efeito, a partir deles, pode constituir-se também um adequado
sistema de Contabilidade Directiva para, no mínimo, ajudar a
empresa a operar continuamente, se esse for (como é razoável supor-
se) o seu intento.

102
- Uma vez que a aceitação (generalizada) de determinada
disciplina como sendo científica depende, em grande medida, da
capacidade que essa disciplina tem para prever, tornou-se necessário
demonstrar que a Contabilidade usufrui da faculdade de estabelecer
leis, e, partindo delas, de prever a realidade económico-financeira.
- As exigências informativas crescentes dos órgãos de gestão e
dos restantes destinatários (sobretudo externos) vêm contribuir para o
aparecimento e aperfeiçoamento de técnicas de análise e interpretação
das Demonstrações Financeiras, com o intuito de se produzir mais e
melhor informação útil.
- Neste contexto, a Contabilidade presta contributos irrecusáveis
na construção e fixação de noções e conceitos que a Análise das
Demonstrações Financeiras utiliza. Com efeito, defende-se que a
análise das DF é, não pode deixar de ser, Contabilidade; como tal,
deverá ser desenvolvida e executada por Profissionais da
Contabilidade (Contabilistas que processem informação, ou outros que
apenas a analisem).
- Assim, o Contabilista não se deve limitar às funções tradicionais
(reunir, classificar, registar e arquivar documentos). Além dessas
funções, ele deve analisar (e interpretar) e comunicar (mensal e
anualmente), ao órgão de gestão, a evolução económico-financeira da
empresa.
- Defende-se, no caso de se tratar de profissional externo (à
empresa), que o analista das DF pode (deve) solicitar ao Contabilista
da empresa esclarecimentos adicionais sobre o conteúdo e
peculiaridades das contas e agregados, bem como solicitar
informações sobre rubricas não usuais (não habituais no sector ou na
empresa). É também o Contabilista que pode informá-lo com maior
rigor acerca da alteração das políticas contabilísticas ou dos critérios
valorimétricos utilizados. Desconhecer ou negligenciar essas situações
conduz, inevitavelmente, a análises desajustadas da realidade da
empresa.
- Com o intuito de demonstrar os efeitos de tal negligência ou da
não consideração de elementos específicos apresentaram-se três
situações (exemplos):

103
CASO I - Desconhecimento do valor real das dívidas
incobráveis e de cobrança duvidosa;
CASO II - Efeito dos Subsídios para Investimentos" no
rácio da autonomia financeira (e outros);
CASO III - Ajustamentos do regime transitório do "leasing"
(DC n°. 10).
- Sendo a análise das Demonstrações Financeiras também
Contabilidade é possível que o processo contabilístico conduza a
estabelecer leis válidas. As leis contabilísticas relacionam,
normalmente, os agregados das Demonstrações Financeiras; assentam
em vários pressupostos (como qualquer lei científica) e constroem-se
a partir do estudo e da análise das relações que se estabelecem entre as
grandezas das DF.
- Recorde-se, a título de exemplo, a lei enunciada por Ferreira
Ribeiro (cf. FERREIRA RIBEIRO, 1985, p.198): "o avigoramento do
equilíbrio qualitativo do património de qualquer empresa, através da
sucessão de instantes, está na razão directa da aceleração da
realização do seu Activo e na inversa da aceleração da exigibilidade
do seu Passivo.
- Conclui-se, no término do Capítulo IV, que a Contabilidade, à
semelhança das outras disciplinas científicas, partindo das suas
próprias leis consegue prever a realidade (económica). Mais, as leis
contabilísticas obedecem a requisitos científicos, isto é, são válidas e
verificáveis. Neste sentido, e para terminar, podemos afirmar que
Contabilidade é ciência, ou seja, é uma disciplina científica.

104
105
SOCIEDADE DE CALCADO
ACTIVO 1994 1993 1992
1. I M O B I L I Z A Ç Õ E S VALOR | % VALOR | 7o VALOR | 7o

* Imobilizações Incorpóreas 10420 0,7% 6.850 0,5% 6.850 0,57o


* Imobilizações Corpóreas 1.179.858 80,5% 1.049.612 69,6% 848.350 67,07o
* (AmortAcumuladas-Imobil.Corpóreas) 773.840 52,8% 673.532 44,7% 580.190 45,8%
* (Amor(.Acumuladas - Imobil.lncorp.) 6.850 0,5% 6.850 0,5% 6.010 0,5%

Total Imob.Corp.+Incorp. 409.588 28,0% 376.080 24,9% 269.000 21,27o


* Imobilizações financeiras
* Partes de capital 200 0,0% 200 0,0% 200 0,0%
* Obrig.+Tit.Part.+Empr. de financ. 0 0,07o 0 0,0% 0 0.07o
* Outros investimentos Financeiros 0 0,0% 0 0,0% 0 0,07o
* (Prov.+AmortAc.-Invest.Financ.) 0 0,0% 0 0,0% 0 0,07o

200 0,0% 200 0,0% 200 0,07o


* Imobilizações em curso 0 0,0% 0 0,0% 0 0.0%
Total de Imobilizações 409.788 28,0% 376.280 25,0% 269.200 21,3%
2. EXISTÊNCIAS
* Mercadorias 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%
* Adiant.p/conta de compr. - Mercad. 0 0,0% 0 0,0% 0 0,07o
* (Prov. p/Deprec.de Exist.- Mercad.) 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%

0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%


* Produtos Acabados e Intermédios 46.430 3,2% 57.492 3,8% 149.780 11,8%
* Subprod.,Desp.,Resíduos e Refugos 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%
* Produtos e Trabalhos em curso 50.452 3,4% 63.272 4,2% 72.644 5,7%
* M.P. Subsidiarias e de Consumo 318.192 21,7% 345.352 22,9% 416.204 32,9%
* Ad.p/conta de cornpr. - Outr.compras 0 0.0% 0 0,0% 0 0,0%
* (Prov. p/Deprec.de Exist. - Outros) 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%

415.074 28,3% 466.116 30,9% 638.628 50,4%


415.074 28,3% 466.116 30,9% 638.628 50,4%
3.TERCEIROS(L.P.)
* Clientes 0 0,0%, 0 0,0% 0 0,0%
* Accionistas/Sócios 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%
* Outros 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%

Total de terc. dem.l.p. 0 0,0% 0 0.0% 0 0,0%,


4.TERCEIROS{C.P.)
* Clientes 452.332 30,9% 385.288 25,6% 309.604 24,5%
* (Provisoes p/cobr.duvid.- Clientes) 56.400 3,8% 45.364 3,0% 38.844 3,1%

395.932 27,0% 339.924 22,5% 270.760 21,4%


* Fornecedores 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%
* Emprest. Concedidos 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%
* Estado e Outros Entes Públicos 78.310 5,3% 71.760 4,8% 49.730 3,9%
* Accionistas/Sócios 0 0,0% 0 0,07o 0 0,0%
* Outros Devedores 43.214 2,9% 75.666 5,0% 15.776 1,2%
* (Provisoes p/ cobr. duvid.- Outros) 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%

Total outr. cred. de c.p. 121.524 8,3% 147.426 9,8% 65.506 5,2%
Total de créditos de c.p. 517.456 35,3% 487.350 32,3% 336.266 26,6%
5. DISPONIBILIDADES
* Caixa 17.006 1,2% 2.398 0,2% 564 0,0%
* Depósitos bancários 96.592 6,6% 170.132 11,3% 21.366 1,7%
* Tit.Neg.+Aplic.Tesouraria 0 0,0% 0 0,07» 0 0,0%
* (Prov.para Aplic.Tes ouraria) 0 0,0% 0 0,0% 0 0.0%

Total de disponibilidades 113.598 7,8% 172.530 11,47o 21.930 1,7%

6. ACRÉSCIMOS E DIFERIMENTOS 9.022 0,6% 5.194 0,3% 0 0,0%

1464938 100% 1507470 100% 1266024 100%


ANEXO I
BALANÇO DA EMPRESA: SOCIEDADE DE CALC ADO DO NOI ÍTE, LDA
PASSIVO + CAPITAL PRÓPRIO 1994 1993 1992
CAPITAL PRÓPRIO VALOR | % VALOR | % VALOR | %
* Capital 200.000 13,77c 200.000 13,3% 200.000 15,8%
* (Accoes / Quotas proprias) 0 0,07c 0 0,0% 0 0,0%
* Prestações Suplementares 0 0,0% 0 0,0% 0 0,07o
* Prémios de emissão 0 0,0% 0 0,07c 0 0,0%
* Ajustamentos de partes de capital 0 0,0% 0 0,07c 0 0,0%
* Reservas de reavaliação 0 0,0% 0 0,07o 0 0,07o
* Outras Reservas 256.196 17,5% 221.800 14,7% 196.970 15,6%
* Resultados Transitados {+/-) 0 0,0% 0 0,07o 0 0,07o
* Resultados Líquidos 35.402 2,4% 34.396 2,3% 26.430 2,1%
* (Dividendos Antecipados) 0 0,0% 0 0,07o 0 0,07o

Total do Capital próprio 491.598 33,6% 456.196 30,37c 42.1400 33,4%

PASSIVO DE M.L.P.

* Fornecedores 0 0,0% 0 0,07c 0 0,07o


* Empréstimos Bancários 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0%
* Outros Empréstimos 0 0,0% 0 0,07c 0 0,07o
* Estado e Outros Entes Públicos 0 0,0% 0 0,07c 0 0,07c
* Accionistas/Sócios 94.000 6,470 120.000 8.0% 200.000 15,87o
* Outros Credores 0 0,07c 0 0,0% 0 0,0%

Total do passivo dem.l.p. 94.000 6,47o 120.000 8,07c 200.1X10 15,8%

PASSIVO (CP.)

* Fornecedores 291.158 19,9% 400.702 26,6% 342.674 27,1%


* Empréstimos Bancários 303.294 20,7% 237.150 15,77o 143.304 11,37o
* Outros empréstimos 0 0,0% 0 0,07o 0 0,07o
* Estado 61.728 4,27o 57.138 3,87o 38.338 3,07o
* Accionistas / Sócios 1.662 0,1% 1.662 0,1% 536 0,0%
* Outros Credores 45.638 3,17o 57,628 3,87o 39.122 3,17o
* Prov. p/outros riscos e encargos 0 0,07o 0 0,07o 0 0,07o

Total do passivo de c.p. 703.480 48,07o 754.260 50,0% 563.974 44,57o

ACRÉSCIMOS E DIFERIMENTOS 175.860 12,0% 176.994 11,7% 78.650 6,2%

TOTAL DO PASSIVO 973.340 66,47o 1.051.274 69,7% 842.624 66,6%

TOTAL DO CAPITAL P. + PASSIVO 1464938 100% 1507470 100% 1266024 100%

107
INDIC. ECON. FINANCEIROS DA: SOCIEDADE DE CALÇADO DO NORTE, LDA
1994 1993 1992
VALOR/7o V A L O R / 7o V A L O R / 7o
ANALISE DE CURTO-PRAZO

Fundo de Maneio Liquido 342.648 371.716 432.850


Fundo de Maneio Reduzido -72.426 -94.400 -205.778
Fundo Maneio Liqu7(Vendas+P.S.) 12,1% 16,0% 20,1%.
Liquidez Geral 148,7% 149,3% 176,7%
Liquidez Reduzida 89,7% 87,5% 63,5%
Tempo medio de Pagamento (dias) 54,1 103,6 74,3
Tempo medio de Recebimento(dias) 58,2 60,5 52.5
Cobert.Stk dem.p.+mercad.(dias) 65,7 98,1 119,2
Cobertura do Stock de p.a.(dias) 6,0 9,0 25,4

AN. SOLVABILIDADE L. P.

Autonomia Financeira 33,6% 30,3% 33,4%


Cobertura do Imobilizado 142,9% 153,1% 231,6%
Solvabilidade 50,5% 43,4%, 50,2%,
Situação de endividamento 119,1% 126,37o 147,2%

INDICADORES ECONÓMICOS

Volume de Negócios 2.838.878 2.324.776 2.153.880


Taxa de crescimento V.Neg. 22,1% 7,9%

De rentabilidade (preços correntes) VALOR | 7o PROD. VALOR | %PROD. VALOR | %PROD.

Margem Bruta (Valor) 1046.818 37.27o 938.142 42,27o 880.718 40,9%


Resultados Operacionais 48.526 1.77o 50.746 Z37o 36.936 1,77o
Resultados financeiros 11.104 0,47o -6.474 -0,37o 12.992 0,67o
Resultados Correntes 59.630 2,17o 44.272 2,07o 49.928 2,37o
Resultados Li qui dos 35.402 1,37o 34.396 1,57o 26.494 1.27o
"Cash - Flow Senso Comum" 147.044 5,27o 137.454 6,27o 124.004 5,8%
Valor Acrescentado Bruto 812.240 28,97o 734.052 33,07o 660.682 30,77o

Rentab. do Volume Negócio 1,27o 1,5% 0,07o


Rentab. do Investimento total 9,07o 10,2% 9,47o
Rentab. dos Capitais Próprios 7,57o 7,87o

An.Dupont (Res.Liq7Sit.Liq.) 7.27o 7,5% 6,3%


(l)*(2)/(3)
(1) Res. Liquido/VoI.Negóc. 1,27o 1,5% 1,27o
(2) Volume Negócios/ Activo 193,87o 154,2% 170,1%
(3) Sit. Liquida / Activo 33,6% 30,3% 33,4%

Grau de Alav. operacioual -0,2 11,8


(Var.Result.Operac./Var.Prod.)
Grau de Alavaucagem financeira -0,2 0,2
(Var R.LiVar(R.Oper+R.Extr.))

ANEXO III

108
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRAHAM PAIS
1993 - "Subtil é o Senhor - Vida e Pensamento de Albert Einstein",
I a . Edição, Gradiva, Lisboa.
AECA
1991 - "Princípios Contables - Princípios y Normas Contabilidad
en Espana", Documento 1, AECA, Madrid.
BAPTISTA DA COSTA, Carlos
1993 - "Auditoria Financeira - Teoria e Prática", Rei dos Livros,
a
4 Edição, Lisboa.
BRAZ MACHADO, JR.
-"Contabilidade Financeira", Associação Portuguesa de
Contabilistas, Lisboa.
CANIBANO CALVO, Leandro
1975 - "Teoria Actual de la Contabilidad", Ed. Ice, Madrid.
1989 - "Un Proyecto a Debate: El Marco Conceptual de la
Contabilidad", Boletin AECA n°. 19,Mayo, Madrid.
1991 - "La Contabilidad - Análisis Contable de la Realidad
Económica", Ed. Pirâmide, Madrid.
CASTRO, Armando
1989 - "Conhecer o Conhecimento", Editorial Caminho, Lisboa.
COLLINGWOOD, R.G.
1986 - "Ciência e Filosofia - A Ideia de Natureza", Editorial
Presença, Lisboa.
CUVILLIER, Armand
1960 - "Vocabulário de Filosofia", 3 a Edição, Livros Horizonte,
Lisboa.
DURKHEIM, Emile
1990 - "As Regras do Método Sociológico", 14a Edição,
Companhia Editora Nacional, São Paulo, Brasil.
FERNANDES FERREIRA, Rogério
1984 - "Normalização Contabilística", Livraria Arnado, Coimbra.
1992 - "Plano Oficial de Contabilidade - Ensaios e Estudos
Críticos", Edições Escher, Lisboa.

109
FERNANDEZ PENA, Enrique
1983 - "7 Conferencias sobre Contabilidad y Auditoria", Semsa
Distribuiciones Empresariales, Madrid.
1989 - "Dicionário de Auditoria", Semsa Distribuiciones, Madrid.
FERNANDEZ PIRLA, J.M\
1983 - "Teoria Económica de la Contabilidad", Ed. Ice, Madrid.
1986 - "Una Aportacion a la Construcion dei Derecho
Contable", Instituto de Planificacion Contable, Ministério de
Economia y Hacienda, Madrid.
FERREIRA DE ALMEIDA, João e MADUREIRA PINTO, José
1990 - "A Investigação nas Ciências Sociais", 4 a . Edição,
Editorial Presença, Lisboa.
FERREIRA RIBEIRO, Joaquim
1985 - "Lições de Teoria da Contabilidade (Geral)", I o . Volume,
Athena Editora, Porto.
GARCIA-AYUSO, Manuel e SIERRA MOLINA
1994 - "La Relacion Entre Investigacion y Pratica en
Contabilidad", Revista Espanola de Financiacion y
Contabilidad, Vol. XXIII, n° 78, Enero-Marzo, Madrid, p. 235-87.
GOMES FRANCISCO, Ivo
1990 - "Compreender a Contabilidade Nacional", Estudos n°. 31,
Banco de Fomento Exterior, Lisboa.
GONÇALVES DA SILVA, F.V.
1991 - "Contabilidade Industrial", 9a. Edição, rev. por Rogério
Fernandes Ferreira, Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa.
KUHN, Thomas S.
1977 - "A Tensão Essencial", Edições 70, Lisboa.
LAMOUROUX, F M .
1989 - "Contabilidad", Ed. Universidad Salamanca.
MORA, José Ferrater
1991 - "Dicionário de Filosofia", Publicações Dom Quixote,
Lisboa.
OCDE
1991 - "La Réforme Comptable dans le Pays dEurope Centrale et
Orientale", OCDE, Paris.

110
PINTO DA ROCHA, Conceição e MAGALHÃES, João Baptista
1981 - "Filosofia 11°. Ano - Manual e Modelos de
Testes", 2a. Edição, 3a. Reimpressão, Contraponto, Porto.
REQUENA RODRIGUEZ, José Ma.
1994 - "Sobre o Concepto y Contenido de la Contabilidad de
la Empresa", Jornal Técnico de Contas e da Empresa, n°. 343,
Abril, Lisboa.
REY, Françoise
1979 - "Développements Récents de la Comptabilité",
Éditions du CNRS, Entreprise Moderne D'Édition, Paris.
SANTOS, Arlindo F.
1991 - "Análise Financeira - Conceitos, Técnicas e Aplicações",
Reimpressão, INIEF, Economia e Gestão, Lisboa.
SCHWEZ, Nicolau
1991 - "Contabilidade: Ciência, Técnica ou Arte?", Actas das
IV Jornadas de Contabilidade, Instituto Superior de Contabilidade e
Administração de Aveiro, Areal Editores, Porto.
SELECÇÕES DO READER'S DIGEST
1980 - "Dicionário Enciclopédico Koogan - Larousse -
Selecções", Volume I, Léxico Comum, 3a. Edição, Lisboa.
SILVA CRAVO, Domingos José da
1990 - "Activos Intangíveis", Trabalho de Fim de Curso do
CESEA, Instituto Superior de Contabilidade e Administração,
Aveiro.
SOCÍ AS SALVA, António 1991 - "La Normalizacion Con table en
el Reino Unido, Francia, Alemana y Espana", Associacion Espanola
de Contabilidad y Administracion de Empresas, Madrid.
TUA PEREDA, Jorge 1983 - "Princípios e Normas de
Contabilidad", Instituto de Planificacion Contable, Madrid.
1985 - "Los Princípios Contables: de la Regulacion Professional
ai Âmbito Internacional", Revista Espanola de Financiacion y
Contabilidad, Vol. XIV, n° 46, Enero-Abril, Madrid, p. 25-56..
VILHENA, Vasco de Magalhães
1977 - "Pequeno Manual de Filisofia", 5a. Edição, Livraria Sá da
Costa Editora, Lisboa.

Ill
PUBLICAÇÕES OFICIAIS:

- Dec. Lei n°. 47/77, de 07 de Fevereiro (POC/77)


- Dec. Lei n°. 394-B/94, de 26 de Dezembro (CIVA)
- Dec. Lei n°. 262/86, de 02 de Setembro (CSC)
- Dec. Lei n°. 442-B/88, de 30 de Novembro (CIRC)
- Dec. Lei n°. 410/89, de 21 de Novembro (POC/90)
- Dec. Lei n°. 238/91, de 02 de Julho (Normas de Consolidação
de Contas)
- Dec. Lei n°. 290/92, de 28 de Dezembro (RITI)
- Dec. Regulamentar 2/90, de 12 de Janeiro (Regime Fiscal das
Reintegrações e Amortizações)
- Dec. Lei n°. 343/98, 06 de Outubro (Alterações, entre outros,
ao Código das Sociedades Comerciais).

- INSERIDAS NO MANUAL DO ROC:

- IV Directiva da CEE
- VII Directiva da CEE
- RT n°. 11 - Revisão da Informação Financeira Prospectiva
- DC n°. 8 - Clarificação da Expressão "Regularizações
não frequentes e de grande significado", relativamente à
Conta 59 - "Resultados Transitados"

112
O ESTADO NOVO E A CONTABILIDADE:
CONTRIBUTO PARA O ESTUDO DO ENSINO TÉCNICO E DA
PROFISSÃO DE CONTABILISTA NA DÉCADA DE 30.*

JOSE FERNANDES DE SOUSA


Professor do ISCA de Aveiro

* Este trabalho é o resultado parcial de uma pesquisa em curso - como, aliás,


se torna evidente - , donde saiu para ser apresentado na I Jornada de História da
Contabilidade - 4 de Abril de 1998 - , relizada pelo Centro de Estudos de História
da Contabilidade da APOTEC - Associação Portuguesa de Técnicos de
Contabilidade - , com a colaboração do ISCAC - Instituto Superior de Contabilidade
e Administração de Coimbra - , em cujas instalações - Quinta Agrícola de Bencanta
-, decorreram as actividades programadas.
INDICE

1. PRINCÍPIOS ORIENTADORES DO ESTADO NOVO


2. CONTABILIDADE E RIORIDADES ESTRATÉGICAS
2.1. A REFORMA DO ORÇAMENTO
2.2. A REFORMA FISCAL
2.3. REFORMA DA CONTABILIDADE PÚBLICA
2.4. REFORMA DO TRIBUNAL DE CONTAS
2.5. A s FINANÇAS E A CONTABILIDADE N A CONSOLŒ)AÇÃO D O
REGIME

3. REFORMA EDUCATIVA E ENSINO TÉCNICO


3.1. ENSINO TÉCNICO E MENTALROADE SOCIAL
3.2. CARACTERÍSTICAS DA POLÍTICA EDUCATIVA
3.2.1. A POLÍTICA RESTRITIVA E O ENSINO COMERCIAL
3.2.2. CENTRALISMO E REPRESSÃO
3.2.3. A EDUCAÇÃO NACIONAL
3.3. «A OFENSIVA PELA EDUCAÇÃO NACIONAL»

4. A PROFISSÃO DE CONTABILISTA
4.1. A CONDIÇÃO SOCIAL DO CONTABDLISTA
4.2. SINDICATOS NACIONAIS E ORGANIZAÇÃO DA PROFISSÃO
4.3. A EXTINÇÃO DO SINDICATO
4.4. REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO DE «TÉCNICOS DE
CONTABILDADE»
4.4.1. «BASES FUNDAMENTAIS PRECONIZADAS»

4.4.2. SUGESTÕES E CONFLITOS DE INTERESSES

CONCLUSÃO

ANEXO
BIBLIOGRAFIA E FONTES

114
1. PRINCÍPIOS ORIENTADORES DO ESTADO N O V O

O Estado Novo emerge do seio de uma Ditadura que, nascida à


sombra das armas, acolhe, desde cedo, como Ministro das Finanças, e
mais tarde como Presidente do Conselho de Ministros, o principal
ideólogo da República corporativa. Esta nasce, formalmente, com a
referendada Constituição Política de 1933, o Estatuto Nacional do
Trabalho e demais legislação complementar, documentos em que
assenta o corporativismo português, e termina por um novo golpe
militar de sentido democrático.

A consolidação do Estado Corporativo resulta de um bem


sucedido esforço de realização dos equilíbrios sociais que viabilizam,
pela convergência de interesses esteados numa doutrina, um frentismo
conservador. A nova forma de organização social recusa as soluções
liberais, designadamente o «caos» da regulação pelo mercado, a
inversão socialista, conduzida pelo Estado totalitário, ou a deriva
anarquista, que o dispensa.
A ideia que surge é a de uma "terceira via", configurada numa
economia auto-dirigida, construída por iniciativa dos agentes
económicos que, ligados por interesses afins, realizariam, com base
nos princípios do capitalismo e numa regulação corporativa, um
desenvolvimento «harmónico e prudente», conciliador dos diferentes
interesses económicos (agrícolas, industriais e comerciais), sociais (de
produtores e consumidores) e laborais (de patrões e operários), assente
em novas solidariedades alheias à luta de classes.
Contudo, o «Estado forte» , a quem competiria um papel
moderador, não consegue convocar os agentes económicos, acabando
o desejado corporativismo de associação por ser moldado por uma
crescente intervenção do Estado, desde a formação das instituições
corporativas - grémios, sindicatos, etc - e dos organismos de
intervenção económica à regulação do seu funcionamento e criação de
mecanismos de intervenção na sua esfera de acção decisória, como
sucede com os preços, salários ou o condicionamento industrial.

J15
O corporativismo de associação transforma-se, de facto, em
corporativismo de Estado, que às corporações deixa apenas a função
de dar pareceres.

António de Oliveira Salazar, com ideias claras e conhecidas,


após campanha pública divulgada pela imprensa conservadora,
nomeadamente Novidades e Diário da Manhã, torna-se Ministro das
Finanças. Na tomada de posse, em 27.04.1928, deixa a certeza da sua
determinação e a convicção de que a hesitante Ditadura militar tinha
encontrado o timoneiro: "Sei muito bem o que quero e para onde vou,
mas não se me exija que chegue ao fim em poucos meses. No mais
que o País estude, represente, reclame, discuta, mas que obedeça
quando se chegar à altura de mandar".1

A acção do ministro vai desenvolver-se de acordo com o seu


pensamento económico, cujo pragmatismo lhe permite alguma
maleabilidade, de acordo com as «circunstâncias correntes», em torno
de um núcleo de princípios, historicamente situados e repetidamente
afirmados: a estabilidade monetária; o equilíbrio orçamental; o
fomento e valorização de recursos nacionais, incluindo, naturalmente,
o império colonial; a defesa do nacionalismo económico, de carácter
autárcico, face à depressão, e mais liberal, em sintonia com a realidade
do pós-guerra.

A exaltação do ruralismo, um dos tópicos mais propalados do


regime, não deriva apenas de uma idiossincrasia confessada, mas da
convicção de que o Portugal da vinha e da oliveira, das «flores
preciosas» e dos «frutos magníficos» poderia ainda transformar-se no
«pomar» e «horta da Europa». Para isso tornava-se indispensável que
a terra fosse «fecundada pelo trabalho e pelo capital», o agricultor
instruído, criada «uma classe agrícola forte, bem construída, ilustrada,

João Medina, História Contemporânea de Portugal. Estado Novo, Vol. I, Multilar,


1990, p. 13

116
e consciente da sua missão» - sem esquecer a resolução dos problemas
da comercialização e do transporte dos produtos agrícolas.
A indústria, «dada a patente inferioridade do nosso meio»,
apenas poderia aspirar à conquista do mercado nacional.
A diminuição do consumo interno, com elevada repercussão nas
importações, pode conseguir-se pela transformação da pobreza e da
abstinência em princípios enformadores do comportamento
económico.
A redução do défice público, que considera «um problema
politicamente insolúvel», passa pela contracção das despesas
públicas.2

A Nova Ordem afirma-se sob o signo do rigor, da disciplina e da


racionalidade, ideias que deixam entrever uma atitude científica, face
à organização do Estado corporativo.

O sector industrialista da sociedade portuguesa, protagonizado


pelos engenheiros, imbuído de um nacionalismo modernizante, que no
dealbar da década de 30 consegue antecipar um quadro teórico de
desenvolvimento industrial em ruptura com a ideologia ruralista
tradicional e os interesses financeiros e comerciais, aponta a linha de
rumo no Congresso Nacional de Engenharia de 1931: « Contam-se,
afirma Joaquim Taveira, como actividades economicamente distintas,
a agricultura, a indústria e o comércio. O poder resultante da sua
exploração está actualmente nas mãos de agricultores, industriais e
comerciantes. O primeiro passo na racionalização deverá ser a
transferência desse poder económico para os agrónomos, engenheiros
e comercialistas»3

José M. Brandão de Brito, Sobre as Ideias Económicas de Salazar, apud AAVV,


Salazar e o Salazarismo, Lisboa, Publ. D. Quixote, 1989, pp. 48.
Joaquim Taveira, A Engenharia Portuguesa Face à Racionalização da Indústria,
Separata do n.° 671 da Revista da Associação dos Engenheiros Civis Portugueses,
Porto, 1931, pág. 25, apud José Maria Brandão de Brito, Os Engenheiros e o
Pensamento Económico do Estado Novo, in AAVV, Contribuições Para a História
do Pensamento Económico em Portugal, Publ. D. Quixote, 1988, p. 219

117
O Governo, mais do que os agentes económicos de um arcaico
tecido empresarial, acolhe estas sugestões, que se repercutem
claramente na reorganização administrativa do Estado.

2. CONTABILIDADE E PRIORIDADES ESTRATÉGICAS

O pensamento económico do estratego do Estado Novo aparece


balizado por quatro princípios nucleares: equilíbrio financeiro, moeda
forte, fomento e nacionalismo económico.
A estabilização financeira e monetária assume um carácter
prioritário.
O projecto de reorganização das finanças públicas assenta em
quatro pilares: a reforma do orçamento, a reforma da Contabilidade
pública, a reforma fiscal e a reforma do tribunal de contas - além de
outras iniciativas de menor alcance.

A Contabilidade, enquanto sistema científico de informação da


realidade económica, não pode deixar de assumir um papel de relevo
no desenvolvimento do projecto corporativo, que alinha o saneamento
financeiro como prioridade estratégica do ressurgimento nacional

O novo ordenamento financeiro revela, para além dos


dispositivos técnicos e dos princípios orientadores, o propósito de
disciplinar as contas do Estado, facto que realça o valor da
Contabilidade na reorganização das finanças públicas do Estado
Novo.

2.1. A REFORMA DO ORÇAMENTO

A organização do orçamento, de acordo com o princípio da


universalidade, assenta num plano financeiro anual que integra todos
os organismos do Estado, mesmo os dotados de autonomia
administrativa, com excepção das instituições bancárias. Todas as
despesas públicas ficam sob controlo absoluto do Ministro das
Finanças, que o exerce através das suas delegações da Contabilidade

118
pública, encravadas nos diferentes ministérios. O controlo efectivo dos
orçamentos dos diferentes ministérios e o veto inicial do ministro das
finanças a qualquer aumento do gasto público inaugura formalmente a
denominada "ditadura financeira".

O rigor orçamental, reforçado ao nível da execução do


orçamento, tem como objectivo fundamental realizar o equilíbrio
financeiro, com base na contracção das despesas, sem deixar de
realizar as obras de fomento consideradas indispensáveis. É o núcleo
da economia clássica, que tudo sacrifica ao equilíbrio orçamental, a
cujos princípios Salazar adere, sem lhe aceitar os pressupostos
liberais, e que já definira de uma forma simples antes de chegar ao
poder: «gastar bem o que se possui e não despender mais do que os
próprios recursos» 4
A reconstituição financeira, apoiada na abolição do défice
orçamental a partir da gerência de 1928-295, culmina, em 1931, com a
adesão do escudo ao padrão divisas ouro e a sua consequente ligação à
libra e ao dólar, com o câmbio fixo de 1 £ (= 110$00). - , paridade
insustentável no contexto de uma incontornável política inflacionista,
patente no, embora diminuto, saldo negativo de 1932/33. 6

4
José M.Brandão de Brito, Sobre as Ideias Económicas de Salazar, in AAVV,
Salazar e o Salazarismo, Lisboa, Publ. D. Quixote, 1989, p. 51.
Salazar redefiniu a ideia de equilíbrio com base no conceito de equilíbrio do
orçamento ordinário, pois os financiamentos públicos destinados a despesas
extraordinárias não afectavam esse equilíbrio, mas apenas o do orçamento
extraordinário. Este critério administrativo, utilizado ao arrepio da prática de vários
países e da óptica corrente da Contabilidade Nacional, constitui um artifício que,
dispensável na década de 30, dado o equilíbrio efectivo por qualquer dos métodos,
vai funcionar posteriormente ao serviço da intangibilidade do mito psicológico do
equilíbrio orçamental.(cf. Sousa Franco, o. c.)
6
Decreto n.° 19.869, de 9 de Julho 1931, in Joel Serrão e A.H.de Oliveira Marques,
(Dir. de) Nova História de Portugal, Vol. XII, apud Fernando Rosas (Coord, de),
Portugal e o Estado Novo (1930-1960), Lisboa, Ed. Presença, p. 311 e ss. Por razões
que se prendem com a estrutura da economia portuguesa, em 1931 há reflexos da
crise e em 32 já ocorrem sinais de recuperação.

119
2.2. A R E F O R M A F I S C A L

A reforma fiscal (1928-29) 7 , após a recusa das condições lesivas


da soberania nacional de um empréstimo externo negociado à sombra
da Sociedade das Nações, exibe as marcas do agravamento de
impostos que, com as repercussões da depressão mundial dos anos 30
- com reflexos visíveis em 1931 - impõe austeridade - esse «calvário,
onde se redimem os homens e salvam as pátrias».
As mudanças fiscais de 29 constituem um recuo face à
orientação modernizadora ensaiada pela reforma de 1922., mas
conduzem ao almejado aumento de receitas, saído do imposto de
salvação pública sobre os rendimentos dos funcionários públicos, de
uma taxa de salvação nacional incidente sobre alguns bens de
consumo (açúcar, gasolina, óleos minerais leves importados), de
novas tarifas aduaneiras e do aumento das taxas de outros impostos.

A nova estrutura dos impostos, sem ser "inovadora", é


"disciplinadora": o imposto pessoal de rendimento dá lugar ao
imposto complementar sobreposto a um conjunto de impostos; a
tributação sobre o rendimento real e progressivo vai agora incidir
sobre o rendimento normal, "estimulando assim a remoção do imposto
pelos contribuintes mais dinâmicos"; é criado o imposto profissional,
que incide sobre os salários e os rendimentos das profissões liberais;
as contribuições predial e industrial são alteradas; a sisa e o imposto
sobre sucessões e doações tornam-se autónomos; o imposto de

7
Decretos com força de lei: 15.289 e 15.290, de 30/03/28; n.° 15.466, de 14/05/28;
n.° 15.814, de 04/07/28 e n.° 16.371, de 13/04/29.
8
Joel Serrão e A.H.de Oliveira Marques, (Dir. de) Nova História de PortugafVol.
XII, apud Fernando Rosas (Coord, de), Portugal e o Estado Novo (1930-1960),
Lisboa, Ed. Presença, p. 310.

120
transacções é abolido e, num esforço de racionalização, uma série de
taxas e adicionais são absorvidos pelos impostos principais.

A reforma fiscal, de acordo com Sousa Franco, que nos vem


informando, propõe-se, em obediência aos "princípios gerais do
pensamento financeiro clássico ortodoxo, /.../ evitar que os impostos
fossem excessivos e visava dotar o sistema de regularidade e
simplicidade" e, do ponto de vista social, "dar certezas e tranquilizar
os proprietários e empresários".9

2.3. REFORMA DA CONTABILIDADE PÚBLICA

A reforma da Contabilidade pública10 pretende, através de um


conjunto de normas disciplinadoras, que acentuam o centralismo, uma
visão «clara e exacta dos movimentos e resultados da administração
pública», que seja a «expressão mais perfeita da realidade financeira»

A forma como a Contabilidade, com seus defeitos e virtudes, se


adapta e enraíza comportamentos favoráveis ao centralismo adminis-
trativo, não escapa à fina observação de Salazar: «a Contabilidade é,
em todos os países, miúda, exigente, rabugenta: são as suas grandes
qualidades de zeladora dos dinheiros públicos; mas tem também uma
tendência absorcionista e centralizadora, que por vezes se manifesta
esterilizante: são os defeitos correspondentes».12
A transparência das contas públicas e a sua eficácia informativa
exigem que o orçamento e as contas sejam «enformados dos mesmos
princípios, e tanto nas receitas como nas despesas», ao mesmo tempo

António de Sousa Franco, Ensaio Sobre as Transformações Estruturais das


Finanças Públicas Portuguesas: 1900-80, in Análise Social, Vol. XVIII n ° 72-73-
74, (pp. 1105-1138), pp. 1 121-1 122.
10
Decreto n.° 18 381, de 24/ 05/1930.
Guilherme de Oliveira Martins, O Ministério das Finanças - Subsídio para a sua
História no Bicentenário de Criação da Secretaria de Estado dos Negócios
Estrangeiros, Lisboa, Ministério das Finanças, 1988, p. 206.
A Oliveira Salazar, in O Comércio Português, cit in R.C.C., n.° 41, 1942.

121
que se exige «a mesma orientação para poderem ser comparados e
poder ver-se num documento a efectivação do outro».13

O papel singular desempenhado pela Contabilidade no seio da


nova estrutura das finanças públicas torna-se bem patente na
afirmação de que: «Fracassariam os melhores esforços no sentido da
regeneração financeira, se a Contabilidade pública, clara e exacta não
traduzisse em cada momento o estado de todas as administrações».

Que as normas da Contabilidade Pública são para cumprir


comprovam-no as sanções cominadas aos funcionários faltosos, que
podem passar pela perda do lugar e incapacitar para o exercício da
função pública. A sua importância confere-lhe honras constitucionais
no diploma fundador do Estado Novo.(C.P., 1933, An. 115)

2.4. REFORMA DO TRIBUNAL DE CONTAS

O órgão supremo de fiscalização das contas retoma o nome de


Tribunal de contas15, denominação em vigor desde 1849-1911, que
sucede ao Conselho Superior de Finanças. A nova instituição, despida
de qualquer função consultiva, aliás secundária, torna-se num
autêntico tribunal que faz o julgamento das contas e verifica - outra
forma de julgar - a sua conformidade com a lei através do visto
prévio, cuja recusa apenas pode ser alterada por decisão fundamentada
do Conselho de ministros.16

13
Guilherme de Oliveira Martins, O Ministério das Finanças - Subsídio para a sua
História no Bicentenário de Criação da Secretaria de Estado dos Negócios
Estrangeiros, Lisboa, Ministério das Finanças, 1988, p. 206; Alberto Santareno,
Crónica da Contabilidade Pública Portuguesa, Ed. do autor, 1997, p. 12. Trata-se do
pseudónimo e do trabalho vencedores do 2o Prémio História da Contabilidade,
atribuído pelo CE.H.C.
14
Rei. do D.L.18.381, de 24 de Maio 30. in RCC, n.° 21, 1938,p. 26.
15
Decreto n.° 18 962, de 25/10/1930.
16
Guilherme de Oliveira Martins, O Ministério das Finanças - Subsídio para a sua
História no Bicentenário de Criação da Secretaria de Estado dos Negócios
Estrangeiros, Lisboa, Ministério das Finanças, 1988, p. 207.

122
O Tribunal de contas abandona a representação parlamentar e
das associações económicas para se tornar numa instância
eminentemente técnica e independente, estatuto bem visível na sua
composição - um presidente e oito vogais, cuja formação passava pelo
Direito (4), Ciências Económicas, Contabilidade ou altos funcionários
(2) e representantes do Ministério da Guerra (1) e da Marinha (1),
sendo estes dois de nomeação temporária (5 anos) e os restantes de
nomeação definitiva - , embora a designação pelo ministro das
Finanças dos vogais vitalícios denuncie a sua governamentalização em
prejuízo da democraticidade. 17

Merecem, ainda, referência, no âmbito da política financeira do


Estado Novo duas inovações institucionais: criação da Inspecção
Geral das Finanças e alterações na Caixa Geral de Depósitos que,
acolhendo, com elevado grau de autonomia, a Caixa Nacional de
Crédito e a Caixa Nacional de Previdência, se transforma num
desenvolto instrumento de política económica. 18

2.5. As FINANÇAS E A CONTABILIDADE NA CONSOLIDAÇÃO DO


REGIME

A estruturação financeira toma-se o eixo de toda a


administração pública, facto que o seu próprio arquitecto reconhece ao
considerá-la «o ponto de partida de toda a reforma administrativa»
(Discursos, Vol. III)).

No seio da turbulência provocada pela orientação subjacente às


reformas estruturais das finanças públicas, Salazar torna-se
imprescindível no seio do governo. Assim pensa o chefe do Estado
que, numa remodelação governamental, sacrifica o presidente do

António de Sousa Franco, Tribunal de Contas, apud Fernando Rosas e J. M.


Brandão de Brito (Dir. de), Dicionário de História do Estado Novo, Vol. II, Lisboa,
Círculo de Leitores, 1996, p. 980.
18
Jaime Reis, A Caixa Geral de Depósitos como Instrumento de Política
Económica: o Período das Duas Guerras, in Análise Social, Revista do Instituto de
Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Vol.XXXII, n.° 141, 1997, p. 255 e ss.

123
ministério, Ivens Ferraz, ao seu ministro das Finanças, cuja
personalidade, iluminada pela magia da engenharia financeira, o
impõe como estrategista da acção política até chegar a Presidente do
Conselho de Ministros (05/ 07/ 32), de onde serenamente assinala a
continuidade governativa: «Os homens são outros, o governo é o
mesmo».

A importância atribuída às disposições financeiras na


consolidação do regime pode avaliar-se pelas inúmeras disposições
com esse carácter ínsitas no Acto colonial de 1931 e na Constituição
de 33 - cerca de 4 dezenas nos dois documentos - , onde as daquele se
integram entre 1951-71.19

A centralidade do Ministério das Finanças no interior da


estrutura institucional que conduz ao saneamento financeiro permite
que a Contabilidade Pública, sedeada no seu interior e ramificada
pelos diferentes ministérios, assuma a função instrumental de fornecer
as informações indispensáveis à boa gestão da coisa pública, papel
que, a par do natural pendor centralizador da Contabilidade, a
configura como artífice primordial e sentinela privilegiada do «Estado
forte», cuja construção se acelera com o acesso de Salazar à chefia do
Governo.

A corporativização do regime leva a Contabilidade ao interior


dos organismos corporativos. Os princípios e critérios enformadores
da Contabilidade Pública são alargados aos Organismos de
Coordenação Económica, dependentes dos Ministérios do Comércio,
da Indústria e da Agricultura (1938), com o objectivo de estabelecer
«um regime administrativo uniforme» relativo ao orçamento e às
contas.

Eugenia Mata e Nuno Valério, Normas de Direito Financeiro nas Constituições


Portuguesas, in Revista de História Económica e Social, (pp. 1-22), Dir. de V. M.
Godinho, n.° 3, Sá da Costa, 1979, p. 18-20
20
Decreto-Iei n.° 29 049, Diário do Governo, Ia Série, n.° 235, de 10 de Outubro de
1938, relativo aos organismos dependentes do Ministério do Comércio e da Indústria

124
O legislador reconhece a necessidade de moldar esses princípios
«à natureza das suas funções», de forma a salvaguardar a desejada
"iniciativa" que lhes compete, devendo por isso ser «corrigidas pelas
características próprias dos referidos organismos, e adaptadas as
classificações da Contabilidade Pública à natureza especial da sua
actividade».21

As explorações fabris, para além das disposições orçamentais


exigidas, devem organizar uma Contabilidade industrial, com a
finalidade de «poder determinar convenientemente o seu rendimento
industrial».(Art.9); por outro lado, considera a possibilidade de
introduzir a Contabilidade digráfica nos «organismos, cujas funções o
exijam para perfeita apreciação da sua actividade económica e
financeira».(Art.9 § único)

A Contabilidade e a tesouraria dos organismos de coordenação


económica ficam sujeitos à Inspecção Geral de Finanças, cujas tarefas
passam pela verificação da organização da Contabilidade, do
funcionamento da tesouraria, da conformidade dos seus
procedimentos com as normas legais que regulam «a aplicação de
fundos» /.../ e «a correcta aplicação das verbas orçamentadas».
(Art. 17), além de se exigir que o relatório das visitas efectuadas
avance sugestões tendentes a melhorar o desempenho dos organismos
inspeccionados.22

e o D. L. n.° 29121, D. G. Io Série, n.° 246, de 14 de Nov. de 1938, relativo aos


organismos dependentes do Min. da Agricultura, cujo conteúdo legal se compõe
apenas de três artigos, um dos quais para aplicar as normas do anterior.
2
Preâmbulo do D. L. 23.049, de 23.9.33. Acerca do lugar dos organismos de
coordenação económica na organização corporativa portuguesa, cf., por todos, Vital
Moreira, Auto-Regulação Profissional e Administração Pública, Coimbra,
Almedina, 1997, p. 243 e ss. São considerados "elementos da administração do
Estado e não elementos da organização corporativa"(p. 244 ).
22
Decreto-lei n.° 29.214, D. G., laSérie, de 06/12/1938: regula as atribuições da
Inspecção Geral de Finanças, prolongamento do omnipresente Ministério das
Finanças.

125
O Prof. Sousa Franco, numa análise das transformações
estruturais das Finanças públicas portuguesas traduz assim o alcance
da minuciosa engenharia financeira de Salazar: "Talvez em poucos
casos no mundo o instrumento financeiro haja sido tão bem utilizado
como meio principal para a conquista do poder e o estabelecimento de
um regime de base largamente pessoal, fundado em convicções
doutrinais fortes e claras e num pragmatismo manobrador que, claro,
excedeu em muito o instrumento financeiro".23

3. REFORMA EDUCATIVA E ENSINO TÉCNICO

3.1. ENSINO TÉCNICO E MENTALIDADE SOCIAL

A recorrente questão do ensino técnico em Portugal não pode


separar-se do problema da educação e prende-se às condições gerais
da evolução da sociedade portuguesa.
A questão corre do interior do ideário republicano - que a
herdou do liberalismo oitocentista - , em consequência de uma
reflexão sobre a relação entre a educação e a modernização da
economia, cujo resultado é o reforço da ideia de que um dos factores
essenciais do desenvolvimento económico reside numa eficiente
consonância entre o ensino e o mundo do trabalho.
Os defensores da pedagogia activa esforçam-se por acordar a
sociedade portuguesa para a necessidade de "dar a todo o ensino, nos
seus diversos graus, um carácter acentuadamente profissional".

António de Sousa Franco, Ensaio Sobre as Transformações Estruturais das


Finanças Públicas Portuguesas: 1900-80, in Análise Social, Dir. de A. Sedas Nunes,
Vol. XVIII, n.° 72-73-74, (pp. 1105- 1138), pp. 1119-1120.
24
Adolfo Lima, Orientação Geral da Educação, Sep. da Revista de Educação Geral e
Técnica, série V, 1 e 2, Outubro, 1916, p. 53, in AAVV, O Estado Novo - Das
Origens ao Fim da Autarcia, 1926-1959, Vol. II, apud Stephen R. Stoer e Helena
Costa G. Araújo, A Contribuição da Educação para a Formação do Estado Novo:
Continuidades e Rupturas, 1926-1933, p. 125.

126
O Ensino técnico - industrial e comercial - aparece como o mais
relacionado com o desenvolvimento económico, sendo-lhe cometida a
tarefa de formar «bons operários e escriturários» , enquanto o Ensino
Liceal, tal como se afirma no I Congresso de Professores de Liceu,
1927, se destina a «dispensar uma cultura geral e via de acesso à
Universidade e não a desaguar para a vida».

A ideia democratizante do ideário republicano da "escola única,


de formação integral, de cultura geral e técnica", não rompe com o
atavismo da dupla via nem com as distintas funções sociais que lhe
são atribuídas: o Liceu funciona como escola cultural e científica,
destinada às elites sociais a caminho da Universidade e dos órgãos de
cúpula da Administração pública e privada; e a Escola técnica,
vocacionada para conteúdos utilitários e funcionais, surge como
educadora das classes populares nas quais deverá desenvolver
capacidades para o desempenho eficiente de tarefas no tecido
produtivo.

Contudo, as classes populares não apreciam o modelo e deixam-


-se seduzir pela via tradicionalmente mais prestigiada - a Liceal. Um
texto legal reconhece a fuga das profissões mecânicas: «O ferreiro
quer o filho médico; o alfaiate quer o filho matemático; o carcereiro
quer o filho Juiz do Supremo; a operária quer a filha formada em
27
letras.»

25
Bento Carqueja, O Ensino Técnico Profissional em Portugal, in AAVV, O Estado
Novo - Das Origens ao Fim da Autarcia, 1926-1959, Vol. II, apud Stephen R. Stoer
e Helena Costa G. Araújo, A Contribuição da Educação para a Formação do Estado
Novo: Continuidades e Rupturas, 1926-1933, p. 132.
26
José Gomes Bento, O Movimento Sindical dos Professores, Lisboa, Ed. Caminho,
1978, p. 132, in AAVV, O Estado Novo - Das Origens ao Fim da Autarcia, 1926-
1959, Vol. II, apud Stephen R. Stoer e Helena Costa G. Araújo, A Contribuição da
Educação para a Formação do Estado Novo: Continuidades e Rupturas, 1926-1933,
p. 135.
27
Decreto-Lei de 16.01.1928. Cria, em 1928, as Escolas do Ensino Primário
Complementar - , extintas após 4 anos por falta de frequência. Apud Rómulo de
Carvalho, História do Ensino em Portugal - desde a Fundação da Nacionalidade até

127
O ensino técnico é vítima dos bloqueamentos da sociedade
portuguesa instalada na rotina, fechada à inovação e tendencialmente
suspeitosa dos cursos profissionais, cuja aprendizagem, orientada por
práticos, se fazia atavicamente através do seu exercício continuado,
sem intervenção da escola.

Gonçalves da Silva, um dos mestres da Contabilidade em


Portugal, enquanto deixa implícita uma crítica ao ensino liceal, realça
este traço da mentalidade portuguesa: «aprecia-se a literatura, a
vadiagem intelectual, o enciclopedismo superficial, e estéril. As
carreiras utilitárias são pouco procuradas e pouco consideradas. São
poucos, por exemplo, os comerciantes que têm orgulho na sua
profissão»; os agentes económicos têm ainda menos apreço pela
Escola técnica, pois «afirmam com prosápia ingénua, que os estudos
regulares não servem para nada». Os cursos profissionais, são
preteridos pelo «inveterado hábito português de julgar que um mestre
de obras é um arquitecto, de procurar o ferrador quando faz falta o
veterinário, de confundir os engenheiros com os mecânicos, de
substituir o agrónomo pelo hortelão, etc., etc.»

G. da Silva não esconde que as condições de funcionamento de


algumas escolas comerciais e industriais constituem «uma vergonha
nacional» que lhes rouba parte da sua eficiência, mas ajuíza que «os
diplomas concedidos constituem uma séria garantia de competência
que muitos comerciantes e industriais parecem ignorar». Essa
competência não tem por fundamento, «o espírito de iniciativa e o
sentimento das responsabilidades que o exercício de qualquer cargo
reclama e que só na vida prática se alcança», mas alicerça-se numa
«apreciável bagagem de conhecimentos de aplicação prática
imediata», que falta aos alunos do Liceu, «cuja cultura tem uma feição
mais desinteressada e mais geral».

ao Fim do Regime de Salazar-Caetano, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, p


731.

128
Por isso repudia a concorrência que a via liceal faz à técnica:
considera um acto de «inteligência e de justiça» escolher alunos das
escolas comerciais para empregados de escritório, pois desenvolvem
conhecimentos e capacidades para, com rapidez e eficiência, se
adaptarem à profissão, enquanto os do Liceu «Nunca ouviram falar na
função do comércio, desconhecem a utilidade do cheque, não sabem
encher uma letra, ignoram o que é um inventário, um desconto, uma
consignação, etc.».

Fazendo eco de uma «campanha brilhante e vigorosa»,


desencadeada em defesa do Ensino Técnico, deixa a convicção
claramente expressa de que nele reside a « condição sine qua non do
progresso do país». A «valorização do património português» e o
«racional aproveitamento das riquezas nacionais», um dos
confessados obiectivos do Estado Novo, não se fará, reitera, sem o seu
28
desenvolvimento e aperfeiçoamento.

3.2. CARACTERÍSTICAS DA POLÍTICA EDUCATIVA

A reorganização do Ensino, em consonância com o pensamento


pedagógico prevalecente no Estado Novo, apesar das indefinições
inerentes à mudança de regime, inicia-se logo após o golpe militar,
mas a personalidade que melhor soube encarnar as novas orientações
foi um Professor da Faculdade de Letras de Lisboa, várias vezes
ministro da Instrução Pública, Gustavo Cordeiro Ramos, que
acompanhou Salazar enquanto Ministro das Finanças e fez parte de
dois dos Governos por si presididos, antes e após, embora por pouco

F.V.Gonçalves da Silva, A Questão do Ensino Técnico, Revista de Contabilidade


e Comércio, n.° 5, 1934, p. 53-55. A referida campanha em prol da dignificação do
Ensino Técnico, a que, aliás, a Revista de Contabilidade e Comércio não fica alheia,
deve-se a Beirão da Veiga, no Diário de Notícias.

129
tempo, a implantação formal do Regime meticulosamente rendilhado
pelo seu Presidente do Conselho de Ministros.29
A política educativa que vai enformar a acção de Cordeiro
Ramos organiza-se em torno de uma tripla orientação: restritiva,
repressiva e nacional.

3.2.1. A POLÍTICA RESTRITIVA E O ENSINO COMERCIAL

Não é fácil, sob o signo da depressão económica que avassala o


mundo, conciliar a inevitável contracção de investimentos, com uma
política de expansão do ensino. Contudo, e talvez o mais grave, a
política restritiva tem suporte intelectual na corrente conservadora da
sociedade portuguesa, que não consegue distinguir o que na tradição
deve ser mantido e revolvido. A sua visão distorcida não lhe permite
compreender o alcance modernizador da educação, sem a qual não há
futuro nem tradição.
Ouçamos algumas afirmações precursoras, que começam a
toldar o horizonte: a escritora Virgínia Castro e Almeida afirmava em
O Século que «A parte mais linda, mais forte e mais saudável da alma
portuguesa reside nesses 75% (de acordo com as estatísticas um pouco
menos) de analfabetos»; o Conde de Aurora, figura sonante do meio
social, proclamava a felicidade dos ignorantes: «Felizes aqueles que
não sabem 1er!»; e João Ameal, escritor e historiador, exarava nos
seus escritos que as escolas não faziam falta, pois «Ensinar a 1er é
corromper o atavismo da raça».31

Rómulo de Carvalho, História do Ensino em Portugal - desde a Fundação da


Nacionalidade até ao Fim do Regime de Salazar-Caetano, Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, fonte de informação indispensável, assinala, pág. 818, que G.
Cordeiro Ramos esteve no Governo, como M.I.P. nos seguintes anos: 10.11.28 a
8.07.1929 e de 21.01.30 a 24.07.33, ao longo de três governos.
J. M. Brandão de Brito (Dir. de), Dicionário de História do Estado Novo, Vol. I,
Lisboa, Círculo de Leitores, 1996, p. 303. Nesta obra se informa o seguinte acerca
da percentagem de analfabetos: em 1920, 66,2%; 1930, 61,8% e 1940,49%.
Rómulo de Carvalho, História do Ensino em Portugal - desde a Fundação da
Nacionalidade até ao Fim do Regime de Salazar-Caetano, Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, p. 726-727.

130
A política restritiva promove a redução do ensino obrigatório, a
desvalorização do ensino primário e dos programas, que se confinam
ao «saber 1er, escrever e contar», a diminuição da formação científica
dos professores, com a criação dos postos escolares e seus regentes,
docentes aos quais apenas se exige a 4a classe e «idoneidade moral e
intelectual»32.
A luta contra o analfabetismo, uma das prioridades da
República, continua com a criação de cursos nocturnos para adultos,
mas imbuída de um novo sentido que é abrir as consciências aos
valores da escola nacional.

A contenção de investimentos não impede a reorganização


global de todos os níveis de ensino e uma expansão horizontal
cautelosa, embora o esforço mais significativo, público e privado -
mais este que aquele - se tenha orientado para o ensino secundário,
nomeadamente o Liceal.

O ensino técnico profissional, considerado parte integrante do


programa de «fomento económico» merece desvelada atenção. A nova
filosofia de acção acentua-lhe o carácter profissional, com base numa
correcta definição dos ofícios e dos correspondentes conteúdos
programáticos que, apesar de simplificados e reduzidos, integram duas
componentes - a disciplinar e a oficinal - e uma orientação regional,
consubstanciada na adaptação dos mesmos ao grau de complexidade
das tarefas exigidas aos operários e empregados pelo mercado do
trabalho local.33
As saídas profissionais para os indivíduos habilitados com o
Curso das Escolas de Comércio ficam assim consagradas no diploma
que o reorganiza, sendo-lhes concedido o direito de concorrer para as

Maria Cândida Proença, Gustavo Cordeiro Ramos, in J. M. Brandão de Brito (Dir.


de), Dicionário de História do Estado Novo, Vol. II, Lisboa, Círculo de Leitores,
1996, p. 813
33
J. Veríssimo Serrão, História de Portugal (1926-1935), Vol. XIII, Lisboa, Ed.
Verbo, s/d., p. 615.

131
seguintes funções: aspirantes de finanças, escrivães e contadores,
secretarias de corpos administrativos e preferência para os serviços
de secretaria dos estabelecimentos de ensino.

O reclamado livro do aluno, elaborado de acordo com os


programas definidos oficialmente, aparece no Ensino Técnico. As
vantagens trazidas ao ensino pelo manual permitem ensaiar um
instrumento privilegiado de controlo e orientação dos conteúdos
pedagógicos - o livro único.

O Ensino Médio é submetido a algumas medidas de


racionalização: os Institutos Industriais e Comerciais de Lisboa e
Porto são desdobrados de acordo com a sua especialidade e, em cada
uma das cidades, surgem dois novos Institutos - o Instituto Industrial
e o Instituto Comercial - , mas o de Coimbra desaparece.

A reorganização do Ensino Médio Comercial assenta em razões


de natureza funcional, bem patentes no preâmbulo do Decreto-Lei 20
328, de 21 de Setembro de 1931: « As realizações industriais e
comerciais compreendem, nas múltiplas modalidades da sua
actividade, funções distintas para as quais se torna necessário preparar
mentalidades e competências adequadas»
O documento que cria o Curso de Contabilista escolhe para o
seu diplomado uma denominação que substitui a «inexpressiva » de
Curso Médio do Comércio - designação que vinha da reforma de
Azevedo Neves - , com a finalidade de lhe fixar «funções técnicas
perfeitamente definidas e absolutamente inconfundíveis».

As razões invocadas para a mudança demonstram que a reforma


tem por objectivo valorizar a actividade do profissional da
Contabilidade: « um título profissional impreciso e incaracterístico,
esclarece, acarreta inconvenientes para o equilíbrio geral e não menos
prejuízos para os diplomados /.../ Importa mais do que tudo que ele
aponte à consideração de todos a posição oficialmente reconhecida do

132
profissional por uma designação a que a sociedade atribua o merecido
e justo valor».34

O plano do Curso de Contabilidade consignado na reforma de


Cordeiro Ramos duplica as cadeiras existentes; às duas de
Contabilidade Geral e Contabilidade Aplicada sucedem as quatro de
Contabilidade Geral, a Contabilidade Industrial e Agrícola,
Operações Bancárias e sua Contabilidade e Instituições de
Previdência - sua Contabilidade.35

O diplomado com o Curso de Contabilista fica habilitado para


exercer as seguintes funções: Perito Contabilista dos Tribunais de
Comércio; Chefe de Contabilidade dos estabelecimentos fabris do
Estado e de empresas industriais e comerciais; Administrador de
falências - concessão que não ultrapassa o ano de 1935, data da
publicação do Código de Falências, que exige a Licenciatura em
cursos afins; Serviços de fiscalização e de comissários de contas em
empresas industriais e comerciais que viessem a ser criados.36

A reforma manteve a possibilidade de os dois primeiros anos do


curso concederem habilitação ao concurso de acesso ao Instituto
Superior de Ciências Económicas e Financeiras e aos Cursos de
Administração Militar e Naval; por outro lado esta habilitação fica
equiparada, para efeitos de concurso a lugares de administração
pública, à secção de Ciências do 7°ano do Ensino Liceal.

Cordeiro Ramos deixa o seu nome ligado a duas importantes


Instituições: a Universidade Técnica de Lisboa, configurada a partir de

O Decreto Lei n.° 20.328 de 21 de Setembro de 1931 é publicado com


rectificações no Diário do Governo de 15.10.1931, apud Francisco Xavier Antunes,
O Instituto Comercial de Lisboa, in Revista de Contabilidade e Comércio, Porto, n.°
27, 1939, p. 322.
" Eduardo Maria Baptista de Oliveira, Evolução do Ensino Técnico Comercial em
Portugal, in R.C.C., n.° 57, 1957, p. 69-70.
36
D. L. 20.804, de 22.01.1932: Regulamento do Instituto Comercial de Lisboa,
aplicado ao do Porto.

133
Escolas já existentes - os Institutos Superiores de Agronomia, de
Comércio, Técnico e a Escola Superior de Veterinária - e a Junta
Nacional de Investigação Científica.

O documento fundador da Universidade Técnica de Lisboa


comete-lhe o objectivo social de ensinar, ao mesmo nível que o fazem
as Universidades clássicas, «como se devem desenvolver a vida
económica, com todas as exigências da civilização moderna»,
considerando que «o ensino superior nas suas relações com a
agricultura, comércio e indústria é de interesse imediato para o
desenvolvimento da unidade económica nacional»37

O Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras


organiza as disciplinas de Contabilidade pelas 4 secções da seguinte
forma:
Secção Aduaneira (2) - Operações Comerciais. Contabilidade
Geral; e Contabilidade Pública e Administrativa;
Secção Diplomática e Consular (1) - Operações Comerciais.
Contabilidade Geral;
Secção de Finanças (3) - Operações Comerciais. Contabilidade
Geral; Contabilidade Industrial; e Contabilidade Pública e
Administrativa;
Secção de Administração Comercial (3) - Operações
Comerciais. Contabilidade Geral; Contabilidade Industrial e Agrícola;
e Contabilidade Pública e Administrativa

O curriculum contabilístico, onde se insere a cadeira de


Contabilidade Pública e Administrativa, que, aliás, não existe nos
Institutos de Comércio, viabiliza funcionalmente o Instituto como
escola de elite destinada aos altos cargos da Administração Pública,
cuja reforma está em curso.

Preâmbulo do Decreto n.° 19.081, de 2.12.1930, apud Veríssimo Serrão, História


de Portugal (1926-1935), Vol. XIII, Lisboa, Ed. Verbo, s/d., p. 620

134
A Junta Nacional de investigação Científica, que por razões de
eficiência e utilidade surge autónoma das Escolas e de outros
estabelecimentos de investigação existentes, recebe a incumbência de
desenvolver uma actividade de coordenação «que metodicamente
proteja, alargue e coordene a nossa actividade intelectual».

As razões aduzidas para a sua criação exprimem uma


consciência aguda da importância da investigação científica para
«fortalecer a cultura científica, factor proeminente da riqueza e da
força de um país, pela sua importância na formação da mentalidade
social e pela sua influência na preparação profissional e na valorização
património comum».38

A Junta reúne uma elite de personalidades intelectuais de


reconhecidos méritos em diferentes áreas do saber, dispostas a
dinamizar a investigação científica. Foi adoptada uma das tradicionais
medidas, preconizada no documento fundador, de preparação e
valorização do pessoal docente, com a escolha de bolseiros a enviar
para os centros de investigação europeus.39

Contudo, é este governante, construtor da identidade profissio-


nal do contabilista e aberto à compreensão da importância da técnica e
da investigação científica para a modernização do país, que vai,
alegando dificuldades orçamentais, espoliar a cidade do Porto - que já
o fora da sua Faculdade de Letras, em 1928-30 - do seu Instituto
Superior de Comércio.

" Preâmbulo do Decreto n.° 16.381, de 16 de Janeiro 1929, apud J. Veríssimo


Serrão, História de Portugal (1926-1935), Vol. XIII, Lisboa, Ed. Verbo, s/d., p. 616.
De acordo com as informações colhidas em J. V. Serrão, o. c , nenhum dos
elementos da Junta e nenhum dos bolseiros pertence a áreas relacionadas com o
comércio.

135
3.2.2. CENTRALISMO E REPRESSÃO

O centralismo administrativo de carácter repressivo está patente


no controlo exercido sobre os Reitores e vice-Reitores dos Liceus e os
professores e alunos de todas as Escolas dependentes do Ministério da
Instrução Pública.
Os Reitores e vice-Reitores, escolhidos de entre os professores
efectivos, são de nomeação governamental e não podem recusar.

Os professores do ensino secundário, enquanto se aguarda o


modelo ideal de nomeação - que seria o de os Reitores escolherem os
seus colaboradore - , ficam impedidos de realizar qualquer acção,
dentro ou fora da sala de aula, na sua zona pedagógica, que prejudique
a «direcção dos serviços escolares ou o aproveitamento pedagógico
dos alunos», sob pena de, por simples despacho do Ministério da
Instrução Pública, atraírem sanções, que podem ir até à suspensão por
180 dias.

Os alunos de todas as escolas, excepto os das primárias, são


afectados por inúmeras acções disciplinares, que podem ir até à
expulsão «definitiva de todas as escolas nacionais». O decreto
sancionatório define como infracção disciplinar «a prática de actos de
manifesta hostilidade contra o Poder Executivo», sendo as penas mais
graves aplicadas a actos como «a insubordinação grave, desrespeito ao
Presidente da República, aos membros do Poder Executivo e
propaganda de ideias dissolventes».

3.2.3. A EDUCAÇÃO NACIONAL

A feição nacionalista da educação manifesta-se através de uma


pedagogia que aproveita todas as possibilidades de socialização do
ensino para enraizar no educando os valores consubstanciados numa

40
Rómulo de Carvalho, História do Ensino em Portugal - desde a Fundação da
Nacionalidade até ao Fim do Regime de Salazar-Caetano, Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, p. 741 e ss.

136
ideologia de exaltação patriótica, elaborada em torno do passado e do
presente, e numa doutrina moral assente na ética cristã e na filosofia
social das encíclicas papais.
A Escola inculcadora de sentimentos nacionalistas e místicos
satisfaz-se com o mínimo de instrução e acentua a vertente moral e
religiosa, torna-se mais formadora da personalidade que informadora
das inteligências; não visa a inserção na realidade social para a
transformar, deseja adaptar-se ao meio para melhor conservar os
valores tidos por intemporais; não projecta a subversão da realidade
económica e social, pretende responder à procura social de educação e
controlar o sentido das novas solidariedades e o ritmo das
transformações sociais.

Os conteúdos programáticos mais sensíveis da escola nacional,


como a disciplina de História, têm de se conformar com a «exactidão
de doutrinas». O Estado, pela acção do governo, invoca a sua
legitimidade para orientar o ensino da História, pois lhe compete
definir «a verdade nacional», isto é, "aquela que convém à nação» que
é a que justifica e glorifica o passado de Portugal, com o objectivo de
fortalecer os valores sociais considerados fundamentais: «a família, a
fé, o princípio da autoridade, a firmeza do governo, o respeito da
hierarquia e a cultura literária e científica».41

3.3. «A OFENSIVA PELA EDUCAÇÃO NACIONAL»

A política educativa, com a consolidação formal do regime,


reflecte a agudização do centralismo repressivo sobre as instituições e'
os cidadãos.
O contexto internacional favorece o desencadear de acções
persecutórias: o fascismo italiano está instalado, Hitler, no poder
desde 1933, denuncia , em 1935, o Tratado de Versalhes, facto que
prenuncia um novo conflito mundial, preludiado, em 1936, na Guerra

Rómulo de Carvalho, História do Ensino em Portugal - desde a Fundação da


Nacionalidade até ao Fim do Regime de Salazar-Caetano, Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian, p. 744.

137
Civil de Espanha. A vida nacional fica assinalada com o crescente
reforço do poder de Salazar: a institucionalização da normalidade
constitucional dá-lhe a Presidência do Conselho, que acumula com as
pastas das Finanças e da Guerra, e consagra o trajecto do político e do
doutrinador, cujos Discursos, pronunciados nas mais variadas
circunstâncias da vida nacional, fornecem o modelo de todo o
comportamento individual e social.

Salazar declara guerra ao comunismo que «tende à subversão de


tudo e na sua fúria não distingue o erro e a verdade, o bem e o mal a
justiça e injustiça».
O campo de batalha escolhido só podia ser a Escola, onde se
ganha ou perde o futuro. «Nós não compreenderíamos - nós não
poderíamos consentir - que a escola portuguesa fosse neutra neste
pleito /.../. Por mais longe que vá a tolerância perante as divergências
doutrinais que em muitos pontos dividem os homens, nós somos
obrigados a dizer que não reconhecemos liberdade contra a Nação,
contra o bem comum, contra a família, contra a moral».

O ano de 1935 - D. L. n° 25.317, de 13 de Maio - marca o início


de um processo repressivo dirigido aos opositores do Regime. Todos
os que pudessem ser acusados de «oposição aos princípios
fundamentais da Constituição Política» ou de não darem «garantia de
cooperar na realização dos fins superiores do Estado» podiam ser
afastados da função pública ou impedidos de nela entrar.
Seguidamente veio a obrigação de declarar distanciamento de todas as
associações ou institutos secretos e, finalmente, o compromisso
oficialmente declarado, de agir sempre «com claro repúdio do
comunismo e de todas as ideias subversivas».

42
Discurso de 28.01.1934, in Rómulo de Carvalho, História do Ensino em Portugal
- desde a Fundação da Nacionalidade até ao Fim do Regime de Salazar-Caetano,
Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, p. 724.
43
Idem, ibidem, (cit.in) p. 751-752.
Esta legislação foi assinada em Conselho de Ministros, sendo Ministro Eusébio
Tamagnini, o 3o a sobraçar a pasta da Instrução Pública, após a saída de G. Cordeiro

138
Neste clima de suspeição, a Universidade portuguesa perde
alguns dos seus melhores valores e o regime encontra, finalmente, o
intérprete fiel do pensamento de Salazar, António Faria Carneiro
Pacheco, ministro desde 18.01.36 a 09.03.39.
O novo ministro, em tom crítico e decidido afirma «que não se
fez ainda obra de conjunto com espírito de sistema; e, por isso, a
restauração nacional, nesta matéria, vai ainda muito atrasada /.../ É
costume dizer-se que quem ocupa um posto ministerial vem render a
guarda. Eu não venho render a guarda ! Venho tomar a ofensiva.
Dirigir a ofensiva do Estado Novo pela educação nacional».44
Em 11 de Abril de 1936, a «Remodelação do Ministério da
Instrução Pública», promulgada em nome da Assembleia da
República, fixa as Bases de uma orientação precisa, retomando de
uma forma sistemática, sem rupturas, a obra já iniciada, de forma a
aprofundá-la e a transformá-la num todo coerente.
A nova denominação do ministério - Ministério da Educação
Nacional - aponta o sentido da reorganização da educação inscrito na
Lei de Bases e no pensamento pedagógico em consonância com as
linhas de força do Estado Novo: a formação das consciências tem
prioridade sobre a transmissão de conhecimentos.

A realização dos objectivos educacionais da escola nacional e


cristã passa pela criação de instituições capazes de enquadrar a
juventude - Mocidade Portuguesa (19.05.1936), Obra das Mães para a
Educação Nacional (15.08.1936), Legião Portuguesa (30.09.1936), e,
finalmente, a Mocidade Portuguesa Feminina (08.12.1937) - , cujos
regulamentos denotam a preocupação de disciplinar corpos e
consciências e de moldar o carácter e a personalidade com os valores
inscritos na ideologia política e doutrinal do Estado Novo.

Ramos, demitido poucos meses depois de Salazar ter ocupado a Presidência do


Conselho de Ministros.
44
António Nóvoa, Educação Nacional, apud J. M. Brandão de Brito (Dir. de),
Dicionário de História do Estado Novo, Vol. I, Lisboa, Círculo de Leitores, 1996, p.
286 e ss.

139
A reorganização do ensino matizou o discurso político de
dúvidas e incertezas acerca do valor da instrução das massas
populares, vingando a tese de que a Escola Primária «devia ensinar
pouco e o mais chãmente possível» e que «fazer o ensino primário por
meio de agentes altamente intelectualizados tem inconvenientes
gravíssimos».
Este receio conduz, de acordo com a política de instrução
mínima e da desprofissionalização da actividade educativa, ao
alargamento dos postos de ensino e à cuidada elaboração do livro
único capaz de interiorizar uma mentalidade de feiçã nacionalista e
cristã.

O próprio Salazar avançara a sua opinião sobre a questão do


ensino das massas populares: «Considero /.../mais urgente a
constituição de vastas elites do que ensinar o povo a 1er. É que os
grandes problemas nacionais têm de ser resolvidos não pelo povo, mas
pelas elites enquadrando as massas».

A reforma do Ensino Liceal, orientada para o «desenvolvimento


harmónico da personalidade moral, intelectual e física dos
Portugueses», atribui-lhe «uma finalidade específica» mais ampla do
que preparar para acesso à Universidade: compete-lhe dotar os
Portugueses de «uma cultura geral útil para a vida».

A novidade maior, como a classifica o próprio preâmbulo do


decreto reformador, consiste na substituição do regime de classes pelo
de disciplinas, cuja implantação, sem outras medidas complementares,
desencadeia uma perniciosa desarticulação de conhecimentos. Os
conteúdos programáticos, com reforçada componente ideológica,
tornam-se mais simples, os exames menos exigentes e a avaliação,
face ao insucesso escolar, sofre correcções administrativas.
O número de escolas de todos os níveis de ensino e a sua
frequência aumenta, mas a qualidade do ensino degrada-se. A

' Maria Filomena Mónica, Educação e Sociedade no Portugal de Salazar, Lisboa,


Ed. Presença, 1978, p. 116.

140
actividade pedagógica é canalizada para objectivos ideológicos
considerados fundamentais, como o culto dos heróis, a exaltação dos
feitos valorosos do passado - os Descobrimentos, a missão
colonizadora, o império - , os valores considerados atemporais, como
Deus, Pátria e Família, sem esquecer as realizações do Estado Novo.

A compartimentação do ensino, que separa sexos, pelo repúdio


da coeducação, e grupos sociais, pela manutenção das duas vias de
ensino - liceal e técnica - permanece e torna-se um factor visível de
ajustamento funcional do ensino às concepções ideológicas do Estado
Novo: o prestígio do lar e da família exigem que a futura mãe tenha
uma educação de acordo com «a missão natural da mulher», enquanto
escola técnica condiciona as expectativas das classes populares que
mais dificilmente poderão aspirar a cargos dirigentes.

Não deixa de ser significativo que, estando o Estado Novo


comprometido com o ressurgimento económico do país, o ideólogo
meticuloso da escola nacionalista e cristã, se não tenha lembrado do
ensino técnico.

Os seus sucessores, no dealbar da década de 40, vão lembrar-se


do ensino técnico para lhe reforçar os conteúdos ideológicos: é criada
a disciplina de Educação Moral e Cívica no Ensino Elementar e
Médio e a de Organização Política da Nação - Economia Corporativa,
nos Institutos Comerciais e Industriais

A Educação moral e cívica, «abrangerá o ensino da religião e


moral católica», cujo ensino se desenvolve sob os auspícios da
autoridade eclesiástica.46
A cadeira de "Organização Política - Economia Corporativa"
aparece, em substituição da cadeira de "Direito Político, Civil e
Administrativo", com a finalidade de «formar os portugueses no
espírito novo, que amanhã hão-de ocupar na vida oficial ou nas

D. L. n.° 30.665, de 23.08.1940, art. Io e 2° in R.C.C. n.° 31, 1940, p. 342.

141
actividades privadas postos de responsabilidade dirigente ou de
simples cooperação».

O legislador considera que a formação profissional, apanágio


das Escolas técnicas profissionais, «não pode prescindir da
consciência dos princípios fundamentais da política económica e da
organização jurídica, que são o alicerce e a estrutura da ordem nova
corporativa: educar, não apenas na técnica mas no espírito social,
contra o individualismo anárquico».
A forma de provimento desvela todo o rigor de controlo
ideológico do poder estabelecido: contempla o regime de contrato, por
ser o único que assegura «garantias de idoneidade profissional e
cívica» e a escolha ministerial, após consulta à Junta Nacional de
Educação.47

4. A PROFISSÃO DE CONTABILISTA

4.1. A CONDIÇÃO SOCIAL DO CONTABILISTA

A Contabilidade, na década de 30, é ensinada em três níveis


distintos: Secundário, nas Escolas técnicas, Médio, nos Institutos de
Comércio - Lisboa e Porto - , cujos diplomados são os únicos a
denominar-se Contabilistas e Universitário, no Instituto de Ciências
Económicas e Financeiras, especialmente na secção de administração,
cujos diplomados se orgulham da denominação de Comercialistas.

A Contabilidade e os seus profissionais cumprem a sua função


económica, social e cultural nos mais diversos níveis da administração
pública e privada, incluindo as colónias, nos organismos de
cooperação económica, nos organismos corporativos, etc.

O Estado Novo concede ao Contabilista um estatuto social de


classe média urbana, patente no seu nível remuneratório: os 1.500

Preâmbulo do Decreto-lei. n.° 30.673, de 23.08.1940, in R.C.C., n.° 31, 1940, p.


343-344.

142
escudos de ordenado, em 1934-35, colocam-no em igualdade de
circunstâncias com o Professor do Liceu, acima do Juiz de primeira
instância (1.300$00) e abaixo do Capitão do Exército (1.800$00).48

Se considerarmos que, apesar da estabilidade do custo de vida,


uma família de 5 pessoas precisava de 1080$00 para ter acesso ao
estritamente necessário 49, concluiremos que a vida do quadro médio,
dadas as exigências do seu estatuto social, não era desafogada. O
recurso a múltiplas ocupações - e mesmo a ligação à terra -
completavam o ordenado, mas não facilitavam a especialização
técnico-profissional.
Os baixos salários, o desemprego, a precaridade do trabalho e a
debilidade da indústria fazem desaguar no sector dos serviços,
nomeadamente em actividades relacionadas com a Contabilidade, um
conjunto heterogéneo de profissionais, com as mais diversas
formações escolares, com ou sem formação específica, ou mesmo
meros práticos que, de simples Caixeiros, pela via do autodidatismo
e/ou de pequenos cursos, se guindam à mesa da Escrituração e da
Contabilidade.

Em período de reorganização das actividades profissionais, em


conformidade com o projecto corporativo aspiram poder fazê-lo com
dignidade, de forma que no processo em curso saia nobilitada a sua
profissão.

Os profissionais da Contabilidade assumem que a valorização da


profissão passa pelo seu envolvimento numa luta em várias frentes, a
montante e a jusante da profissão: é a defesa da Contabilidade como
ciência e disciplina intelectual, cujo estudo a nível Universitário se
impõe por si própria e pela sua utilidade para o desenvolvimento
económico e o progresso moral do país; é a necessidade de reformar o
Ensino técnico comercial a todos os níveis para o fazer acompanhar a

48
José Matoso (Dir.de), História de Portugal, Vol. VII, apud Fernando Rosas, O
Estado Novo (1926-1974), Lisboa, Círculo de Leitores, 1994, p. 107.
49
Idem, Ibidem, p. 94-95.

143
hora do ressurgimento nacional; é o reforço das solidariedades
associativas e a regulamentação do exercício da profissão que,
enquanto permanecer aberta não poderá ser expurgada da "vaidosa
mediocridade"; é, finalmente, a necessidade de se avizinhar
pedagogicamente dos agentes económicos para os convencer da
importância da Contabilidade na boa gestão de todas as organizações
económicas.
Sem menosprezar as outras frentes de luta, vamos debruçar-nos
sobre alguns aspectos da Organização sindical e da Regulamentação
profissional.

4 2. Sindicatos Nacionais e Organização da Profissão

O D. L. n° 23.050, de 23.09.1933, constrói um novo quadro


relativo às associações de classe: define a sua forma de constituição,
fixa os fins, os direitos e os deveres, e estabelece as regras de
funcionamento dos Sindicatos Nacionais. As associações sindicais, em
conformidade com a lei - sem as excepções que o pragmatismo do
regime soube garantir aos poderes fincadamente instalados - têm
apenas duas alternativas: ou dissolvem-se, até 31.12.33, ou reformam
os seus estatutos em conformidade com os princípios "nacionalistas"
do regime - e daí a designação de Nacional - , que lhes impõe a recusa
da "luta de classes", o dever de subordinar os interesses de classe aos
interesses da economia nacional, definidos pelo Estado, e o
compromisso de apenas exercerem a sua actividade no plano nacional,
isto é, fica-lhes vedado, sem autorização governamental, estabelecer
relações internacionais.50

A Associação dos Comercialistas do Norte de Portugal recusa,


em Assembleia Geral convocada para o efeito, organizar-se em
Sindicato Nacional e, invocando o estatuto profissional de
Comercialistas, assente num Curso Superior, com graus de

José Carlos Valente, Sindicatos Nacionais, in J. M. Brandão de Brito (Dir. de),


Dicionário de História do Estado Novo, Vol. II, Lisboa, Círculo de Leitores, 1996 p
916

144
Licenciatura e Doutoramento, decide desencadear um conjunto de
acções - sem sucesso, diga-se - tendentes a constituir a «ordem dos
comercialistas».

A Associação dos Comercialistas Portugueses, sedeada em


Lisboa, após a recusada proposta feita aos seus colegas do Norte,
decidem transformar-se em Sindicato Nacional dos Comercialistas
Portugueses (1934).52 Para reforçar as adesões permitem, embora
mantendo a esperança de conseguir do Governo autorização para
constituir a ordem dos comercialistas , a inscrição no sindicato dos
Licenciados de qualquer das secções do Instituto Superior de Ciências
Económicas e Financeiras54, que podem, como qualquer sócio - e não
apenas os Licenciados pelas 4 secções - pertencer aos corpos gerentes
dos sindicatos.55

A formação do Sindicato dos Comercialistas Portugueses parece


ter despertado o interesse de algumas personalidades, que se
solidarizam em comissão instaladora de uma Associação Cultural de
Ciências Económicas e Financeiras 56, cujos esforços desembocam na
criação da Sociedade de Ciências Económicas, ligada às instalações e
a professores do ISCEF.57

Em 25 de Janeiro de 1934, a Associação dos Contabilistas e


Guarda-livros do Norte de Portugal - após um rápido processo
ritmado pela decisão de reformar os Estatutos, 09.10.1933, pela sua
aprovação pela Assembleia Geral e pelo Governo - reúne para eleger

51
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n.° 2, 1933, p. 151 e
n.° 7, 1934, p.277.Esta rubrica, não assinada, que se mantém ao longo da publicação
da Revista, presume-se do seu Secretário, José Henriques Garcia.
52
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n.° 13, 1936, p. 113.
53
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n.° 21, 1938, p. 176-
177.
5
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n.° 23, 1938, p. 408.
55
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n.° 35, 1941, p. 375.
5
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n.° 13, 1936, p. 113.
57
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n.° 37, 1940, p. 107.

145
os corpos gerentes da nova organização em que se transformara - o
Sindicato Nacional dos Contabilistas e Guarda-livros do Distrito do
Porto.

Os seus Estatutos consagram os seguintes objectivos:


«a) Assegurar o prestígio da classe por forma a garantir a
existência de uma correcta e rígida conduta profissional, dos seus
filiados.
b) Contribuir para o progresso da técnica profissional,
organizando para tal fim sessões de estudo e bibliotecas, e criar, se for
possível, uma revista da especialidade.
c) Criar escolas profissionais com as cadeiras julgadas
convenientes.
d) De uma forma geral, promover, auxiliar e ampliar o estudo
dos interesses profissionais dos seus filiados, nos seus aspectos moral,
económico e social, utilizando todos os elementos e meios legais».

O esforço organizativo e mobilizador do sindicato assume um


triplo carácter:

a) Reivindicativo
O sindicato pretende o exclusivo da concessão da carteira
profissional; deseja, em conformidade com a lei (D. L. 23.712, de
28.03.34) monopolizar, através da Agência de Colocações que
conseguiu fazer aprovar (10.06.1936)58, a lista de desempregados
sobre a qual se deveria exercer o consagrado direito de escolha dos
empregadores; preocupa-se com os salários e os horários de trabalho;
firma contratos colectivos, se a tal se dispuser o patronato, sendo certo
que apenas assinou, após longas negociações, o contrato colectivo
solicitado pelo Grémio dos Importadores Armazenistas de

A Agência de Colocações, aprovada por Despacho do Sub-Secretário das


Corporações, em 10.06.36, e publicado no Diário do Governo, II Série, n.° 158, de
9.07.36, teve vida difícil e limitada duração face à hostilidade dos patrões, in R.C.C.,
n.° 15, 1936, p. 305 ess.

146
Mercearia ; pressiona o Governo no sentido de alargar o leque de
cargos e funções destinados aos sócios, tal como a peritagem;
promove e acompanha, com uma atenção especial às disposições
transitórias, a Regulamentação do exercício da actividade
profissionais dos «técnicos de Contabilidade»; etc.

b)Formativo
Neste âmbito, promove a criação de biblioteca, sala de convívio,
cursos de formação, nomeadamente de línguas alemã, francesa e
inglesa, conferências relativas aos interesses cívicos e profissional,
etc.

b) Assistencial
Neste domínio, que é um dos objectivos essenciais do sindicato,
instala um consultório médico; propõe-se criar uma Caixa Sindical de
Previdência, «expressão da solidariedade corporativa», mas cujo
sucesso depende das concessões obtidas nos contratos colectivos,
tarefa que a magnanimidade dos patrões não facilita.

O Sindicato, de acordo com o seu Presidente, deu à classe


«ordem, prestígio e alguma disciplina», mas reconhece que a
militância sindical, e o interesse pelas. suas realizações não são
significativos. «Criou os cursos de aperfeiçoamento que a classe não
aproveita, lamenta-se o presidente, e um Conselho técnico que nem
sequer reúne. Instalou uma biblioteca que quase se não lê. Despendeu
alguns contos numa instalação digna da classe que poucos frequentam
e raros trocam pelo café».60

Os Organismos Corporativos, nomeadamente os Sindicatos, que


sofrem a hostilidade dos patrões nos domínios mais sensíveis -

59
Este contrato foi realizado em 23 de Setembro, exactamente no dia festivo do 4o
aniversário do Estatuto Nacional do Trabalho, in Vida Associativa, R.C.C., n.° 19,
1937, p. 337
60
J. G., O Presidente do Sindicato dos Contabilistas fala à "Revista de Contabilidade
e Comércio", in R.C.C, n.° 18, 1937, p. 228.

147
contratos colectivos, emprego, salários, etc. - e a quase indiferença da
classe que representam, acolhem, às vezes com entusiasmo, certas
intervenções do Estado, ao arrepio dos princípios corporativos, como
acontece com a fixação de salários mínimos e quotização obrigatória.

O pagamento obrigatório de jóia e quota61 por todos os


Contabilistas e Guarda-livros a exercer a sua actividade no Distrito do
Porto incutiu novo ânimo no Sindicato do Norte.
O optimismo gerado pelo novo enquadramento profissional é
manifesto: « Caminhamos numa boa estrada, de onde se divisam as
grandes esperanças»62, afirma Luís Mourão.
Satisfeito com «um mínimo de vantagens profissionais»
conseguido em seis anos de luta, não esconde que a confluência
forçada no Sindicato de todos os que vivem da Contabilidade vai
desencadear uma forte solidariedade capaz de acordar em cada um a
perfeita «inteligência do seu próprio interesse».
A previdência social, que o aumento das receitas torna possível,
será a face humana do novo sindicalismo. Quer para o Sindicato
escolhas mais criteriosas e exigentes dos seus associados; espera o
desenvolvimento do espírito associativo; e deseja aprofundar o
entendimento entre os técnicos de Contabilidade, como forma de
traçar um rumo firme para a acção comum.

4.3. A EXTINÇÃO DO SINDICATO

A corrida pioneira a um lugar na base da pirâmide corporativa


pertenceu às combativas Associações de Empregados Bancários,
Empregados de Escritório e Empregados de Seguros que, em 18 de
Novembro de 1933, em sessão solene, no Teatro de S. Carlos,
significativamente presidida pelo Sub-Secretário de Estado das
Corporações e Previdência Social, Pedro Teotónio Pereira, se
organizam em Sindicatos Nacionais.

" D. L. n.° 29.931, de 15.1939, aplicado pelo Despacho de 30.10.1939.


Luís Mourão, A Cotização obrigatória e o S.N. dos C. e G. livros, R.C C n ° 28
1939, p. 418.

148
O Sindicato dos Empregados de Escritório, sob a liderança do
Sindicato dos Empregados Bancários, disputa o mesmo território
profissional do Sindicato dos Contabilistas e Guarda-livros,
actividades que considera meras categorias no interior da profissão de
Empregados de Escritório: «sendo Guarda-livros uma categoria,
Contabilista um título, e Perito contabilista uma profissão, não nos
parece possível regular, com critério uniforme, actividades que se
exercem num plano tão diverso».63

Luís Mourão, presidente do Sindicato dos Contabilistas e


Guarda-livros do Distrito do Porto, assume uma posição distinta
configurada em duas razões fundamentais: o Contabilista « exerce
uma função específica, independente e livre», não pode aceitar
subordinações que belisquem a sua autonomia, e «um sindicato único
de trabalhadores de escritório, provocaria a desordem pelas
prepotências dos que hierarquicamente fossem superiores» .

O sindicalista, no sentido de evitar a ameaçada pulverização da


classe, sugere uma posição conciliadora, a dupla sindicalização: no
sindicato do "ramo" de actividade, onde o técnico de Contabilidade
colheria todas as vantagens de ordem social, e no sindicato técnico,
que lhe prestaria o apoio técnico e profissional.65

Na década de 40, os argumentos a favor de uma distinção


profissional entre Técnicos de Contabilidade e Empregados de
Escritório não convenceu o Sub-Secretário das Corporações e
Previdência, nem o Supremo Tribunal Administrativo. Trigo de
Negreiros, por despacho de 07.06.43 6Ó, invocando a unicidade de
representação das profissões, e mesmo a ilegalidade da constituição do

Representação do Sindicato dos Empregados Bancários do Distrito de Lisboa ao


Sr. Ministro do Comércio e Indústria, em 15.04.1935, in R.C.C., n.° 10, 1935, p. 155
e ss.
64
J. G., O Presidente do Sindicato dos Contabilistas fala à "Revista de Contabilidade
e Comércio", in R.C.C, n.° 18, 1937, p. 229.
65
Idem,ibidem, p. 223.
66
R.C.C., n.°42, p. 231-233, onde aparece transcrito o referido despacho.

149
Sindicato dos Contabilistas e Guarda-livros do Distrito do Porto,
considera caber, por lei, ao Sindicato dos Empregados de Escritório,
agora instalado no Porto, a representação dos interesses dos
Contabilistas e Guarda-livros, decisão que o Supremo, após recurso,
confirma (04.03.44)67.
O Sindicato Nacional dos Contabilistas e Guarda-livros do
Distrito do Porto, que aspirara alargar a sua jurisdição a outros
Distritos do país - Vila Real, Bragança, Guarda, Castelo Branco,
Aveiro, Viseu e Coimbra - é extinto, revertendo o remanescente da
liquidação para o Fundo de Assistência do Sindicato Nacional dos
Empregados de Escritório do Distrito do Porto.68

4.4. REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO DE «TÉCNICOS DE


CONTABILIDADE»

4.4.l.«BASES FUNDAMENTAIS PRECONIZADAS»

Os profissionais da Contabilidade, de acordo com os seus


interesses, organizam-se em diferentes associações, mas a consciência
de que a sua profissão, frequentada por estranhos, tem de ser
valorizada convoca-os em torno de um eixo polarizador das aspirações
da classe: o estatuto da Contabilidade e do exercício e
responsabilidade profissionais.

A regulamentação da profissão, indispensável ao prestígio da


Contabilidade e à dignidade da profissão, pressupõe um diálogo
triangular - Estado, patrões e profissionais da Contabilidade - que a
comissão incumbida pelo governo de elaborar uma Lei de Bases
promove, convocando todos os interessados para uma discussão

R.C.C.n.0 45, p. 116-120, onde aparece publicado o supra citado acórdão.


Despacho, de 07.06.1943, do Sub-Secretário de Estado das Corporações e
Previdência, in R.C.C., n.° 42, 1943, p. 231 e 233.

150
pública, com pedido expresso de «alvitres e sugestões das pessoas que
desejem fornecê-los».69

A proposta da comissão governamental desenvolve-se ao longo


de seis bases.

A Base I - Do exercício da profissão - faz uma caracterização


dos «Técnicos de Contabilidade»: Guarda-livros, Contabilista e Perito
Contabilista.

A Base II - Do uso dos títulos - fixa as condições de acesso aos


diferentes escalões da profissão com base num multicritério definido
pelos seguintes parâmetros: idade, cursos, anos de exercício da
profissão, com prática em Contabilidade digráfica, e concurso de
admissão, este apenas exigido para ascender ao último escalão de
Perito contabilista, realizado junto do Conselho Superior dos Técnicos
de Contabilidade.
As disposições transitórias para integrar os actuais profissionais
apenas mantém o critério da idade e dos anos de exercício da
profissão, que para o Guarda-livros - ao qual não se exigem
habilitações mínimas - , não precisa de ser prestado em Contabilidade
digráfica.
O Contabilista vê qualificadas as suas «funções de direcção de
serviços de Contabilidade digráfica em quaisquer sociedades
anónimas ou bancárias, ou em quaisquer organismos públicos ou
administrativos» que, realizadas as condições de tempo, lhe conferem
o direito de utilizar o título. O mesmo acontece com os que «exerçam
ou hajam exercido o lugar de chefe de Contabilidade digráfica de
quaisquer sociedades anónimas ou bancárias ou de quaisquer
organismos públicos ou administrativos e ainda os Guarda-livros das
empresas que se transformem em sociedades anónimas».

Preâmbulo da proposta das «Bases fundamentais preconizadas», R.C.C., n.° 9,


1935, p. 45

151
O Perito contabilista, além de outras formas de graduação
disponíveis, pode, sem exigência de qualquer habilitação mínima,
desde que tenha exercido funções durante pelo menos dois anos,
requerer o uso do título.

Os diplomados com o antigo Curso Secundário de Comércio ou


de Contabilista dos Institutos Médios de Comércio podem, sem
qualquer prática profissional, desempenhar, mediante inscrição,
funções de Guarda-livros, enquanto os Comercialistas, diplomados
pelos Institutos Superiores de Comércio e pelo Instituto Superior de
Ciências Económicas e Financeiras, têm acesso a quaisquer funções
de «Técnico de Contabilidade».

A Base III - Das Atribuições dos técnicos de Contabilidade -


dispõe que as organizações, com movimento de receitas ou de
despesas superior a 200 000 escudos, devem entregar a direcção dos
serviços de Contabilidade a um Contabilista; os balanços, para que
qualquer «escrituração mercantil» possa considerar-se «arrumada» e
«fazer fé em juízo», devem ser assinados por um Contabilista; e os
exames periciais têm de ser feitos por peritos devidamente inscritos.

A Base IV - Da responsabilidade e sanções - pune, em


conformidade com regulamento a publicar, os desempenhos que não
estejam em consonância com os princípios da Contabilidade, as leis
em vigor e a ética da profissão.

A Base V - Do Conselho Superior dos Técnicos de


Contabilidade - cria um órgão para « Superintender científica e
disciplinarmente sobre todos os técnicos de Contabilidade» e
«Administrar as receitas e autorizar as despesas do Conselho».

A composição do Conselho - Presidente e 6 vogais - acautela


uma representação alargada - Governo, Escolas oficiais de
Contabilidade de todos os níveis de ensino e profissionais diplomados
de todos os escalões de técnicos de Contabilidade. Contudo, a forma

152
de nomeação, bienal, dos seus membros obedece às orientações do
centralismo administrativo, que faz do Estado, pela via do Governo, o
plasma de todas as organizações: o Presidente e os 3 professores são
de escolha governamental e os 3 profissionais são eleitos pelos
inscritos no Ministério do Comércio e Indústria. Acresce que todas as
nomeações relativas ao primeiro biénio são deixadas à
responsabilidade do Governo.

A proposta da comissão afigura-se conciliadora dos interesses


daqueles que fazem valer a sua preparação teórica adquirida nas
escolas oficiais ou oficializadas e os daqueles que valorizam o saber
de experiência feito no «calvário da Prática» 70
Não fecha totalmente a profissão a não especializados, mas
reserva um espaço significativo aos verdadeiros especialistas, já que
as organizações, com movimento de receitas ou de despesas superior a
200 mil escudos, não podem dispensar os seus serviços.

As disposições transitórias denotam a preocupação de consagrar


os direitps adquiridos no exercício da profissão, salvaguardados por
critérios de duvidosa exigência, dada a ausência de habilitações
mínimas, de exames ou de análise curricular e qualidade dos
desempenhos.

Os alvitres e as sugestões aparecem na literatura contabilística,


nomeadamente no Fórum em que se constitui a Revista de
Contabilidade e Comércio, e em representações aos ministros que
tutelam as escolas e a actividade dos técnicos de Contabilidade; e nem
o Presidente do Conselho escapa à ânsia de se conseguir um código
regulamentador da profissão.

Luís Mourão, Da Regulamentação dos Técnicos de Contas, R.C.C., n.° 8, 1934 p


355.

153
4.4.2. SUGESTÕES E CONFLITO DE INTERESSES

As reflexões efectuadas em torno do projecto traduzem pontos


de vista diferentes, em consonância com os interesses sociais que
representam, e revelam a enorme expectativa gerada pelo documento
na classe dos Técnicos de Contabilidade - actuais e futuros.
As sugestões abordam aspectos de carácter geral e quase todos
os tópicos da proposta, mas as principais divergências relacionam-se
com as disposições transitórias.
Sem qualquer pretensão sistematizadora, vejamos algumas das
sugestões mais significativas.

O Sindicato dos Contabilistas e Guarda-livros do Distrito do


Porto pretende que a profissão de Técnico de Contabilidade seja
exercida em exclusividade de funções71 e considera exagerado o papel
atribuído aos desempenhos em sociedades anónimas, com vista à
graduação profissional.

Os alunos dos Institutos Comerciais vêem com desagrado a


usurpação do título de Contabilista, que lhes pertence por lei. O seu
alargamento a outros profissionais, sem o mínimo de habilitações, não
os leva a recusar o «espírito das concessões transitórias», mas a sua
«largueza»72, pelo que, em certas circunstâncias, devem os candidatos
submeter-se a exame nos Institutos Comerciais.
A sua proposta retira à docência do ensino não oficializado a
possibilidade de graduar candidatos a Perito Contabilista e altera de
dois para oito o tempo de exercício profissional indispensável à
concessão do mesmo título.7

71
Representação do S. N. de Contabilistas e Guarda-livros do D. do Porto, in
R.C.C., n.° 9, 1935, p. 51.
72
T Representação dos alunos do Instituto comercial do Porto, in R.C.C., n.° 10,
1935, p. 146.
73
Uma representação dos alunos dos Institutos Comerciais, in R.C.C., n.° 22, 1938,
p. 296.

154
Os diplomados da Escola Raul Dória reclamam o título de
Contabilista para todos os diplomados das escolas privadas de
reconhecido valor. Consideram de «flagrante injustiça, pelo que de
afrontoso contém, quanto aos sagrados direitos adquiridos», o facto
de, por falta de título oficial, serem nivelados pelos que não possuem
«quaisquer habilitações literárias ou conhecimentos especializados» e
terem de deixar de ser o que sempre foram, Contabilistas.

Um dos temas que aflora nas reflexões sobre a regulamentação é


a necessidade de, a par da competência técnica, avaliar a capacidade
moral do profissional da Contabilidade, pois uma conduta fraudulenta
face à Contabilidade não dignifica o exercício da profissão, subverte a
Contabilidade que em si própria é animada por «um espírito de
disciplina, de ordem e cooperação» e prejudica a economia nacional.

A conduta moral prende-se com a questão da responsabilidade


profissional, o tema nuclear do código ambicionado, já que é
considerada a única via de moralizar a actividade do técnico de contas,
pois o torna independente e lhe dá autoridade para resistir às
arbitrariedades patronais com reflexos na elaboração dos documentos
contabilísticos.

O Estatuto da Contabilidade e do exercício e responsabilidade


profissionais movimenta inúmeras personalidades que, como o Dr.
Alfredo Coelho de Magalhães, reconhecem a sua importância na
solução dos problemas económicos e sociais: «os técnicos de contas,
afirma, hão-de sentir-se valorizados, não só do ponto de vista
profissional, como do ponto de vista moral, o que se reflectirá na vida
económica do pais».
74
Representação dos diplomados da Escola Raul Dória, in R.C.C., n.° 10, 1935, p.
153.
75
Representação do S.N.dos Contabilistas e Guarda-livros do Distrito do Porto ao
Sr. Presidente do Conselho, in R.C.C., n.° 27, 1939, p. 314.
76
Representação enviada ao Ex.mo Sr.Ministro do Comércio e Indústria pelo Dr. A.
Coelho de Magalhães, em nome do Conselho Escolar do I.C. do Porto, in Vida
Associativa, R.C.C. n.° 11, 1935, p. 306

155
Contudo, a frustração começa a instalar-se - e com razão - face
à hesitação dos poderes públicos, indiferentes perante «os clamores de
77
todos os colegas que desejam dignificar a sua profissão».
A década de 30 chega ao fim com algo de premonitório: os
técnicos da Contabilidade, visivelmente divididos, têm de continuar a
lutar para conseguir um estatuto profissional autónomo e diferenciado
dos empregados de escritório.
A ideia de uma Câmara dos Contabilistas Portugueses, que gera
entusiasmo e inúmeras adesões, está em marcha . Ao apelo de
70
«organizemos uma Câmara dos Contabilistas Portugueses»
constitui-se uma Comissão pró-Câmara, liderada por diplomados do
Instituto de Comércio de Lisboa, que pretende reunir todos os
diplomados de escolas equivalentes, nomeadamente os do Instituto
Comercial do Porto e dos Pupilos do Exército.
Concluindo, creio poder afirmar que o papel desempenhado pela
Contabilidade na reforma financeira e administrativa, que está na base
da organização do Estado corporativo e do poder pessoal do seu
ideólogo, lhe conferiu algum prestígio com reflexos na reforma do
ensino técnico comercial do início da década. A Contabilidade
transpôs a porta de Minerva e o Contabilista adquiriu um título
revelador da sua prestigiosa profissão
Na segunda fase da consolidação do Estado Novo, a partir de
1936, a agudização do centralismo administrativo e do controlo
ideológico repercute-se na Escola, que se torna eminentemente
formativa, mais preocupada com a inculcação dos valores da «Ordem
Nova» do que com a transmissão de saberes e o desenvolvimento de
capacidades modernizadores da sociedade. A pedagogia da escola

Joaquim Rodrigues dos Santos, Aspirações de classe III, in R.C.C., n.° 26, 1939,
p. 218.
Francisco Xavier Antunes, Uma Câmara dos Contabilistas, uma ideia em marcha,
R.C.C., n.° 28, 1939, p. 452.
Francisco Xavier Antunes, Organizemos a Câmara dos Contabilistas Portugueses,
R.C.C., n.°27, 1939, p. 306 ess. .

156
nacional promove a conformação mais do que a insatisfação; valoriza
a conservação mais do que impulsiona a transformação; e a custo
descobre no passado e no presente o sentido do futuro.
A conjuntura internacional, em fase de depressão, favorece a
autarcia, limita as possibilidades de crescimento económico e dificulta
a expansão do ensino técnico - via essencialmente destinada às classe
populares; por outro lado, a necessidade de manter os equilíbrios
sociais em que assenta o Estado Novo e a falta de mobilidade da
sociedade portuguesa não facilitam o alargamento da base de
recrutamento das elites sociais, facto que limita a expansão e
diversificação do ensino, nomeadamente o Superior.
Assim, torna-se conveniente para os equilíbrios sociais que a
Contabilidade se mantenha à sombra da Administração e as profissões
comerciais, incluindo a de Contabilista, permaneçam território de
descompressão social, aberto a todos aqueles que abandonam os
estudos e não chegam à Universidade.

157
ANEXO

158
REGULAMENTAÇÃO DO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE
«TÉCNICOS DE CONTABILIDADE»: GUARDA-LIVROS,
CONTABILISTAS E PERITOS CONTABILISTAS

BASES FUNDAMENTAIS PRECONIZADAS80

A comissão nomeada pelo Ministério do Comércio e indústria


para estudar e propor a regulamentação do exercício das profissões de
guarda livros, contabilistas e Peritos Contabilistas, a que presidiu o Sr.
Dr. Francisco de Almeida Carmo e Cunha e de que fizeram parte os
Srs. Dr. Mosés Amzalak., Dr. António Pedroso Pimenta e Dr. Augusto
António Borges, Engenheiro Henrique de Carvalho, Dr.Sebastião
Alfredo da Silva, Dr. Octávio da Fonseca Brito e Capitão Francisco
Caetano Dias, apresentou ao Sr. Ministro do Comércio e Indústria o
seu relatório.
A fim de que todos os interessados tomem conhecimento do
estudo realizado e dos seus resultados, foi superiormente determinado
que as bases propostas fossem dadas a público, aguardando-se os
alvitres e sugestões das pessoas que desejem fornecê-los.
As referidas bases são do teor seguinte:

BASE I - Do EXERCÍCIO DA PROFISSÃO

Denominam-se «técnicos de contabilidade» os guarda-livros, os


contabilistas e os Peritos Contabilistas.

Guarda-livros é o técnico que têm a função de, por si ou


conjuntamente com os seus auxiliares, executar todas as operações de
escrituração.

Contabilista é o técnico cuja função consiste em superintender,


organizar, orientar e dirigir os serviços de contabilidade dos organis-
mos públicos e privados.

A ortografia foi actualizada.

159
Perito contabilista é o técnico que tem por função a
fiscalização e verificação de contabilidade e factos gestivos dos
organismos económicos.

BASE II - Do uso DOS TÍTULOS

O uso dos títulos respectivos só é permitido aos indivíduos que,


inscritos no Ministério do Comércio e Indústria, satisfaçam aos
requisitos a seguir indicados:

Guarda-Iivros.- 0 uso do título de guarda-livros só é permitido


aos indivíduos de qualquer sexo, que, tendo pelo menos 18 anos de
idade, se encontrem legalmente emancipados, sejam diplomados com
o antigo curso secundário de comércio, com o curso de comércio das
antigas Escolas Técnicas Profissionais de Comércio, oficiais ou
oficilizadas, ou cursos equivalentes reconhecidos por lei e provem ter,
pelo menos, dois anos de prática de contabilidade digráfica em
qualquer organismo económico.

Como medida transitória, o uso do título de guarda-livros deverá


ser concedido, quando requerido no prazo de um ano a todos os
indivíduos que, possuindo pelo menos 18 anos de idade, se mostrem
legalmente emancipados, provem ter exercido a profissão durante,
pelo menos, 2 anos.

Contabilista - 0 uso do título de contabilista só é permitido aos


iudivíduos de qualquer sexo, que, tendo, pelo menos, 23 anos de
idade, sejam diplomados com o antigo curso secundário de comércio,
com o curso de contabilista dos institutos médios de comércio ou
cursos equivalentes por lei e possuam, pelo menos, 3 anos de prática
em serviços de contabilidade digráfica.
Transitoriamente, o uso do título de contabilista será concedido
aos indivíduos que o requeiram no prazo de um ano, tenham, pelo
menos, 23 anos de idade e 5 anos de desempenho de funções de

160
direcção de serviços de contabilidade digráfica em quaisquer
sociedades anónimas ou bancárias, ou em quaisquer organismos
públicos ou administrativos.

Também poderão requerer o título de contabilista os indivíduos


que, à data da publicação do diploma sobre a regulamentação,
exerçam ou hajam exercido o lugar de chefe de contabilidade digráfica
de quaisquer sociedades anónimas ou bancárias ou de quaisquer
organismos públicos ou administrativos e ainda os guarda-livros das
empresas que se transformem em sociedades anónimas.

Perito-contabilista - O uso do título de perito contabilista, só é


permitido aos indivíduos de qualquer sexo que tenham pelo menos 25
anos de idade, sejam diplomados com o antigo curso secundário de
comércio ou o curso de contabilista dos institutos médios de comércio
e cursos equivalentes reconhecidos por lei e tenham aprovação num
concurso de admissão, prestado junto do Conselho Superior dos
Técnicos de Contabilidade.

Como medida transitória o uso do título de perito-contabilista,


poderá ser concedido, quando requerido no prazo de 6 meses, a todos
os indivíduos que reúnam as condições estabelecidos em qualquer das
alíneas seguintes:

a) Possuírem o antigo curso secundário de comércio ou o de


contabilista e exercerem ou terem exercido as funções de guarda-
livros ou de contabilista;
b) Terem exercido as funções de professor de contabilidade em
escolas de comércio oficiais ou oficializadas;
c) Haverem exercido, durante pelo menos dois 2 anos, as
funções de perito-contabilista.

Os diplomados com o antigo curso secundário de comércio ou o


de contabilista dos institutos médios de comércio, poderão, mediante a

16J
inscrição respectiva, desempenhar as funções de guarda-livros, logo
após a terminação dos seus cursos.
Os diplomados com o curso superior de comércio ou os
licenciados em ciências económicas e financeiras - secção de
administração comercial - poderão, mediante inscrição respectiva,
desempenhar quaisquer das funções de técnicos de contabilidade, logo
após a terminação dos seus cursos.

BASE III - DAS ATRIBUIÇÕES DOS TÉCNICOS DE


CONTABILIDADE

As sociedades anónimas, as sociedades bancárias, as Juntas


Gerais de Distrito, as Câmaras Municipais de Concelhos de l.a classe,
os organismos do Estado com autonomia e com contabilidade
privativa e as corporações administrativas com um movimento de
receitas ou de despesas superior a 200 000$00, deverão ter a
superintender e dirigir a sua contabilidade um contabilista.

A partir de 6 meses da data da publicação do diploma a


promulgar, nenhuma escrituração mercantil se considerará
devidamente arrumada nem fará fé em juízo, desde que os balanços
não estejam devidamente assinados por um técnico de contabilidade
inscrito.
Os exames periciais de contabilidade só poderão ser realizados
por peritos contabilistas devidamente inscritos.

BASE IV - DAS RESPONSABILIDADES E SANÇÕES

Serão punidos nos termos do regulamento a publicar, indepen-


dentemente de outras sanções estabelecidos nas leis em vigor, os
técnicos de contabilidade que:

a) Assinem balanços que não estejam dentro das normas e prin-


cípios da contabilidade;

162
b) Efectuem lançamentos de operações que não se encontrem
devidamente justificados ;
c) Efectuem lançamentos cujas operações sejam contrárias aos
preceitos estabelecidos pelas leis vigentes;
d) Assinem qualquer laudo que não seja a expressão do que
examinarem;
e) Se mancomunem com qualquer das partes;
f) Pratiquem quaisquer factos puníveis no regulamento.

BASE V - Do CONSELHO SUPERIOR DOS TÉCNICOS DE


CONTABILIDADE

Superintendendo sobre todos os técnicos de contabilidade,


haverá um organismo com a designação acima e com a seguinte
composição:

Presidente: de nomeação do Governo


Vogais: 1 professor de contabilidade do Instituto Superior de
Ciências Económicas é Financeira;
1 professor de contabilidade dos Institutos Médios de Comércio:
1 professor de contabilidade das Escolas Profissionais de
Comércio;
1 perito contabilista diplomado;
1 contabilista diplomado;
1 guarda-livros diplomado;

Os quatro primeiros de livre escolha do Governo, feita


bienalmente; os três últimos eleitos, também bienalmente, pelos
respectivos inscritos no Ministério do Comércio e Indústria.

As primeiras nomeações de todos os vogais, contudo, serão


feitas directamente pelo Governo.

O Conselho Superior dos Técnicos de Contabilidade tem por


funções.

163
I o ­ Superintender científica e disciplinarmente sobre todos os
técnicos de contabilidade;

a) cientificamente, organizando boletins tratando unicamente de


assuntos de contabilidade, estabelecendo normas oficiais e gerais de
balanços e demais princípios de contabilidade;
b) disciplinarmente, aplicando sanções de harmonia com o regula­
mento.

2o ­ Administrar as receitas e autorizar as despesas do Conselho.

BASE VI ■ DAS RECEITAS DO CONSELHO SUPERIOR DOS


TÉCNICOS DE CONTABILIDADE

As receitas do Conselho Superior dos Técnicos de Contabilidade


serão provenientes das taxas de inscrição e da taxa de revalidação na
importância de 2$50, a que estão sujeitas todas as carteiras
profissionais, de cinco em cinco anos.
As taxas de inscrição serão as seguintes, pagas por uma só vez:
para o perito­contabilista, 200$00; para contabilista, 150$OO; para o
Guarda­livros, 1 0 0 $ 0 0 .
Contra o pagamento das respectivas taxas, serão entregues aos
interessados as respectivas carteiras profissionais.

164
BIBLIOGRAFIA E FONTES

I. DICIONÁRIOS E OBRAS COLECTIVAS

AAVV, Contribuições Para a História do Pensamento Económico em


Portugal, Publ. D. Quixote, 1988.
AAVV, O Estado Novo: Das Origens ao Fim da Autarcia, (1926-
1959), Vol. e II, Lisboa, Ed Fragmentos, 1987.
AAVV, Salazar e o Salazarismo, Lisboa, Publ. D. Quixote, 1989.
BRITO, J. M. Brandão de Rosas, Fernando e ( Dir. de )Dicionário de
História do Estado Novo, Vol. I e II, Lisboa, Círculo de Leitores,
1996,
MEDINA, João, ( Dir.de ), História Contemporânea de Portugal.
Estado Novo, Multilar, Vol. I, 1990.
MÓNICA, Maria Filomena, Educação e Sociedade no Portugal de
Salazar, Lisboa, Editorial Presença, 1978.
ROSAS, Fernando (Coord, de), Portugal e o Estado Novo (1930-
1960), apud Serrão, Joel e Marques, A.H.de Oliveira, ( Dir. de ) Nova
História de Portugal, Vol. XII Lisboa, Editorial Presença, 1992.
ROSAS, Fernando, O Estado Novo (1926-1974), apud Matoso, José
(Dir.de ), História de Portugal, Vol. VII, Lisboa, Círculo de Leitores,
1994.

II. MONOGRAFIAS

BENTO, José Gomes, O Movimento Sindical dos Professores, 2a Ed.,


Lisboa, Ed. Caminho, 1978,
CARVALHO, Rómulo de, História do Ensino em Portugal desde a
Fundação da Nacionalidade até ao Fim do Regime de Salazar-
Caetano, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1986.
MARTINS, Guilherme de Oliveira, O Ministério das Finanças -
Subsídio para a sua História no Bicentenário de Criação da Secretaria
de Estado dos Negócios Estrangeiros, Lisboa, Ministério das
Finanças, 1988.

165
MÓNICA, Maria Filomena, Educação e Sociedade no Portugal de
Salazar, Lisboa, Ed. Presença, 1978.
MoREiRA,Vital, Auto-Regulação Profissional e Administração
Pública, Coimbra, Livraria Almedina, 1997.
SANTARENO, Alberto, Crónica da Contabilidade Pública Portuguesa,
exemplar fotocopiado, 1997. ( Trata-se do pseudónimo e do trabalho
vencedores do 2o Prémio História da Contabilidade, atribuído pelo
C.E.H.C. da APOTEC).
SERRÃO, J. Veríssimo, História de Portugal (1926-1935), Vol. XIII,
Lisboa, Ed. Verbo, s/d.

III. ARTIGOS DE PUBLICAÇÕES PERIÓDICAS

ANTUNES, Francisco Xavier, O Instituto Comercial de Lisboa, in


Revista de Contabilidade e Comércio, Porto, n° 27, 1939.
ANTUNES, Francisco Xavier, Organizemos a Câmara dos Contabilistas
Portugueses, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 27, 1939.
ANTUNES, Francisco Xavier, Uma Câmara dos Contabilistas, uma
ideia em marcha, in Revista de Contabilidade e Comércio., n° 28,
1939.
FRANCO, António de Sousa, Ensaio Sobre as Transformações
Estruturais das Finanças Públicas Portuguesas: 1900-80, in Análise
Social, Vol. XVIII, n° 72-73-74.
GARCIA, José H , O Presidente do Sindicato dos Contabilistas fala à
"Revista de Contabilidade e Comércio", in Revista de Contabilidade e
Comércio, n° 18, 1937.
Mata, Eugenia e Valério, Nuno, Normas de Direito Financeiro nas
Constituições Portuguesas, in Revista de História Económica e Social,
(pp. 1-22), Dir. de V. M. Godinho, n° 3, Sá da Costa, 1979.
Mourão, Luís, A Cotização obrigatória e o S.N. dos C. e G. livros, in
Revista de Contabilidade e Comércio., n° 28, 1939.
MOURÃO, Luís, Da Regulamentação dos Técnicos de Contas, in
Revista de Contabilidade e Comércio, n° 8, 1934.

166
OLIVEIRA, Eduardo Maria Baptista de, Evolução do Ensino Técnico
Comercial em Portugal, in Revista de Contabilidade e Comércio., n°
57, 1957.
Proposta das «Bases fundamentais preconizadas», in Revista de
Contabilidade e Comércio., n° 9, 1935.
REIS, Jaime, A Caixa Geral de Depósitos como Instrumento de
Política Económica: o Período das Duas Guerras, Análise Social, in
Revista do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa,
Vol.XXXII, n° 141, 1997.
Representação do Sindicato dos Empregados Bancários do Distrito de
Lisboa ao Sr. Ministro do Comércio e Indústria, em 15.04.1935, in
Revista de Contabilidade e Comércio, n° 10, 1935.
Representação do Sindicato Nacional de Contabilistas e Guarda4ivros
do Distrito do Porto, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 9,
1935.
Representação do Sindicato Nacional dos Contabilistas e Guarda-
livros do Distrito do Porto ao Sr. Presidente do Conselho, in Revista
de Contabilidade e Comércio, n° 27, 1939.
Representação dos Diplomados da Escola Raul Dória, in Revista de
Contabilidade e Comércio, n° 10, 1935.
Representação enviada ao Ex m o Sr.Ministro do Comércio e Indústria
pelo Dr. A. Coelho de Magalhães, em nome do Conselho Escolar do
I.C. do Porto, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 11, 1935.
SALAZAR, A Oliveira, O Comércio Português, in Revista de
Contabilidade e Comércio, n° 41, 1942.
SANTOS, Joaquim Rodrigues dos, Aspirações de classe III, in Revista
de Contabilidade e Comércio, n° 26, 1939.
Segunda Representação dos Alunos do Instituto Comercial do Porto,
in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 10, 1935.
SILVA, F.V.Gonçalves da, A Questão do Ensino Técnico, in Revista
de Contabilidade e Comércio., n° 5, 1934.
Uma representaçõa dos alunos dos Instituto Comerciais, in Revista de
Contabilidade e Comércio, n° 22, 1938.

167
Vida Associativa81, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 13,
1936.
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 13,
1936.
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 19,
1937.
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 21,
1938.
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 23,
1938.
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 35,
1941.
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio, n° 37,
1940.
Vida Associativa, in Revista de Contabilidade e Comércio. n° 7, 1934.
Vida Associativa, Revista de Contabilidade e Comércio, n° 2, 1933, p.

151.

IV. LEGISLAÇÃO

Decreto-Lei de 16.01.1928,apud Rómulo de Carvalho, História do


Ensino em Portugal desde a Fundação da Nacionalidade até ao Fim do
Regime de Salazar-Caetano, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian,
1986.
Decreto Lei: n.° 15.289.
Decreto Lei: n.° 15.290, de 30/03/28.
Decreto Lei n° 15.466, de 14/05/28.
Decreto Lei n° 15.814, de 04/07/28.
Decreto Lei n° 16.381, de 16 de Janeiro 1929, apud J. Veríssimo
Serrão, História de Portugal (1926-1935), Vol. XIII, Lisboa, Ed.
Verbo, s/d.
Decreto Lei n° 16.371, de 13.04.29.
81
Esta rubrica, não assinada, que se mantém ao longo da publicação da Revista,
presume-se do seu Secretário, José Henriques Garcia, que veio a tornar-se Director.

168
Decreto Lei n° 18.381 ( Relatório do ), de 24 05 30, in Revista de
Contabilidade e Comércio, n° 21, 1938.
Decreto n° 18 962, de 25.10.1930.
DecretoLei n° 19.081, ( Preâmbulo do ), de 2.12.1930, apud Veríssimo
Serrão, História de Portugal (1926-1935), Lisboa, Vol. XIII, Ed.
Verbo,, s/d.
Decreto n° 19.869, de 9 07 1931, apud Fernando Rosas (Coord, de),
Portugal e o Estado Novo (1930-1960), apud Joel Serrão e A.H.de
Oliveira Marques, (Dir. de) Nova História de Portugal, Vol. XII,
Lisboa, Ed. Presença.
Decreto Lei n° 20.328, de 21 09 1931, publicado com rectificações no
Diário do Governo de 15.10.1931, apud Francisco Xavier, O Instituto
Comercial de Lisboa, Revista de Contabilidade e Comércio, Porto, n°
27, 1939.
Decreto Lei n° 20.804, de 22.01.1932: Regulamento do Instituto
Comercial de Lisboa, aplicado ao do Porto.
Decreto Lei n° 23.049, de 23.9.33, apud Vital Moreira, Auto-
Regulação Profissional e Administração Pública, Coimbra, Almedina,
1997.
Despacho do Sub-Secretário das Corporações, em 10.06.36, publicado
no Diário do Governo, II Série, n° 158, de 9.07.36, in Revista de
Contabilidade e Comércio, n° 15, 1936.
Decreto Lei. n° 29.049, de 10.10.38, in Revista de Contabilidade e
Comércio, n°24, 1938.
Decreto Lei n.° 29121, de 14 11.38, in Revista de Contabilidade e
Comércio, n°24, 1938.
Decreto-lei n° 29.214, D. G, PSérie, de 06/12/1938: regula as
atribuições da Inspecção Geral de Finanças, prolongamento do
omnipresente Ministério das Finanças.
Decreto Lei n° 29.931, de 15.1939, aplicado pelo Despacho de
30.10.1939.
Decreto-lei. n° 30.673, ( Preâmbulo do ), de 23.08.1940, in Revista de
Contabilidade e Comércio, n° 31, 1940.
Decreto Lei n° 30.665, de 23.08.1940, art. I o e 2o, in Revista de
Contabilidade e Comércio, n° 31, 1940.

169
Despacho, de 07.06.1943, do Sub-Secretário de Estado das
Corporações e Previdência, in Revista de Contabilidade e Comércio,
n°42, 1943, p. 23 l e 233.
Despacho do Supremo Tribunal Administrativ, de 07.06.43, in Revista
de Contabilidade e Comércio, n°42, p. 231-233.
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 04.03.44, in Revista
de Contabilidade e Comércio, n° 45, p. 116-120, onde aparece
publicado o supra citado acórdão.

170
EXTENSÕES DE UM ANEL.
CORPO DE QUOCIENTES Q.

MARGARIDA MARIA SOLTEIRO MARTINS PINHEIRO


Professora Adjunta de Matemática
I.S.C.A.A.
SUMÁRIO

O presente artigo faz parte de um dos temas discutidos no


concurso de provas públicas para Professores-Adjuntos do Ensino
Superior Politécnico, realizado em Dezembro de 1994. Após a
introdução de alguns conceitos básicos, provam-se dois resultados
sobre extensões de um anel.
No primeiro, mostra-se que a partir de um anel sem identidade é
possível construir um anel com identidade que contem um subanel
isomorfo ao primeiro.
No segundo resultado, mostra-se que a partir de qualquer
domínio de integridade é possível construir um corpo que contem uma
cópia isomorfa ao domínio inicial.

172
PRELIMINARES

Comecemos por introduzir alguns conceitos.

Definição 1
Chama-se anel a todo o termo (E,9,*) onde E é um conjunto não vazio
e 6 e * são duas operações internas em E tais que:
(E,6) é grupo abeliano e (E,*) é semi-grupo e * é distributiva em
relação a 9; isto é,
X/a,b,c 6 E,a* (bdc) = (a* b)6(a* c)
Va,b,ce E,(adb) *c = (a *c)9(b *c)
Ao elemento neutro de 9 chamamos zero do anel e representamos por
O1.

Definição 2
Um anel E diz-se comutativo se a multiplicação é comutativa.

Definição 3
Um anel E diz-se anel unitário ou anel com identidade se a
multiplicação tem elemento neutro 2.

Também podemos definir anel de outro modo: um anel é um conjunto E não vazio,
munido de duas operações, uma chamada adição e usualmente denotada por + e
outra chamada multiplicação e usualmente notada por . (ou ausência de ponto) tais
que:
(E,+) é grupo abeliano, (E,.) é semi-grupo e a multiplicação é distributiva
relativamente à adição; isto é
Va,b,ce E,a(b + c) = ab + ac
X/a,b,ce E,ia + b)c = ac + bc
De agora em diante e supondo que não haja perigo de confusão, denotaremos o anel
(E,+,.) simplesmente por E.

O elemento neutro da multiplicação, caso exista, será denotado por 1 e diz-se


identidade ou elemento unidade do anel.

173
Definição 4
Seja (E,+,.) um anel e S um subconjunto de E.
Diz-se que S é subanel de E se S é um anel para as operações que
conferem a E a estrutura de anel.

Proposição 1
Seja E um anel. Então:
i) V r e £ , r 0 = 0 r = 0
ii) Vr, s G E,(-r)s = r(—s) = -(rs)
iii) \/r,se E,(-r)(-s) = rs

Demonstração:
I) Como 0 é o elemento neutro da adição, 0+0=0 e portanto
r(0+0) = r0. Atendendo à distribuitividade do anel vem,
r0 + r0 = rO. Pela lei do corte, válida em E, conclui-se que r 0 = 0 .
Provámos então que rO = 0. De modo análogo provamos que Or = 0.
Então i) está provado.
ii) Sejam r,sEE. Pretendemos mostrar, em primeiro lugar, que
(-r)s = -(rs). Sabemos que r + (-r)-0. Atendendo à
distribuitividade do anel e a i) deduz-se que
(r + (-r))s = Os O rs + (-r)s = 0
Donde se conclui que (-r)s = -(rs).
De modo análogo provamos que r(-s) = -(rs) e portanto ii) fica
provada.
iii) De ii) resulta
(-r)(-s) = -(r(-s)) = -(-(rs)) = rs
porque, num grupo aditivo -(-x) = x. Então iii) fica demonstrada.

Definição 5
Seja E um anel comutativo.
r e E diz-se um divisor de zero se r t- 0 e existe sï 0, com se E
tal que rs = 0.

174
Definição 6
Chama-se domínio de integridade (ou simplesmente domínio) a um
anel comutativo com elemento unidade (diferente do zero do anel) e
sem divisores de zero.

Definição 7
Seja D um domínio de integridade e seja D' um subconjunto de D.
Diz-se que D' é um subdomínio de D se e só se:
i) D' é subanel de D;
ii) D' contem a identidade;
iii) D' não tem divisores de zero.

Definição 8
Seja D um domínio de integridade e a E D \ {0}.
Diz-se que a é cancelável à esquerda se, Vx, y e D, ax = ay => x = y

Proposição 2
Seja E um domínio de integridade. Então todo o elemento não nulo de
E é cancelável em (E,.).

Demonstração:
Seja a£D\(0}. Como por hipótese D é domínio de integridade, D já é
um anel comutativo pelo que basta provar que a é cancelável à
esquerda. Sejam ainda x,yeD tais que ax = ay. Queremos provar
que x = y. Ora
ax = ay <=» ax - ay = 0 <=> a(x - y) = 0
Como a # 0 e D não tem divisores de zero, tem que ser x-y-0 e
logo x = y , como pretendíamos. *

Proposição 3
Um subconjunto S não vazio de um anel E é um subanel se e só se:
i) Para todos a,beS, temos a-beS

175
ii) Para todos a,beS, temos abe S
Demonstração:
(=>)
Por hipótese S é um subanel de E, de onde, atendendo à definição 4
facilmente se conclui que, para todo a,beS, a-beS e a.beS.

Seja S um subconjunto não vazio de E. De i) resulta que (S,+) é um


subgrupo de (E,+) e como (E,+) é grupo comutativo concluímos que
(S,+) é grupo comutativo.
De ii) resulta que (.) é uma operação interna em S. Uma vez que a
assoeiatividade é uma propriedade hereditária, podemos concluir que
(S,.) é semi-grupo. Analogamente, como a propriedade distributiva
também é hereditária, podemos concluir que S é anel. Logo S é
subanel de E, c.q.d. *

Definição 9
Chama-se corpo a todo o anel comutativo tal que o conjunto dos
elementos não nulos é grupo para a multiplicação.

Provemos agora o seguinte Teorema.

Teorema 1
Seja D um domínio de integridade com um número finito de
elementos. Então D é um corpo.

Demonstração:
Seja D={al,a2,...,an}e vamos supor, sem perda de generalidade,
que os elementos estão ordenados de forma a que aj seja o zero do
anel e a2 seja o elemento unidade. Uma vez que D é um anel
comutativo com elemento unidade, para provar que D é um corpo,
falta provar que todos os elementos não nulos constituem um grupo
para a multiplicação. Como, por hipótese (D,.) já é semi-grupo, só
resta provar que qualquer elemento não nulo admite inverso para a
multiplicação.

176
Seja ajED com ai T^aj . Consideremos os produtos aja{ com i=l,...,n.
Em particular e atendendo às definições feitas tem-se ajaj=aj e
aja2=aj. Por outro lado, atendendo à Proposição 1, se a[ ^a^ então
ajãi ^ajajç. Consideremos o conjunto
{ajal,aja2,aja3,...,ajan} = {ax,aj,aJa^,...,ajan} = D
Logo, existe ak £ D \ {aA tal que a\a]í-a2- Como D é comutativo
af[aj=a2 e logo afc=(ai) o que completa a demonstração. *

De acordo com o teorema acabado de demonstrar, se D é um domínio


de integridade finito,então D é corpo.
Mas podemos ainda dizer mais. Contudo e antes de passar ao teorema
seguinte, introduzamos alguns novos conceitos.

Definição 10
Seja E um conjunto.
Chama-se relação binária definida em E a todo o subconjunto não
vazio do produto cartesiano ExE=E

Definição 11
Seja RcE uma relação binária definida em E. Diz-se que R é uma
relação de equivalência se R é simultaneamente reflexiva, simétrica e
transitiva.
i) R é reflexiva se para todo o xeE , se tem (x,x)eR.
ii) R é simétrica se para todos x,yeE , se (x,y)eR então (y,x)£R.
iii) R é transitiva se para todos x,y,zeE , se (x;y)eR e (y,z)ER então
(X,Z)ER.3

Definição 12
Seja R uma relação de equivalência sobre E e xeE.

Se (a, b)ER também se pode escrever aRb.

Ill
Chama-se classe de equivalência de R relativa a x, ao conjunto de
todos os elementos de E, R-equivalentes a x e representa-se por x.

Da definição conclui-se que x- {a&E:aRx).

Definição 13
Seja R uma relação de equivalência sobre E.
Ao conjunto de todas as classes de equivalência determinadas em E
por R, chama-se conjunto quociente de E por R e nota-se por E/R.

Tem-se então que EI R= {X.XEE} .

Definição 14
Chama-se homomorfismo do anel E no anel E' a toda a aplicação
(p:E—>E' tal que
Vr,r'e E,(p(r + r') = (p(r) + (p(r')
Vr,r'eE,(p(rr') = (p(r).(p(r')
Se cp é ainda bijectiva, então diz-se um isomorfismo de E sobre E'.

178
EXTENSÃO DE UM ANEL SEM IDENTIDADE A UM ANEL COM
IDENTIDADE

Apesar de um anel não ter necessariamente identidade, por exemplo o


anel (Z 2 ,+,.), vamos ver que podemos sempre estender um anel sem
identidade a um anel com identidade.

Teorema 2
Seja E um anel sem identidade. Então existe um anel A com
identidade que contem um subanel isomorfo a E.

Demonstração:
Seja A=ExZ, onde Z designa o anel dos inteiros relativos. Em A
definem-se as seguintes operações:
uma adição
+:A....x....A -»....A
((a,m),(a',m'))—> (a,m) + (a',rrí) = (a + a',m+ rrí)
e uma multiplicação
..:A....x....A -»....A
((a,rrí),(a',m'))—» (a,m)(a',m) = (aa'+ma'+m'a,mm)
Vamos ver que, com estas duas operações A é um anel cujo zero é
(0,0) e cuja identidade é (0,1).
Que a operação + é interna em A e que goza das propriedades
comutativa e associativa, é imediato, pelas próprias definições e
construção de A.
Como, para qualquer elemento (a, m) de A se tem
(a, m) + (0,0) = {a + 0, m + 0) = {a,m)
e para qualquer elemento {a, m) de A existe (-a,-m) tal que
(a,m) + (-a,-m) = (a + (-a), m + (-m)) = (0,0)
então (A,+) é grupo comutativo.
Como (A,.) é grupoide, para garantir que (A,+,.) é anel, basta garantir
que:

179
V(a,m),(a , ,m'),(a" ) m")GA,((a,m)(a',m , ))(a",m") =
= {a,m)((a,,m')(a",m"))
V(a, m), (a', rri ), (a", m" ) e A, ((a, m) + (a', m' ))(a", m" ) =
= (a,m)(a",m") + (a',m')(a",m")
V(a,m),(a',m'),(a",m")e A,(a,m)((a',m') + (a",m")) =
= (a, m)(a', m' ) + (a, m)(a' ', m" )
Ora 1) e2) resultam imediatamente, efectuando os cálculos.

3) \/(a,m) 6 A,(a,m)(0,l) = (0,l)(a,m) = (a,m)

De facto
(a, m)(0,l) = (0 + m0 + a, m) = (a, m) e
(0,l)(a, m) = (0 + a + mO, m) = (a,m)
Provámos então que A um anel com identidade.

Falta provar ainda que o A contem um subanel isomorfo a E.


Seja A'= Ex{0} = {(a,0),a G E] c ExZ. Então A' é um subanel de A.
Como (0 £ ,0) G A' resulta que A é não vazio.
Sejam (a,0),(a',0) G A'. Então
(a,0)-(a\0) = ( a - a ' , 0 ) e A '
(a,0)(a',0) = (aa'+0a'+0a,0) = (aa',0) G A'
Logo, pela proposição 3 concluímos que A' é subanel de A.

Falta provar que tal subanel é isomorfo a E.


Considere-se a aplicação
(p:E^Ex{0} = A'
..a—> (a,0)
É óbvio que (p é bijectiva.

Vamos provar que (p é um homomorfismo de anéis.


Sejam a,a'EE. Então,
<p(a + a') = (a + a',0) = (a,0) + (a',0) = <p(a) + <p(a')

180
e
(p(aa') = (aa' ,0) = (aa'+0a'+0a,0) = (a,0)(a' ,0) = <p(a)(p(a')
o que prova que (p é um isomorfismo de anéis.
Concluímos então que A=ExZ é um anel com identidade que contem
um subanel Ex{0} isomorfo a E. *

CONSTRUÇÃO DO CORPO DE QUOCIENTES

Que todo o corpo é anel é uma afirmação clara que resulta da própria
definição.
A questão que queremos aqui colocar é a inversa: "Será que um anel
arbitrário se pode estender a um corpo?"

Suponhamos E um anel comutativo com elemento unidade. Repare-se


que, se E tem divisores de zero, então existem elementos não
invertíveis e, pela definição 9, E não pode estender-se a um corpo.
Então, para estendermos um anel E a um corpo, a primeira exigência a
fazer é que E seja um domínio de integridade.

Estamos agora em condições de garantirmos.que um qualquer domínio


de integridade pode ser estendido a um corpo. As considerações que
vamos a seguir fazer, permitem-nos, a partir de um domínio de
integridade, construir um corpo, que contém esse domínio de
integridade.

Teorema 3
Seja D um domínio de integridade. Então existe um corpo Q que
contém um subdomínio isomorfo a D.
A esse corpo chamamos corpo das fracções ou corpo dos quocientes
de D.

181
Demonstração:
Consideremos o produto cartesiano DxD onde D* = D\ {0}. Em D
vamos definir a relação binária "~" tal que (a,b)~(c,d) se e só se
ad-bc. Facilmente se vê que a relação binária assim definida é uma
relação de equivalência. Sendo a reflexividade e a simetria evidentes,
vamos apenas provar a transitividade. Sejam então (a,b), (c,d), (e,f)
elementos do produto cartesiano DxD tais que (a,b)~(c,d) e (c,d)~(e,f)
. Mas então ad-bc e cf-de . Multiplicando ambos os membros de
cada igualdade por / e b, respectivamente (supostos não nulos por
construção) , vem adf-bcfo, cfb-deb . donde concluímos que adf-deb
, ou seja, afd-ebd. Atendendo agora à proposição 2, temos que af-eb
{d é não nulo, por construção) . Ou seja, (a,b)~(e,f) . Consideremos
agora o conjunto quociente DxD / e notemos por — a classe de
/
~ b
equivalência que contem o elemento (a,b) . Ou seja,
DxD / / = {—^ae D,b eD*}. Para simplificar, designemos por Q o
~ b
conjunto quociente considerado; isto é Q = {— ,a e D,b e D*}. Em Q
b
vamos definir duas operações:

i) uma adição
QxQ^Q
,a c. a c ad + bc
(—,—)-»- + — =
b d b d bd

ii) uma multiplicação


QxQ^Q
a c a c _ ac
b d b d bd

182
Antes de mais, comecemos por verificar que as operações assim
definidas são compatíveis com a relação de equivalência "~" atrás
definida. Temos então de provar que:

i) para a adição
(a,b)~ (a',b')A (c,d)~(c',d')^(ad+ bc,bd) ~(a'd'+b'c',b'd')
_ a a' c c' ad + bc a' d'+b' c'
Ou seia, — = — A — = — => =
b b' d d' bd b'd'

ii) para a multiplicação


(a,b)~ (a',b') A (c,d)~(c\d') => (ac,bd) ~(a'c',b'd')
_ . a a' c c' ac a'c
Ou seia, — = — A — = — => — =
b b' d d' bd b'd'
Vamos verificar a compatibilidade da adição com a relação de
equivalência.
i)Sejam então (a,b),(a',b'),(c,d),(c',d') EDXD* tais que (a,b)~
(a',b') A (c,d)~(c',d') . Ou seja, ab'= ba' e cd'= de'
Queremos provar que (ad + bc)b'd'= (a'd'+b'c')bd . Ora, atendendo
a que D é domínio de integridade,
(ad+bc)b'd'=adb'd'+bcb'd'=ab'dd'+bcd'b'=ba'dd'+bdc'b' =
= (a'd'+b'c')bd
como pretendíamos.

Vamos agora verificar a compatibilidade da multiplicação com a


relação de equivalência.

ii) Sejam então (a,b),(a',b'),(c,d),(c',d')eDxD* tais que (a,b)~


(a',b') A (c,d)~(c',d') ; ou seja, ab'-ba' e cd'=dc' .Queremos
provar que acb'd'= a'c'bd . Ora, atendendo a que D é domínio de
integridade, acb'd'= ab'cd'= ba'de'= a'c'bd, como pretendíamos.

183
Facilmente se prova que , com as operações atrás definidas, Q é um
corpo cujo zero é — e cujo elemento unidade é - , como vamos ver.

Comecemos por mostrar que a adição é comutativa; para isso basta ter
em conta a definição da operação de adição e observar que o resultado
ad + bc , ,. a c
da adição — H—
bd b d
não se altera se trocarmos a ordem das parcelas.
Para provarmos a associatividade, consideremos três elementos
a c e
A ^

—, —,— deQ.
b d f
Temos
a c e _ ad + bc e _ {ad + bc)f + e(bd) _ adf + bcf + ebd
b d f~ bd f~ (bd)f bdf
e
a c_ e_ _ a cf + ed _ a(df) + (cf + ed)b _ adf + cfb + edb
b^ ~d+J ~~b+~~dT b(df) bdf
É imediato que os resultados encontrados são iguais.
,, . 0 0 a a ^
Vejamos que — e o zero. Para tal, basta mostrar4que — H— = — . Ora
1 1 b b
0 a _0b + al _0 + a _a
í b~ \b b ~~b
Que todos o elemento — de Q admite simétrico do tipo — também é
b b
de fácil verificação. De facto,
a -a ab + (-a)b ab + (-ab) 0 0 0
—H = : = ; = —r . So falta ver que __ = _ .
b b b2 b2 b2 b2 1
2
Mas, por construção , resulta trivialmente que 0.1 = Ob , para todo o b
de D*.

184
Até agora provámos que (Q,+) é grupo comutativo. Mostremos de
seguida que, em Q, a multiplicação goza das propriedades comutativa
e associativa e admite elemento neutro.
Que a multiplicação é comutativa, resulta trivialmente da própria
definição da operação de multiplicação. A associatividade obtem­se,
, , .a c . e ac e (ac)e
observando que ( )—= =■
bd f bd f (bd)f
a C 6 Cl C6 Cl(cë)
e que — ( )= = . Por último, observemos que ­ é o
4
b d f b df b(df) 1
elemento neutro para a multiplicação. De facto é trivial que
al la a
— - = — = — . Para terminar a demonstração de que Q é corpo, falta
b 1 1b b
verificar, por um lado, que todo o elemento não nulo de Q admite
inverso multiplicativo e, por outro a propriedade distribuitiva em Q.
Quanto ao primeiro aspecto, notemos que dizer — = 0 é equivalente a
b
dizer a-0 , uma vez que 0 = ­ (Observe­se que ­ = ­ <=> 0.1 = O.b ).
1 b 1
Ou seja, se — e um elemento não nulo de Q , então é do tipo a ï 0 e
b
b*0 . Mas sendo a,b*0 então —eQ. Ora, =— =— =1 .
a b a ba ab
a b
Logo — admite inverso da forma —.
b a
Quanto à distribuitividade, basta mostrar que
.a c. e a e c e , ,
( ­ + —) — = + Mas
b d f bf df

185
a c\ e ad + cb e (ad + cb)e ade + cbe .
( - + —) — = =- = bdf e
b d f bd f (bd)f
a e ce ae ce _ aedf + cebf _ (aed + ceb) f _
~bj + lj~~bf+^f~ bfdf _
bdff "
aed + ceb f aed + ceb
bdf J" bdf
Resta-nos, para terminar a demonstração do teorema 3, provar como
podemos considerar o domínio de integridade D isomorfo a um
subdomínio do corpo Q. Para isso, consideremos Q'={— ,aeD} e
vamos provar que Q'(zQ (Q' é subdomínio de Q) é isomorfo a D.
Para verificar que Q' é um subdomínio de Q, temos de verificar que: i)
Q' é subanel de Q; ii) Q' contem a identidade; iii) Q' não tem
divisores de zero.
Ora Q'czQ e Q'*0.
a b a b
v
T'T6ô'T"Teô
De facto, £ - * = £ + Z * = £ Z * e f i .
1 1 1 1 1
Por outro lado,
v£,*ej2',£*efi'
ii ii
_ , a b ab „ ,
De facto, = — eQ
11 1
Logo Q' é subanel de Q e i) está verificada.
Que ii) se verifica, é imediato.
Para provar iii) suponhamos, por absurdo, que Q' admite divisores de
zero. Seia — um divisor de zero em Q'. Logo,
1
a' 0 aa 0 _, ^ a' ^ a „
3— eO'\{-}:l ; = - . Mas como g c Q , — £ í2 e logo — e
1 ^ l 1 1 1 1 1
divisor de zero em Q, o que é absurdo.

186
Logo Q' é um subdomínio de Q.
Vamos agora procurar o isomorfismo. Consideremos a aplicação

a . É evidente que cp é sobrejectiva. Para provar a


....a—» —
1
injectividade, consideremos dois elementos a e a' de D tais que
(p(a) = q>(a') ou seja, — = — . Daqui resulta a=a' pelo que (p é
injectiva. Falta provar que cp é homomorfismo de anéis. Ora,
. a + Z? a 6 ...
<p(a + b) = —— = - + - = <p(a) + <p(fc).

Analogamente (p(ab) = — = = ç(a)(p(b) . Logo cp é um


isomorfismo. De tudo o que foi dito, concluímos que Q é um corpo
que contém um subdomínio isomorfo a D, c.q.d. *

Já foi dito que o corpo Q que construimos é chamado corpo dos


quocientes de D. A partir de agora podemos esquecer o modo como tal
corpo foi encontrado e pensamos apenas nas suas propriedades: todo o
elemento de Q pode ser escrito sob a forma de um quociente de dois
elementos de D. Em particular, usaremos a notação ab~ para
a
representar —.

Contudo, preste-se atenção para que não se caia no erro grosseiro de


considerar que para duas fracções — e — serem iguais é necessário
b d
que a-c e b-d. Note-se que a fracção — não é um par de elementos
b
de D, onde b?&, mas é representante de uma classe de pares de
elementos de D.
Em particular, se fizermos D=Z (mostra-se que Z é domínio de
integridade) e atendendo às considerações feitas, encontramos o corpo
Q dos números racionais.

187
S U B C O R P O S E E X T E N S Õ E S

Definição 15
Seja (K,+,.) um corpo e S um subconjunto de K. Diremos que S é um
subcorpo de K se S é um subanel de K que é um corpo sobre as
operações (+) e (.). Diremos dualmente que K é uma extensão de S se
S é subcorpo de K.

Definição 16
Seja K uma extensão do corpo S e M um subconjunto de K.
Chamamos extensão de S por adjunção de M e representamos por
S(M) à intersecção de todos os subcorpos de K que contém SuM.
Das próprias definições é óbvio que:
• ScS(M)cK
• S(M) = S see só se M c S

SUBGRUPO N O R M A L . G R U P O QUOCIENTE

Definição 17
Seja G um grupo e H um subgrupo de G. Diz-se que H é subgrupo
normal de G e escreve-se H < G se xH=Hx , para todo o xeG.

Proposição 4
Se G é um grupo abeliano então qualquer seu subgrupo é subgrupo
normal.

Demonstração:
Seja H um subgrupo de G. Vamos provar que xH-Hx , para todo o
XEG. Seja xeG, arbitrário. Então
xH = {xh: heH} = {hx: heH} = Hx c.q.d. *

188
Vamos de seguida ver, como, de um grupo e de um subgrupo normal,
podemos obter um novo grupo.
Seja então G um grupo e H um seu subgrupo e consideremos a relação
de equivalência R definida por aRb<=> b~]aeH, com a,beG. Que a
relação R é reflexiva, resulta do facto de que, para todo o aeG,
aa~x - e S H. (Porque H é subgrupo de G, o elemento unidade tem de
pertencer a H). Para provar a simetria de R, considerem-se a,bGG tais
que aRb. Então b~laeHe, sendo H um subgrupo, se contém um
elemento também contém o seu inverso. Portanto {b~la)~l eH , ou
seja, a~lb e H o que significa que bRa.
Para a transitividade, consideremos a,b,cEG tais que aRb e bRc.
Vamos provar que então ciRc. Por hipótese b~laeH e c~]beH e,
como H é subgrupo resulta {c^b)(b~xa) e H . Ou seja, c~la eHo que
significa cRa. Como à relação R é reflexiva, simétrica e transitiva é
uma relação de equivalência. Vamos definir , sendo aeG, a classe de
equivalência [a]^ tal que
[a]R = {xe G :xRa) = {xeG:a^xeH} = {xeG:a~{x = h,heH} =
= {xe G: x- ah,he H) =
= {ah,heH} = aH

Designemos por G'- {aH,ae G}. Vimos então que G' é a partição de
G correspondente à relação de equivalência atrás definida. Forme-se o
conjunto quociente G / R- {[a]R:aeG], ou seja G'=G/R .
Representemos este conjunto por G/H ; isto é, Gl H- {afr.heH},
com GI H ï0 já que eH - H e G / H .Em G/H vamos definir um
produto tal que (aH)(bH) = (ab)H, para todos os aH e bH de G/H.
Pretende-se que tal produto seja uma aplicação de G/HxG/H em G/H;
ou seja, pretende-se que
i) VaH, bHeGIH, (aH)(bH) eG/H

189
ii)
VaH,a'H,bH,b'He GIH,aH = a'H AbH = b'H^> (ab)H = (a'b')H

Como a,beG, tem-se que abe G e logo (ab)HeG/ H. Falta


garantir que, se a'eaH e b'ebH então a'b'e (aH)(bH) = (ab)H .
Vejamos que esta compatibilidade resulta do facto de H ser subgrupo
normal de G. Seja a'eaH . Então a'=ah] com h]EH. Por outro lado,
sendo b'ebH ,b'=bh,2 , para algum /z 2 e//. Logo
d b'= {ahx){ah2) = a{hfi)h2 .Como H é subgrupo normal de G,
Hb-bH e portanto, dado hjeH, existe h'jeH. tal que hib=bh'i .De
onde a'b'=a(bh\)h2=ab(h\h2) = (ab)h com h = h\h'2eH ,
porque H é subgrupo. Logo, a'Z? e (ab)H , como pretendíamos.
GlHxGI H:->G/ H
Vejamos agora que a operação interna confere
..{aH,bH)...^(ab)H
a G/H a estrutura de grupo.
Sejam aH,bH,cHeG/H. Então
[(aH)(bH)\cH) = ((ab)H)(cH) = ((ab)c)H = (a(fcc))# =
qU£
= (o2ï)((te)H) = (off)[(èH)(cff)] °
significa que a operação é associativa. Por outro lado, para qualquer
aeG, (aH)(eH) = (ae)H = aH = {ea)H = (eH)(aH) o que significa
que eH é elemento neutro em G/H .Quanto à existência de elemento
inverso e sendo aeG, temos que
1 i 1 l
(aH)(a- H) = (aa- )H = eH = (a- a)H=(a- H)(aH). Ou seja, o
inverso do elemento aH é a~'H. Note-se que, sendo aeG e G um
x 1
grupo, existe a~ eG e portanto a' H existe e pertence a G/H .De tudo
o que vimos, podemos concluir que G/H é grupo para a operação atrás
definida. Este grupo designa-se por grupo quociente de G por H.

190
IDEAL DE U M A N E L
A N E L QUOCIENTE

Definição 18
Um subconjunto não vazio R de um anel A diz-se um ideal se:
(i) R é subanel de A
(ii) Para todos os rG R e ae A, are R e rae R

Vimos que a noção de subgrupo normal, permite construir, a partir de


um grupo e de um subgrupo, um novo conjunto que designamos por
grupo quociente. Ora, a definição de ideal é, na teoria doas anéis, a
que corresponde à noção de subgrupo normal na teoria dos grupos.
Vemos como a noção de ideal permite construir a partir de um anel e
de um subanel, um novo anel que desiganremos por anel quociente.
Seja R um anel e S um subanel de R. Como (S,+) é subgrupo de (R,+)
e (R,+) é abeliano, pela proposição 2, (S,+) é subgrupo normal de
(R,+) pelo que podemos pensar no grupo quociente R/S. Pretende-se
definir em R/S uma estrutura multiplicativa de tal modo que R/S seja
um anel. Defina-se uma multiplicação tal que
RI SxRIS:^>RI S
(r + S,r'+S) ^ (r + S)(r'+S) = rr'+S
que seja compatível com a estrutura das classes; isto é, pretende-se
que os elementos da forma (r + s^),(r'+s2) pertençam à classe
produto, para quaisquer r,r'<=R e sl,s2 eS. Analisemos os diversos
casos possíveis. Sejam Si,S2 elementos de S.
Se r=0 e r'=0 então
(r + S)(r'+S) = (0+s,)(0 + s2) = 0 + 5 = S.

Se r=0 e rVO então


(0 + 5,)(r'+í 2 ) = Or+Os, +s,r'+í l ó' e 0 + 5
=> 3seS:slr'+sls2 = s => 3s6 S = sxr'= s-s^ => 5,r'e S .

19J
Se r^O e r'=0, então
(r + sl )(0 + s2 ) = rO + rs2 + s, 0 + s, <>2 6 0 + 5
=> 3se 5:^2 +5,,52 = s, => 3se S:rs2 = s-s}s2 => rs2 e S .

Se r*0 e rVO então (r + s, )(r'+52 ) = rr'+S


=> 3s G S:rr'+rs2 + slr'+sis2 = rr'+s=> 3s G S:rs2 +i'1r'+515'2 = s
=> Else 5 : ^ +s,r'= s—s^ => rs2 + slr'eS

Concluímos assim que, para definir em R/S uma estrutura


multiplicativa compatível com a estrutura das classes, temos de exigir
que:
• S seja subanel
• Para todo os reR e se S se tenha rseS e sreS.
Resumindo, para definir em R/S uma estrutura multiplicativa
compatível com a estrutura das classes temos que exigir que S seja
ideal de R.
Conclusão: se I é um ideal de R, podemos definir em R/I uma adição e
uma multiplicação compatíveis com a esturutra das classes e que
conferem a R/I a estrutura de anel. O anel assim obtido designa-se por
anel quociente.
Vamos agora ver que o anel quociente satisfaz uma propriedade
fundamental.

Definição 19
Seja (p:R—>R' um homomorfismo de anéis. Chama-se núcleo de (p e
representa-se por Ker(cp) à pré-imagem de {0R.} ; isto é,
Ker((p) = {xeR:(p(x) = 0R.}.

Teorema 4
Sendo I um ideal de anel R, existe um homomorfismo de anéis de
domínio R cujo núcleo é exactamente I.

192
Demonstração:
Como I é um ideal de R, podemos considerar o anel quociente R/l.
Consideremos a aplicação " e vamos provar que é um
r^r + l
homomorfismo de anéis, cujo núcleo é exactamente I. Sejam r,r'ER
arbitrários. Ora p(rr') - rr'+l - (r + I)(r'+I) = p(r)p(r')
Considerando agora a operação de adição tem-se, para r,r&R
arbitrários, p(r + r') = (r + r') + I = (r + I) + (r'+I) = p(r)+ p(r') •
Provamos então que p é um homomorfismo. Por outro lado

Ker(p) = {reR: p{r) = 0 + 1} = {r e /?: r + 1 = 0 + 1} = {re R:rel} = I


,como se pretendia. *

Como consequência, verifica-se ainda uma propriedade de


R I Ker{(p). Antes porém apresentemos uma definição.

Definição 20
Chama-se epimorfismo a todo o homomorfismo sobrejectivo.

Proposição 5
Seja <p:R—>R' um epimorfismo de anéis. Então R I Ker((p) e R' são
isomorfos ; isto é RI Ker(ç) = R'.
Demonstração: (sem demonstração)

Proposição 6
Seja q):R-^R' um homomorfismo de anéis, (p é injectiva se e só se
Ker((p)={0}.

Demonstração:
(=>)
Se (p é injectiva e (p(r)=0 então cp(r)= (p(0) e daí r=0 (trivial).

193
(«=)
Se Ker(cp)={0}, consideremos r,r'ER tais que cp(r)=(p(r'). Logo
0 = <p(r) -(p(r') -cp{r- r') porque (p é homomorfismo. De onde
0 = r - r ' < = > r = r ' e portanto (p é injectiva. *

IDEAL PRIMO. IDEAL M A X I M A L .

Definição 21
Seja R um anel e X um subconjunto de R. Chama-se ideal gerado por
X à intersecção de todos os ideais de R que contêm X.

Proposição 6
Seja R um anel comutativo com identidade e X um subconjunto não
vazio de R. Então o ideal de R gerado por X é

RX = Ç2jrixi>ri ER
>XÍ eX,i = l,...,n,n>l}.
1=1

Demonstração: (sem demonstração)

Definição 22
Um ideal P diz-se primo se, sempre que xy e P então xe P ou y G P

O resultado seguinte é uma caracterização dos ideais primos de um


anel comutativo com elemento unidade.

Teorema 5
Seja R ï {0} um anel comutativo com elemento unidade. Seja N um
ideal próprio de R. Então N é um ideal primo se e só se R/N é um
domínio de integridade.

194
Demostração
(=0
Seja N um ideal primo de R . Sabemos que R/N é um anel, comutativo
com elemento unidade. Para provar que R/N é domínio de integridade,
basta provar que em R/N não existem divisores de zero. Seja a+N um
elemento não nulo de R/N, (isto é a+N^N). Vamos ver que a
igualdade (a+N)(b+N)-N só é possível com b+N=N. De facto,
(a + N)(b + N) = N<=>ab + N = NaabeN=ï>aENvbEN , uma
vez que N é ideal primo. Ora, por hipótese, aíN ; então beN e logo
b+N=N, como pretendíamos.
(<=)
Seja R/N um domínio de integridade e N um ideal próprio de R.
Queremos provar que N é um ideal primo. Seja abeN . Então
ab+N=N; ou seja, (a+N)(b+N)=N . Mas, como R/N não tem divisores
de zero tem-se que a+N=N ou b+N=N . Isto é, aeN ou beN, o que
prova que N é ideal primo, como se pretendia. *

Definição 23
Um ideal M de um ideal R diz-se um ideal maximal se M^R e se não
existe nenhum ideal próprio de R que contenha M, propriamente.

Teorema 6
Seja R um anel comutativo com elemento unidade e M um ideal de R.
M é um ideal maximal se e só se R/M é um corpo.

Demonstração:
(=>)
Seja M um ideal maximal de R. Então M^R e portanto R/M tem pelo
menos um elemento não nulo. Como R é um anel comutativo com
elemento unidade, também R/M é anel comutativo com elemento
unidade. Para provar que R/M é corpo, temos de garantir que todo o
elemento não nulo de R/M admite inverso multiplicativo. Seja

195
a+MïM um elemento não nulo de R/M. Pretendemos provar que
existe b+MeR/M tal que (a+M)(b+M)=l+M.
Seja X = {a}uM; consideremos o ideal gerado por X e que
representamos por (X). Como M é um ideal maximal de R, deverá ter-
se (X)=R . De facto, se (X)czR e uma vez que Mcz(X) já que
a£M por hipótese, e ae(X) M não seria um ideal maximal de R,
contrariando a hipótese. Então (X)=R e logo le(X) . Pela proposição
5, (X) = {ar + m,reR,mE M} e portanto tem-se l=ar+m, para
algum r de R e algum m de M. Então ar-l-m ; logo arel+M . Donde
resulta que ar+M=l+M e logo (a+M)(r+M)-l+M , pelo que está
garantida a existência de um elemento b+MeR/M tal que
(a+M)(b+M)=l+M, como pretendíamos.

(<=)
Suponha-se que R/M é um corpo. Então R/M tem pelo menos um
elemento não nulo e portanto M^R . Para provar que M é ideal
maximal, temos de provar que não existe nenhum ideal próprio de R
que contenha M propriamente. Por absurdo, suponhamos que existe
um ideal MVR tal que McM' . Mas, como M'cR, existe aeR tal que
agM' e, como McM' existe beM' tal que b0M . Vejamos que tal
situação vai conduzir ao absurdo. Como, por hipótese R/M é corpo e
b+M?M , tem-se que, existe b'+MeR/M, tal que (b+M)(b'+M)=l+M
Daqui resulta (b+M)(b'+M)(a+M)=a+M. Ou seja, existe c+MeR/M
tal que (b+M)(c+M)=a+M . De onde bc+M=a+M e logo (bc-a)EM
Atendendo a que McM' tem-se que (bc-a)eM' e logo bc+M'=a+M'
Ou seja (b+M')(c+M')=a+M' e como beM' resulta b+M'=M', isto é,
b+M' é o zero de R/M' .Mas como o zero de um anel, multiplicado
por qualquer outro elemento é sempre igual a zero do anel, vem que
a+M'=M' e logo aeM', o que contraria a escolha de a. O absurdo
resultou de se ter suposto que existia um ideal próprio M' contendo
propriamente M, o que supunha que M não era maximal. Então M é
ideal maximal, como pretendíamos. *

196
Definição 24
Seja A um anel comutativo com elemento identidade 1. Um elemento
a de A diz-se uma unidade se c.a=l=a.c, para algum ce A.
U(A) representa o conjunto de todas as unidades de A.

Definição 25
Seja D um domínio de integridade e r,seD. Diz-se que r divide s
(simbolicamente r\s) se existe keD tal que s=kr.

Definição 26
Seja D um domínio de integridade e reD. Um elemento r diz-se
elemento primo em D sse:
i)rïÔereU(D)
i) dados a,bOeD sempre que r\ab então r\a ou r\b.

Teorema 7
Seja D um domínio de integridade e peD\{0}. Então p é primo em D
se e só se (p) = {rp,r&D) é um ideal próprio primo.

Demonstração:
Designemos por D*=D\{0}.
(=>)
Seja pe D* tal que p é primo. Então pi U(D) e pM pelo que (p) é ideal
próprio de D.
Seja xye(p). Então xy=rp para algum reD o que significa que p\xy).
Como p é primo tem-se p\x ou p\y . Se p\x então x=kip, com kieD
pelo que xe(p). Se p\y e analogamente, se conclui que ye(p). Mas
assim concluímos que, se xye(p) então xe(p) ou ye(p), o que
significa que (p) é um ideal primo.
(<=)
Suponha-se que (p) é um ideal próprio primo de D. Como peD*,
(p)^{0}. Pelo teorema 4 D/(p) é um domínio de integridade. Então

197
l+(p)^p) e portanto lg(p). Então, para todo reD, rpïl o que
significa que pgU(D). Por outro lado, sejam a,èeD tais que p\ab).
Isto é, ab=kp, para algum keD, o que significa que aèe(p).
Consequentemente ae(p) ou òe(p), porque, por hipótese (p) é ideal
primo. Mas então resulta que p\a ou p\b. Concluímos assim que p é
um elemento de D tal que
p*0,p£U(D)
o que significa que p e um elemento primo de
p\(ab)^> p\av p\b
D, como se pretendia. *

198
EXTENSÕES SIMPLES
EXTENSÕES ALGÉBRICAS E TRANSCENDENTAIS

Definição 27
Seja K um corpo, S um subcorpo de K e 9e K. Chama-se extensão
simples de S à extensão de S por adjunção de 0 e representa-se por
S(0).

Teorema 8
Seja K um corpo, S um subcorpo de K e 06 K. Então S(0) é o menor
subcorpo de K que contém Su{0}.

Demonstração:
Consideremos o conjunto K tal que
— a0+ax9 + ...an9n
": = {
è 0 + ^ + ... + ^ " ' ' a
"^ e 5
'' = 0
'-'n'7' = 0'-'m'n''?íeyVo'
b0+bí9+... + bm0m ^0}
onde, por definição
a0 + a.9+...a9"
be+bfi+...+bJ- =<°. +«,P+-+».«-X»b + ^ + - + * . 8 - ) - .
Vamos provar que K é o menor subcorpo de K que contém Su{0}.
Seja K, um subcorpo de K que contém Su{0}. Como Kj contém 0 e,
em particular, Ki é ainda um corpo, contém todas as potências
multiplicativas de 0 e portanto 0'eKi, i=0,l, ... Mas então também são
elementos de K, todos os polinómios a0 + a19+...+an6n com
a e
j S,j: = 0,...,n e também os seus inversos. Logo, para todos os
ãj eS,j = 0,...,n e para todos os bk e AT, ,k = 0,...,m tem-se
(a0+aie+...+anen)(b0+bl6+...+bm9",y[ eK, desde que
b0 +bí9+...+bm9m * 0 . Mas então i^cK, e portanto K é o menor

199
subcorpo que contem Su{8}. Donde, por definição, resulta
ÃT=Su{9} ;istoé, £=S(0) +

Recordando que podemos designar por S[6] o anel dos polinómios


sobre S na indeterminada 9, verifica-se que S[0]cS(9).

Definição 28
Seja K um corpo, S um subcorpo de K e 9eK. Se S(6) = S[6] diz-se
que 9 é algébrico sobre S e que S(9) é a extensão algébrica de S por
adjunção de 9 .

Definição 29
Seja K um corpo, S um subcorpo de K e 9eK. Diz-se que 9 é
transcendente sobre S se S(0)ZJS[6] e que S(9) é a extensão
transcendente de S por adjunção de 9 .

Para distinguirmos extensões algébricas de extensões transcendentes,


consideremos o teorema seguinte.

Teorema 9
Seja K um corpo, S um subcorpo de K e 9eK. Então verifica-se uma e
uma só das seguintes condições:
i)S(0) = S(X)
ii) S(0)~S[X]/(p
onde (p 6 S[X] é um polinómio irredutível na indeterminada x e S(X)
representa o corpo das fracções de S[X]
Antes porém da demonstração deste teorema, recordemos a definição
de polinómio irredutível.

Definição 30
Seja K um corpo e p e K[x] Diz-se que p é um polinómio irredutível
se:

200
I) p não é um polinómio constante;
ii) para todos os g,heK[X] , se p=gh, então ou h é um polinómio

constante não nulo ou g é um polinómio constante não nulo.

Passemos, agora sim, à demostração do teorema 8.

Demonstração:
(p:S[x]->S(6)
Consideremos a aplicação " "
7=0 ;=0

Facilmente se verifica que (p é um epimorfismo de anéis, se S(9) é


uma extensão algébrica de S. Então, pela Proposição 3

/Ker(D ~ ^[^] ' ^ e m o s ent


ã° dois casos a considerar:
(i) Kenp = {0}
Pela Proposição 4, tp é injectiva e logo S[X]=S[9]. Como K é um
corpo, S[X] é domínio de integridade e logo S[0] também é domínio
de integridade. Logo, são também isomorfos os corpos das fracções de
S[X] e S[9]. Temos então S(X)=S(G), o que prova (i).
(ii) {0} * Kenp c S[x]
Como S é um corpo, S[X] resulta um domínio de ideais principais.
Então, existe \j/eS[X] tal que Ker(p = (\fr) e então S[9]=S[X]/(\|/) .
Como S é corpo, S [9] é domínio de integridade e tem-se que S[X]/(\|/)
é um domínio de integridade. Pelo Teorema 4 concluímos que (v|/) é
um ideal primo. Mas então o Teorema 6 garante que y é um
polinómio primo. Como S[X] é um domínio de integridade tem-se que
V é um polinómio irredutível. Por outro lado, sendo (vj/) um ideal
maximal, o Teorema 5 garante que S[X]/(\|/) é um corpo. Mas então
S[9] é corpo e, por definição de extensão , S(9)=S[0]. Então
S(6)=S[0]/(\|O com \|/eS[X], irredutível, o que completa a
demonstração. *

201
BIBLIOGRAFIA

Godement, R. (1966) Cours d'Algèbre. Paris. Hermann

Santos, V. , Apontamentos de Álgebra, Universidade de Aveiro.

(1994).Apontamentos de Álgebra, Mestrado da Universidade de


Coimbra

202
PARTICULARITIES OF THE GREEK BANKING SYSTEM
(G.B.S. )

PANTELIS F. KYRMIZOGLOV
SUMMARY

1. HISTORY OF THE G.B.S.


2. BASIC CHARACTERISTICS
2.1 .HIGH DEGREE OF CONCENTRATION
2.2.THE DOMINANT ROLE OF THE STATE
2.3. GEOGRAPHIC CONCENTRATION
2.4. LACK OF COMPETITIVENESS
3. IMPORTANCE OF THE MARKETING DEPARTMENTS IN THE GREEK
BANKS.
4. PROBLEMS FROM NOT TAKING ADVANTAGE OF MARKETING LN THE
GREEK BANKS
4.1. SERVICES
4.2. PRICING
4.3. DISTRIBUTION
4.4. PEOPLE
5. EPILOGUE

REFERENCES

204
1. HISTORY OF THE G.B.S.

The history of the Greek banking system starts in 1828 when the
first prime minister of the modern Greek state, established the
National Financial Bank, in order to overcome the fiscal and credit
problems arising out of the war of independence from the Turks.
Due to the people's unwillingness to trust a bank dealing with
the financial problems of the new unstable state, the bank was led to
closure. In 1831 the National Bank of Greece was established as the
first private bank in Greece.
The number of Banks operating in Greece, increased gradually
and stopped increasing only during the Balkan wars and the I World
War. The right of issuing bank notes was exercised by the National
Bank of Greece and the Ionian Bank, up to 1928, when the Bank of
Greece was set up to operate as the Central Bank of the country.
The financial crisis of the 1929 led to a decrease in the number
of Greek banks as a result of the bankruptcy of the smaller banks and
some mergers. There were 31 banks operating by the end of 1938 and
they were decreased to 15 in 1945 after the II World War.
The civil war which ended in 1949, led to an upsetting of the
relations of Banks with the Bank of Greece. Due to the consequences
of the war, banks were asked to contribute for the reconstruction of
the Greek Economy. Since then the State has increasingly, intervened
in banking, and the biggest banks were nationalised.
The presence of foreign banks has increased since the 1960 due
to the internationlisation of banking, and the country's admission to
the European Union.

2. BASIC CHARACTERISTICS

The contemporary Greek banking system has the following


characteristics:

205
2.1. High degree of concentration
As the alternative forms of financial markets are still of minor
importance, the credit management of national savings is carried out
mainly by banks. The biggest part of banking transactions is carried
out by two biggest commercial banks together with the banking
institutions they control. This situation can be seen in the following
table:

1988 1988 1993 1993


LOANS DEPOSITS LOANS DEPOSITS
National Bank 43,6 53,4 30,5 45,7
Commercial 15,2 13,4 14,1 14,3
Bank
Ionian Bank 7,8 7,3 6,1 6,3
Credit Bank 7,6 6,9 10,2 8,9
TOTAL 74,2 81,0 60,9 75,2
Rest Com. 25,8 19,0 39,1 24,8
Banks
TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0

The trend of reduction in the degree of concentration continues


in the more recent years but it still remains very high.

2.2. The dominant role of the State


The Greek state controls the biggest part of banking. We can
understand this argument by considering the struture of the banking
system. The G.B.S. of Commercial banks1 and the Specalised Credit

1
There were 43 commercial banks operating in Grèce by the end of 1996.
Twenty of them were Greek banks, fourteen were branches of commercial banks
incorporate in other m&r.iber states of E.U. and nine were branches of banks from
third countries.

206
Institutions ( Investment Banks, Agricultural Bank, Mortgage Bank,
Postal Savings Bank, Deposits and Loans Fund).
Commercial banks control respectively 70% and 50% of the
total deposits and loans.
Specialised Credit institutions control respectively 30% and
50% of the total deposits and loans.
We can realize the powerful presence of the State, if we bear in
mind that the State-owned commercial banks control 70% of the
deposits and 60% of the loans of all the commercial banks. In the
specialised credit institutions the dominance of the State is absolute,
with the exception of a small private mortgage bank.

2.3. Geographic concentration


All banks are based in Athens and Thessaloniki, and that has to
do with the concentration of business in the urban centers. Only a few
years ago some local cooperative banks started their activity, but their
markets shares are negligible.
The degree of geographic concentration is even higher
concerning the foreign banks. With exception of a few branches of
CITIBANK, all the branches of foreign banks are located in Athens
and some of them in Thessaloniki.

2.4. Lack of competitiveness


The lack of competitiveness of the G:B.is mainly due to the
following factors:
a) The reserve requirements ratio remains at a high level.
b) Rates of interest are still very high, due to the high state
budget deficit and therefore the higher rates of interest of state bonds
and treasury bills.
c) Lack of investments in new technology.

The number of commercial banks increased substantially in the last years in


anticipation and as result of the deregulation of markets and the liberalisation of
capital flows.

207
d) The ratio of staff expenditure to the owerage assets remains,
for the Greek banks, the higher among the countries of E.U.. In the
same time there is a shortage specialists in new banking services.
e) The Greek banks have started thinking mergers and
acquisitions only a few months ago. Therefore many small banks have
managed to be profitable, just because they take advantage of the lack
of flexibility of the bigger state-owned banks.
f) Privatisations are carried out with great difficulties, even if
they concern very limited part of the G.B.S. . This is due to the power
of the trade unions, which are very strong in the state-owned banks.
We strongly believe that the lack of competitiveness of the
G.B.S. is to a considerable extent due to the still undergraded position
of marketing in the Greek banks. This undergrading has to do both
with the position of the Marketing departments in the hierarchy of the
banks and the inefficient use of the elements of the marketing mix.
In the following lines we will try to confirm what we have just
mentioned.

3. IMPORTANCE OF THE MARKETING DEPARTMENTS IN


THE GREEK BANKS.

The Greek banks seem to underestimate the importance of


marketing departments
That was one of the conclusions drawn from a research carried
out by our Institute. The research was concerning the relationship
between commercial banks and small firms, and included 15
commercial banks having 90% of the total assets of all the commercial
banks operating in Greece.
The first Marketing department was established in the biggest
Greek bank in 1981.
Only 6 out of the 15 banks have a department with a tittle
including the word marketing.
Five of the banks approached stated that although they care
about the marketing matters, they don't have a department dealing
exclusively with marketing affairs.

208
The role of the Marketing departments in the cases they exist,
has to do with suggestions. In none of the banks the marketing people
had any authority to decide on crucial matters.
The marketing functions are carried out by various people of
various departments. The split of the marketing activities in many
departments, results in the wrong function of marketing, namely in the
wrong diagnosis of the customers' needs and consequently the lack of
full satisfaction of their needs.

4. PROBLEMS FROM NOT TAKING ADVANTAGE OF


MARKETING IN THE GREEK BANKS

The consequences of underestimating the importance of


marketing in the Greek banks, can be seen in each element of the
marketing mix. In the next lines we will refer to some cases which we
think owe evidences that banks could be in a better position if they
adopted the principles of marketing in a move efficient way.

4.1. Services
Some critics state that in Greece we have only 10% of the
internationally known banking services Maybe this is an
exaggeration, but still the reality is not very encouraging.
The lack of banking services tailored to the needs of the
customers is in some cases very evident. For exemple: short-term
bank loans in 1989 were counting as 38,2 % of the total short term
sources of finance, compared with 37,5% short-term credits from
suppliers of the firms. In 1995 short-term bank loans were gradually
reduced to 32,5%, compared with 43,2% from the credits of suppliers.

This exemple shows that competition is not fierce only within


the banking system, but it comes also from outside, and the banks do
not seem ready to face it. The conclusion is even more discouraging if
we bear in mind that deregulation of the banking market has started

2
Ependitis - Economy, 14.06.98, p. 18.

209
since 1987. Namely, instead of having more flexible banks, we ended
up with the reverse effects. In the same time the services of factoring
which might constitute an alternative for short-term bank loans, cover
less than 11% of the total needs, compared with an average of 11% in
the E.U.
On the other hand the spectacular growth of mutual funds (based
on market segmentation) compared with the stagnation in the
traditional bank deposits, can show what marketing can do to give a
boost to the banking turnover.

4.2. Pricing
The lack of transparency and consistency is the main reason that
prevents pricing to become an effective tool towards achieving the
bank's objectives. Let's refer to some exemples:
a) Even in cases where pricing policy could be considered as
given, it is not so.
For example, due to the lack of secondary market for state bands
and treasury bills, different banks may charge the customers with
varying penalties in case they need the money before the expiry of the
bonds. The difference is due to the varying methods of calculation
used by different banks.
b) In many cases, an unsincere formulation of pricing policy is
observed.
For exemple the bank announces for a current account of
advances that the customer is charged with a 20% vate of interest plus
1% commisson. The commission ends up to be 1,7% due to the
particular way it is calculated (This is a common practice for many
Greek banks).
c) Banks use political year in calculating interest for deposits,
and mixed year in case of loans. In this way they pay less interest for
the deposits and receive more interest for the loans.
d) Banks use "valeur" in order to increase their revenus in some
cases even without the slightest rationale.
e) Banks' policy to receive commisions associated with
collateral, ends up with a higher charge for the smaller firms.

210
Overcharging of small firms has led then either to be unable to pay out
their loans or to look for other alternatives (i.e.suppliers'credit etc.).

4.3. Distribution
There are certain factors which prevent the banks to establish
their branches, based on rational criteria.
Some of these factors are the following:
a) Very often the management is based on intuition rather than
scientific marketing research in order to establish a new branch.
b) Some times social and economic reasons dictate the decision
for a new branch. For exemple the State owned banks open branches
in areas with low income or diminishing population.
c) Opening new branches with leading executives having
hnowledge which is not supplementary with each others'. Another
factor creating problems in the new branch is when the leading
executives come from a branch neighboring with the new one. If the
Management cannot overcame these problems they had better
postpone the opening of the new branch.
d) Sometimes new branches may come as a result of pressures
exercised by the trade unions for the creation of managerial posts.

4.4. Promotion
The problems associated with the above mentioned elements of
the marketing mix make the task of promotion more difficult.
News papers seems to be the most popular means of
advertisement in the last ten years with 49,09 % of the total
advertising expenditure, second is television with 36,22 %, third is
magazines with 9,01 % and fourth is radio with 5,68 % .
The last few years Greek banks have realised that personal
selling is the most appropriate means of approaching customers and
they gradually attribute more and more importance to this element of
promotion following the exemple of insurance companies.
In general promotion has been more important during the last
ten years, because of the deregulation of the market and the overall

211
developments in the banking sector, wich have resulted in more
complicated banking services.

4.5. People
Greece is one of the very few countries of O.E.C.D.where the
people employed in the banking sector are increasing. This
development in combination with the fact that the ratio of staff
expenditure to the average assets is very high, show to a considerable
extent in the inability to take advantage of the new technological
applications.
By the end of 1990 the Greek banks were employing about
40.000 employees. Among them 35 % were educated at university
level, 53 % had finished secondary education and 12 % had finished
primary education.
Since then many changes have taken place and continue even
faster. Employees have to be more adjustable in the changing
environnment and more capable of assuming responsibilities and
taking initiatives.
The increased use of computers and the customers' demand for
a more qualitative approach has led to a substantial increase in the
staff dealing with the personal selling and consultancy for the
customers. This trend is expected to continue even faster in the near
future.

5. EPILOGUE

In this article we referred to the history and the characteristics of


the Greek banking system, and we also examined the underestimated
role of marketing in the Greek banks by trying to show some of the
consequences of this weakness. We believe that since 1987 the G.B.S.
has been placed in a new course, with deregulation of banking market
having changed the rules of the game. Until 1987 all the banks were
offering the same services in the same prices and therefore there was
very little room for marketing to develop.

212
Nowadays the more successful banks will be those that have
fully adopted the principles of marketing and have been adjusted to
the new challenging environment.

213
REFERENCES

CHARALAMPIDES E. , " Modernisation of Banks and its


Consequences on Specialisation and Training of Human Resources",
HBA Bulletin, Apr/Jun., 1994, p.25-41.
GEORGOPOULOS, A., " Traditional Bank Lending in Front of
New Challenges", Economiki Epitheorisi, Oct/Dec, 1997, p. 4-25.
GHORTSOS, C., "Greek Banking System", HBA, 1997.
KYRMIZOGLOV, P. , "Money and Banking", T.E.I. Thes, 1991.
MAVRIDES, D. "The Dynamics of Ratio Analysis", Económica
Chronika, Oct., 1997, p. 42-44.
SARMANIOTIS, C , Unpublished PhD. Thesis, University of
Thessaloniki, 1991.
ALPHA CREDIT BANK, Economics Bulletin, 1996, p. 8-12.
Sugestões para Apresentação dos Originais

1. Os originais podem ser acompanhados por uma nota biográfica que não exceda três linhas.

2. Os textos devem fazer-se acompanhar de um sumário elaborado de acordo com os tópicos do


artigo.

3. Os artigos não podem, em princípio, exceder 25 páginas, marginadas de acordo com os


parâmetros da Revista. As recensões não devem ultrapassar as cinco páginas.

4. Os originais serão acompanhados de registo em diskete, de acordo com as seguintes normas de


processamento de texto:
4.1. Sistema Operatitvo: MS/DOS - ambiente Windows.
4.2. Tipo de Letra:Times New Roman, com o seguinte tamanho: 14 no título, 13 nos capítulos,
etc., 12 no texto e 10 nas notas.
4.3.Alinhamento do texto em centímetros:Top. 5,5; Bot. 6,75; Ins.5,5; Out. 3,5; Head. 1,25;
Foot.5,5; Paragr.1,0; e com opção de páginas par e ímpar.

5. Bibliografia, referências bibliográficas, citações e notas.


5.1. A Bibliografia deve ser ordenada com base no apelido do autor: Ex: Amorim, Jaime Lopes. Se
a obra for colectiva, normalmente mais de três autores, refere-se pelo nome do I o autor e pelo vocábulo
latino alii ( ou apenas al.). Ex: Amorim, Jaime Lopes et al (ou e o.).
5.2. As referências bibliográficas devem seguir as orientações vulgarmente aceites: rigorosas,
precisas e uniformes, respeitando o seu carácter específico. As monografias devem inserir as seguintes
informações: Autor, (eventualmente o ano da fed.), título, volume, edição, local da edição, editor, ano
da edição consultada. Os artigos das publicações periódicas devem referir: autor, título do artigo, in título
da publicação, local da publicação, série, volume, n°, data (mês(es) e ano, pags (50-75) em que se
encontra o artigo.
5.3. As referências bibliográficas coladas às l"s citações devem acrescentar aos campos
enunciados em 5.2, a(s) página(s) - p.ou pp. - e, se fôr caso disso como nos Dicionários e Jornais, etc.
a(s) coluna(s). Ex.Godinho,Vitorino Mag.alhães, Complexo histórico-geográfico, in. Joel Serrão,
(Dir. de), Dicionário de História de Portugal, Vol.l/A-D, Porto, Iniciativas Editoriais/Figueirinhas,
p. 645, col.2. As referências bibliográficas relativas às 2.as citações colhem a vantagem da sequência das
notas: aparecem abreviadas recorrendo aos vocábulos latinos idem (autor), ibidem (obra) e, às vezes,
passim (em vez de uma indicação precisa da página). A redução dos campos bibliográficos acontece
igualmente quando as referências têm por suporte a bibliografia geral. Ex: Amorim, Jaime Lopes A (ou
B); ou simplesmente o ano de publicação: Amorim, 1929, p. 20.
5.4. Localização das referências bibliográficas.
5.4.1. As referências bibliográficas podem aparecer em nota de rodapé, na totalidade ou
articuladas com a bibliografia geral.
5.4.2. Podem igualmente surgir, em alguns casos restritos, no interior do texto logo a seguir à
citação, seguindo o modelo mais sintético de referência. Ex: Amorim, 1947 D, p. 20.
5.4.3. As notas podem também aparecer no final do texto, devendo esta opção prevalecer sempre
que o artigo exige longas notas informativas ou explicativas, que em rodapé tornam demasiado pesado o
seu desenvolvimento.

Você também pode gostar