Arte da capa e foto: André Azevedo

Parceria pode Mídia a Favor

mudar a vida da Paz
de deficiente físico Edvaldo Pereira Lima rede mundial de jornalistas pela paz vem
motivando o emprego do jornalismo
A crescente violência imperante no literário como forma de expressão
mundo em todas as suas formas e a preferencial na alavancagem de um trabalho
Renda de reciclados será revertida contrapartida da procura da paz têm transformador, sintonizado com a
na fabricação de cadeiras de rodas provocado um profundo questionamento em construção de um mundo pacífico, social e
diversas esferas da sociedade. Mais do que ecologicamente responsável.
nunca, o estado desesperador da civilização Estamos agora dando um passo a mais .
reprodução
Claudinei Honório contemporânea torna-se visível, exigindo O nosso Curso de Comunicação Social
7° período de Jornalismo ações dramáticas de transformação que acaba de adotar “A Mídia e a Cultura da
levem ao estabelecimento sólido de uma Paz” como o tema inspirador deste semestre.
O lixo produzido pela população cultura pela paz. Estamos assumindo proativamente um
uberabense pode ter uma finalidade social. O questionamento, assim como as compromisso de colaboração efetiva na
Os objetos passíveis de reciclagem poderão iniciativas que visam transformar o estado germinação da paz, através de iniciativas
ser doados para a empresa Transentulho que vigente, também começam a crescer no que envolvem desde a abertura de espaço
fará a comercialização dos reciclados. A âmbito dos profissionais para o tema nos nossos
renda será revertida na fabricação de da comunicação social. veículos experimentais de
cadeiras de rodas. Esta atividade faz parte Não há dúvida que os Estamos assumindo comunicação e na nossa
do projeto que a Adefu (Associação dos meios de comunicação de proativamente um agência experimental de
deficientes Físicos de Uberaba) e o Rotary massa desempenham um publicidade e propaganda,
Club Uberaba Norte estão desenvolvendo, papel primordial na compromisso de até ações sociais comuni-
visando a geração de emprego e renda para sociedade, mas triste- colaboração efetiva tárias em Uberaba, pas-
os deficientes. mente, constatam os pro- na germinação da paz sando por programas de
Segundo Nabi Gouveia, presidente da fissionais mais atentos, na educação crítica da mídia,
avenida de serviços do Rotary, o objetivo é maioria das vezes estão à junto a escolas da cidade.
montar um banco de cadeiras de rodas que serviço da manutenção de um baixo estado Queremos, antes de tudo, que nossos
servirão tanto para a comercialização, como de consciência da população, contribuindo estudantes ampliem a consciência do
para doação aos deficientes mais carentes, necessidades”, afirma Íris. indiretamente para a propagação de uma papel que podem desempenhar, agora e
auxiliando também na manutenção das O projeto está a procura de cultura que no mínimo dificulta a paz. como futuros profissionais, na
antigas cadeiras. “Esta patrocinadores e São exemplos promissores dessas transformação do mundo para melhor.
fábrica de manutenção colaboradores. A iniciativas o lançamento no Brasil do Queremos que educadores e alunos
e produção de cadeiras “Fábrica de manutenção e fábrica será Movimento Mídia da Paz (na internet: reconquistem a fé no ser humano para
vai integrar os produção de cadeiras vai montada na www.midiadapaz.org) e no cenário ações nobres. E que experimentem
própria Adefu, internacional a criação da rede mundial de meios criativos de direcionarmos o
deficientes à sociedade, integrar os deficientes à
uma vez que eles serão podendo desta jornalistas pela paz (www.firewords- trabalho do comunicador para funções que
sociedade, uma vez que eles press.org) façam uma diferença realmente
treinados para o maneira oferecer
trabalho”, afirma Nabi.
serão treinados para trabalho” uma estrutura Os valores que alimentam a visão significativa.
Para o presidente da direcionada para filosófica do Curso de Comunicação Social A oportunidade está criada. Cabe-nos
Adefu, Íris Nogueira, a fábrica vai trazer o trabalho dos deficientes. Os presidentes da Universidade de Uberaba estão alinhados caminharmos agora, juntos, com mente
grandes benefícios para os deficientes, pois da Adefu e do Rotary esperam que no com essas preocupações desde quando a lúcida e coração tranqüilo.
a qualidade de vida deles tende a melhorar. máximo, até o final do ano, a fábrica já reformulação do Curso teve início, em 1998.
“Muitos, até tem uma cadeira de rodas, mas esteja construída e as primeiras cadeiras O interesse pela responsabilidade social é Edvaldo Pereira Lima é diretor do Curso de
ela não é completamente adaptada para as sejam entregues. Para Nabi, “esta é uma um exemplo disso. O estímulo a uma forma Comunicação Social da Universidade de
suas necessidades, com a construção das oportunidade de doar trabalho para uma diferenciada de narrativa jornalística, o Uberaba. Jornalista. Doutor em Ciências
cadeiras, poderemos suprir estas causa de absoluta necessidade”. jornalismo literário, é outro. Por sinal, a da Comunicação pela USP.

Jornal-laboratório do curso de Comunicação Social, produzido e editado pelos alunos de Jornalismo e Publicidade & Propaganda da Universidade de Uberaba

Edição: Alunos do curso de Comunicação Social • • • Supervisão de Edição: Celi Camargo (celi.camargo@uniube.br) • • • Projeto Gráfico: André Azevedo (andre.azevedo@uniube.br) • • •
Diretor do Curso de Comunicação Social: Edvaldo Pereira Lima (edpl@uol.com.br) • • • Coordenadora da habilitação em Jornalismo: Alzira Borges da Silva (alzira.silva@uniube.br) • • •
Coordenadora da habilitação em Publicidade e Propaganda: Érika Galvão Hinkle (erika.hinkle@uniube.br) • • • Professores Orientadores: Norah Shallyamar Gamboa Vela (norah.vela@uniube.br),
Vicente Higino de Moura (vicente.moura@uniube.br) e Edmundo Heráclito (heraclit@triang.com.br) • • • Técnica do Laboratório de Fotografia: Neuza das Graças da Silva • • • Distribuição: Assessoria de Imprensa
• • • Reitor: Marcelo Palmério • • • Ombudsman da Universidade de Uberaba: Newton Mamede • • • Jornalista e Assessor de Imprensa: Ricardo Aidar • • • Impressão: Jornal da Manhã
Fale conosco: Universidade de Uberaba - Depto. de Comunicação Social - Bloco L - Av. Nenê Sabino, 1801 - Uberaba/MG - CEP 38055-500 • • • Tel: (34)3319-8952 • • • http:/www.revelacaoonline.uniube.br
As opiniões emitidas em artigos assinados são de inteira responsabilidade de seus autores.
2 1 a 7 de abril de 2002
O que é paz na mídia para você?
Alunos do 7º período de Jornalismo analisam comportamento da imprensa,
tendo como foco a cobertura sensacionalista da violência urbana
O grotesco ajuda a vender?
Adriana Amaral Guardieiro
Atualmente, os meios de comunicação
de massa tornaram-se algo imprescindível
na vida das pessoas. Porém, muitas vezes,
eles abusam da liberdade de expressão, pois
quando pegamos uma folha de jornal ou
ligamos a televisão, tudo o que vemos são
barbáries que se transformaram em um mero
acontecimento do nosso cotidiano. As
pessoas não estão sabendo distinguir o certo
do errado, nem mesmo onde está localizado
o seu direito de cidadão.
A mídia de modo geral (jornais,
televisão e rádio) está , a cada dia que passa,
mais sensacionalista em todos os seus
setores. Um telespectador, por exemplo,
quando chega em casa e liga seu aparelho
de TV, passa a assistir a violência
inconsciente de sua dignidade. Programas
infantis, jornalísticos, novelas, tudo isso é
representado por uma auto-exposição das
personalidades que estão na tela. E, por
curiosidade, o telespectador continua
assistindo para saber o que está acontecendo
no mundo artístico para poder comentar
depois com os amigos.
A sociedade, hoje, enfrenta um dos
grandes problemas de sua existência: a
banalização da violência. Por mais que um
veículo de comunicação possa expressar
livremente o cidadão deve ter em mente o
que é ou não correto para sua vida. J. Pereira,
em sua obra “A comunicação e o direito de
expressão”, diz: “Há, sim, nas letras e nas
1 a 7 de abril de 2002
reprodução
artes, como em todos os setores de atividade
humana, uma parte que abusa, deturpando
e prejudicando os veículos de expressão
artística por não saber utilizá-los com
inteligência dentro da liberdade que lhe é
conferida”.
As manifestações do pensamento e da
opinião são essenciais à existência da
sociedade democrática. Mas é necessário
que os meios de comunicação estabeleçam
um limite de expressão, para não ferir o
direito do cidadão em poder se informar.
Neste aspecto, vem à tona uma pergunta:
onde fica a ética? Na obra “Psicologia, ética
e direitos humanos”, o Conselho Nacional
de Direitos Humanos afirma que “dizer que
ética é justiça torna-se muito claro quando
pensamos sobre o que esta significa. Justiça
tem a ver com o respeito aos direitos das
pessoas. Há justiça quando os direitos das
pessoas são respeitados. Do mesmo modo
com a ética”.
Portanto, podemos observar que a mídia,
por completo, para poder vender o seu
produto, está fazendo de tudo, inclusive
passando por cima da consciência de seus
consumidores, mostrando fatos grotescos
para chamar a atenção. O pior é que estes
fatos estão sendo aceitos pela comunidade,
que a cada dia se acomoda um pouco mais
com esta situação. Assim, não há como
haver paz na mídia se a população não se
posicionar e enfrentar o “Quarto Poder”,
reivindicando seu direito de uma vida digna,
com informações, mas sem violência.
Jornalismo sangrento é útil?
Luciana Souza
Os meios de comunicação social estão
correndo um sério risco de se transforma-
rem em Hemocentro. Cada vez que se abre
um jornal gotas de sangue caem em nossos
pés ou se ligar a televisão deve-se afastar
os carpetes para não manchar, sangue man-
cha. Não só a roupa, mas também as vidas
de milhares de pessoas que mantém conta-
to direto ou indireto com a mídia.
Hoje em dia um dos assuntos mais dis-
cutidos é sobre a ética na mídia, que pode
ser considerada como um sonho difícil de
ser realizado. Até mesmo os veículos con-
siderados “importantes” ou de maior
veiculação, utilizam um certo sensaciona-
lismo nos títulos e fotografias. Também
pode-se identificar este tipo de apelação nos
mais simples programas da mídia como em
um “inofensivo” desenho animado.
Todos os dias, nossas casas são invadi-
Público gosta da violência?
Vanessa Andrade França
Infelizmente, hoje em dia, parece que a
paz na mídia é um projeto quase que
irrealizável. Ligamos a televisão, compra-
mos o jornal, escutamos os noticiários das
rádios e o que encontramos? Na maioria das
vezes, a resposta se resume a uma só pala-
vra: violência.
Na televisão a situação é um pouco mais
grave. Num determinado canal uma moça
entrevista celebridades, cobrindo seu rosto
e mostrando quase todo o resto. Em outra
emissora são anunciados “produtos milagro-
sos” para tudo , desde a queda de cabelo à
celulite. As crianças parecem querer imitar “
tiazinhas, feiticeiras e as bailarinas do É o
Tchan” deixando de lado a ingenuidade da
infância para se espelharem em seus ídolos.
Isso sem falar nos programas tipo Rati-
das por milhares de informações sangren-
tas e exploradoras que podem causar estra-
gos irreversíveis ao cidadão. Como todo
meio de comunicação social acaba influen-
ciando na opinião e no comportamento da
sociedade, este tipo de imprensa marrom,
como era denominada antigamente o sen-
sacionalismo, afeta e abala verdadeiras Tor-
res de Babel.
Não se sabe ao certo se as pessoas con-
sumidoras gostam deste tipo de informação
ou se estão simplesmente acostumadas com
isto. Realmente não faz sentido nenhum um
veículo impresso apresentar fotografias que
mais parecem um laudo do Instituto Médi-
co Legal (IML), ao invés de pessoas saudá-
veis. Os temas voltados para a educação e
o desenvolvimento da comunidade são pou-
cos. Mesmo assim ainda há esperança de
que a situação se reverta e que a mídia en-
contre o seu caminho, para isto é que
estamos nos preparando.
nho e Canal Aberto. Os programas infor-
mativos e educativos estão cada vez mais es-
cassos na televisão brasileira. Já nos jornais
impressos, a situação também não se diferen-
cia em nada. Jornais sensacionalistas usam
fotografias chocantes para conseguirem uma
maior vendagem de seus exemplares. A vio-
lência se encontra em todas as formas.
A ética profissional parece ter sido es-
quecida, pois, tem sido colocada em se-
gundo plano. Mas de quem será a culpa?
Certamente a resposta não é fácil de ser
encontrada, mas com certeza isso tudo se
dá através de um conjunto de situações
que reúne o interesse das empresas de co-
municação ao definir a sua linha editorial
e do próprio público, que de certa forma,
gostam de ver essa violência (de modo tão
exposto) estampada nos jornais e nas te-
las de TV.
3
3

O Educador além
do seu tempo
Rubem Alves mostra que educar
é uma arte que se ensina com amor
Margarida Ribeiro
7º período de Jornalismo
No dia 15 de março, o auditório da
ABCZ (Associação Brasileira de Criadores
de Zebu) reuniu centenas de pessoas para
prestigiar um dos intelectuais mais famoso
e respeitado do País, Rubem Alves. Esta
personalidade brasileira com as suas
multifacetas - pedagogo, poeta, filosofo, cro-
nista, contador de estórias, ensaísta, teólogo,
acadêmico e psicanalista - tem enriquecido a
nossa Educação com vasta obra para adultos
e crianças. Suas literaturas têm servido de sub-
sídio também para trabalhos nas igrejas, con-
sultório psiquiátrico e outros fins de ajuda.
Rubem Alves tem o dom de fazer das
palavras e das idéias brinquedos e instru-
mentos divertidos para transmitir conheci-
mentos. Deste modo ele fala de uma educa-
ção que perpassa todo o universo humano.
Ensina que o verbo educar deve ser conju-
gado com o amor e paixão.
Sobre seu interesse pela educação bra-
sileira, o próprio Rubem irá nos comunicar
através desta entrevista.
Revelação: Como surgiu o seu interesse
pela educação? Revelação: Esta seria a prioridade para
Rubem Alves: Eu sempre tive vontade educação?
de ensinar, mas o interesse concentrado foi Rubem Alves: Para mim a prioridade
quando era professor
em Lavras, interior de Se você tiver um professor professores. O que acon-
Minas. Nesse período
apaixonado, ainda que
comecei a pensar nos
problemas da educa- ele não saiba muita
ção, o assunto passou didática dará um jeito
a ser parte da minha
vida, é a coisa que mais me domina, o tem- para a aposentadoria. Aí perdem o encanta-
po todo estou pensando nisto. mento com as crianças e os adolescentes.
Revelação: Sobre as suas obras, quantas
já tem publicadas?
Rubem Alves: Eu devo ter mais ou me-
nos trinta livros para crianças e trinta para
adultos. Os livros têm sido usados muito
em igreja, em hospitais infantis para pre-
parar as crianças para cirurgia. Quando os
escrevi foi pensando somente na minha fi-
lha, de repente descobri que estavam sen-
do aproveitados em empresas, em situa-
ções de terapias, viraram teatros e agora
vão virar Cds.
4 1 a 7 de abril de 2002
Margarida Ribeiro
Revelação: Qual obra que tem mais do seu
pensamento de forma sistemática?
Rubem Alves: A obra que circunda o
meu pensamento saiu de circulação e vai
reentrar na bienal, se chama “O poeta, o
guerreiro e o profeta”.
Revelação: Como o senhor vê os atuais li-
vros de literatura?
Rubem Alves: A gente ainda tem gran-
des autores, por exemplo Saramago e Gui-
marães Rosa. Há muitas obras bonitas sen-
do produzidas, mas também há muito lixo.
Shopenhauer dizia que parte da sabedoria de
ler é a sabedoria de saber escolher o que no
ler. Ele falou isto no século XIX, imagina a
quantidade de lixo que existe nas livrarias!
Revelação: Como o senhor avalia a forma
de incentivo do Governo, com o Programa
Bolsa-Escola?
Rubem Alves: Para mim esses esforços
são louváveis, mas a grande questão da edu-
cação não passa por aí, mas pelas cabeças
dos professores. Educação não se faz com
prédios com material escolar, mas ela se faz
com professor apaixonado.
que tenho é seduzir os
tece freqüentemente, é
que, com a rotina e o pas-
sar do tempo, eles ficam
amargos e começam a fa-
zer contagem do tempo
Revelação: E qual é o grande segredo da
educação?
Rubem Alves: O grande segredo é a
paixão do professor. Se você tiver um pro-
fessor apaixonado, ainda que ele não saiba
muita didática dará um jeito.
Revelação: O senhor falou que há dois ti-
pos de olhos na educação. Gostaria que
comentasse um pouco sobre o olhar do
atual educador?
Rubem Alves: A educação do primeiro
Rubem Alves lotou auditório da ABCZ em Uberaba
olho, vê as coisas do finito, é o que a maio- Pessoa diz, não basta não ser cego pra ver as
ria das nossas escolas fazem o tempo todo, árvores e as cores, há pessoas que têm vistas
ensinar a ciência, ensinar as coisas da vida, excelentes e não percebem nada. É preciso
ver o mundo. A educação do segundo olho ensinar os nossos alunos a enxergar o mundo.
mostra as coisas eternas. Com o primeiro
olho ensinamos a ciência, com o segundo a Revelação:Que conselho o senhor daria
poesia. Gastor Maschelar, se dedicou a vida aos novos educadores?
inteira a educar o primeiro olho, e escreveu Rubem Alves: Que a educação é absolu-
livros eruditos sobre a filosofia das ciências. tamente apaixonante. Paixão para uma vida.
De repente ele passou a educar o segundo Em primeiro lugar eu diria que eles se consi-
olho e escreveu “A chama de uma vela”. A derem afortunados por serem tocados por esta
vela para iluminar preci- vocação. Segunda coisa,
sa se consumir. Quando Shopenhauer dizia que é preciso que amem as
Maschelar fala da vela, crianças. Freqüente-
parte da sabedoria de ler
não se refere a conheci- mente os professores
mentos modernos, mas é a sabedoria de saber têm a preocupação com
ele abre um terceiro escolher o que no ler um programa. Meu filó-
olho, o da sensibilidade. sofo favorito, Nietzsche,
dizia que o verdadeiro educador é aquele que
Revelação: Como se desenvolve a sensibi- leva a sério questões relacionadas com seus
lidade dos educadores e educandos? alunos, inclusive a si mesmo. Logo a preocu-
Rubem Alves: Através da literatura. O pação do educador não pode ser com o pro-
conselho que eu daria é ler literatura. Na mi- grama, deve ser com o aluno, e por isso, ele
nha área de psicanálise é muito importante deve ter um olho para cada aluno, porque está
conhecer a alma humana, e o conhecimento lidando com ser humano e não com o número
vem não é da leitura de Freud, ela ajuda, mas para exame.
na medida que buscamos a literatura, então se A primeira tarefa do educador é seduzir o
descobre o drama da existência humana, vi- aluno para o fascínio do seu objeto. Se ele não
vida com todas as suas dores e alegrias. for seduzido não terá vontade de aprender. A
Adélia Prado, uma grande pedagoga dizia, “não
Revelação: Qual a grande tarefa do educador? quero faca e nem queijo, eu quero é fome”.
Rubem Alves: A grande tarefa é dizer Significa que a primeira tarefa é fazer o aluno
“está ali, está ali – perceba! Olhe!” –Fernando ter fome do que você pretende ensinar.
Compreender o ser humano
é desafio permanente
Juvenal Arduini convida a humanidade a inventar a verdade

André Azevedo de apresentação da obra não exagera quando vazio prometer paz aos que nada têm para
1º período de Jornalismo anuncia a “constelação de temas” que sobreviver. Há momentos em que protestar
Arduini rege no livro. Através de referências é paz, e silenciar é antipaz.” Para ele, paz
A rebelião antropológica proposta por à mitologia, filosofia e antropologia, o autor não é sossego, concordismo ou
Juvenal Arduini é uma reação à sociedade ilumina dimensões do raciocínio que cumplicidade. “Paz requer bravura”.
de massa que reproduz cópias, multiplica o normalmente encontravam-se escondidas na
modelo predominante, enquadra idéias, sombra do senso comum. Homem e tempo
gestos e costumes. O autor chama de Um exemplo é a discussão sobre o Arduini critica duramente as mentes que
“clonagem sociológica” o fenômeno de problema da “diferença”. Para ele, a embaraçam-se no fatalismo cronológico e
auto-reprodução contínua dessa diferença não é anormalidade nem transferem ao tempo o que é produzido pela do ódio, da ruína, do medo. O corajoso é
padronização cultural. Ele afirma que há distorção, mas originalidade que distingue humanidade. Ele lembra que o agente audacioso, mas não violento. O corajoso
inesgotável potencialidade para a personalidades. O autor escreve que há dois histórico é o homem, e não a sucessão dos acolhe, o violento expulsa. O corajoso
humanidade tornar-se emancipada, modos de interpretar os seres humanos: dias no calendário. “A ilusão cronológica congrega, o violento dispersa. O corajoso
autônoma; mas a pedagogia da submissão através do que leva a pensar que atrai, o violento espanta. O corajoso é
imobiliza a revolta autêntica. Arduini possuem em mudanças no tempo solidário, o violento é individualista”.
argumenta que é necessário resgatar o comum e pelo que “Pessoas incorporam significam mudança de Arduini afirma que o ser humano tem
sentido positivo dos termos “insubissão” e diferenciam. “Na vida. Entretanto, sede de verdade. O homem “vai buscá-la
“re-volta” – enviar de volta o que é devido, primeira visão, os atitudes introjetadas verifica-se que o tempo nas encostas do mundo e nos recôncavos
devolver, restituir a dignidade usurpada –; homens aparecem como se fossem decisões corre e muda, mas os de seu espírito”. As manifestações artísticas
termos que foram estigmatizados pela como repetidos. Na de sua própria vontade” sistemas políticos seriam uma forma de buscar essa essência.
mentalidade conservadora. segunda visão, cada perversos permanecem O autor vai mais longe. Argumenta que nas
Arduini afirma que um comportamento pessoa caracteriza- imutáveis”, escreve. criações do homem poderíamos recorrer ao
adesista empobreceu o pensamento se por alguma singularidade. É o confronto Portanto, esperar que o tempo resolva os termo “inventar” - que significa ‘criar, fazer
contemporâneo. “As pessoas aderem entre a indiferença e diferença”. De fato, o problemas da sociedade é uma grande surgir o novo’. “Importa ‘inventar’ a
apressadamente a idéias, sistemas políticos, que é comum nos é indiferente. Somos alienação. verdade, ir à morada da verdade, encontrar
expressões culturais e credos religiosos”, naturalmente indiferentes às estatísticas que Esse vínculo entre mudança cronológica a verdade. E também criar a verdade por
escreve. Essa adesão é incentivada pela representam a miséria no país, por exemplo. e mudança social trata-se de uma cilada meio das diversas atividades humanas”,
sedução da publicidade maciça, de forma A valorização da diferença impediria que a mental. Ao difundir-se a crença da escreve
que “as pessoas incorporam atitudes indiferença reduzisse os homens a coisas. imutabilidade histórica, o tempo é Em todo o livro, o ser humano é visto
introjetadas como se fossem decisões de sua “Ativar a diferença legítima entre pessoas, transformado em fetiche e o ser humano como um grande paradoxo: águia que
própria vontade”. A “adesão” é confrontada nações e culturas é avanço histórico da esvaziado. A lógica é que não adiantaria recorta horizontes vastos, mas também
com o termo “opção”. Ao aderir, o ser humanidade. (...) A indiferença tende a lutar contra o tempo. “Por isso, os que se verme que rasteja. “A fronte do ser humano
humano é conduzido por um modelo cancelar a diferença que incomoda”, enriquecem com a atual sociedade injusta roça a face de Deus, mas seus passos
exterior; mas ao optar o homem afirma-se, escreve. Saber conviver com as diferenças, tentam mostrar que é inútil querer escorregam na lama”. Por isso, “ao exaltar
assume responsa- portanto, é sinal de t r a n s f o r m á - l a ” . o ser humano, não se
bilidade intelectual, Arduini tem a habilidade de maturidade. Arduini insiste que a esqueça sua vulne-
responde por seus Arduini contesta mudança da socie- “Ao exaltar o ser humano, rabilidade. Ao ape-
passos e por suas erguer as palavras, desnudá-la, valores engessados dade é uma questão não se esqueça sua quenar o ser huma-
conseqüências. examiná-la exaustivamente e que tornam-se antropológica, e não vulnerabilidade. no, não se esqueça
A precisão em trazer de volta o significado dogmas. Cita Jurgen c r o n o l ó g i c a , Ao apequenar o ser humano, sua grandeza”, es-
que o autor analisa os Habermas, que portanto. Não de- creve. Contudo,
conceitos é justa- autêntico do termo analisa o dogma- pende do tempo, mas
não se esqueça sua grandeza”
justamente por não
mente um dos pra- tismo como incapa- do homem. estar totalmente
zeres mais estimulantes na leitura do livro. cidade de auto-reflexão. “O dogmatismo é O autor faz um elogio à audácia, determinado, o homem é essencialmente
Arduini tem a habilidade de erguer as utilizado para sufocar o surto emancipatório lembrando que a verdadeira coragem não é mutável. Aí está justificado sua esperança
palavras, desnudá-la, examiná-la e impedir a discordância”, escreve. Ele um arroubo eufórico, mas um estado de com a humanidade. Parafraseando Sartre,
exaustivamente e trazer de volta o refuta, por exemplo, a “paz” que amacia a espírito persistente. Amedrontar é tido como conclui que o homem, mais do que estar
significado autêntico do termo. Esse exploração para torná-la tolerável. “A sinônimo de tiranizar, pois o medo encolhe “condenado à liberdade”, está “condenado
processo - chamado hermenêutica, ou “a verdadeira paz gera a coesão orgânica da o ser humano. Entretanto, coragem não é a superar-se”.
arte de interpretar” - ele desenvolve humanidade. (...) A pseudopaz mascara a apresentada como sinônimo de violência.
sobretudo através da contraposição de realidade”. Por pseudopaz, entende aquela Ele escreve, inclusive, que o violento não é Antropologia, Ousar Para Reiventar a
conceitos que, por causa da distração do paz que anestesia consciências para corajoso. “A coragem é aliada do amor, da Humanidade - Juvenal Arduini
leitor, antes não pareciam opostos. O texto imobilizar os revoltados. “É moralismo vida, da criatividade. A violência é aliada Ed. Paulus - 171 págs - R$16,00

1 a 7 de abril de 2002 5
 Revelação: Mas não dependemos
totalmente da natureza?
Arduini:É aí que nós temos que refletir
inteligentemente. Muita gente fala: mas sem
a água, sem o ar, o ser humano não vive. Mas
todos nós entendemos que o ser “ar” – que é
importante – jamais tem uma complexidade
ou um valor que tem o ser “humano”, com
toda a inteligência, a criatividade, a liberdade
– que é capaz, até mesmo, de trazer outras
soluções que não as do ar.
Então é isso que nós queremos mostrar.
Quer dizer, a ecologia é importante, é
meritório o trabalho, é necessário, só que
coloco uma prioridade. Essa ecologia tem um
valor muito grande e ela é necessária para o
ser humano. Agora, o ser humano – se formos
colocar uma hierarquia – é
a primazia. Mas por ter
primazia, não pode abusar Temos um go
da natureza. aumentou a
a publicidad
Revelação: Vivemos há vai fazer com
pouco tempo sob censura
feroz do regime militar.
Atualmente, gozamos de certa democracia.
Arduini dá autógrafo no lançamento do livro: Antropologia - Ousar para reinventar o Ser Humano fotos: André Azevedo Entretanto, você afirma que sofremos hoje
sob uma tirania difusa, sigilosa. Que tirania
é essa?

A utopia pode e Arduini:Existem muitas formas de

tirania. Tirania é um domínio forte sobre a
humanidade. Então, nem só a tirania das

deve acontecer
Juvenal Arduini confia no olhar libertário da juventude
armas, da ditadura política, que é verdade.
Há outras, e hoje há tiranias muito
disfarçadas. Há tiranias até simpáticas.
Quando políticos saem por aí à fora
proclamando democracia, proclamando certa
grandeza, às vezes ele está apenas
defendendo interesses dele e de um grupo.
André Azevedo grande mal pode ser um pouco exagerado. comportamento nos atuais movimentos Isso é muito comum. Porque aí nós entramos
1º período de Jornalismo Pode não ser o maior, porque há outros mais ecológicos, como o Greenpeace, por muito na área do poder.
graves. Mas é um grande mal. Porque a apatia exemplo? O poder é uma força muito grande, uma
Monsenhor Juvenal Arduini é filósofo, imobiliza, ela é estéril, torna a vida fixada, Arduini:Eu não queria indicar casos força tremenda. Muitas vezes aparece de modo
antropólogo, escritor e conferencista. É mem- sem movimento. A apatia dificulta demais a concretos, mas nós podemos perceber que às cruel, brutal, selvagem, que vai arrasando, que
bro efetivo da “International Society for movimentação da sociedade. Devemos vezes há uma desproporção nessa questão de vai estragando a vida. A tirania disfarçada é
Metaphysics”, “World Phenomenology eliminar a apatia porque é um ponto de causas ecológicas. A ecologia é um grande aquela que vai atraindo as pessoas, envolvendo
Institute”, entre outros. Foi professor de Fi- partida totalmente negativo; aliás, nem é valor. Eu mesmo a defendo. Só que a ecologia a mentalidade. É uma tirania porque as pessoas
losofia Geral e de Antropologia Filosófica ponto de partida. é vista muitas vezes como ambiente, o ficam “acreditando” numa proposta que, na
na Faculdade de Filosofia cosmos... – que também verdade, é do poder – a
de Santo Tomás de Aquino, Revelação: Você alerta beneficia o ser humano, não há proposta não é da sociedade,
em Uberaba. Publicou vá- “Às vezes há uma também para o ousar dúvidas nessa parte. Mas se Hoje há tiranias dos direitos humanos, da
rias obras, entre elas “Ho- desproporção nessa maduro. Como é isso? nós formos fazer uma muito disfarçadas. dignidade e mesmo da
rizonte de Esperança”, Arduini:É claro que não verdadeira hierarquia de democracia.
“Destinação Antropológi-
questão de causas é todo ativismo que é a valores – e quando falamos
Há tiranias Por isso hoje critico
ca” e “O Marxismo”. ecológicas” solução. A apatia é uma falha. nisso, não estamos dizendo até simpáticas muito – não é bem criticar,
Hoje, realiza missas na O apático cruza os braços e que um ideal é valor e outro mas nós precisamos de
Capela do Hospital São Domingos, dá as- deixa que as pessoas, mais atrevidas até, não tem valor; a hierarquia diz que há vários espírito crítico perante a democracia. A
sistência religiosa aos enfermos e acaba de possam ir mais longe. Por outro lado, quando valores, mas às vezes não vão ter o mesmo democracia, que nós entendemos em geral
lançar o livro Antropologia, Ousar para a gente condena a apatia, não se está peso – então eu posso ter um valor como um ideal, é importante. Mas nós temos
Reiventar a Humanidade. Esta entrevista foi justificando todo tipo de ativismo. Por isso importante, mas há um mais importante que perguntar de que democracia nós
concedida no dia 22 de março em uma sala devemos refletir em vários ângulos, porque ainda. Ou posso ter um valor muito falamos. Vemos que há “atitudes
do Hospital São Domingos. há ativistas que são salteadores, estupradores, importante e outro menor. Bem, nós democráticas”, ou chamadas de
ou outras coisas também. precisamos da água, precisamos do ar, da democráticas, que são totalitárias.
Revelação: No livro você cita um autor que natureza e uma série de coisas. São valores.
disse “o mal muito propagado hoje é a Revelação: Você considera contra-senso de Pessoas dizem: mas sem eles a humanidade Revelação: Por exemplo?
apatia”. Você diria que a apatia é justamente ecologistas medíocres, quando falam de não vive. É mesmo. Só que eles são os Arduini:Por exemplo: um ministro quis
o grande mal da humanidade? preservação da natureza mas negligenciam instrumentos. A humanidade como tal é o negar por aí à fora, aos poderosos, que a
Juvenal Arduini: Dizer que a apatia é o o ser humano. Você vê esse tipo de valor máximo. globalização é anti-democrática. Eles falam

6 1 a 7 de abril de 2002
 até que a globalização é eminentemente interesses pessoais”. A arte tem condições
democrática. Eles nos dizem isso. Mas não de confrontar sua verdade com a verdade do
é! O mundo poderoso – países ricos, grandes poder?
corporações – aparecem como democracia, Arduini:A arte é um valor muito grande.
mas que democracia é esta? Os Estados E esse é o ponto. Nem sempre ela é vista com
Unidos, por exemplo, foram aliados de simpatia pelo poder. É interessante, olhando
Pinochet. Foram aliados também de Somoza. a história do mundo, perceber que o poder
E então eles dizem: precisamos defendê-los não tem muita simpatia com a arte. A não ser
porque são nossos aliados. Ora, ser aliado é que o artista seja vendido ou submetido. Eu
uma coisa muito relativa e uma coisa acho muito triste quando um artista fica ali...
ambígua. Porque nós podemos ter aliados perto do poder... das autoridades... Não me
autênticos, humanos, com desejo de justiça, parece ser uma aliança muito simpática não.
e podemos ter aliados tiranos, que enganam, Porque a arte é criativa, é independente. Por
que derramam sangue. que nas revoluções, e sobretudo nas ditaduras
eles escurraçam com os artistas? Porque os
Revelação: Nosso atual governo é artistas têm uma intuição da verdade, uma
constituído por intelectuais de esquerda visão mais límpida, mais clara.
dos anos 60 aliados a Quando vi o Madureira fazendo o trabalho
tradicionais representan-tes dele, aquela exaltação do ser humano, fiquei
overno que da oligarquia. O poder no Brasil pensando que certos temas não são admitidos
verba para finalmente colocou a razão à porque aquilo vai desagradar o poder, vai Ana Cristina Marchiori Tavares, da editora Paulos, e Lineu Miziara acompanharam o lançamento do livro
de. O que ele sua mercê? provocá-lo. Então me parece que o poder não
m isso? Arduini:Percebemos que tem uma fisionomia simpática. Entre poder e Arduini:Alguns identificam utopia com tradição, dos hábitos, dos valores que às
se faz muito disso. Submete-se arte, eu opto pela arte. idealismo. Então as pessoas falam: é utopia vezes não são valores coisa nenhuma.
a razão ao poder. E isso às vezes que a humanidade toda possa ser digna, que Então eles estão mais livres.
é feito não por forma violenta, mas por forma Revelação: Você critica o idealismo como não haja pobre. Mas eu diria que o idealismo E por outro lado eles têm um olhar que
capciosa, envolvente, e aí a razão começa a “concepção abstrata que deduz o mundo nunca vai concretizar uma solução para essa é novo. Eles olham as coisas de modo
ficar dominada, controlada pelo poder. Mas real a partir de idéias”. Mas o ideal utópico humanidade. Se nós pensamos na sociedade, diferente. Claro que aí já trazem um
não aparece como uma ditadura, como um também é visto como um rumo para buscar temos que lutar para que a utopia se concretize conteúdo da cultura, mas é muito frequente
poder violento. Vivemos muito isso hoje. um mundo melhor. Qual a diferença entre e para que essa realidade utópica, que ainda que eles comecem a olhar diferente.
esta noção de utopia aquela noção de não existe, possa e deva concretizar-se. Então E por isso que agora volto – e você
Revelação: Como enxergamos isso? idealismo? nós temos que lutar muito nesse ponto, e não não viveu na época, felizmente – quando
Arduini:Por exemplo, temos um governo Arduini:O idealismo fica muito no plano permitir que haja uma identificação entre ocorreu o golpe militar, por exemplo. O
que aumentou a verba para a publicidade. O do pensamento. O filósofo alemão Hegel foi utopia e o idealismo, porque há uma confusão que aconteceu? O governo foi em cima
que ele vai fazer com isso? Vai ser uma mestre da consciência idealista, do pensamento aí nos significados. Que é uma forma também dos trabalhadores que faziam greve, e dos
publicidade que vai ajudar a consciência – que não é totalmente errado. Mas ele projeta de fugir à uma responsabilidade ao dizer: isso estudantes. O escritor Alceu Amoroso
crítica, que vai ajudar a educação, que vai muita força e valor na idéia. Por isso que Karl é utopia, isso não vai acontecer, nunca foi Lima, que já esteve em Uberaba com a
favorecer efetivamente a saúde? Ou é uma Marx fez grande crítica à ideologia idéia. assim... Portanto, a gente tem que insistir: A gente mais de uma vez, disse que o golpe
publicidade que vai projetar a figura daqueles Marx não admitia o idealismo. Ele utopia pode acontecer! militar trouxe duplo silêncio: silenciou os
que têm o poder para que sejam aceitos pela considerava a realidade no aspecto histórico, Faço mais uma distinção: a utopia não é trabalhadores e silenciou os estudantes.
sociedade? E sejam eleitos pela própria social. O idealismo é uma visão filosófica que só o possível. Vai mais longe. Porque só o
sociedade? Então nós temos que pensar muito tem também suas verdades. Mas é uma visão possível pode ficar eternamente possível e Revelação: A juventude de hoje está mais
nisso. Aliás eu tenho sempre muita reserva mais do pensamento amplo que às vezes não nunca se concretizar. A utopia pode ser alienada do que a geração anterior?
com relação ao poder. Nós devemos lutar para atinge a realidade. Um pensamento muito possível mas deve se transformar em Arduini:Tenho uma confiança muito
passar de uma era de muito menos poder e abstrato. Nem sempre sabe a diferença entre o realidade, deve passar do possível para a grande na juventude, a ao mesmo tempo
com muito mais a razão. que é uma idéia abstrata e um fato real concreto. realidade. sabemos que jovens de hoje também
O idealismo tem uma natureza própria e tende sofrem muitas pres-sões. Agora, por
Revelação: Então você é anarquista? a ficar naquele plano, não o da vida, mas no Revelação: Sua exemplo, nesse de-
Arduini:Não sou anar- plano do pensamento que afinidade com univer- semprego, o jovem
quista não. Mas acho que a circula por aí. sitários é notória. É uma forma de fugir à uma pode ter feito um
verdade é uma grande força, Acho muito triste Agora, quando falamos Você vê sabedoria nos bom curso para ter
e muitas vezes tem que quando um artista fica em utopia, ou espírito jovens?
responsabilidade ao dizer: uma profissão, mas
discordar do poder. utópico, é diferente. A utopia Arduini:Olha só, isso é utopia, isso não vai chega na hora de
ali... perto do poder... ainda não está concretizada. não é luxo, não é acontecer, nunca foi assim... trabalhar é aquele
Revelação: Parece que das autoridades... Mas tem uma diferença em capricho, mas eu tenho massacre. Isso força
saltamos de um regime relação ao idealismo, porque uma afinidade muito muito a
militar meio “1984”, (de George Orwell), para ela é uma situação que não está concreta mas grande com eles. Eu olho a humanidade como personalidade daquele jovem que
uma tirania sedutora de estilo “Admirável que pode tornar-se concreta. E que até se deve um todo, mas tem sempre uma coisa que a precisa trabalhar e tem que se “adaptar”
Mundo Novo”, (de Aldous Huxley), que lutar para fazê-la concreta. Essa é a visão juventude fala diferente. Porque, sem ir ao sistema. Então eu acho isso muito
transformou a metáfora cruel do Big Brother utópica. É aquilo que não existe ainda mas longe, tem duas coisas que ela sempre me triste.
em entretenimento. É mais ou menos isso? pode e deve vir a existir. Então é muito impressiona. Porque a juventude – por muito A juventude tem critérios diferentes.
Arduini:Acho que você pode fazer essa diferente. Nós temos sonhos que podem, ou que tenha sido trabalhada – porque não viveu Eu vejo nas missas. A gente ouve e
comparação sim. devem concretizar-se. E idealismo é uma muito, ainda não foi massificada, plasmada percebe a sabedoria, a sensatez verda-
coisa que nunca se concretiza, que até pode pelos costumes, pelos hábitos. Pois uma deira que falam. Às vezes as pessoas
Revelação: O homem é capaz de criar a ter uma beleza que circula mentalmente, mas pessoa de seten... eu já ia falar setenta anos... dizem: mas não erram? Ora, todos
verdade através da arte. Mas o poder que não seja concretizado. uma pessoa madura, de quarenta anos, é uma erram. Padre erra também. Errar, nós
também tende a “produzir” sua própria Revelação: Então é fundamental fazer a pessoa já acertada. Os jovens não foram tão todos erramos. Mas não porque é jovem;
verdade na intenção de preservar distinção? massificados ainda, tão impregnados da erra porque é humano.

1 a 7 de abril de 2002 7
Lançamento Vírus HPV pode
lembrou os vários provocar câncer
Juvenais de colo uterino
Lineu Miziara diz que termo adequado Exame de prevenção deve ser feito
para Arduini é “sabença” pelo menos uma vez por ano
André Azevedo

Luciana Souza pode não sentir nenhuma alteração em seu

7º Período de Jornalismo corpo.
Existe tratamento para o problema que
O câncer de colo uterino é uma doença pode ser curado com sucesso em cerca de
grave que atinge muitas mulheres. É 90% dos casos. Nem toda mulher infectada
causado principalmente pelo HPV – uma pelo vírus vai desenvolver câncer de colo
família com mais de 80 tipos de vírus de útero. Entretanto, está comprovado pelo
transmitidos através de contato sexual. Por Ministério da Saúde que 99% das mulheres
isso, para combater o câncer de colo de útero acometidas por este tipo de câncer foram
é preciso, primeiramente, se prevenir contra antes infectadas pelo HPV.
a transmissão e realizar o exame de O tratamento depende prin-
prevenção de forma periódica. Luc cipalmente, do tipo de lesão
ian
Ao ser transmitido no aS causada no colo do útero:
ou
ato sexual o HPV afeta za displasia leve, mode-
tanto a área genital de rada, acentuada, CA
mulheres quanto de in situ ou invasor.
homens. Alguns são “Mas está claro
inofensivos, cau- que prevenir e
sando apenas al- diagnosticar é o
gumas verrugas no melhor caminho
corpo. Outros para se evitar o
Arduini convida à união de forçar para que esta seja “a humanidade da nossa esperança” muito perigosos, câncer de colo,
pois infectam toda que apresenta
Wander Marcio de Rezende nada, aquele que vai visitar os enfermos do área genital trazendo alto índice de cura
3º período de Jornalismo hospital São Domingos levando a eles uma lesões que, quando quando diagnos-
palavra amiga, o Juvenal das missas para não tratadas, trans- ticado precoce-
O lançamento do livro “Antropologia, acadêmicos, o Juvenal perseguido, quase formam-se em Câncer. mente”, ressalta a mé-
ousar para reinventar a humanidade” ocor- preso, e o Juvenal amigo, tão presente na Segundo a médica dica.
reu no dia 20 de março, no Centro Cultural vida de cada um de nós”, completou. Janete Santana, do Para prevenir bas-
Cecília Palmério. O livro é o primeiro de Miziara disse que o termo adequado para Programa da Saúde da tam apenas alguns
uma coleção a ser lançada pela editora Arduini era sabença, porque o termo sabe- Família (PSF) de Con- A médica Janete Santana cuidados em relação à
Paulus. doria, para ele, encontra-se semanticamen- quista/MG, para lembra que todas mulheres transmissão que são
Na abertura, o ator e diretor de teatro, te desgastado. Montandon lembrou a cora- descobrir a doença, é que têm relações sexuais simples e fáceis de
José Maria Madureira, em companhia de gem de Arduini ao tomar posições políticas necessário que se realize ativas devem fazer o exame, serem seguidos. Segu-
seu filho Lourenço, recitaram um texto que no passado. o exame periódico de ndo Janete Santana,
clamava de forma contundente a libertação Para Arduini, “a humanidade é o grande prevenção, o
independente da idade deve-se visitar regular-
do ser humano. valor que nós temos. Há outros valores, mas Papanicolaou, de pelo mente o ginecologista
Para apresentar Arduini ao público, fo- este devemos arriscar a vida e fazer tudo por menos uma vez por ano. “Todas mulheres para fazer o exame de prevenção; manter
ram convidados Renato Montandon, dire- ela”. O escritor afirmou que a solução não que têm relações sexuais ativas devem fazer a higiene da área genital; usar
tor do curso de Direito da Universidade de vêm da riqueza econômica, mas da humani- o exame, independente da idade. Muitas preservativos durante toda relação sexual;
Uberaba, Ana Cristina Marchiori Tavares, dade em si, através da soma dos seres huma- vezes elas pensam que por serem novas não ter parceiro fixo ou reduzir o número de
representante da editora Paulus, Mário Sal- nos. “Havemos de lutar, sem fugir e sem ter tem necessidade. Mas esquecem que a parceiros; evitar fumar, beber em excesso
vador, presidente da Academia de Letras do medo. Havemos de ter também disposição doença não é transmitida pela idade e sim ou usar drogas , “pois isso afeta o sistema
Triângulo Mineiro e Lineu Miziara, médi- para podermos arriscar muitas vezes, unin- pelo contato sexual”, esclarece. de defesa do organismo”; ficar informada
co e professor na Universidade. do forças para podermos reinventar a huma- Os sintomas do HPV costumam ser da doença e compartilhar informações
Os convidados lembraram que existem nidade de hoje, para que esta seja a grande bastante discretos, quando não inexistentes. com seus parceiros e amigas e por fim,
vários Juvenais. Salvador rememorou humanidade de nossa esperança”, concluiu. Geralmente a mulher sente uma leve coceira pedir a seu parceiro que também procure
“aquele que leva sua voz aos jovens, ensi- na região genital, sente dor na relação sexual um médico para verificar a presença do
nado o caminho certo mas sem forçá-los a Colaborou: André Azevedo ou nota algum tipo de corrimento. Também vírus.
8 1 a 7 de abril de 2002
 reprodução
A prática milenar
em busca da verdade
Doutrina oriental cria forças e espalha
suas raízas na cidade através do budismo
Leonardo Boloni está plantando para um dia poder colher, por
7º período de Jornalismo isso hoje ele escolhe com muito cuidado a
semente que jogará no canteiro de sua vida.
A ideologia budista visa uma interação Desde pequeno, Rafael Costa Alves, 14
do universo interno de cada pessoa como o anos, vem recebendo os ensinamentos
universo externo, é o que explica Adriana budista de seus pais. “Tive está felicidade e
Nunes de Melo Hirosi, 33 anos e que a 15 estou sempre em busca de conhecimentos”,
estuda o busdismo. “A lei da ação e reação afirma o jovem que apesar da idade, já
é a base principal de seus ensinamentos”, demostra uma maturidade em relação a
ressalta, acrescentando que o budismo não prática e estudos da filosofia.
é um parte ou uma divisão, é um todo. “Nele “O budismo é uma revelação interna, é
o bem e o mal estão sempre juntos, porém como a lapidação de um diamante”, afirma
é preciso que seu praticante saiba Luiz Henrique Gonçalvez, 36 , que também
diferenciar um do outro para que possa conheceu uma nova vida a partir do momento
evidenciar a prática do bem”, adverte. em que aceitou o budismo em seu cotidiano.
A família de Adriana Hirosi integra a A filosofia valeu também como alento no
lista das 60 famílias praticantes do budismo momento de doença para José Silva, 57 anos.
em Uberaba. A disseminação desta doutrina Ele havia enfrentado vários problemas de Criada há 3 milênios, o Budismo busca a interação do ser humano com o Universo
na cidade começou na década de 70, com a saúde na família e, segundo disse, conseguiu
chegada da família Hirosi. A filosofia era recuperar suas força através do budismo. suas existências. É aí que entra o Carma, universais e a oração do Nam-myoho-
propagada entre as pessoas que “Houve momentos em que cheguei ao que para o budismo representa tanto as rengue-kyo. Diante deste pergaminho as
demonstravam afinidade com a questão. O desespero, então, fui convidado a conhecer ações positivas, quanto as negativas que pessoas oram e pedem sabedoria e
número de pessoas adéptas ao budismo o budismo. Aprendi a oração Nam-myoho- trazemos de um existência anterior. A partir discernimento para que suas práticas diárias
ainda não é suficiente para que seja erguido rengue-kyo dirigida ao sol nascente buscando deste Carma, conforme a filosofia, podemos sejam concretizadas. O Budismo acredita
um templo na cidade. Mesmo assim, toda entrar em harmonia com as forças do traçar ações que irão orientar uma vida também na existência de vidas em outro
as semanas as famílias se reunem em casa Universo. A partir de 1987 começei a estudar futura. “Essas práticas irão se manifestar em planetas. Estas vidas estariam em estágios
e recitam o Nam-myoho-rengue-kyo, ou essa religião milenar do Oriente”, conta. um momento oportuno”, explica Adriana. diferentes de evolução. “Assim, não
seja, a expressão da verdade máxima ou da José Silva vive hoje muito bem com sua “Somente com a reparação destas atitudes podemos pensar na independência total, mas
realidade fundamental da vida que permeia família e sempre que pode, procura passar é que conseguiremos resgatar nossas falhas. sim na ligação sutil de todas as formas de
todos os fenômenos algum conhecimento Somente através da oração é possível vida do universo, proporcionando a
do Universo. Eles Ao contrário que muitas para o próximo. Para ultrapassar os limites pessoais”, ensina. existência eterna”, concluiu.
realizam ainda as ele não existe oração Para o budista, a vida é composta por
reuniões mensais pessoas acreditam , o budismo sem respostas, assim dez estados: inferno; ira; fome; animalidade; Como surgiu
abertos a visitantes de Daishonin não adora aquela como não existe tranqüilidade; alegria; erudição; absorção; Criada há 3 milênios, o Budismo é uma
interessados em imagem de um Buda gordo pecado sem perdão. E bodhisattva (estado de ajuda ao próximo) religião que busca a interação do ser
conhecer a filosofia sentado sobre as pernas assim ele segue sua e, o estado de Buda, o mais elevado. A humano com o Universo, tendo como
budista. vida, pedindo, palavra Buda é de origem japonesa e precursor o príncipe Sidharta, que vivia na
A prática dos fundamentos budista tem recebendo e compartilhando a sabedoria significa “aquele que enxergou a verdade” Índia. Ele criou a religião que hoje está
auxiliado pessoas ao longo dos milênios. adquirida através de seus estudos e ou simplesmente “o Iluminado”. O espalhada por 159 países. Após sua morte,
Adriana Hirosi disse que descobriu uma dedicações à pratica budista. Budismo esclarece que cada um destes seus discípulos compilaram seus
nova maneira de enxegar as coisas da vida estados podem manifestar-se a qualquer ensinamentos em 28 capítulos, o Sutra
depois que começou a estudar o Budismo. A reecarnação momento. Porém é dever de cada um saber Dilotos. Desta variação surgiu cerca de mil
“Não preciso de nada mais sofisticado nem Durante o desenvolvimento humano, controlar e deixar que os estados seitas que vieram se desenvolvendo a partir
luxuoso para ser feliz com a minha sempre existiram conceitos e formas de manifestem em nossas vidas. “As causas dos ensinamentos divulgados pelos
família”, ressalta. Ela acredita que cada um buscar algo além da vida, que transcendesse exteriores não dominam as causas discípulos de Sakyamuni, nome adotado pelo
tem aquilo que pode ter e deve se dar por o lado material e terreno. Uma busca que interiores”, acredita Adriana. príncipe Sidharta.
satisfeito. Neste aspecto, a riqueza material sempre fez com que nossas vidas não Ao contrário que muitas pessoas Após a morte de Sidharta, já no século
fica em último plano, já que nenhum bem fossem simplesmente vividas, mas sim acreditam , o budismo de Daishonin não XIII, Nitiren Daishonin iniciou um trabalho
será levado adiante, a não ser os bens que estudadas e compreendidas, para que adora aquela imagem de um Buda gordo de propagação de seus ensinamentos no
precisaremos para dar continuidade a nossa houvesse uma razão no modo de plantar e sentado sobre as pernas. “Aquela imagem Japão. Daishonin conseguiu transpor as
jornada pela eternidade. colher as sementes de nossa existência. Em pertence a uma outra seita que difere muito dificuldades da época e, seus ensinamentos,
O estudante Nixon Costa Alves, 26 anos, relação as reencarnações, Adriana Hirosi do verdadeiro budismo”, explica Adriana. atravessaram os séculos conseguindo cativar
conseguiu orientar sua vida. Ciente da lei explica que somente a sucessão de vidas Seu objeto de devoção é o Gohonzon, um pessoas e as tornando seguidores do budismo
universal da ação e reação, Nixo disse que poderá lapidar o ser humano ao longo de pergaminho que trás escrito os dez estados verdadeiro – o budismo de Daishonin.
1 a 7 de abril de 2002 9
 fotos: Wagner Ghizzoni Junior
Coleções:
você já tem a sua?
Colecionar é uma diversão
que pode sair quase de graça
Wagner Ghizzoni Junior O jovem telecartofilista – é assim que se
6º período de Jornalismo chamam os colecionadores de cartões
telefonicos – acha que não é nem um pouco
Todos nós temos uma atividade para ali- difícil ter esta coleção. “Eu pelo menos não
viar as tensões do cotidiano. Pode ser o fico doido atrás de cartões,” conta. A maio-
futebolzinho nos fins de semana, sair para ria dos cartões ele ganhou de amigos. Ou-
Colecionadores de cartões telefonicos são chamados de telecartofilistas
dançar, cuidar do jardim ou tomar um pote tros ele pôs em sua coleção depois de ter
de sorvete. Mas um dos passatempos mais comprado pra seu próprio. “O segredo de
populares em todo o mundo é o hábito de colecionar é trocar”, ensina. só em celulares, mas em telefones fixos tam- cartões para montar uma imagem, como
colecionar. Vinicius tem exemplares de vários paí- bém”, conta. “Na Itália, os cartões vêm com num quebra cabeça. Tem também divulga-
Existem coleções de todos os tipos e ta- ses, como Itália, Estados Unidos, Japão, uma parte descartável para você identifi- ção de Festas como o Carnagoiania, fotos
manhos. Desde pontas de lápis e papéis de Áustria, Espanha e França. “Tenho um ir- car qual já foi usado”, continua. de jogadores de futebol e mensagens para
bala até carros antigos. Muitas pessoas pen- mão que mora nos Estados Unidos e outro Dentre todos, o cartão preferido de datas especiais, como o dia das Mães. Um
sam em começar uma coleção mas desis- na Itália e eles me mandam sempre”, conta. Vinícius é um do personagem Bobby, do de- cartão pode ser até presente.
tem porque acham que dá muito trabalho, Sem ter gastado muito dinheiro, ele afirma senho animado da televisão, que guarda com
consome muito tempo que se diverte e aprende muito cuidado, junto aos Gosto herdado
ou gasta muito dinheiro. com os cartões. “Sempre demais, em estojos espe- Muitas pessoas co-
Não é bem assim. Existem pessoas tem informações interes- ciais para esse fim. Muitos começam este meçam este hobby her-
É verdade que exis- que fazem de suas santes. Está circulando Podemos ver muitas hobby herdando os dando a coleção do pai,
tem pessoas que fazem coleções a maior uma coleção da CTBC coisas diferentes nestes costumes do pai, por exemplo. Outros
de suas coleções a maior contendo as Sete Mara- pequenos pedaços de herdam só um objeto e
razão de suas vidas. Isso razão de suas vidas vilhas do Mundo”, plástico. As imagens da
por exemplo começam ali sua cole-
com certeza exige muita exemplifica. natureza são recordistas. ção. É o caso de Aurélio
dedicação. Achar aquela camisa do campeão Algumas curiosidades ele fica sabendo Tem propagandas de empresas, mensagens Velloso, de 37 anos. Quando tinha 23 anos,
da terceira divisão do Nepal não é para qual- não lendo no verso dos cartões, mas con- bíblicas, fotos de pontos turísticos das ci- ele herdou uma caneta Parker 51 pena de
quer um. versando com outros colecionadores. “Nos dades, horóscopo e até receitas culinárias. ouro de seu avô. “Aí eu pensei: ‘cansei de
Mas ter uma coleção pode ser apenas Estados Unidos, existe o plano pré-pago não Há casos em que é preciso comprar vários usar Bic!’ e comecei a colecionar canetas”,
como uma atividade que não atrapalhará sua lembra Aurélio.
rotina normal. Você não vai deixar de estu- Hoje possui mais ou menos 1700 cane-
dar, trabalhar ou namorar para ir atrás das tas. Ele admite que já gastou bastante di-
figurinhas da Copa de 82. O aconselhável é nheiro com sua coleção. A maioria dos ob-
colecionar coisas mais fáceis, tipo tampi- jetos ele mesmo comprou. E costumam cus-
nhas de garrafa ou cartões telefônicos. Ob- tar caro. “Uma Lamy francesa não sai por
jetos que são fáceis de conseguir e não cus- menos de 250 reais”, exemplifica. “Mas no
tam caro. Só depois de algum tempo você começo eu trabalhava de revisor num jor-
decide se vale a pena fazer loucuras pela nal e ganhava apenas um salário. Gastava
sua coleção (tipo viajar até a China para con- quase tudo com a faculdade, que naquele
seguir aquela latinha de refrigerante come- tempo se pagava com um salário. Com o
morativa de um Festival de Kung-Fu) ou que sobrava, dava para ir comprando no-
começar uma coleção de mais difícil aces- vos exemplares,”recorda.
so (objetos mais dificeis, como calcinhas Suas canetas não foram só compradas.
de atrizes, ou mais caros, como carros im- Adquiriu-as “comprando, ganhando, rou-
portados). bando, pegando no lixo”, revela. “Eu sou
professor e meus alunos sabem que coleci-
Colecionar não é difícil ono e às vezes me dão uma nova”, conta,
Foi sem nenhum compromisso que provando que falta de dinheiro não é des-
Vinicius Vicente Martins, de 15 anos, co- culpa para não ter uma coleção. “Tem pes-
meçou a colecionar cartões telefônicos, há soas que colecionam só canetas de propa-
um ano. Hoje ele já tem mais de 200. Um ganda”, disse.
primo de Vinicius tinha o mesmo hobby e Aurélio dispensa um cuidado especial a
Coleção da revista Tex inclui versão em italiano
este resolveu começar sua própria coleção. suas canetas. Coloca-as nas grades das ja-
10 1 a 7 de abril de 2002
nelas de seu escritório, que são persianas, e lecionar nada. “Um dia, vi uma revista
em potes. As mais raras, como uma do Tex num sebo e folheei. Foi estranho,
Parker55, ele deixa no estojo original. porque eu nem gostava de faroeste, mas
Internet tem
E algumas ele reserva para seu uso diá- pareceu legal e resolvi comprar uma.
rio. Suas canetas são bonitas, mas nem to- Gostei e passei a comprar direto. De re-
das são caras. Algumas ele comprou em pente, já era um colecionador”, lembra.
papelarias nada sofisticadas. “O importan- Ele dá a dica para quem quiser colecio-
de tudo
Aqui vão alguns sites sobre coleções
te é a estética e ter uma melhor escrita, ou nar qualquer tipo de revista. “O ideal é para você conferir.
seja, a pegadura, um jeito de escrever mais você comprar o máximo que puder em
leve, correr melhor pelo papel.” Alguns bancas. Lógico que você acaba se inte- www.airsicknessbags.com:
exemplares são simples, ressando pelas mais Como tem louco para tudo, aqui tem
mas curiosos. “Tenho antigas, só que aí cor- coleções de sacos de vômitos de
uma chamada ‘Colecio- Colecionar o que quer que re o risco de ela estar aviões! Vazios, pelo menos.
nador de Ossos’. Na pon- seja pode ser visto como mal conservada”. Em
ta, tem uma bola e dentro mais que um passatempo. suas contas, metade de www.cancollector.com
o cartaz do filme”, conta. As vezes é até uma terapia suas revistas ele ad- Uma das coleções mais tradicionais é
Mais uma vez, vemos quiriu de segunda a de latinhas de refrigerantes e
que não é preciso dedicar- mão, em sebos ou de cervejas. Aqui tem de muitos países.
se compulsivamente para ter uma coleção. outros leitores. “Tenho revistas de quan-
“Quando não tenho nada pra fazer, limpo, do eu nem era nascido ainda. Elas estão Revistas de Carlos Santiago www.stararchive.com
confiro se as cargas estão ressecando. Só amareladas, algumas rasgadas. Se fosse são guardadas em estante de aço Para que se acotovelar para conseguir
gasto meu tempo ocioso”, afirma. outro tipo de coleção, você se desfaria um autógrafo de seu artista preferido?
destes exemplares, mas no meu caso a Aqui, além de muitas assinaturas de
Colecionando cultura paixão é pelo personagem, não pelo não coloque durex ou grampeie: com o tem- gente famosa, você tem o endereço de
Revista é uma das coisas mais tradici- hobby de colecionar.” po, o durex perde a cola e o grampo enfer- celebridades mundiais, se quiser is a
onais para se colecionar. Dos mais varia- Carlos tem diversos tipos de revistas do ruja, deixando a folha marcada. luta com papel e caneta na mão.
dos assuntos. Carlos Santiago, 20 anos, pistoleiro. Desde reedições até exemplares Carlos gastou muito dinheiro com a co-
escolheu os gibis de faroeste do persona- italianos – país de origem da publicação. leção, mas não se arrepende: “Qualquer tipo www.comicsdb.com/default.asp
gem “Tex”. Ele começou a ler a revista Ele ensina alguns truques para conservar re- de leitura, até um Cebolinha, não é gasto a Coleções de quadrinhos
há uns cinco anos e já tem mais de 500 vistas: o ideal é conservar cada uma em um toa. Você melhora o vocabulário e aprende
exemplares. saco plástico e colocá-las em um local onde muita coisa interessante. No caso específi- www.gasmaskcollectors.com.uk
Carlos fala que nunca pensou em co- não entre poeira. Caso uma folha rasgue, co de Tex, os autores relatam com fidelida- Para fetichistas ou o que for: coleções
de vários episódios da história dos Estados de máscaras
Unidos e ensinam, por exemplo, os costu-
mes dos índios”, relata.
Um último toque do colecionador. “Tem
gente que não empresta suas revistas. Eu O significado dos
acho válido, desde que seja para alguém de
confiança. Se você desconfia do cara, em-
presta uma revista que você não goste e só
se ela voltar direitinho você empresta as suas
objetos
favoritas”, ensina. Procuramos num dicionário de símbo-
los o significado de alguns objetos mais
Mais que um passatempo comuns entre colecionadores. O selo,
Colecionar o que quer que seja pode por exemplo, quer dizer poder e auto-
ser visto como mais que um passatempo. ridade, já que os reis carimbavam os
As vezes é até uma terapia. A psicóloga documentos para expressar sua vonta-
Alci Cabral explica que as pessoas que de. Veja mais exemplos:
não tem um objetivo na vida podem ape- Quem coleciona carros gosta de traba-
lar para uma coleção para se concentrar lhar em equipe, já que o carro é um con-
em algo. “Você se entusiasma, fica com junto de peças funcionando.
vontade de buscar o diferente, tem uma
motivação para estar vivendo e ser mais Camisas: significa proteção. Estar sem
feliz”. O ponto principal de uma coleção camisa significa total despojamento dos
é a motivação. “Um relacionamento, por bens materiais. Dar uma camisa signi-
exemplo, pode trazer sofrimento porque fica intimidade, já que a camisa é uma
depende de mais de uma pessoa. A cole- segunda pele.
ção não, é algo que depende só de sua
motivação. Qualquer coisa que dependa Bicicletas: quer dizer esforço próprio, já
só de você tem mais chances de te fazer que só uma pessoa usa a bicicleta e usa
feliz”, explica Alci. sua própria força para movimentá-la.
Segundo a psicóloga, o que se coleciona
também tem o seu significado. “Cada objeto Disco: significa comunidade. Assim
tem sua simbologia. Inconscientemente, o como os anéis, círculos, bolas, não tem
que a pessoa escolhe para colecionar tem uma começo e fim.
representação. Por exemplo, as coleções de
notas e moedas antigas. O dinheiro quer di- Garrafa: quer dizer segredo. Afinal, o que
Vinícius têm cartões de vários países, como Itália, Estados Unidos, Japão, Áustria, Espanha e França zer apego aos bens materiais.” importa não á o frasco, mas o conteúdo.

1 a 7 de abril de 2002 11