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CELEBRANDO A CIÊNCIA

15-07-2007

+ Marcelo Gleiser

Celebrando a ciência
Há dez anos, o Universo era profundamente diferente

MARCELO GLEISER,
é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover
(EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"

Este é um período especial para mim. Com a edição de hoje, são


mais de 500 colunas, 503 para ser preciso. Parece que foi ontem,
mas são já quase dez anos que desfruto deste privilegiado espaço
para compartilhar com vocês as inúmeras facetas da ciência, desde
suas raízes filosóficas até as últimas descobertas sobre o Universo
e a vida.

Muitas vezes, quando me perguntam se a coluna ainda existe e


respondo que sim, escuto comentários do tipo "Mas quanto
assunto, hein?" Pois é. Uma das lições mais fundamentais que
aprendemos ao fazer ciência é que a pesquisa é um processo
contínuo e que o conhecimento jamais deixa de crescer e de se
renovar. Nossa visão de mundo, o que entendemos sobre a
natureza do tempo e do espaço e sobre nós mesmos, está sempre
em transformação. Para ilustrar isso nem é preciso voltar ao século
16, antes de Copérnico, quando todo mundo acreditava, incluindo
os astrônomos e filósofos, que a Terra era o centro do Universo e
que os planetas, a Lua, o Sol e as estrelas giravam eternamente a
nossa volta. Não, basta voltar à minha primeira coluna, de 28 de
setembro de 1997, "A Reconstrução da História Cósmica", para
vermos como as coisas mudaram em apenas dez anos. O Universo
em que vivemos hoje, ou ao menos nossa concepção dele, é
profundamente diferente do de 1997.

Hoje, sabemos que o Universo tem uma "idade" -o período passado


desde o evento que deu origem a espaço e tempo, chamado Big
Bang- de 14 bilhões de anos e que sua geometria é plana, ao
menos dentro da região que podemos observar (o nosso horizonte
cósmico). Sabemos, também, que sua composição material é
extremamente estranha: a matéria comum, feita de elétrons e
prótons como nós, compõe apenas 5% da matéria (e energia) que
preenche o cosmo. E os outros 95%? A resposta vem de uma
descoberta absolutamente surpreendente que ocorreu em 1998,
que o Universo não só está em expansão (disso sabíamos em
1997), mas em expansão acelerada.

A receita cósmica, o balanço de matéria e energia que determina


como o Universo cresce, dita que, dos 95%, em torno de 70% são
devido a essa força antigravitacional, chamada de energia escura.
Os outros 25% são devidos à igualmente misteriosa matéria escura,
que tem massa (da mesma maneira que elétrons e prótons) e,
portanto, exerce atração gravitacional sobre a matéria comum, mas,
ao contrário dela, não tem qualquer outra interação, seja ela
elétrica, magnética ou subatômica. Se nos últimos dez anos
aprendemos muito, descobrimos também o quanto ainda
precisamos aprender. A ciência ensina humildade.

Planetas foram encontrados girando em torno de estrelas distantes,


confirmando a suspeita de que o nosso sistema solar não é a
exceção mas a regra. Se existem, então, planetas girando em torno
de inúmeras estrelas, e tudo indica que planetas girem em torno da
maioria delas, qual a probabilidade de existir vida extraterrestre? A
astrobiologia, a ciência que estuda a origem da vida na Terra e a
possibilidade de vida extraterrestre, tomou força na última década, e
promete descobertas sensacionais. Várias missões estão
programadas para os próximos anos, com o objetivo de identificar
"outras Terras", planetas que tenham propriedades semelhantes às
do nosso, como água líquida e oxigênio na atmosfera.

Enquanto isso, aqui na Terra, a engenharia genética e a


nanotecnologia redefinem a passos rápidos nossa concepção do
que seja a vida e de como podemos criar laços cada vez maiores
entre nós e as máquinas. Alguns falam até de imortalidade... Acho
que não vai faltar assunto para mais 500 colunas.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth
College, em Hanover (EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1507200703.htm

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