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PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DA 5ª REGIÃO


Seção Judiciária do Ceará - 3a Vara Federal
Praça Murilo Borges, s/n, edf. Raul Barbosa, 9º andar, Centro, Fort.-CE, CEP 60035-210, PABX (85)
3452.25.00

*2004.81.00.021499-2*
Sentença nº 3.___________/2009 - Tipo A
Processo nº 2004.81.00.021499-2.
Classe 2 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROB. ADMINISTRATIVA.
Autor(a)(e)(s): MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF.
Ré(u)(s): PEDRO GERVÁSIO MOREIRA MARTINS.

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.


MUNICÍPIO. VERBAS PROVENIENTES DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE-SUS. PISO DE ATENÇÃO BÁSICA-PAB.
MALVERSAÇÃO. ATOS DE IMPROBIDADE CARACTERIZADOS. LEI 8.666/93, ARTS. 41 E 66. LEI Nº 8.429/1992,
ARTS. 7º, 10, INCISOS I, V E XII, E 11, CAPUT. APLICAÇÃO DAS PENALIDADES COMINADAS NO ART. 12.
PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS.

I - RELATÓRIO
1. Trata-se de Ação de Improbidade Administrativa aforada pelo Ministério Público Federal - MPF em
desfavor do Sr. Pedro Gervásio Moreira Martins, ex-Secretário de Saúde do Município de Canindé, no
Estado do Ceará, imputando-lhe a prática de inúmeros atos tipificados no bojo dos arts. 7º, 10, incisos I, V e
XII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) e dos arts. 41 e 66 da Lei nº
8.666/1993 (Lei de Licitações e Contratos), perpetrados durante a sua gestão, requerendo o MPF a
condenação do Réu nas sanções prescritas nos incisos II e III do art. 12 da Lei nº 8.429/1992 e no art. 82 da
Lei nº 8.666/1993.
2. Em prol de sua pretensão, o Parquet aduz, em suma, que, em fiscalizações realizadas in loco acerca da
gestão conduzida pelo ex-Secretário, foram constatadas inúmeras ilicitudes decorrentes da malversação de
verbas federais do Sistema Único de Saúde - SUS, transferidas pelo Ministério da Saúde por via do Piso de
Atenção Básica - PAB, consubstanciadas, basicamente, na aquisição superfaturada de peças de reposição e
serviços para a manutenção de veículos da Secretaria de Saúde do referido Município, as quais
apresentavam, em alguns casos, cifras que ultrapassavam o patamar de 1.000% (mil por cento) acima do
preço corrente do mercado.
3. Assevera que foram apuradas robustas evidências de outras irregularidades, tais como: a falsificação de
assinaturas para o recebimento de vencimentos de agentes públicos; a falta de medicamentos nos postos
de saúde e nos hospitais da rede municipal, bem como de equipamentos essenciais ao normal desempenho
das atribuições incumbidas à Secretaria; descontrole e falta de planejamento quanto ao acondicionamento
e à distribuição dos medicamentos; aplicação indevida dos recursos financeiros do SUS no pagamento de
despesas não vinculadas ao Sistema; e a não-comprovação da freqüência e da produtividade de alguns
agentes públicos, de forma que estes permaneciam recebendo suas remunerações sem prestarem serviços.
4. Com a inicial a documentação de fls. 23-1294 e 1311-1335.
5. Devidamente notificado (fls. 1299/1337/1341), a teor do art. 17, § 7º, da LIA, o réu apresentou a
manifestação prévia de fls. 1345-1360, na qual, preliminarmente, alega a carência da ação por ilegitimidade
passiva ad causam e por ilegitimidade ativa do MPF, bem como por falta de interesse processual em virtude
da inadequação da via processual eleita e por impossibilidade jurídica do pedido.
6. No mérito, afirma, genericamente, que os atos por ele perpetrados, concernentes à aplicação dos
recursos do SUS destinados ao Município de Canindé, durante a gestão da Secretaria de Saúde do
Município, obedeceram, de forma fiel, aos comandos normativos pertinentes, inexistindo em tais atos
administrativos qualquer conduta que tenha implicado lesão ao Erário Municipal ou Federal, bem como
qualquer desvio de finalidade que legitime a procedência desta demanda, não havendo provas nos autos
que comprovem o cometimento dos atos de improbidade administrativa alegados.
7. Ressalta, também, que as insignificantes falhas formais ocorridas nos processos de pagamento
apontados como irregulares não deu ensejo a nenhum prejuízo para o Município ou para a União, uma vez
que foram causadas por simples atecnias contábeis e a aquisição dos produtos, por via de licitação,
acarretou excelentes resultados nas ações de saúde destinadas à população.
8. Juntada de novos documentos pelo MPF às fls. 1371-1392.
9. A inicial foi recebida às fls. 1395-1399.
10. Devidamente citado (fls. 1409-1409v.), o Réu não contestou (fls. 1411).
11. A União postulou sua inclusão no pólo ativo, à vista do seu interesse na causa (fls. 1419-1420), o que foi
deferido (fls. 1421).
12. Às fls. 1563-1564, o Ministério Público Federal pugnou pelo julgamento antecipado da lide, em face da
revelia do Réu.
13. Vieram-me os autos conclusos.
14. Eis o brevíssimo relatório.
II - FUNDAMENTAÇÃO
15. De início, convém examinar as alegações do Parquet às fls. 1563-1564.
16. Realmente, a parte requerida, apesar de citada, deixou fluir in albis o prazo para apresentar resposta.
17. O art. 319 do Diploma Processual Civil pátrio estabelece que, se o réu não contestar a ação, reputar-se-
ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.
18. Já o art. 320 informa as exceções à regra prevista no artigo anterior. Referido dispositivo se encontra
assim redigido, in verbis:
Art. 320. A revelia não induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente:
I - se, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação;
II - se o litígio versar sobre direitos indisponíveis;
III - se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento público, que a lei considere indispensável
à prova do ato.
19. Entretanto, não se pode olvidar que o § 1º do art. 17 da Lei nº 8.429/92, que dispõe sobre as sanções
aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo,
emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências, veda
a transação, acordo ou conciliação nas ações de improbidade administrativa.
20. Ora, um dos parâmetros que evidencia o conceito de indisponibilidade de direitos é precisamente a
impossibilidade de composição a seu respeito. A vedação gravada no § 1º do art. 17 da Lei nº 8.429/92
ressalta o caráter indisponível do direito tratado nos autos.
21. Portanto, incide a exceção gravada no inciso II do art. 320 do CPC, não tendo aplicação o art. 319 do
CPC, vale dizer, não se aplicam os efeitos da revelia, com a confissão ficta dos fatos alegados na inicial,
devendo a parte autora provar o seu direito, na forma do inciso I do art. 333 do CPC.
22. Por fim, ressalto que a indisponibilidade do direito não afasta a aplicação do disposto no art. 322 do
CPC, cuja dicção é a seguinte:
Art. 322. Contra o revel que não tenha patrono nos autos, correrão os prazos independentemente de
intimação, a partir da publicação de cada ato decisório.
23. Em sendo assim, fica decretada a revelia do promovido Pedro Gervásio Moreira Martins, sem induzir,
contudo, os efeitos mencionados no art. 319 do CPC, mas fluindo os prazos independentemente de
intimação, nos termos do art. 322 do estatuto processual civil em vigor.
24. Sem mais preliminares ou prejudiciais, e presentes as condições genéricas da ação e os pressupostos de
constituição e desenvolvimento válido e regular da instância, passo ao exame do mérito.
25. Na espécie, depreendo do substancial acervo probatório trazidos à colação pelo MPF (sindicância
promovida pela Comissão de Saúde da Câmara de Vereadores de Canindé; informações prestadas pela
Prefeitura de Canindé; notas fiscais, faturas e recibos de pagamentos; cópias dos autos de licitações, tais
como o Convite nº 020-A/2002 e a Tomada de Contas nº 002/2003; auditorias do Ministério da Saúde - nºs
1250 e 1832; Tomada de Contas Especial do TCM), em perfeita simbiose com os fatos narrados na petição
vestibular, que restaram devidamente provadas as irregularidades imputadas ao ex-Secretário de Saúde
ora Réu, referentes à malversação de recursos públicos federais do Sistema Único de Saúde - SUS,
transferidos pelo Ministério da Saúde ao Município de Canindé/CE por via do Piso de Atenção Básica - PAB,
assim discriminadas:
1) na aquisição superfaturada de peças de reposição e serviços para a manutenção de veículos da
Secretaria de Saúde do referido Município, as quais apresentavam, em alguns casos, cifras que
ultrapassavam o patamar de 1.000% (mil por cento) acima do preço corrente do mercado, as quais se
qualificam como ilícitos administrativos, nos termos dos arts. 41 e 66 da Lei nº 8.666/1993 (Lei de Licitações
e Contratos), perfazendo um prejuízo de R$ 1.238,94 (mil, duzentos e trinta e oito reais e noventa e quatro
centavos);
2) pagamentos de despesas efetuadas pelo Fundo Municipal de Saúde que não deveriam ter sido pagas
com recursos do SUS, eis que não contemplados pela Portaria nº 3.925/98, perfazendo um prejuízo de R$
5.160,00 (cinco mil, cento e sessenta reais);
3) falsificação da assinatura de alguns servidores para que pudessem ser recebidos os valores a que fariam
jus a título de gratificação SIA/SUS, perfazendo um prejuízo de R$ 18.116,00 (dezoito mil, cento e dezesseis
reais) para os cofres públicos;
4) não provimento de material indispensável ao trabalho dos profissionais do município, como, v.g,
pranchetas, balanças, cronômetros, termômetros, fitas métrica, bicicletas para os Agentes Comunitários de
Saúde - ACS, equipamentos básicos de acordo com a legislação, ou de aparelhos para os fisioterapeutas;
não provimento de medicamentos em unidades de saúde, em quantidades adequadas, especialmente
Captopril e antibióticos, o que representa um prejuízo estimado em R$ 1.644,34 (mil, seiscentos e quarenta
e quatro reais e trinta e quatro centavos) para os cofres públicos;

5) Ausência de menção à produtividade e freqüência dos prestadores de serviços contratados nas folhas de
pagamento do Município, levando a crer que receberam sem produzir, perfazendo um prejuízo de R$
76.361,22 (setenta e seis mil, trezentos e sessenta e um reais e vinte e dois centavos) para os cofres
públicos.
26. De início, comprovou-se que o Réu era Secretário de Saúde de Canindé, conforme Portaria nº
007/2001, de 02.01.2001, cargo que ocupou até ser exonerado em 31.07.2003 (Portaria nº 132/2003, às fls.
294 do Volume II do Apenso) e foi quem autorizou os pagamentos irregulares, enquanto ordenador das
despesas da Secretaria de Saúde e gestor das verbas destinadas à saúde no Município, em relação às quais
cabia administrar, planejando, executando e controlando a distribuição dos recursos de forma racional e
eficiente, dever do qual não se desincumbiu a contento.
27. Com efeito, a Licitação regulada pelo Convite nº 020 - A/2002 e seus anexos (fls. 478-484) previa a
aquisição de peças de reposição e manutenção para os veículos pertencentes à Secretaria de Saúde do
Município de Canindé, com recursos provenientes do PAB - Piso de Atenção Básica.
28. Observa-se, no entanto, que a Administração não observou os termos do Edital: tome-se como exemplo
o item nº 01 constante do Anexo II do referido Edital - um par de buzinas para o veículo universal (fls. 485-
492), o qual, após homologação e adjudicação do objeto do certame, foi assim discriminado na ordem de
compra emitida pelo Setor de Compras da Prefeitura Municipal de Canindé, conforme planilha de fls. 573-
580:
Descrição do Produto
Uni
Qtde
Vlr Unit
Total R$
BUZINAS(UNIVERSAL)
PAR
2.00
50.00
100.00

29. Verificou-se igual distorção com referência a inúmeros itens licitados, o que representa violação
patente aos termos do Edital e evidencia a afronta aos arts. 411 e 662 da Lei nº 8.666/93, eis que a lei veda
o aumento quantitativo do objeto licitado fora dos permissivos legais, às quais não se subsume a hipótese
dos autos.
30. A par disso, os preços constantes da proposta vencedora, apresentada pela empresa R. Santos Peças e
Acessórios Ltda, afiguram-se em muito superiores aos praticados no mercado, conforme se apurou na
investigação empreendida pela Câmara Municipal na Administração da Secretaria Municipal de Saúde de
Canindé (fls. 640-649), dela resultando a constatação de superfaturamento de diversos itens licitados.
31. Nessa esteira, toma-se como exemplo das distorções reveladas durante aquela investigação o item nº
222 do Anexo II do Convite nº 020 - A/2002, "Pastilhas Dianteiras (Land Rover)", o qual, embora cotado a
R$ 210,00 (duzentos e dez reais) no mercado, foi adquirido pela Municipalidade pelo preço ofertado pela
empresa vencedora do certame, a saber, R$ 475,00 (quatrocentos e setenta e cinco reais), mais de 50%
(cinqüenta por cento) superior.
32. Distorções similares foram identificadas pela Auditoria do Ministério da Saúde, a qual estimou perdas
para o erário no valor de R$ 1.238,94 (mil, duzentos e trinta e oito reais e noventa e quatro centavos) (v. fls.
608-629).
33. No que concerne à aplicação dos recursos do SUS, observo que a Portaria nº 3.925/98 preconizava que
os recursos do Piso da Atenção Básica - PAB, repassados do Fundo Nacional de Saúde diretamente aos
Fundos Municipais de Saúde poderiam ser utilizados para cobertura de quaisquer categorias de despesas
constantes dos Planos Municipais de Saúde e das Programações Anuais, aprovadas na Lei de Orçamento
dos Municípios ou em Créditos Adicionais específicos, desde que exclusivamente destinados à execução de
ações e serviços de atenção básica à saúde definidos no Manual para Organização da Atenção Básica. (art.
2º e 3º, § 1º).
34. Portanto, as despesas correspondentes à aquisição de agendas como brindes natalinos a servidores da
Secretaria de Saúde e à realização de show popular em solenidade de inauguração de Posto do PSF em
Salitre, conforme apurado pela Auditoria do Ministério da Saúde in loco (fls. 608-629), não poderiam ter
sido efetuadas com recursos do SUS, pois não são considerados pela legislação ações ou serviços de
atenção básica à saúde.
35. Outra irregularidade comprovada nos autos diz respeito à percepção indevida da gratificação do SUS
por profissionais contratados pelo Município, decorrente da sua inclusão em folha de pagamento por
ordem do Réu, o qual, inclusive, autorizava o valor a ser preenchido no cheque, para posterior saque em
banco e pagamento em espécie ao beneficiário.
36. De fato, as servidoras Gláucia Maria Nóbrega Rocha e Suzana Ramirez permaneceram em folha de
pagamento nos meses de janeiro a junho de 2003 (fls. 255, 259, 262, 265, 268 e 273 volume I, Apenso I), e
de maio e junho de 2003 (fls. 271, 276 volume I, Apenso I), respectivamente, embora a primeira estivesse
em gozo de licença sem remuneração por dois anos a partir de dezembro de 2002 (fls. 74 volume I Apenso
I) e a segunda houvesse rescindido seu contrato em 02 de março de 2003 (fls. 106 volume I Apenso I), não
fazendo jus, portanto, à percepção daquela gratificação paga com recursos do Sistema Único de Saúde.
37. Por fim, outra grave anomalia apurada durante a gestão do Réu na Secretaria de Saúde de Canindé
consiste no deficiente planejamento de aquisição de equipamentos e medicamentos, bem como no
controle da distribuição de tais recursos para as unidades de saúde e para os agentes comunitários de
saúde do Município.
38. Nesse sentido, a Comissão provisória de gestão dos serviços de saúde do Município, instaurada após
emergirem as denúncias de malversação de verbas da Secretaria de Saúde durante a gestão do Réu, apurou
uma série de irregularidades, imputadas ao Sr. Pedro Gervásio Moreira Martins, como a inclusão de
prestadores de serviços em folha de pagamento "Dengue e Controle de Doenças" sem que tivessem
trabalhado, dentre outras (v. fls. 08-13 do volume I dos apensos).
39. Da mesma forma, Auditoria realizada pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS, do Ministério
da Saúde na Secretaria de Saúde do Município de Canindé (v. fls. 608-629) constatou, após ouvir cento e
cinco Agentes Comunitários de Saúde, que não lhes foram fornecidos equipamentos básicos para o
exercício de suas atribuições, como fardamento adequado, pranchetas, balanças, cronômetros,
termômetros, fitas métricas e bicicletas.
40. Ademais, em vistoria a nove unidades de saúde na área urbana e quatro na zona rural, constatou-se a
falta de medicamentos como Captopril e antibióticos, adquiridos em quantidades insuficientes.
41. Por fim, os auditores do Ministério da Saúde identificaram, após exame criterioso às folhas de ponto do
Programa de Endemias - Campanha da Dengue dos meses de março, novembro e dezembro de 2002 e
janeiro, maio e junho de 2003, a inclusão nas mesmas de prestadores de serviços que receberam sem
trabalhar no Programa, como os Srs. Fernando Antônio da Silva e Francisco Weber Castelo Mesquita, a par
da ausência de comprovação da produtividade ou freqüência de todos os prestadores de serviços
remunerados pela Prefeitura nos meses de março a dezembro de 2002 e janeiro a junho de 2003, a
conduzir à ilação de que os mesmos receberam sem produzir.
42. Por outro lado, o Réu não apresentou qualquer documento ou outros elementos capazes de afastar a
materialidade e a autoria dos fatos apurados, nem de ilidir a presunção de legitimidade de atos
administrativos como o Relatório de fls. 608-629, as investigações da Câmara Municipal de Canindé ou o
Acórdão nº 1.091/07, do Tribunal de Contas do Município, de que decorreu a aplicação de multa ao ex-
gestor municipal, à vista do julgamento pela irregularidade de suas contas (fls. 1537-1541).
43. Portanto, a lesão ao erário está provada nos autos, uma vez que o montante de R$ 102.520,50 (cento e
dois mil, quinhentos e vinte mil reais e cinqüenta centavos), transferido ao Município de Canindé pela
União através do Sistema Único de Saúde e Piso de Atenção Básica, foi indevida e irregularmente utilizado
pelo Réu, legítimo gestor e ordenador de despesas de Saúde do Município.
44. Dessa forma, após análise da robusta prova colacionada pelo Parquet federal, entendo que os fatos
relatados consubstanciam uma ruinosa gestão das verbas originárias do Sistema Único de Saúde (SUS), do
Piso de Atenção Básica (PAB), além de revelar o absurdo descalabro na administração dos serviços de saúde
do Município de Canindé, ainda mais grave se atentarmos que tal Município, enquanto inserido no
contexto do Nordeste brasileiro, apresenta uma população carente e desassistida e que, até pouco tempo
atrás, apresentava altas taxas de mortalidade infantil, dentre outros aspectos negativos.
45. Assim, tais graves irregularidades qualificam-se como atos de improbidade administrativa, ex vi dos
arts. 7º, 10, incisos I, V e XII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa), in
verbis:
Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito,
caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a
indisponibilidade dos bens do indiciado.
Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que
assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do
enriquecimento ilícito.
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão,
dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos
bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa
física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades
mencionadas no art. 1º desta lei;
(...)
V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de
mercado;
(...)
XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração
pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e
lealdade às instituições, e notadamente:
(...)
46. Por fim, sabe-se que a configuração dos atos de improbidade administrativa enseja a aplicação das
penalidades previstas no art. 82 da Lei nº 8.666/93 e art. 12, II e III, da Lei nº. 8.429/92, com as
ponderações contidas no parágrafo único:
Lei nº 8.666/93: Art. 82. Os agentes administrativos que praticarem atos em desacordo com os preceitos
desta Lei ou visando a frustrar os objetivos da licitação sujeitam-se às sanções previstas nesta Lei e nos
regulamentos próprios, sem prejuízo das responsabilidades civil e criminal que seu ato ensejar.
LIA: Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação
específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações:
II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos
ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos
políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de
contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou
indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de
cinco anos;
III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública,
suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da
remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da
qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.
Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano
causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.
III - DISPOSITIVO
47. Ante o exposto, julgo procedentes os pedidos.
48. Por conseguinte, condeno o Réu Pedro Gervásio Moreira Martins, com amparo no art. 12 da LIA e no
art. 82 da Lei nº 8.666/93, ao ressarcimento integral do dano, correspondente ao valor de R$ 102.520,50
(cento e dois mil, quinhentos e vinte mil reais e cinqüenta centavos), devidamente atualizado e acrescido
de juros moratórios a partir do ilícito; à suspensão dos direitos políticos de cinco anos; ao pagamento de
multa no valor do dano e a permanecer proibido de contratar com o Poder Público e de receber benefícios,
incentivos fiscais e creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual
seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
49. Sem custas. Sem honorários (CF, art. 128, II, "a").
50. P.R.I.
Fortaleza/CE, 2 de dezembro de 2009.

GERMANA DE OLIVEIRA MORAES


Juíza Federal da 3a Vara

CERTIDÃO DE REGISTRO

Certifico que esta Sentença foi registrada no Livro de Registro de Sentenças mantido no Sistema Processual
TEBAS. Dou fé.

Fortaleza-CE, 2 de dezembro de 2009.

Servidor(a) da 3ª Vara

1 Art. 41. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha
estritamente vinculada.
2 Art. 66. O contrato deverá ser executado fielmente pelas partes, de acordo com as cláusulas avençadas e
as normas desta Lei, respondendo cada uma pelas conseqüências de sua inexecução total ou parcial.
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Processo nº 2004.81.00.021499-2 (3ª VF/SJ-CE/TRF5) 8/8

Fonte:
Site oficial - Tribunal de Justiça Federal do Estado do Ceará - Poder Judiciário da União

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