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LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

TEMA 2:

O DESENVOLVIMENTO NA INFÂNCIA
E ADOLESCÊNCIA

Docentes: Lina Morgado


Angelina Costa

© Universidade Aberta, 2009


Psicologia do Desenvolvimento
U. C. PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO, UNIVERSIDADE ABERTA

Tex to   1 :    
As Grandes Linhas do Desenvolvimento na Infância 
 
 
 
PERSPECTIVA HISTÓRICA 
  Até os adultos reconhecerem e permitirem a emergência da infância, ela parecia 
não  existir.  Durante  longos  séculos  pensou‐se  que  por  volta  dos  6/7  anos  de  idade  a 
criança  estaria  preparada  para  ser  tratada  como  um  adulto.  As  crianças  eram 
consideradas  pouco  mais  do  que  adultos  em  miniatura.  Com  excepção  de  um  pequeno 
conjunto  de  crianças  ricas,  nascidas  em  boas  famílias,  todas  as  outras  trabalhavam 
juntamente com os adultos nos campos, lutavam e morriam nas guerras, trabalhavam nas 
minas e, com a industrialização, trabalhavam de manhã à noite nas fábricas. 
  Considerando um período de tempo de 4 mil a 5 mil anos de história, verifica‐se 
que  a  educação  das  crianças  é  um  fenómeno  recente.  Apenas  nos  últimos  150  anos  as 
sociedades  adultas  ocidentais  reconheceram  a  infância  e  os  anos  juvenis  como  estádios 
especiais  de  desenvolvimento.  As  crianças  sempre  existiram  nas  sociedades.  Contudo, 
tornava‐se necessário o reconhecimento dos adultos para que a infância pudesse existir e 
ser estudada. 
  Uma vez reconhecida, surgiu um período de grandes mudanças. Formularam‐se 
leis protectoras do bem‐estar e da saúde das crianças. E o que aconteceu no século XIX 
para  as  crianças,  voltou  a  acontecer  no  século  XX  para  a  adolescência.  Apenas 
recentemente,  nos  países  e  culturas  industrializadas,  os  adultos  começaram  a  levar  em 
conta  as  necessidades  e  capacidades  fisiológicas  e  psíquicas  características  dos 
adolescentes  e  esta  percepção  deu‐lhes  oportunidade  de  reconhecer  um  estádio 
específico  de  desenvolvimento  humano.  Como  consequência,  tem  vindo  a  aumentar  a 
nossa compreensão acerca das características fundamentais dos adolescentes. Na última 
metade do século XX assistimos a mudanças no modo como os adolescentes são tratados 
pelos adultos, as quais são semelhantes às modificações vividas pelas crianças no século 
anterior. 
 
CONCEITOS BÁSICOS: ESTÁDIOS E DOMÍNIOS DE CRESCIMENTO 
Na psicologia do desenvolvimento contemporânea, o conceito de estádio tem um 
significado  importante  e  especial.  Um  estádio  é  um  sistema  de  funcionamento  humano 

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que é distinto, único e consistente como um todo. As diferenças entre um estádio inicial e 
um  estádio  posterior  são  qualitativas  e  não  quantitativas.  Os  estádios  são  sequenciais, 
construindo‐se cada um deles a partir do que lhe antecedeu. O crescimento ao longo dos 
estádios  não  é  automático,  mas  depende  da  combinação  da  maturação  fisiológica  com 
uma interacção adequada com o meio ambiente.  
 
Estádio: um sistema distinto, único, consistente do funcionamento humano 
Os  psicólogos  desenvolvimentalistas  afirmam  que  todos  os  seres  humanos 
processam, activamente, o conhecimento que é adquirido na prática, isto é, que a mente 
humana  tenta  atribuir  um  significado  a  cada  experiência.  O  ser  humano  possui  a 
capacidade  de  pensar,  de  reflectir,  de  examinar  e  de  raciocinar.  Quando  vivenciamos 
alguns  acontecimentos  tentamos  processá‐los  cognitivamente  de  forma  a  procurar, 
activamente,  chegar  a  algum  significado.  Por  outras  palavras,  não  somos  receptáculos 
vazios  ou  indivíduos  passivos.  Em  vez  disso,  somos  participantes  activos  na  vida, 
procurando tornar significativas todas as nossas experiências. A capacidade de reflexão é 
intrínseca  à  condição  humana;  possuímos  uma  forte  tendência  para  tentar  retirar 
significado das experiências. 
A forma como cada indivíduo processa as situações representa o estádio, isto é, o 
conjunto  das  operações  mentais  que  ele  geralmente  utiliza.  No  seio  de  grupos  etários 
amplos,  as  operações  cognitivas  têm  tendência  a  ter  em  comum  um  conjunto  de 
características  semelhantes.  Além  disso,  cada  pessoa  tende  a  utilizar  o  mesmo  sistema 
básico de pensamento de uma maneira generalizada e consistente. Para explicar a noção 
de  estádio  cognitivo‐desenvolvimentalista  são  utilizadas,  frequentemente,  diversas 
expressões: esquema, estrutura cognitiva, estrutura mental, sistema mediador interno ou 
estratégia de resolução de problemas. Estes termos baseiam‐se no tipo de raciocínio que 
cada indivíduo efectua num processo de tomada de decisão. 
A  cognição,  o  acto  de  pensar,  ou,  de  um  modo  geral,  o  processamento  do 
conhecimento,  e  inerentemente,  uma  capacidade  humana.  Em  aspectos  particulares  do 
desenvolvimento,  o  sistema  que  cada  pessoa  utiliza  possui  características  que  se 
identificam facilmente, como um estádio coerente e internamente consistente. Para um 
desenvolvimentalista,  ou  para  um  educador,  é  extremamente  importante  ser  capaz  de 
identificar  o  processo  de  raciocínio  e  de  tratamento  da  informação  que  cada  um 
efectivamente  utiliza,  dado  que  isso  lhe  permite  adequar  o  trabalho  ao  nível  de 
funcionamento actual do aprendente. 
 
Estádios: sistemas de processamento que são qualitativamente diferentes 

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Uma  segunda  característica  dos  estádios  consiste  no  facto  de  eles  serem 
qualitativamente  diferentes. As  diferenças entre um  estádio  e  o  seguinte  são  diferenças 
de  género.  Este  ponto  de  vista  entra  em  contradição  com  a  visão  geral  sobre  os  seres 
humanos, defendida no fim do século XIX, especificamente, eu a infância, a adolescência e 
a  vida  adulta  eram  partes  essenciais  de  um  contínuo.  Assim,  por  exemplo,  as  crianças 
eram  consideradas  fisicamente  mais  pequenas,  mentalmente  mais  lentas,  capazes  de 
memorizar  menos  informação  e  de  escrever  frases  ais  elementares  do  que  os 
adolescentes  ou  adultos.  As  crianças  eram  quase  como  os  adultos,  sendo,  apenas  de 
menor  tamanho.  Não  existiam  características  essenciais  que  fossem  diferentes,  com 
excepção para a capacidade de reprodução. As diferenças eram todas de grau, possuindo 
os adultos mais «expressões» de uma dada característica do que as crianças e os jovens. 
Hoje  em  dia  sabemos  que  as  mudanças  de  um  estádio  para  outro  constituem 
transformações. Pode fazer‐se uma analogia adequada com a entomologia: o processo de 
transição  do  ovo  de  uma  lagarta para  uma  borboleta.  Cada  estádio  de desenvolvimento 
humano  representa,  idealmente,  esse  tipo  de  metamorfose.  Outra  analogia  pode  ser 
retirada da física: quando acontece uma descoberta nova e radical, um novo método de 
compreensão  de  algum  aspecto  do  Universo  como,  por  exemplo,  a  descoberta  da 
gravidade  feita  por  Newton,  é  descrita  uma  nova  lei,  dando‐se  um  salto  quântico.  Da 
mesma maneira, uma mudança de estádio de funcionamento constitui um avanço deste 
tipo  para  um  novo  nível  de  processamento  do  conhecimento.  Este  novo  estádio  é  mais 
complexo do que o anterior e representa um novo modo, ou sistema, de pensamento. 
 
 
Os estádios de desenvolvimento são sequenciais 
  Os  estádios  são  ordenados  de  acordo  com  níveis  de  complexidade.  Todas,  ou 
quase  todas  as  pessoas,  iniciam  o  seu  desenvolvimento  aproximadamente  ao  mesmo 
nível  e  o  crescimento,  por  definição,  progride  de  um  nível  menos  complexo  para  outro 
mais  complexo.  Uma  vez  que  cada  novo  estádio  se  edifica  directamente  sobre  as 
experiências  do  estádio  anterior,  o  crescimento  é  sequencial,  isto  é,  passa‐se  de  um 
estádio a outro por ordem de complexidade. Foi referido anteriormente que os estádios 
são qualitativamente diferentes; por isso eles constituem uma hierarquia. Esta hierarquia 
dos  estádios  e  a  natureza  sequencial  do  desenvolvimento  mostram  que  a  ordem  é 
unidireccional  e  que  respeita  determinados  passos.  Os  estádios  iniciais  não  podem  ser 
omitidos. 
  Existe outro aspecto igualmente importante nesta ideia. De uma maneira geral, 
se uma pessoa atinge completamente um determinado estádio nunca regredirá para um 
nível  de  complexidade  menor.  Tecnicamente,  esse  fenómeno  é  atribuído  à 

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impossibilidade  de  ocorrer  uma  regressão  estrutural.  Nesta  perspectiva,  uma  vez 
terminada  a  infância,  o  indivíduo  não  consegue  voltar  a  ter,  integralmente,  uma  visão 
ingénua  do  mundo  (partindo  do  princípio  de  que  as  funções  intelectuais  permanecem 
intactas).  Esta  observação  não  significa  que  o  adulto,  por  vezes,  não  seja  um  pouco 
infantil. No entanto, as suas vivências não são qualitativamente iguais às das crianças. 
 
Os estádios representam diferentes domínios de processamento humano 
  Muitas  vezes  o  conceito  de  estádio  é  mal  interpretado.  Tem  havido  uma 
tendência para afirmar que, quando se refere um estádio de desenvolvimento, se faz uma 
generalização  ao  domínio  completo  do  funcionamento  humano.  Apesar  de  ser  fácil  cair 
nesta  sobregeneralização,  a  investigação  actual  indica  que  devemos  ser  bastante 
cautelosos ao especificar a que aspecto particular, ou domínio, nos estamos a referir. 

  Os  autores  que  defendem  a  existência  de  estádios  têm  concentrado  os  seus 
esforços  em  áreas  diferentes  do  funcionamento  humano.  Por  exemplo,  os  trabalhos  de 
Piaget dão particular ênfase ao desenvolvimento cognitivo. Do mesmo modo, ao falarmos 
do  desenvolvimento  psicossexual,  a  perspectiva  de  Freud  propõe  uma  sequência 
específica  de  estádios.  O  mesmo  acontece  com  outras  áreas  como  o  desenvolvimento 
moral  ou  o  desenvolvimento  da  identidade.  Assim,  cada  domínio  possui  uma  sequência 
característica de desenvolvimento. 
 
O desenvolvimento dos estádios depende do processo de interacção 
  O pressuposto mais importante e, de certa forma, decisivo, refere‐se ao facto de 
o crescimento depender do processo de interacção, tal como se afirmou anteriormente. 
Alguns autores defenderam o oposto, nomeadamente que o desenvolvimento era, de um 
modo amplo, orientado internamente. Este é um ponto de vista maturacionista. Contudo, 
o desenvolvimento não é unilateral. O pano de fundo, tal como Erik Erikson lhe chamava, 
ou  a  determinação  orgânica,  constitui  apenas  um  dos  elementos  do  processo.  O 
desenvolvimento  tem  lugar  dependendo  quer  do  género,  quer  da  qualidade  da 
estimulação ambiental, a qual interage com a capacidade do indivíduo para tirar proveito 
das  experiências.  A  sequência  constante  dos  estádios  oferece  uma  ideia  geral,  alargada, 
sobre a forma como o desenvolvimento resulta da interacção indivíduo‐ambiente. 
  Os  perigos  de  uma  perspectiva  unilateral  são  duplos.  Podemos  dificultar  ou 
mesmo  obstruir  o  desenvolvimento  quer  impedindo  a  interacção,  quer  subjugando  a 
pessoa  ao  ambiente.  No  primeiro  caso  extremo,  por  exemplo,  mantendo  fechadas  em 
armários, garagens e sótãos crianças com atraso mental, tem‐se a certeza de que elas não 

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se desenvolverão mesmo dentro do seu limitado potencial. Outro exemplo está expresso 
num estudo realizado em escolas do primeiro ciclo da cidade de Nova Iorque que mostrou 
que  as  capacidades  de  algumas  crianças  declinavam  como  consequência  da  própria 
aprendizagem. Os seus resultados na leitura e o seu auto‐conceito diminuíam durante os 
anos  iniciais  da  escolaridade.  Uma  análise  das  interacções  reais  na  sala  de  aula  indicou 
que  as  crianças  estavam  inseridas  num  meio  pouco  estimulante  e  monótono,  no  qual 
eram frequentemente ignoradas. 
  Existem também estudos que mostram de forma clara que uma estimulação em 
excesso,  que  conduza  a  uma  idade  adulta  prematura,  pode  ser  prejudicial  para  as 
crianças. Por exemplo, um estudo com crianças da área de Bóston revelou que as crianças 
em  idade  pré‐escolar  tinham  de  cuidar  dos  seus  irmãos  mais  novos,  alguns  recém‐
nascidos. Elas aprendiam a ir às compras, a negociar astutamente e, muitas vezes, a cuidar 
dos  pais  alcoólicos.  Por  este  facto,  apresentavam  competências  sociais  muito 
desenvolvidas. Contudo, este tipo de desenvolvimento prematuro provocava dificuldades 
acentuadas no seu desenvolvimento emocional e pessoal. Além disso, manifestavam uma 
incapacidade acentuada para adquirir mesmo as competências básicas do primeiro ano de 
escolaridade. Os custos deste comportamento adulto prematuro distorciam o seu futuro 
antes de terem iniciado a escolaridade obrigatória. 
  Outros  estudos  mostram  os  efeitos  positivos  de  uma  estimulação  e  apoio 
emocional adequados. Alguns programas eficazes de educação pré‐escolar, para crianças 
socialmente desfavorecidas, apresentam evidências claras de que uma interacção positiva 
e apropriada leva à promoção de um desenvolvimento saudável. O que é verdadeiro para 
as escolas também o é para o ambiente familiar. Também neste domínio vários estudos 
documentam  os  benefícios  da  colocação  de  crianças  muito  novas,  adoptadas  e 
provenientes  de  meios  precários,  em  lares  onde  lhes  era  dado  um  ambiente  adequado. 
Nestas  condições,  o  ambiente  enriquecido  estimulava  o  crescimento  das  crianças. 
Surpreendentemente, não foi só o seu funcionamento geral que melhorou, mas também 
o  valor  do  seu  QI  que,  em  média,  subiu  cerca  de  20  pontos  comparativamente  ao  das 
crianças  do  grupo  de  controlo.  Mesmo  as  capacidades  intelectuais  não  estão 
determinadas  à  nascença,  mas  dependem,  em  grande  medida,  da  qualidade  da 
interacção. 
  A importância da interacção não se restringe à infância. Por exemplo, as curvas 
de desenvolvimento e os índices de base relativos aos anos da adolescência mostram que, 
em  muitos  casos,  os  níveis  de  desenvolvimento  decrescem  ou  tornam‐se  estáveis.  Este 
resultado  sugere  que  pode  deixar  e  existir  uma  adequada  interacção  na  escola  ou  em 

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casa.  Por  exemplo,  uma  grande  maioria  dos  adolescentes  não  é  capaz  de  resolver  os 
problemas  escolares  que  envolvem  o  raciocínio  abstracto.  Teoricamente,  pelo  menos  a 
maior  parte  deles  deveria  ser  perfeitamente  capaz  de  desenvolver  o  raciocínio  e  outras 
funções  intelectuais  a  este  nível.  Contudo,  os  programas  educacionais  muitas  vezes  não 
proporcionam  a  estimulação  adequada.  Como  consequência,  menos  de  um  teço  dos 
adultos consegue alcançar o nível intelectual de que é potencial capaz.  
  Dados  semelhantes  indicam  que  o  que  acontece  para  o  pensamento  formal 
também  é  verdade  para  o  desenvolvimento  dos  valores,  do  ego  e  das  relações 
interpessoais.  Não  nos  podemos  esquecer  de  que  o  processo  de  interacção  é  a  base 
essencial para a estimulação do desenvolvimento. 
Adaptado de N. Sprinthall e W. Collins, Psicologia do Adolescente, 1994 

Tex to   2 :    
As Grandes Linhas do Desenvolvimento na Adolescência 
 

Introdução 
O termo adolescência tem origem na palavra adolescere, que quer dizer crescer 
para adulto. Sempre se cresceu para adulto. Mas nem sempre foi dado a este crescimento 
um tempo de vida tão alargado como nos tempos vigentes. 
Nos  dias  de  hoje,  a  adolescência  é  um  período  alongado,  que  se  estende  até  à 
terceira  década  de  vida,  em  que  o  adolescente  vive  com  os  pais.  Para  este  facto  são 
apontadas várias causas: culturais, como a maior liberalização, aceitação e tolerância dos 
costumes;  sociais,  onde  se  destaca  o  prolongamento  dos  estudos  que  leva 
consequentemente  a  uma  maior  dependência;  e  económicas,  como  o  desemprego  ou o 
trabalho precário (Braconnier & Marcelli, 2000). 
Uma  das  questões  que,  ao  longo  da  história  da  adolescência  se  tem 
sistematicamente  levantado,  é  a  da  turbulência  e  instabilidade  que  o  jovem  vive  nesta 
fase da sua vida. Apesar de estarem um pouco de lado as perspectivas storm and stress, 
continuam  a  estudar‐se  os  problemas  da  adolescência  porque  eles  são  reais  e  trazem 
consigo mal‐estar e novas dificuldades. No entanto, existem hoje noções diferentes face a 
estes  problemas  que  permitem  ver  a  adolescência  de  outro  modo.  Sabe‐se  hoje  que 
alguns  jovens  encontram  na  adolescência  dificuldades,  mas  que  tal  não  é  verdade  para 
todos.  Sabe‐se  também  que,  quando  existem  dificuldades,  estes  problemas  não  se 
generalizam  a  todas  as  áreas  de  funcionamento  do  jovem  ou  atingem  necessariamente 
graves  proporções.  Sabe‐se,  ainda,  que  muitos  dos  problemas  na  adolescência  surgem 

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como  formas  de  adaptação  do  adolescente  aos  novos  desafios  que  se  lhe  colocam 
(Sprinthall & Collins, 1999). 
E são múltiplos os desafios a vencer: a adaptação a uma nova condição biológica, 
a conquista de uma nova autonomia, o estabelecimento de novas relações interpessoais 
próximas  e  duradouras,  a  progressão  académica,  entre  outros.  E  como  se  isto  não 
bastasse,  o  adolescente  precisa  ainda,  tal  como  todo  o  ser  humano,  de  sentir‐se 
valorizado como pessoa, estabelecer um lugar num grupo produtivo, sentir‐se útil para os 
outros,  dispor  de  sistemas  de  suporte  e  saber  usá‐los,  fazer  escolhas  informadas  e 
acreditar  num  futuro  com  oportunidades  reais.  Ultrapassar  estes  desafios  e  preencher 
estas necessidades tornam‐se requisitos necessários para que os adolescentes se tornem 
adultos saudáveis e produtivos. 
 
Um pouco da história da adolescência 
  A  adolescência,  tal  como  hoje  se  concebe,  é  uma  fase  da  vida  relativamente 
recente. Ariés (1973) refere que a adolescência se encontrou absorvida pela infância até 
ao  século  XVIII,  não  se  verificando,  no  entanto,  mesmo  após  esta  época,  uma 
preocupação  em  considerar  a  adolescência  como  um  período  de  desenvolvimento 
diferenciado que impunha um olhar especial. 
  Pode‐se, no entanto, traçar um percurso um pouco mais distante no tempo para 
o  surgimento  deste  período.  Segundo  Lutte  (1988),  a  adolescência  surgiu  no  início  do 
século  II  a.C.,  na  sociedade  romana,  como  consequência  de  profundas  alterações  do 
sistema económico‐social. O senado aprovou duas leis, a lex plaetiria e a lex Villia annalis. 
A primeira correspondia ao nascimento de um novo grupo social, instituindo uma acção 
penal contra quem abusasse da inexperiência de um jovem com idade inferior a 25 anos. 
A  segunda  limitava  a  participação  dos  jovens  em  cargos  públicos.  A  juventude  ou 
adolescência  surge  assim  como  uma  fase  de  protecção  e  simultaneamente  de  limitação 
dos direitos e recursos. 
  Durante  a  Idade  Média  e  a época pré‐industrial,  a  juventude  situava‐se  entre  a 
dependência  da  infância  e  a independência  relativa  da  idade  adulta, que  por  sua  vez se 
caracterizava pelo casamento e herança dos bens. Este período, entre a infância e a idade 
adulta, situava‐se aproximadamente entre os 7‐10 anos até aos 25‐30 anos. Agra (1986) 
refere  a  existência  na  Idade  Média  de  palavras  como  pueritia  (puerícia),  adolescentia 
(adolescência)  e  juvenes  (jovens),  mas  salienta  que  não  apresentavam  qualquer 
correspondência  com  a  existência  de  etapas  de  vida  ou  estatuto,  tal  como  hoje  se 
concebem. 
  Até  ao  século  XVIII  e  durante  este  século,  are  prática  frequente  os  jovens,  na 
altura  da  puberdade,  deixarem  a  casa  de  seus  pais  para  irem  para  a  casa  de  outras 

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famílias,  por  vezes  em  locais  bastante  afastados  do  lar.  Aqui,  rapazes  e  raparigas  eram 
colocados na situação de aprendizes ou criados. O controlo dos pais torna‐se assim mais 
reduzido,  o  que  constitui  um  processo  facilitador  da  sua  autonomia  e  responsabilização 
(Claes, 1985). 
  No entanto, apenas no século XIX surge a adolescência, tal como é concebida nas 
sociedades  contemporâneas.  Nos  meados  do  século  XIX,  o  termo  utilizado 
frequentemente  era  jovem,  apenas  ocasionalmente  se  encontra  referência  ao  termo 
adolescência.  No  final  do  século  XIX,  o  termo  começa  a  aparecer  com  mais  frequência. 
Mas apesar de não ser frequente, já existiam muitas ideias precisas em relação a esta fase 
da  vida.  A  adolescência  era  vista  como  um  período  de  transição,  de  desenvolvimento 
individual,  que  envolvia  grandes  mudanças  a  nível  físico,  sexual,  comportamental  e 
profissional. 
  A  «repartição  da  vida»  em  mais  uma  etapa,  a  adolescência,  coincidiu  com  um 
período  histórico:  a  revolução  industrial.  Lutte  (1988)  refere  que  a  industrialização 
conduziu  a  mudanças  radicais  na  estrutura  cultural,  escolar,  familiar.  E  estas  mudanças 
reflectiram‐se na «construção» desta nova «etapa» da vida. Factores como o declínio da 
aprendizagem as profissões devido ao processo de industrialização, extensão progressiva 
e obrigatoriedade da escolaridade foram determinantes no estabelecimento do estatuto 
de  adolescente.  Mas,  sem  dúvida,  que  um  factor  bastante  forte  neste  processo 
construtivo  foi  a  evolução  da  concepção  de  família.  É  a  partir  de  meados  do  século  XIX 
que surge a mudança no seio da família: cada vez mais o adolescente permanece junto da 
sua  família,  deixando‐a  apenas  para  constituir  a  sua  própria  família.  A  família, 
anteriormente  patriarcal,  transforma‐se  em  família  nuclear,  constituída  por  pais  e  filhos 
que  permanecem  juntos,  coabitando  o  mesmo  espaço.  Assim,  a  adolescência  decorre 
entre  a  puberdade  e  o  acesso  ao  estatuto  de  adulto.  Este  longo  período  de  vida  dos 
indivíduos,  vivido  sob  tutela  parental,  coincide  com  o  nascimento  da  família  moderna. 
Esta nova concepção de família orienta as suas energias ara a vida privada, para a troca 
afectiva, para a promoção do bem‐estar dos filhos, para a transmissão de valores, dando 
assim  um  enfoque  privilegiado  às  tarefas  educativas.  É  em  torno  destes  objectivos  que 
vive a família moderna. 
 
As grandes mudanças na adolescência 
  A  adolescência  é  um  tempo  de  crescimento,  de  desenvolvimento  de  uma 
progressiva  maturidade  a  nível  biológico,  cognitivo,  social  e  emocional.  Nas  sociedades 
modernas não existe um acontecimento único que marque o fim da infância ou o início da 
adolescência. (Segundo Baumerind (1987), a adolescência engloba o período que vai dos 
10 aos 25 anos. Este período é geralmente repartido em três fases: fase inicial, entre os 10 

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e  os  15  anos;  fase  intermédia,  entre  os  15  e  os  18  anos;  e  a  fase  final,  que  envolve  o 
período desde o final do ensino secundário até à entrada em um ou mais papéis adultos). 
Esta  transição  envolve  um  conjunto  de  mudanças  graduais  em  múltiplas  esferas  da 
condição  humana,  que  ocorrem  durante  um  período  mais  ou  menos  alargado  e  que 
preenchem toda a adolescência. 
  Um  dos  temas  centrais  da  adolescência  continua  a  ser  a  forma  como  se 
ultrapassam estas mudanças, transições, desafios, crises, necessidades ou o que quer que 
se lhe chame. Encontram‐se sempre dois lados da questão: o pessimismo e o optimismo. 
Para  uns,  a  adolescência  é  um  período  de  mudanças  dramáticas  a  nível  familiar,  a  nível 
escolar,  ao  nível  das  amizades,  a  nível  profissional.  É  um  período  de  confusão,  de 
sentimentos paradoxais, excitação e ansiedade, felicidade e tristeza, certezas e incertezas. 
E, como se não bastasse, estas dúvidas não se limitam ao jovem, mas alastram aos outros 
que  com  ele  privam,  nomeadamente  pais,  professores  e  amigos  que  vivem  também  os 
seus  próprios  problemas  (Lerner  &  Galambos,  1998).  Para  outros,  a  maioria  dos  jovens 
está preparada para lidar com as mudanças biológicas, cognitivas, emocionais e sociais da 
adolescência  e  ultrapassá‐las  com  sucesso  (Steinberg,  1998).  De  acordo  com  esta 
perspectiva,  parte  dos  problemas  que  surgem  na  adolescência  não  têm  consequências 
graves  ou  a  longo  prazo.  Devem,  pois,  ser  equacionados  como  fazendo  parte  do 
desenvolvimento normal como formas exploratórias necessárias ao desenvolvimento, ou 
como  um  reflexo  de  um  desfasamento  entre  a  maturidade  biológica  e  a  maturidade 
emocional (Baumerind, 1987; Irwin, 1987; Moffiitt & Caspi, 2000). 
 
Mudanças Biológicas 
  As  mudanças  biológicas  que  ocorrem  no  início  da  adolescência  constituem  os 
sinais  mais  evidentes  de  que  uma  nova  época  chegou.  Entrou‐se  na  adolescência.  Esta 
entrada poderá ser mais ou menos «aceite» pelo próprio e pelos outros. 
  Steinberg /1998) refere que um factor talvez mais importante do que a entrada 
em si é o momento em termos cronológicos desta transição. Segundo o autor, o impacto 
imediato  da  puberdade  na  auto‐imagem  e  no  humor  do  adolescente  pode  ser 
relativamente discreto, mas o timing da maturação física afecta o desenvolvimento social 
e  emocional  do  jovem  de  formas  importantes.  Parece  que  esta  maturação  precoce  está 
associada a aspectos mais positivos para os rapazes do que para as raparigas. Os rapazes 
que maturam mais cedo tendem a ser mais populares, a ter autoconceitos mais positivos 
e  a  ser  mais  autoconfiantes,  comparativamente  com  os  que  maturam  mais  tarde.  Por 
outro  lado,  as  raparigas  que  maturam  mais  cedo  podem  sentir‐se  desconfortáveis  e 
desajeitadas com a sua nova imagem. 

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  Encontram‐se também referências que defendem que a maturação precoce pode 
constituir  um  factor  de  risco  para  o  desenvolvimento  de  problemas  de  externalização 
(padrões  comportamentais  observáveis,  potencialmente  desajustados  do  ponto  de  vista 
interpessoal, denominados também  problemas  de  comportamento,  como,  por  exemplo, 
agressividade ou comportamento delinquente), devido ao facto dos jovens que maturam 
mais  cedo  desenvolverem  amizades  com  adolescentes  mais  velhos.  No  entanto,  parece 
que este risco é sobretudo válido para jovens que têm história de dificuldades anteriores 
à  adolescência.  Segundo  Moffitt  e  os  seus  colaboradores  (2002),  os  problemas  que  se 
desenvolvem nesta fase são essencialmente devidos ao desfasamento entre a maturidade 
biológica  e  social.  E  este  desfasamento  ou  fosso  entre  a  puberdade  e  a  maturidade 
psicossocial  é  maior  nos  tempos  actuais.  A  puberdade  ocorre  mais  cedo,  os  jovens 
prolongam  mais  os  ses  estudos  e,  como  tal,  adiam  a  entrada  na  vida  activa, 
comparativamente  com  épocas  passadas.  Será  este  um  prenúncio  de  cada  vez  mais 
problemas durante esta longa adolescência? 
 
Mudanças Cognitivas 
  A  adolescência  é  também  um  período  de  grandes  mudanças  a  nível  cognitivo. 
Muda‐se  a  forma  de  pensar  sobre  as  coisas.  Com  a  entrada  no  período  das  operações 
formais,  o  pensamento  torna‐se  mais  complexo  e  mais  eficiente.  Primeiro,  os 
adolescentes estão mais aptos a pensar sobre hipóteses. O raciocínio hipotético‐dedutivo 
que  se  desenvolve  na  adolescência  permite  ultrapassar  as  barreiras  do  concreto,  sendo 
assim possível pensar acerca de ideias abstractas. Uma outra característica é a capacidade 
de pensar sobre o processo de pensar, que se denomina meta‐cognição. Este processo de 
pensamento permite uma maior consciência de si, na medida em que trata como objectos 
de  contemplação  os  seus  pensamentos  e  os  dos  outros.  Cada  vez  mais  o  pensamento 
tende a analisar múltiplos aspectos da vida e a vê‐los como fruto de posições pessoais ou 
de critérios de avaliação. 
  A teoria de Piaget trouxe uma contribuição fundamental para a compreensão do 
desenvolvimento cognitivo, facto que pode ser avaliado pelo lugar de destaque e atenção 
que  ainda  hoje  se  dá  às  suas  formulações.  Piaget  (1983)  apresenta  quatro  estádios  de 
desenvolvimento,  sendo  que  o  último  estádio,  estádio  das  operações  formais,  surge  na 
adolescência.  Este  estádio  inclui  operações  como  pensamento  proposicional,  análise 
combinatória,  raciocínio  probabilístico,  correlacional  e  abstracto,  que  se  tornam  as 
operações mentais mais abstractas, complexas, lógicas e flexíveis. 
  Nos  últimos  anos  surgiram  novas  abordagens  ao  desenvolvimento  cognitivo 
baseadas  no  processamento  da  informação.  Segundo  esta  abordagem,  o  sistema  de 
processamento  da  informação  nos  adolescentes  aumenta  a  sua  capacidade  de 

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processamento,  sendo  consequentemente  mais  sofisticado  e  complexo.  Os  defensores 
desta perspectiva argumentam que a passagem do período das operações concretas para 
as  operações  formais  depende  precisamente  desta  evolução  ao  nível  da  capacidade  do 
sistema  de  processamento  de  informação.  Por  detrás  destas  mudanças  estão  três 
aspectos:  aumento  do  conhecimento,  maior  organização,  planeamento  e  controlo  na 
capacidade  de  pensar  e  processamento  mais  rápido  e  automático.  Estas  capacidades 
permitem a realização de várias tarefas cognitivas ao mesmo tempo. 
 
Mudanças Emocionais 
  A  par  das  alterações  biológicas  e  cognitivas,  ocorrem  as  alterações  emocionais. 
Estas  alterações  envolvem  mudanças  na  forma  como  os  indivíduos  se  vêem  a  eles 
próprios  e  na  sua  capacidade  de  funcionar  independentemente.  Com  a  entrada  na 
adolescência  aumenta  a  consciência  de  si  próprio,  pelo  que  os  adolescentes  estão  cada 
vez  mais  capazes  de  se  caracterizar  de  modo  complexo  e  abstracto.  A  procura  e 
estabelecimento  de  uma  definição  de  si,  isto  é,  de  uma  identidade  pessoal  constituem 
uma  das  tarefas‐chave  da  adolescência.  No  entanto,  outros  desafios  importantes  se 
colocam.  Segundo  Steinberg  (1998),  estabelecer  um  sentido  de  autonomia  e 
independência  é  uma  parte  tão  importante  da  transição  emocional  como  o 
estabelecimento da identidade.  
 
A Procura de uma Identidade 
  O  conceito  de  identidade  foi  «popularizado»  por  Erikson.  Na  perspectiva  deste 
autor,  o  desenvolvimento  processa‐se  por  etapas  ou  estádios  psicossociais  nos  quais  os 
indivíduos são confrontados com desafios ou crises que necessitam de ser resolvidas de 
forma adequada para enfrentar os desafios seguintes. 
  Segundo  Erikson  (1968,  1982),  a  adolescência  é  a  fase  da  vida  em  que  os 
indivíduos  devem  estabelecer  um  sentido  de  identidade  pessoal.  Este  desafio  da 
construção  da  identidade,  mais  conhecido  por  crise  de  identidade,  é  fruto  do 
desenvolvimento biológico, de  expectativas  culturais  e de  pressões  sociais.  A  identidade 
não  surge  espontaneamente  com  a  maturação,  tem  de  ser  procurada  e  estabelecida 
através de um esforço pessoal. Para Erikson, a identidade só pode ser encontrada através 
da interacção com os outros significativos. E nesta fase da vida assumem uma importância 
especial, os amigos e os grupos de pares. As relações que se estabelecem a este nível são 
fundamentais  no  encontro  da  sua  identidade  pessoal,  na  medida  em  que  dão 
oportunidades  de  experimentar  papéis  e  oferecem,  em  simultâneo,  uma  apreciação  do 
desempenho.  O  adolescente  passa,  assim,  por  um  período  de  maior  necessidade  de 
reconhecimento pelo grupo de pares e por um envolvimento quase compulsivo com este 

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grupo. Esta ligação forte com os pares cria uma nova dependência que vem substituir a 
dependência dos pais. Tal como a anterior, esta nova dependência precisa ser quebrada 
para que o jovem se encontre a si próprio e atinja uma identidade madura. A aquisição de 
uma identidade pessoal permite ao jovem adulto ter autonomia, iniciativa e confiança nas 
suas  decisões.  Por  outro  lado,  a  não  resolução  deste  desafio,  ou  uma  resolução 
inadequada,  leva  à  construção  de  uma  identidade  difusa,  incoerente,  ou  a  uma  má 
«consciência do eu». Segundo Erikson, muitos dos problemas de comportamento que os 
jovens  apresentam  poderão  ser  nada  mais  do  que  reflexos  de  uma  identidade  mal 
resolvida. 
  Marcia  (1980)  expandiu  a  teoria  original  de  Erikson,  concretamente  através  de 
um  enfoque  especial  e  do  alargamento  de  alguns  aspectos  relacionados  com  o  estádio 
«identidade versus confusão da identidade». De acordo com Márcia, o critério para atingir 
uma identidade madura é baseado em duas variáveis essenciais, que Erikson identificou 
como  crise/exploração  e  comprometimento.  A  crise/exploração  refere‐se  ao  tempo  em 
que o adolescente analisa e coloca em causa os objectivos e valores definidos pelos pais, e 
começa  a  procurar  alternativas  ajustadas  a  si  próprio  em  termos  de  valores,  crenças  e 
opções  futuras.  O  comprometimento  diz  respeito  ao  envolvimento  pessoal  e  afirmação 
dos objectivos, valores, crenças e opções que elegeu. Combinando estes critérios, surgem 
quatro modos distintos de conceptualizar as questões da identidade na adolescência.  
1)  identidade  difusa  ou  confusa,  o  adolescente  ainda  não  explorou  hipóteses  nem  se 
comprometeu  com  alternativas  possíveis.  As  questões  da  identidade  ainda  não 
surgiram como significativas ou não foram ainda resolvidas.  
2)  comprometimento  precoce,  o  adolescente  ainda  não  explorou  hipóteses,  mas  já  se 
comprometeu com valores e objectivos que surgem de uma identificação com os pais 
ou outros significativos. Como tal, a identidade não resulta de um investimento pessoal 
de procura de alternativas.  
3)  moratória,  que  é  uma  fase  de  exploração  activa  em  que  o  adolescente  experimenta 
diferentes  papéis  no  sentido  de  encontrar  a  sua  verdadeira  identidade.  No  entanto, 
ainda não se comprometeu definitivamente com nenhuma das alternativas possíveis.  
4)  aquisição  da  identidade,  o  adolescente  passou  por  um  processo  de  exploração  de 
hipóteses  bem  sucedido.  Como  resultado,  construiu  uma  identidade  madura  com 
comprometimento  pessoal  em  termos  de  ocupação,  crenças  e  valores.  Márcia  refere 
que  cada  um  destes  estatutos  não  é  estático,  mas  sim  um  processo  em  decurso.  O 
indivíduo  estabelece  um  sentido  de  identidade  progredindo  através  destes  quatro 
estatutos.  No  entanto,  segundo  o  autor,  apenas  a  moratória  é  essencial  para  a 
aquisição  da  identidade,  na  medida  em  que  é  a  etapa  em  que  ocorre  exploração, 
fundamental para o estabelecimento de um verdadeiro sentido de identidade pessoal. 

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A Conquista de uma Maior Autonomia 
  A  autonomia  é  uma  tarefa  central  na  adolescência.  A  autonomia  refere‐se  à 
medida  em que  o  processo de  socialização  facilita  o desenvolvimento  de um  sentido  de 
identidade pessoal, eficácia e valor (Barber, 1997). Envolve uma mudança nas relações e 
na  representação  que  o  adolescente  tem  de  si  e  dos  outros.  Entre  estes  outros, 
encontram‐se  os  pais,  elementos‐chave  na  tarefa  da  conquista  da  autonomia  (Fleming, 
1993).  Neste  período  de  vida,  o  adolescente  é  confrontado  com  duas  necessidades 
paradoxais em relação aos pais: a separação e a dependência. A separação é inicialmente 
psicológica,  traduz‐se  num  sentimento  de  desilusão  em  relação  aos  pais:  os  pais  não 
escutam,  não  permitem  o  diálogo,  não  entendem.  Os  pais  deixam,  pois,  de  ser  vistos 
como os mais sábios e poderosos. Muitas vezes, perante esta desilusão, o jovem procura 
modelos no seu grupo de pares ou em outros adultos. Assim, os pais deixam de ser a sua 
única fonte primária de apoio e suporte. As preocupações, os aborrecimentos e as mais 
variadas  necessidades  podem  agora  ser  partilhadas  ou  preenchidas  por  outros 
significativos,  que  não  os  pais.  No  entanto,  a  necessidade  de  dependência  continua  a 
existir.  Esta  necessidade  é,  segundo  Braconnier  e  Marcelli  (2000),  escondida  pelos 
adolescentes.  A  resistência  a  esta  necessidade  de  dependência  pode,  segundo  estes 
autores, estar na origem de muitos dos conflitos da adolescência. Contudo, é importante 
salientar que este desejo de separação, travado pela dependência, não implica uma perda 
da ligação afectiva que os adolescentes têm com os seus pais. Fleming (1993) salienta que 
uma ligação segura aos pais é condição fundamental para a autonomia. 
  Mas  o  que  é  ser  autónomo  para  um  adolescente?  E  como  se  conquista  a 
autonomia? Fleming realizou um estudo com jovens entre os 12 e os 19 anos que permite 
dar resposta a estas questões. Ser autónomo, para o adolescente, é poder decidir e agir 
de  acordo  com  as  suas  ideias  e  opiniões  numa  série  de  aspectos  relevantes  na  sua  vida 
como,  por  exemplo,  saídas  com  amigos,  fins‐de‐semana,  férias,  aparência  pessoal, 
organização  do  seu  espaço  pessoal  (quarto),  gestão  do  dinheiro,  relações  afectivas  e 
resolução  de  assuntos  pessoais.  A  conquista  desta  autonomia  está  relacionada  com  as 
percepções  que  os  adolescentes  têm  das  atitudes  e  do  amor  que  os  pais  têm  para 
consigo.  Quanto  maior  a  percepção  de  que  os  pais  encorajam  a  autonomia,  maior  será 
esta capacidade. Também em relação ao amor se verifica que os adolescentes que sentem 
que  os  pais  têm  amor  para  com  eles  são  aqueles  que  manifestam  maior  capacidade  de 
autonomia.  De  acordo  com  as  conclusões  do  trabalho,  um  ambiente  familiar  de 
encorajamento  contínuo  da  autonomia,  de  baixo  ou  moderado  controlo  parental 
sobretudo na fase intermédia e final da adolescência, são condições fundamentais para a 
autonomia comportamental dos adolescentes. 

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Mudanças Sociais 
   As  mudanças  a  nível  cognitivo  e  emocional  influenciam  a  forma  como  os 
adolescentes  vêem  o  mundo  social.  Os  adolescentes  têm  agora  mais  capacidades  para 
pensar  sobre  possibilidades,  para  auto‐análise  das  suas  cognições  e  para  perceber  e 
analisar  diferentes  perspectivas.  Assim,  conseguem  avaliar  e  antecipar  as  possibilidades 
de  resposta  e  de  comportamentos,  são  capazes  de  deduzir  características  pessoais, 
motivações  e  sentimentos  a  partir  de  comportamentos,  e  reconhecer  que  existem 
diferentes perspectivas sobre uma mesma situação (Sprinthall e Collins, 1999). 
  Apesar deste importante desenvolvimento em termos de capacidades cognitivas, 
Elkind  (1980)  refere  que  no  início  da  adolescência  os  jovens  são  frequentemente 
egocêntricos.  Este  egocentrismo  apresenta  duas  componentes:  o  público  imaginário 
(apesar do reconhecimento de diferentes perspectivas, os adolescentes têm a crença de 
que são o centro das atenções e de que a sua perspectiva prevalece sobre as outras); e a 
narrativa pessoal (a crença de que os seus sentimentos são únicos e que ninguém os pode 
entender). Segundo o autor, a maturação a nível cognitivo e as interacções com os pares 
permitirão  ultrapassar  este  egocentrismo.  E  o  grupo  de  pares  assume  realmente  uma 
posição de destaque na socialização dos adolescentes. 
  Um  dos  aspectos  mais  importantes  ao  nível  do  desenvolvimento  social  é  a 
mudança  quantitativa  e  qualitativa  ao  nível  dos  contextos  sociais  significativos  para  o 
adolescente. Com a aquisição de uma maior autonomia, o jovem passa menos tempo em 
casa com  os pais  e  dirige  este  tempo  para estar  com  os pares.  Os  pares  têm, durante  a 
adolescência  um  papel  especialmente  importante  no  desenvolvimento  do  jovem, 
nomeadamente  como  um  espaço  onde  é  permitido  experimentar  novos  papéis  sociais, 
um espaço de diálogo acerca dos seus problemas pessoais, escolares e profissionais, um 
espaço  de  formação  e  partilha  de  opiniões  acerca  dos  próprios  indivíduos,  dos  outros 
relevantes e do mundo social. 
Adaptado de M. C. Simões, Comportamentos de Risco na Adolescência, 2007 
 
 
 

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Tex to   3 :    
O Comportamento de Vinculação 
 
A energia que o homem e a mulher dedicam à produção de 
bens  materiais  aparece  quantificada  em  todos  os  nossos  índices 
económicos.  A  energia  que  um  homem  e  uma  mulher  dedicam  à 
produção, na sua própria casa, de filhos felizes, saudáveis e seguros 
de  si  mesmos,  não  contam  para  nada.  Criámos  um  mundo  ao 
contrário.  
J. Bowlby, 1988 
 

Capítulo  1.  Um  modelo  em  dupla  hélice  do  desenvolvimento  psicológico:  vincula‐
ção/separação ao longo do ciclo de vida 
 
1. Introdução 
  Em 2003 celebraram‐se os 50 anos da publicação, na revista Nature, daquela que 
pode ser considerada a mais marcante descoberta da biologia molecular do século XX: o 
modelo em dupla hélice da molécula de ADN, elaborado por James Watson e Francis Crick 
(1953). Para além do seu valor simbólico e heurístico, o modelo da dupla hélice permeou 
a cultura popular e tornou‐se parte do imaginário do nosso tempo. 
  Não  admira  assim  que  a  dupla  hélice  me  tenha  surgido  como  um  modelo 
inspirador  do  desenvolvimento  psicológico  do  ser  humano.  A  minha  dupla  hélice 
apresenta  o  desenvolvimento  humano  como  resultado  da  interacção  dinâmica  entre 
hélices  psicológicas,  a  do  processo  de  vinculação  e  a  do  processo  de  separação‐
individuação.  Esta  perspectiva  contraria  a  perspectiva  mais  clássica  da  Psicologia  do 
Desenvolvimento,  que  tenta  integrar  as  numerosas,  e  por  vezes  contraditórias,  teorias 
contemporâneas  sobre  componentes  cognitivas,  morais  ou  sociais  do  desenvolvimento 
humano. 
  Sugiro,  portanto,  uma  nova  orientação:  investigar  o  desenvolvimento  da 
personalidade como dinâmica interactiva entre individuação e vinculação, processos que, 
embora estando, como defendo, interligados, têm sido investigados em separado. 
 
2. Revisitando a dupla hélice do ADN 
  A  molécula  de  ADN  pode  ser  descrita,  metaforicamente,  como  uma  escada  em 
espiral em que os seus dois longos corrimãos são sustentados por numerosos degraus. Os 
corrimãos  correspondem  às duas  longas cadeias  em  espiral  de  elementos  repetitivos  de 
açúcares‐fosfatos:  os  degraus  que  unem  transversalmente  os  corrimãos,  são  os  compo‐
nentes «nobres» da molécula: cada degrau é um par de bases complementares e, no seu 

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conjunto,  armazenam  toda  a  informação  genética  da  célula  ou  do  indivíduo.  Devido  ao 
facto  de  todos  os  degraus  da  escada  terem  o  mesmo  comprimento,  os  corrimãos  man‐
têm‐se  a  uma  distância  constante  ao  longo  de  toda  a  cadeia  da  molécula  de  ADN.  Esta 
distância constante entre as duas hélices constitui uma clara diferença entre a molécula 
de ADN e o modelo da dupla hélice para o desenvolvimento psicológico humano que pro‐
ponho, já que no meu modelo as hélices da vinculação e da separação‐individuação vão 
variando de distância entre si ao longo da vida. 
 

 
 
 
3. A dupla hélice psicológica: a hélice da vinculação e a hélice da separação 
  Tal  como  a  molécula  de  ADN,  a  dupla  hélice  psicológica  consiste  numa  espiral 
feita  de  duas  longas  e  sinuosas  cadeias,  tal  como  está  ilustrado  na  figura  da  página 
seguinte. A extensão desta dupla hélice corresponde à extensão total do ciclo de vida do 
ser  humano.  Uma  das  hélices  representa  o  grau  de  vinculação  do  sujeito  a  outro  ser 
humano;  a  outra  hélice  refere‐se  ao  grau  de  separação‐individuação  do  mesmo  sujeito. 
Estas duas vertentes do desenvolvimento psicológico vão sofrendo alterações durante as 
diferentes idades do ser humano, ora se aproximando ora se afastando do eixo central da 
dupla hélice. 
 
4. Principais características da dupla hélice psicológica 
  O modelo rege‐se pelos seguintes postulados: 
(i)  O  desenvolvimento  psicológico  humano  progride  de  acordo  com  um  padrão 
ascensional em espiral de dupla hélice, organizando‐se de forma assimétrica em torno 
de  um  eixo  central  já  que,  habitualmente,  uma  hélice  predomina  sobre  a  outra  (em 
contraste com os modelos bidireccionais compostos por duas linhas que caminham em 

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sentido  contrário,  como  é  o  caso,  por  exemplo,  do  modelo  de  desenvolvimento 
proposto por Erikson). 
 (ii) As hélices mantêm‐se activas ao longo do ciclo de vida e mudam a sua distância em 
relação  ao  eixo  central,  em  função  de  estímulos  internos  e  externos  que  afectam  o 
psiquismo  humano,  no  quadro  do  processo  interactivo  entre  o  ser  e  o  meio  que  o 
rodeia. 
 (iii)  As  duas  hélices  entram  em  interacção  través  de  mecanismos  de  retroacção  que 
modulam a distância entre si e, naturalmente também, a distância que as separa do 
eixo central da estrutura. Uma maior distância representa que nesta fase do ciclo de 
vida uma das duas linhas de desenvolvimento predomina sobre a outra, significando 
que  as  tarefas  de  desenvolvimento  que  lhe  correspondem  estão  mais  activas  (por 
exemplo, na primeira infância as tarefas de desenvolvimento que visam a vinculação 
predominam sobre as que visam a separação‐individuação). 
 
O  objectivo  principal  do  modelo  é  o  de  afirmar  que  ocorre  uma  interacção 
dialéctica,  ao  longo  de  toda  a  vida,  entre  a  vinculação  e  a  separação‐individuação. 
Contrariamente  à  visão  tradicional  que  apresenta  estes  dois  desenvolvimentos  como 
antagonistas,  aqui  o  que  se  propõe  é  ma  visão  que  consiste  em  afirmá‐los  como  duas 
entidades que co‐evoluem interactivamente: o estabelecimento de vínculos entre pais e 
filhos potencia a separação‐individuação, esta, por sua vez, estimula o sistema vinculativo 
e  o  indivíduo  pode  permitir‐se  o  afastamento  e  a  separação  porque  se  sente  ligado  aos 
pais por vínculos seguros. 

Vinculação (V) Separação-Individuação (SI)


 
 
 
5. Premissas da «dupla hélice psicológica» 

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  O modelo assenta nas seguintes premissas: 
1)  O  desenvolvimento  psicológico  humano  ocorre/decorre  na  tensão  dialéctica  entre  o 
processo de vinculação e o processo de separação‐individuação, concebido como duas 
hélices  que  evoluem  em  torno  de  um  eixo,  que  representa  a  evolução  psicológica, 
aproximando‐se  mais  ou  menos  deste  eixo  consoante  predominam  os  processos  de 
vinculação ou de separação, no quadro das sucessivas matrizes familiares. 
2)  Estes  dois  processos  ocorrem  em  simultâneo,  estão  presentes  desde  o  período  pré‐
natal, mantêm‐se activos e permanecem como motores de desenvolvimento ao longo 
e todo o ciclo vital. 
3) A vinculação responde à necessidade primária de criar ligações afectivas, de apegar‐se a 
outros seres humanos, como meio de assegurar segurança e protecção. 
4) A individuação responde à necessidade primária de criar a sua própria individualidade, 
a  sua  própria  identidade,  à  necessidade  de  não  se  fundir/confundir  com  o  Outro  a 
quem se está vinculado 
5) Estes dois processos, articulados entre si, vão conhecendo configurações diferentes, em 
função das tarefas de desenvolvimento específicas de cada etapa de desenvolvimento 
ao  longo  do  ciclo  de  vida  do  ser  humano  (se,  por  exemplo,  no  período  perinatal  é  a 
vinculação  que  predomina,  na  adolescência  é,  ao  contrário,  a  individuação  que 
desempenha o papel mais forte. 
 
6. O início da dupla hélice: da infância precoce à infância propriamente dita 
  Do mesmo modo que nos primatas, a vinculação entre os progenitores e as suas 
crias  tem  uma  função fundamental  de  sobrevivência,  assegurando a  protecção  das  crias 
face aos seus predadores, a vinculação nos seres humanos cria a base para os sentimentos 
de protecção e de segurança da criança. A vinculação tem ainda a função fundamental de 
assegurar  as  ligações  trangeracionais,  ligando  afectivamente  as  famílias  de  ascendência 
com as famílias de descendência ao longo de todo o ciclo vital. 
  De igual forma, se na família humana os pais asseguram a função de vinculação, 
eles  também  são  responsáveis  pelo  incentivo  da  função  de  separação‐individuação.  No 
contexto  emocional  das  interacções  precoces  com  o  bebé  e  através  da  parentalidade 
intuitiva e a intencionalidade educativa, os pais estimulam a emergência de processos de 
simbolização  (acesso  ao  diálogo,  ao  símbolo  e  à  linguagem)  permitindo  que  a  criança 
inicie  os  comportamentos  exploratórios  e  a  sua  progressiva  integração  no  meio  físico  e 
sociocultural que a rodeia. 
 
7. A vinculação predomina no recém‐nascido 

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  A vinculação inicia‐se ainda durante o período de gestação, quando a mãe cria o 
primeiro vínculo ao seu bebé imaginário ainda antes do vínculo ao bebé real, após o nas‐
cimento deste. Bowlby (1951) sugere a existência, no bebé, de sistemas comportamentais 
inatos  prestes  a  serem  accionados  imediatamente  após  o  nascimento.  Estes  sistemas 
(compostos pelos comportamentos de mama, agarrar, seguir, chorar, sorrir) visam estabe‐
lecer o apego a figuras específicas que se mostrem mais próximas e permanentes e que 
asseguram a sobrevivência do bebé, o que habitualmente é desempenhado pela mãe bio‐
lógica. 
  É  a  existência  de  um  sistema  de  comportamentos  inatos,  prestes  a  serem 
accionados  logo  após  o  nascimento,  que  permite  ao  bebé  vincular‐se  a  figuras  de 
protecção.  Mas  é  também  a  existência  de  capacidades  perceptivas  muito  precoces  de 
reconhecimento  e  de  diferenciação  do  Outro  que  permite  ao  bebé  iniciar  um  processo 
que visa a sua individuação. 
  As  observações  de  Brazelton  e  colaboradores  (1979;  1991,  1994)  revelaram  o 
papel que, desde o seu nascimento, o bebé assume no estabelecimento de relações com 
o  objecto  materno,  mostrando  competências  muito  precoces  de  discriminação  e  de 
diferenciação em relação ao que o rodeia. Imediatamente após o nascimento, o bebé em 
estado de «alerta» é capaz de atenção focal e de diferenciar entre imagens, vozes e sons. 
  Destaco  os  estudos  de  Brazelton  que  evidenciam  a  capacidade  do  bebé  para 
estimular comportamentos maternos de resposta: se, por acaso, ela não responde, o bebé 
prossegue  no  seu  esforço  para  captar  a  sua  atenção,  só  vindo  a  desinteressar‐se  após 
tentativas  muito  activas  e  continuadas.  De  acordo  com  este  autor  «o  bebé  nasce  com 
meios excelentes para dar a conhecer as suas necessidades e também para agradecer aos 
que o cercam. De facto, pode até escolher o que espera dos seus pais (1981: 387). 
  A capacidade precoce de criar vínculos e a capacidade de diferenciar, são funções 
básicas  na  evolução  e  estruturação  normal  do  psiquismo  humano,  fundamentais  para  o 
seu desenvolvimento emocional e cognitivo. É da qualidade e quantidade das experiências 
relacionais com as figuras cuidadoras, propiciadoras de sentimentos de satisfação versus 
frustração, que se vão constituindo os ingredientes básicos para que o desenvolvimento 
se processe de forma mais ou menos harmoniosa. 
  Se o sistema vinculativo se mostra apto a responder às necessidades do bebé, e 
se  a  vinculação  entre  a  mãe  e  o  bebé  é  propiciadora  de  prazer  para  ambos,  o  bebé 
adquire confiança no seu cuidador, e cria objectos internos confiáveis, suportes mentais 
para a sustentação do sentimento interno de segurança e de autoconfiança. Isto mesmo 
também  foi  posto  em  evidência  por  Mahler  (1968,1975):  se  os  pais  respondem  com 
sensibilidade  às  necessidades  do  bebé  e  providenciam  um  meio  seguro  à  criança,  ela 
progride  na  sua  capacidade  de  explorar  o  seu  meio  ambiente  de  modo  cada  vez  mais 

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complexo  e  a  maior  distância,  sabendo  que  ela  pode  sempre  regressar  para  perto  dos 
pais. 
  Um padrão organizado de vinculação propicia à criança um continuado sentimen‐
to  interno de segurança.  Ele  vai‐se  estabelecendo  ao  longo do primeiro  ano  de  vida e  é 
este sentimento que permite ao bebé tolerar a ausência temporária da mãe, porque ele 
acredita que ela vai voltar (Ainsworth, 1978). Se, pelo contrário, a qualidade das interac‐
ções precoces não é de boa qualidade, no sentido que Bowlby lhe dá (1988), a ansiedade 
que  se  gera  pode  atingir  níveis  dificilmente  tolerados  pelo  bebé  e,  neste  caso,  podem 
ocorrer fenómenos que perturbam o seu desenvolvimento psíquico. 
  As  funções  maternas  de  contenção  –  capacidade  de  conter/integrar 
mentalmente  as  experiências  emocionais  do  filho  –  e  de  rêverie  –  capacidade  de 
transformar  as  experiências  emocionais  em  representações  e  atribuir‐lhes  significado  – 
foram  descritas  por  Bion  (1962).  Vários  outros  estudos  concluíram  que  a  capacidade 
materna  de  contenção  dos  estados  mentais  do  bebé  aumenta  a  confiança  deste  na 
capacidade  materna  de  o  cuidar  com  afecto,  de  tal  forma  que  o  bebé  sente  que  pode 
recorrer  a  ela  nos  estados  de  sofrimento  e  de  grande  excitação.  A  expectativa  de  ser 
consolado e confortado fortalece o vínculo emocional da criança com a pessoa que cuida 
dela. 
 
8. A interacção dinâmica entre vinculação e separação inicia‐se na primeira infância 
  É o sentimento de segurança e de confiança no Outro que estimula a criança a 
ter  comportamentos  de  exploração  do  meio  que  a  cerca,  a  afastar‐se  das  figuras  de 
vinculação  e  a  iniciar  o  processo  de  separação‐individuação.  É  também  este  sentimento 
que  alicerça  a  auto‐estima  e  a  autoconfiança  da  criança,  criando  condições  para  a 
separação física dos pais, constituídos agora como «pais internos» que não desaparecem, 
mesmo quando estão fisicamente ausentes. 
  Deste modo, os processos de vinculação e de separação‐individuação potenciam‐
se mutuamente e a espiral do desenvolvimento progride. De acordo com este modelo, o 
estabelecimento  de  ligações  afectivas  constitui  a  primeira  e  fundamental  base  para  a 
separação‐individuação  e  esta,  por  sua  vez,  estimula  o  sistema  vinculativo.  Neste 
contexto, a criança pode permitir‐se o afastamento dos cuidadores porque se sente ligada 
a elas por vínculos seguros. 
  Diferentes  trabalhos  de  investigação  realizados  as  últimas  décadas  mostram  a 
relação entre a qualidade dos vínculos estabelecidos e o desenvolvimento de capacidades 
cognitivas infantis. Se o vínculo for seguro, a criança está em melhores condições de men‐
talizar.  Target  &  Fonaggy  (1996)  afirmam  que  «as  crianças  cuja  necessidade  de  apego  é 
completamente atendida parecem sentir‐se livres para explorar a mente das pessoas que 

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cuidam delas e estão numa situação duplamente vantajosa para o seu desenvolvimento. À 
sensitividade  materna,  mediador‐chave  da  interacção  precoce  mãe‐bebé  estes  autores 
juntam um outro mediador, a função reflexiva: a capacidade dos pais espelharem as suas 
próprias mentes e as mentes dos seus filhos. Uma função altamente reflexiva protege os 
filhos contra uma vinculação insegura. Isto significa que o desenvolvimento emocional e o 
desenvolvimento cognitivo progridem em simultâneo. 
 
9. A separação‐individuação acentua‐se a partir do primeiro ano de vida 
  A aquisição da  consciência  de  si como  um ser  separado traz grandes benefícios 
para a autonomia da criança, que assim pode expandir as suas ligações a outras figuras do 
seu  meio  familiar  e  extra‐familiar.  Durante  a  fase  de  ensaios  –  dos  9  aos  16  meses 
aproximadamente – a criança, devido à sua maior mobilidade, deseja conquistar o mundo 
físico à sua volta. A consciência de se saber um ser separado é simultaneamente dolorosa 
e  necessária  à  criança  como  condição  indispensável  para  a  saída  da  concha  fusional 
familiar. O reconhecimento da sua imagem na fase do espelho (Lacan) e a capacidade do 
«não»  (Spitz)  são  alguns  dos  indicadores  e  organizadores  psicológicos  da  progressiva 
diferenciação do Eu. Eles constituem a base  a  partir  da qual  a criança evolui  para  níveis 
mais complexos de construção da individualidade e de uma rede cada vez mais alargada 
de ligações afectivas, dentro e fora do espaço de convivialidade familiar.  
Na fase seguinte do processo de separação‐individuação, designada por fase de 
reaproximação,  entre  os  16  e  os  24  meses  de  idade,  o  movimento  em  direcção  à 
individuação conhece um notável incremento, inicialmente num registo de ambivalência, 
uma vez que a criança alterna entre o desejo de desvinculação e o desejo de aproximação 
às  figuras  de  vinculação.  Mais  tarde,  a  ambivalência  diminui  e  o  desejo  de  individuação 
estimula  a  criança  a  tornar‐se  cada  vez  mais  autónoma.  Pelo  terceiro  ano  de  vida,  a 
criança progride para novos estádios como resultado de uma vinculação segura aos seus 
objectos de amor, os cuidadores primários, em combinação com a «autonomia, a individuação, 
a constância e coesão do Eu». 
As  mudanças  psíquicas  estruturais  preparam  a  criança  para  a  resolução  de 
questões  relacionadas  com  o  complexo  de  Édipo  e  para  o  desenvolvimento  cognitivo, 
nomeadamente para o desenvolvimento de competências interpessoais (Selman, 1981): a 
capacidade  de  perceber  que  o  Outro  tem  sentimentos  e  pensamentos  separados  e 
diferentes  dos  que  lhe  são  próprios.  A  capacidade  da  criança  reconhecer  o  Outro  como 
alguém  que  é  psicologicamente  diferente  de  si  permite  um  avanço  significativo  na 
individuação  e,  em  consequência,  a  hélice  separação‐individuação  torna‐se 
predominante. 

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Simultaneamente, estas novas competências estimulam o progresso na hélice de 
vinculação:  a  criança  relaciona‐se  cada  vez  mais  com  o  meio  social  e  adquire  novas 
capacidades para a cooperação, o desempenho de papéis e para um novo tipo de relações 
emocionais. 
 
10. Entre a infância e a adolescência: o período de latência 
Apesar  do  alargamento  dos  laços  e  das  relações  sociais  (aos  amigos  e  pares  de 
idade,  no  infantário,  na  escola  e  noutros  contextos  sociais)  e  apesar  do  desejo  de 
conquistar  cada  vez  mais  autonomia  face  ao  controlo  dos  pais,  o  desejo  de  viver  no 
espaço  familiar,  a  necessidade  de  protecção  e  a  adesão  aos  valores  e  estilos  de  vida  da 
família  não  são  postos  em  causa  pela  criança  no  período  de  latência  dos  6  aos  10  anos 
aproximadamente). A tensão entre as hélices de vinculação e de separação‐individuação 
atenua‐se e a distância de cada uma ao eixo central é equivalente.  
A  família  é  então  o  contexto  de  vida  mais  importante  e  a  dependência  é 
valorizada  positivamente.  A  espiral  do  desenvolvimento  progride  para  novas  tarefas  à 
medida  que  a  tensão  gerada  entre  as  duas  hélices  é  superada  e  se  avança  em 
competências sociais e relacionais. Às grandes mudanças da primeira e segunda infância 
segue‐se  um  período  de  acalmia  no  plano  pulsional/afectivo  e  no  plano  das  relações 
familiares. 
Um  acontecimento  biológico,  a  puberdade,  irá  perturbar  esta  fase  do 
desenvolvimento  psicológico.  Durante  a  puberdade,  o  calendário  genético  impõe  a 
maturação  genital  e  esta  irá  introduzir  novos  e  significativos  dados  no  equilíbrio 
psicológico  da  criança  e  no  equilíbrio  familiar.  A  emergência  de  novas  competências  de 
empatia,  mutualidade  e  de  preocupação  com  o  Outro  preparam  a  criança  para  o 
desenvolvimento  de  dimensões  mais  complexas  da  hélice  da  separação‐individuação  o 
que, por sua vez, potencia novas experiências no plano da vinculação. 
 
11. A separação‐individuação predomina na adolescência 
  A partir da puberdade, a hélice da separação‐individuação vai ser predominante 
e  puxar  inevitavelmente  para  a  consolidação  de  níveis  mais  complexos  e  radicais  de 
autonomia.  Os  vínculos  aos  pais  perdem  a  sua  força  tão  atractiva,  e  a  protecção  e  o 
controlo  parental,  aceites  pacificamente  até  aí,  são  questionados  e  tornam‐se  fonte  de 
conflitualidade  entre  pais  e  filhos,  particularmente  durante  o  segundo  processo  de 
individuação do adolescente. 
  O  valor  da  dependência  e  da  vinculação  aos  pais  é  questionado  e  o  valor  da 
autonomia  de  comportamentos  e  de  atitudes  começa  a  impor‐se.  O  adolescente 
manifesta  novos  desejos  e  inicia  comportamentos  até  aí  não  realizados.  A  entrada  na 

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adolescência,  como  acontecerá  com  a  saída  e  entrada  na  idade  adulta,  são  períodos  de 
transição que desafiam o sistema familiar para a mudança. 
  A  evolução  das  capacidades  cognitivas  para  um  novo  estádio,  o  das  operações 
formais, caracterizado pelo pensamento formal, introduz a capacidade de pensar em abs‐
tracto,  de  modo  complexo  e  flexível  e  de  um  raciocínio  social‐cognitivo.  O  adolescente 
passa a ser capaz de «pensar em perspectiva» e de reconhecer o carácter de mutualidade 
das relações com os pais. 
  O  adolescente  sente‐se  atravessado  por  forças  que  o  puxam  em  sentido 
contrário: por um lado o desejo de ficar no espaço de protecção da família e manter a sua 
vinculação  aos  pais  e  por  outro  o  desejo  de  partir,  de  aumentar  os  comportamentos 
exploratórios fora da esfera e do controlo parental. 
Os  resultados  da  minha  própria  investigação  nesta  área  mostraram 
repetidamente  que  o  desejo  de  autonomia  se  manifesta  desde  o  período  peripuberal  e 
que  os  comportamentos  autónomos  aumentam  de  forma  contínua  ao  longo  da  idade, 
sendo uma das fontes de conflitualidade entre pais e filhos (Fleming, 2005). A capacidade 
de  desobedecer  e  de  se  comportar  de  acordo  com  as  escolhas  e  valores  pessoais,  num 
processo  que  implica  a  desidealização  das  figuras  parentais,  vai‐se  impondo 
progressivamente à medida que o período adolescente avança. 
Apesar  da  notável  variabilidade  do  comportamento  adolescente,  posta  em 
evidência  nomeadamente  nos  estudos  pioneiros  de  Margaret  Mead,  teóricos  e 
investigadores estão de acordo em afirmar que a principal tarefa de desenvolvimento na 
adolescência  é  a  autonomia,  intrinsecamente  ligada  ao  processo  de  separação‐
individuação. A separação intrapsíquica e relacional (entre pais e adolescentes) organiza 
todas as outras mudanças de desenvolvimento: a remodelação interna da ligação aos pais, 
a consolidação da autonomia e da identidade. O adolescente e os pais têm de se ajustar 
mutuamente e encontrar novos papéis, novas hierarquias na regulação do poder parental. 
As  relações  familiares  evoluem  da  dependência  para  uma  maior  mutualidade  e 
reciprocidade. 
 
12. A transição para a idade adulta: replicações 
  A transição para a idade de jovem adulto coloca ao ser humano novos desafios e 
obriga‐o a empenhar‐se em novas tarefas de desenvolvimento. Se na fase anterior era o 
ganho  em  autonomia  o  mais  importante,  agora  é  a  capacidade  para  a  intimidade  a 
principal tarefa de desenvolvimento (Erikson, 1968). O jovem adulto «está pronto para a 
intimidade, ou seja, para se comprometer com afiliações e relações específicas». 
  A hélice da vinculação replica‐se, ou seja, enquanto as vinculações primárias se 
mantêm, novas vinculações têm lugar. A capacidade de se envolver em relações de inti‐

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midade vai trazer a capacidade para o casamento. O ser humano é agora um ser capaz de 
gerar  (a  principal  tarefa  de  desenvolvimento  do  estado  adulto,  de  acordo  com  Erikson, 
1963) não só os seus filhos, mas também ideias e uma grande variedade de realizações. A 
hélice da  vinculação  desdobra‐se  e dá  lugar  à  hélice  das  novas  vinculações  trazidas pela 
constituição  de  laços  familiares  complexos  aos  pais  e  também  aos  filhos,  numa  rede  de 
afiliações transgeracional. 
  A  investigação  nesta  área  tem  repetidamente  mostrado  que  os  jovens  adultos 
depois da sua saída de casa apresentam níveis mais elevados de separação‐individuação, 
como  seria  de  esperar,  mas  também  e,  mais  surpreendentemente,  evidenciam  vínculos 
mais  fortes  aos  pais.  Quando  se  tornam  pais,  mostram  uma  maior  proximidade  afectiva 
entre eles próprios e os seus pais. A vinculação, tal como dissemos atrás, assegura agora 
as  ligações  transgeracionais,  vinculando  as  famílias  de  ascendência  com  as  famílias  de 
descendência. 
  A  investigação  empírica  tem  demonstrado  que  também  que  os  jovens  adultos 
que  melhor  progridem  em  termos  de  desenvolvimento  psíquico  (medido  pelo  seu  bem‐
estar,  adaptação  a  novas  situações,  níveis  mais  bem  integrados  no  plano  da  identidade, 
maior capacidade de estabelecer relações de intimidade e tendo mais sucesso após a sua 
saída  da  família  de  origem)  são  também  aqueles  que  apresentam  um  maior  grau  de 
separação‐individuação  (medido  pela  capacidade  de  controlo  pessoal,  autonomia  e 
sentido de responsabilidade), em simultâneo com um maior grau de vinculação, expresso 
pela capacidade de ligação afectiva e pela proximidade aos pais. 
  A interacção entre vinculação e separação‐individuação encontrada ao longo da 
infância  e  adolescência  continua  na  idade  adulta:  mais  uma  vez  se  constata  que  uma 
vinculação  segura  favorece  a  separação‐individuação,  separadas  mas  em  interconexão, 
ascendem na espiral de dupla hélice do desenvolvimento humano. 
 
13. Da maturidade à velhice 
  Com a entrada na última fase do ciclo de vida, a hélice da vinculação volta a ser 
predominante  e  a  comandar  o  desenvolvimento  nesta  fase.  A  perda  de  capacidades 
associadas  ao  envelhecimento  transforma  o  ser  humano  num  ser  cada  vez  mais 
dependente, o que reactiva os comportamentos de vínculo, sob um registo ansioso. 
  A  tensão  entre  as  duas  hélices  que,  no  decurso  do  ciclo  de  vida  humana, 
funcionou como motor de desenvolvimento psicológico, decai na velhice: as duas hélices 
aproximam‐se e a hélice da vinculação volta a ser predominante como acontecia no início 
da vida. 
  A morte representa uma ruptura, lembrando a ruptura física da molécula de ADN 
quando ocorre a morte celular programada, a apoptose, mas os laços afectivos persistirão 

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como  marca  e  como  recordação  nos  descendentes  ao  longo  dos  anos,  revelando, 
portanto, que o poder da vinculação humana continua para além da morte. 
Adaptado de Fleming, M., Entre o Medo e o Desejo de Crescer, 2005 

 
 
A Vinculação 
O  conceito  de  vinculação  surge  na  segunda  metade  do  século  XX,  a  partir  da 
constatação dos efeitos das separações e carências afectivas resultantes da experiência da 
Segunda Guerra Mundial. A institucionalização de crianças pequenas, separadas dos pais e 
em  condições  precárias,  ou  a  hospitalização,  por  períodos  prolongados,  foram  outros 
aspectos que sugeriram um conjunto de estudos com conclusões surpreendentes. Outro 
aspecto  ainda  que  suscitou  a  atenção  para  este  conceito  foi  a  progressiva  saída  das 
mulheres  para  o  mundo  do  trabalho  e  a  necessidade  de  criação  de  instituições  que 
prestassem cuidados às crianças. 
Com  o  aumento,  há  bem  poucas  décadas  atrás,  do  número  de  mulheres  a 
trabalhar fora de casa, a questão dos cuidados às crianças teria que ser posta, mais que 
não  fosse  por  aqueles  que  consideravam  estes  comportamentos  desadequados  e  que  a 
função  feminina  se  deveria  restringir  aos  cuidados  com  a  família.  Também  a  difusão  da 
informação relativamente aos estudos da psicologia sobre os comportamentos maternais, 
desde  o  aleitamento  até  à  relação  de  vinculação,  muitas  vezes  mal  interpretada  e 
apresentada  nos  meios  de  comunicação  social  de  modo  superficial  e  distorcida,  veio 
acender o debate e criar em muitas mulheres sentimentos de culpa perturbadores. 
Não é por acaso que o tempo legislado de permanência da mãe com o seu bebé, 
após  o  parto,  tem  vindo  a  aumentar.  A  questão  da  colocação  da  criança  numa  creche 
prende‐se com a acumulação de factores de risco que as instituições podem apresentar, 
como, por exemplo, mudanças constantes de pessoal, remunerações instáveis e precárias, 
condições  deficientes.  Mas  também  com  a  acumulação  de  factores  de  risco  que  as 
famílias podem apresentar como vulnerabilidade social e económica, pais cansados e com 
pouca  disponibilidade  para  cuidar  adequadamente  as  crianças.  Vários  estudos  têm 
mostrado  que  os  factores  familiares  são  mais  importantes  para  o  desenvolvimento 
saudável da relação de vinculação do que os factores da instituição de guarda. 
A  questão  fundamental  que  ressalta  de  todo  o  debate  é  que  as  crianças 
necessitam de estabelecer ligações seguras a adultos do seu meio ambiente. Se «os pais 
estão satisfeitos consigo mesmos e com as suas decisões, e se o bebé tem uma ama ou 
auxiliar  da  creche que  se  liga  a  ele  e  lhe  incute  um  sentimento  de  insegurança,  então  a 
criança  pode  de  facto  desenvolver  uma  vinculação  segura  com  a  ama  ou  a  auxiliar, 
construindo assim vínculos sólidos com os pais (…). Em todo o caso é preciso não confiar 

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em pontos de vista baseados em generalizações abusivas, que não têm qualquer validade 
científica, ou posições puramente ideológicas e “politicamente correctas”»  [Karen, 1994, cit. 
por Guegeney e Guedeney, 2002: 82‐83]. 

 
Os estudos de Bowlby 
As primeiras fases da vida são decisivas para o desenvolvimento de uma criança. 
As relações que estabelece com o mundo que a rodeia, designadamente através dos pais, 
asseguram‐lhe as condições para a sua sobrevivência e desenvolvimento, por exemplo, o 
alimento,  o  abrigo,  o  conforto  e  a  segurança.  O  psiquiatra  britânico  John  Bowlby 
desenvolveu  uma  teoria  a  partir  de  uma  hipótese:  a  relação  privilegiada  que  o  bebé 
estabelece com a mãe é decisiva para o seu desenvolvimento físico e psicológico. Bowlby 
designa  por  vinculação  os  laços  que  se  vão  construindo  entre  a  mãe  e  o  bebé.  A 
vinculação é a necessidade de criar e manter relações de proximidade e afectividade com 
os  outros,  de  o  bebé  se  apegar  a  outros  seres  humanos  para  assegurar  protecção  e 
segurança. 
Esta  relação,  que  se  manifesta  pela  necessidade  de  contacto  físico  e  de 
proximidade,  seria,  tal  como  a  fome  e  a  sede,  uma  necessidade  básica  ou  primária. 
Segundo  a  teoria  de  Bowlby,  para  assegurar  estas  relações  existem  esquemas 
comportamentais  inatos  que  se  manifestam  logo  após  o  nascimento  e  que  permitem 
estabelecer laços com as pessoas mais próximas, geralmente com a mãe biológica. Assim, 
chorar, sorrir, mamar, agarrar, seguir com o olhar constituem os comportamentos que o 
bebé  adopta  para  manter  a  relação  privilegiada  com  as  figuras  de  vinculação,  de 
protecção. 
Bowlby  explica  a  relação  de  vinculação  através  da  Teoria  dos  Sistemas  de 
Controle. Ele começou por trabalhar sobre a problemática das perturbações apresentadas 
pelos lactentes separados da mãe, e só mais tarde se tornou um teórico da vinculação. O 
seu trabalho apresenta uma síntese entre a psicanálise, no que se refere à perda da liga‐
ção  maternal,  e  a  etologia,  no  que  se  refere  ao  imprinting.  O  fenómeno  de  imprinting 
demonstra  que  em  algumas  espécies  podem  desenvolver‐se  e  persistir  laços  entre 
indivíduos  sem  que  haja  necessariamente  satisfação  das  necessidades  fisiológicas 
primárias. 
Durante muito tempo pensou‐se que os animais nasciam com instintos, respos‐
tas  comportamentais  prontas  a  utilizar,  enquanto  que  os  seres  humanos  tinham  de 
aprender  tudo.  Hoje,  compreendemos  que  esta  oposição  radical  entre  o  instinto  e  a 
aprendizagem, entre o animal e o homem, era falsa. Tanto para um como para outro, a 
aprendizagem,  mais  ou  menos  longa,  é  quase  sempre  necessária.  Tanto  para  um  como 
para  outro,  existem  sistemas  de  reacção  inatos,  mais  ou  menos  numerosos,  e  pensa‐se 

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que,  tanto  para  um  como  para  outro,  a  activação  destes  sistemas  se  realiza  em  certos 
períodos.  O  essencial  é  a  existência destes  sistemas,  a  identificação da vinculação  como 
um destes sistemas, e o facto deste sistema descoberto no animal existir nos seres huma‐
nos. 
Para  Bowlby,  há  cinco  comportamentos,  padrões  fixos  de  acção,  que  estão  ao 
serviço da vinculação. São eles o chupar, agarrar, seguir, chorar e sorrir. No início, estes 
comportamentos  são  relativamente  independentes  uns  dos  outros,  mas  no  decurso  do 
primeiro ano de vida integram‐se num comportamento, cuja função é a de ligar a criança 
à mãe e contribuem para a dinâmica recíproca desta relação. Enquanto que em relação ao 
chupar, agarrar e seguir, o bebé é o principal elemento activo, o choro e o sorriso servem 
para  activar  o  comportamento  maternal,  actuando  como  desencadeadores  sociais  de 
respostas das mães. 
Bowlby frisa que um dos pontos principais da sua tese é que cada uma das cinco 
respostas  que  sustentam  a  ligação  à  mãe  está  presente  devido  ao  seu  valor  de  sobre‐
vivência.  Afirma  ele  que  a  não  ser  que  haja  poderosas  respostas  inatas  que  assegurem 
que  a  criança  desperta  a  atenção  maternal  e  permanece  numa  proximidade  íntima  da 
mãe,  durante os  anos da  infância,  a criança  morrerá.  Desta  forma, no decurso  da  nossa 
evolução,  o  processo  de  selecção  natural  levou  a  que  o  choro  e  o  sorriso,  o  chupar,  o 
agarrar e o seguir se tornassem respostas específicas da espécie humana.  
Bowlby afirma que todas as respostas instintivas parecem atingir um máximo e 
depois  decrescem.  «Conforme  os  anos  passam,  primeiro  a  sucção,  depois  o  choro  e 
depois  o  agarrar  e  o  seguir,  todas  diminuem.  Até  o  sorridente  bebé  de  dois  anos  se 
transforma  na  criança  de  escola  mais  solene.  São  um  quinteto  que  compreende  um 
repertório bem adaptado à infância, mas que, tendo cumprido a sua função, é relegado 
para um lugar secundário. Não obstante, nenhuma delas desaparece. Todas permanecem 
em  diferentes  graus  de  actividade  ou  latência  e  são  utilizadas  em  novas  combinações 
quando  o  repertório  adulto  amadurece.  Além  disso,  algumas,  em  particular  chorar  e 
agarrar,  voltam  a  um  estado  anterior  de  actividade,  em  situações  de  perigo,  doença  ou 
incapacidade.  Nestes  papéis,  desempenham  uma  função  natural  e  saudável  que  não  é 
necessariamente regressiva.  
Dois  conceitos  são  ainda  importantes  para  entender  a  perspectiva  de  Bowlby. 
São  eles  o  de  ambiente  de  adaptabilidade  evolutiva  e  o  de  proximidade.  O  conceito  de 
ambiente de adaptabilidade evolucionista sugere que o comportamento de vinculação é 
um  comportamento  adaptativo  necessário  à  sobrevivência,  inscrito  biologicamente  e 
resultado  do  processo  evolutivo  da  espécie  humana.  Dado  a  vulnerabilidade, 
inacabamento ou aquilo que se costuma chamar imaturidade do bebé humano, os adultos 
que o rodeiam são fundamentais não só para o protegerem dos perigos do meio, numa 

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perspectiva evolutiva, como também para garantirem o desenvolvimento das estruturas 
psíquicas necessárias ao processo de se tornar humano. 
O  conceito  de  proximidade  implica  uma  noção  espacial  relacionada  com  a  dis‐
tância física necessária entre o bebé e a figura parental que permite, no comportamento 
de vinculação, responder às necessidades da criança, proporcionando‐lhe um sentimento 
de segurança. 
 
Alguns estudos marcantes sobre a necessidade de vinculação 
Todos  estamos  de  acordo  que,  durante  o  primeiro  ano  de  vida,  a  criança  des‐
envolve uma forte relação com a figura maternal. O interessante é perceber por que razão 
é que isto se passa assim. 
  Inicialmente a criança era considerada como um ser que passava dum estado pu‐
ramente  biológico  ao  estado  de  ser  social  por  aprendizagem.  Segundo  alguns 
investigadores, os bebés só encontrariam prazer na companhia do adulto em virtude de 
associarem o adulto à satisfação de necessidades fisiológicas. A criança teria necessidades 
fisiológicas que deveriam ser satisfeitas como, por exemplo, a fome, a sede, o alívio da dor 
e  o  calor,  mas  não  eram  referidas  necessidades  sociais.  A  criança,  ao  longo  do  tempo, 
aprenderia que a mãe é fonte de gratificação, e esta serviria de reforço à manutenção da 
relação.  As  necessidades  fisiológicas  seriam  primárias.  O  afecto  seria  secundário.  Nesta 
perspectiva,  a  dependência  social  derivaria  da  dependência  física  e  seriam  as 
necessidades fisiológicas que produziriam a necessidade emocional do outro. 
  Também  os  teóricos  da psicanálise  eram  unânimes  em  reconhecer  as primeiras 
relações  objectais  da  criança  como  pedra  fundamental  do  seu  desenvolvimento.  No 
entanto,  não  há  concordância  quanto  à  natureza  e  dinâmica  destas  relações.  Uma  das 
ideias  mais  generalizadas  era  a  de  que  os  bebés  têm  necessidades  inatas  de  se 
relacionarem com o seio humano, de o chupar e de o possuir oralmente. A seu tempo, o 
bebé aprenderia que ligada ao peito há uma mãe, e desta forma relacionar‐se‐ia também 
com  ela. Da  mesma  forma  que  para  os autores  anteriores,  os  autores desta perspectiva 
olham  para  a  relação  com  a  mãe  como  um  benefício  secundário  da  satisfação  das 
necessidades de alimento. 
Investigações  realizadas  na  área  da  Etologia  vêm  contrariar  esta  ideia.  Estes 
estudos  partiram  da  hipótese  de  que  nas  espécies  não‐humanas  há  muitas  respostas 
inatas  que  são  independentes  de  necessidades  fisiológicas  e  cuja  função  é  promover  a 
interacção social entre os membros dessa espécie. Esta interacção social tem por função 
assegurar a cooperação entre os congéneres. 
Por exemplo, algumas aves, como os patos, os perus e os gansos, cujas ninhadas 
não são alimentadas pelos pais, começam a debicar um dia depois de nascerem. E curio‐

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samente seguem qualquer coisa que se mova no seu ambiente. É conhecida a imagem de 
Lorenz, etólogo austríaco que foi prémio Nobel, com uma ninhada de patinhos atrás. Este 
comportamento a que Lorenz chamou imprinting [impregnação ou cunhagem], não deri‐
va  da  satisfação  das  necessidades  fisiológicas  mas  da  necessidade  inata  de  um  vínculo 
social. 
Lorenz criou alguns ovos de ganso numa incubadora deixando outros ao cuidado 
da mãe. Os gansos, cujos ovos tinham sido incubados artificialmente, não demonstravam 
qualquer medo de serem pegados e seguiam qualquer pessoa que passasse por eles, pian‐
do dolorosamente quando eram deixados para trás. Quando, posteriormente, colocou es‐
ses gansos junto da ninhada criada com a mãe natural, verificou que esta os incluía, sem 
qualquer problema, na prole, defendendo‐os logo que via a mão do homem aproximar‐se. 
Pelo contrário, os gansos bebés do primeiro grupo, não apresentavam predisposição para 
seguir  os  adultos  da  sua  espécie,  piavam,  fugiam  e  seguiam  o  primeiro  ser humano  que 
por acaso passasse. Os filhotes criados na incubadora por Lorenz iam atrás de dele, procu‐
rando‐o  quando  assustados.  Os  outros  filhotes  seguiam  a  mãe  e  formavam  um  vínculo 
com ela. 
 
1. As investigações de Harlow 
Nos  finais  da  década  de  50,  Harry  Harlow  desenvolveu  um  conjunto  de  estudos 
com macacos Rhesus que mostraram os efeitos da ausência da mãe junto das jovens crias 
desenvolveu com a sua equipa várias experiências que passamos a descrever. 
Construiu  duas  mães  artificiais  substitutas,  ambas  de  forma  cilíndrica:  uma  de 
arame  soldado,  a  outra  de  arame  revestido  de  tecido  felpudo.  As  duas  mães  artificiais 
forneciam  alimento  através  de  um  biberão  situado  no  «peito»  das  duas  mães.  Os  oito 
macaquinhos  recém‐nascidos,  separados  das  suas  mães,  acediam  a  qualquer  uma  das 
mães artificiais. Do ponto de vista estritamente fisiológico, as duas mães cumpriam o seu 
papel  de  alimentadoras:  os  macacos  bebés,  alimentados  por  uma  ou  por  outra, 
desenvolveram‐se fisicamente ao mesmo ritmo. Contudo, Harlow constatou que as crias 
passavam  a  maior  parte  do  tempo  agarradas  à  mãe  de  peluche.  Era  junto  dela  que 
procuravam abrigo face a uma situação de perigo. 
 
Mesmo quando só estava presente a mãe de arame,
os macaquinhos não procuravam a sua protecção
numa situação ameaçadora. Numa outra variante,
em que só a mãe de arame fornecia alimento, as
crias mantinham-se agarradas à mãe de peluche
recorrendo à de arame só para se alimentar.

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    Em  estudos  posteriores,  Harlow  procurou 
avaliar o efeito dos bebés macacos criados sem qualquer contacto. Isolou‐os em jaulas de 
ferro vazias sem verem outro ser vivo durante três meses a um ano. quando os períodos 
eram longos, os animais encostavam‐se ao fundo do compartimento, balançavam para a 
frente  e  para  trás  e  abraçavam‐se  a  si  próprios  e  mordiam‐se.    Quando  juntos  a  outros 
macacos  criados  com  as  suas  mães,  não  participavam  nas  brincadeiras  fugindo  de 
qualquer  contacto.  Quando  adultos,  o  seu  comportamento  sexual  estava  bastante 
afectado  bem  como  a  sua  capacidade  para  tratar  das  cias.  As  mães  não  manifestavam 
qualquer  interesse  ou  capacidade  para  tratar  dos  seus  filhos,  chegando  a  provocar‐lhes 
maus tratos. 
  Com  estas  experiências,  Harlow  concluiu  que  o  vínculo  entre  a  cria  e  a  mãe 
estaria mais relacionado com o contacto corporal e o conforto daí decorrente do que com 
a alimentação. Esta necessidade básica de contacto/conforto é também reconhecida elo 
investigador nos bebés humanos, que manifestam a necessidade de estar junto da mãe, 
ou  de  outro  cuidador,  em  contacto  físico.  A  origem  da  vinculação  encontrar‐se‐ia  nesta 
necessidade  e  não  na  alimentação.    Concluiu  ainda  que  são  devastadores  os  efeitos  da 
ausência  da  mãe  ou  dos  agentes  maternantes:  a  privação  desse  contacto  humano 
traduzir‐se‐ia em perturbações físicas e psicológicas profundas. 
 
2. As investigações de Spitz 
  René  Spitz,  psiquiatra  infantil  de  origem  austríaca,  com  formação  psicanalítica, 
desenvolveu um conjunto de estudos em crianças que, durante os 12 primeiros anos de 
vida, permaneceram durante um período prolongado numa instituição hospitalar ou num 
orfanato,  privadas  da  presença  da  mãe.  Estudou  as  consequências  e  concluiu  que  os 
bebés  apresentavam  perturbações  somáticas  e  psíquicas  como  resultado  da  ausência 
completa  da  mãe  numa  instiuição  em  que  os  cuidados  são  administrados  de  forma 
anónima,  sem  que  se  estabeleçam  laços  afectivos.  Do  ponto  de  vista  do  cuidado  físico, 
estavam asseguradas as condições fundamentais de higiene e de alimentação; do ponto 
de  vista  afectivo,  constatou uma  carência afectiva  total, porque cada  adulto  tinha  à  sua 
guarda várias crianças. 

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  Spitz designou por hospitalismo o conjunto de perturbações ividas por crianças 
insitucionalizadas e privadas de cuidados maternos: atraso no desenvolvimento corporal, 
dificulades  nas  competências  manuais  e  na  adaptação  ao  meio  ambiente,  atraso  na 
linguagem.  Constatou,  ainda,  uma  menor  resistência  às  doenças  e  que,  nos  casos  mais 
graves, pode ocorrer apatia. Os efeitos do hospitalismo são duradouros e, muitas vezes, 
irreversíveis. 
  Com as suas investigações, Spitz confirmou a necessidade de laços e de contactos 
afectivos  entre  o  bebé  e  o  adulto,  especialmente  entre  a  mãe  e  o  filho.  A  sua  ausência 
pode conduzir a perturbações emocionais, comportamentais e desenvolvimentais graves. 
Recentemente,  as  suas  conclusões  foram  confirmadas  por  estudos  desenvolvidos  nas 
crianças encontradas em orfanatos, sobrelotados, em 1989 na Roménia.  
  A  ausência  de  uma  relação  privilegiada  com  a  mãe  ou  com  um  agente 
maternante  (um  adulto  que  a  substitua),  tem  como  consequência  a  recusa  em  se 
alimentar,  a  perturbação  do  sono,  a  manifestação  de  comportamentos  ansiosos.  O 
sentimento de abandono e a ausência de uma figura securizante compromete o equilíbrio 
das crianças. 
  Estas conclusões levaram a Organização Mundial de Saúde, em 1950, a incluir nas 
suas orientações um documento, Cuidados maternos e saúde mental, on de afirma: «(…) 
fica claramente demonstrado que  os cuidados maternos no decurso da primeira infância 
desempenham um papel essencial no desenvolvimento harmonioso da saúde mental». 
 
3. As investigações de Ainsworth 
  Mary  Ainsworth,  psicóloga  canadiana  que  trabalhou  com  Bowlby  e  que 
desenvolveu uma teoria da vinculação estudando no Uganda o efeito da separação em 28 
bebés, durante três anos. Apresenta então o que considera serem as etapas do processo 
de vinculação: a um primeiro estádio de orientação, segue‐se um estádio de focalização 
que conduz, cerca dos 7/8 meses, à vinculação propriamente dita. 
  Se  a  relação com  os  pais  gera  segurança, na  medida  em  que  o  bebé  está  certo 
que  a  relação  se  mentém  para  além  da  separação,  a  criança  sente‐se  mais  livre  para 
decsobrir  o  mundo  e  para  estabelecer  outras  relações.  Mary  Ainsworth  descreve  o 
funcionamento  desta  base  de  segurança  dada  pelos  pais  a  partir  das  experiências  que 
desenvolveu.  Ao  voltar  aos  EUA,  aprofundou  a  sua  investigação  recorredo  a  um 
procedimento  experimental  que  ficou  conhecido  como  Situação  Estranha.  Em  síntese,  a 
investigadora regista o efeito da separação e do reencontro dos bebés entre os 12 e os 24 
meses com a sua mãe: 
• a criança está com a mãe numa sala; 

32
• uma pessoa estranha entra e junta‐se a eles; 
• a mãe abandona a ala deixando a criança com a pessoa estranha; 
• a pessoa estranha abandona a sala deixando a criança sozinha; 
• a pessoa estranha egressa para junto da criança; 
• a mãe regressa para junto da criança. 
Na perspectiva de Ainsworth, a forma como o bebé reagia, quer à ausência da mãe, 
quer  ao  seu  regresso,  reflectiria  o  seu  equilíbrio  emocional,  que  relacionava  com  os 
cuidados que recebera. 
A partir das suas observações, distingue três categorias de vinculação: a vinculação 
segura, a vinculação evitante e a vinculação ambvalente/resistente. 
No  primeiro  tipo,  as  crianças  choram  e  protestam  com  a  ausência  da  mãe,  mas 
procuram o contacto físico logo que ela entra na sala, ficando camas. As crianças com uma 
vinculação evitante parecem indiferentes à separação da mãe e ao seu regresso. Os bebés 
com uma vinculação ambivalente/resistente manifestam ansiedade mesmo antes da mãe 
sair  e  perturbação  quando  abandona  a  sala,  hesitando  entre  a  aproximação  e  o 
afastamento  dela  quando  esta  regressa.  A  vinculação  segura  seria  o  tipo  de  vinculação 
com o carácter mais adaptativo. 
Estes  estudos  mostraram  a  importância  das  primeiras  vinculações  e  que  a  sua 
qualidade influencia as relações que a criança vai estabelecer no futuro, designadamente 
com  colegas  e  professores.  Seria  como  que  um  modelo  do  que  se  pode  esperar  dos 
outros. 
Ainsworth  estudou  também  a  relação  que  a  criança  estabelece  com  o  pai, 
utilizando a experiência da Situação Estranha com o progenitor masculino. Concluiu que a 
criança  manifestava  igualmente  sinais  de  angústia  quando  ele  abandonava  a  sala,  assim 
como a procura do contacto quando voltava.  
 
Depois destes estudos, a ligação da criança à mãe foi vista noutra perspectiva. Os 
bebés têm uma necessidade inata de estar em contacto e de se agarrar a um ser humano. 
Neste sentido há a necessidade de um objecto independente do alimento. Esta necessi‐
dade social é tão necessária como a necessidade de alimento e de calor. Trata‐se de uma 
necessidade inata e não aprendida.  
Esta constatação  veio  sublinhar  a natureza  primária  do  amor,  a  força  irreprimível 
da  necessidade  de  vinculação,  sendo  a  vinculação  condição  primeira  do  que  será  mais 
tarde o equilíbrio e a adaptação social.  
Bowlby considera o caregiving (tradução literal «dar cuidados») como o conjunto 
dos  comportamentos  parentais  que  implicam  os  cuidados  físicos  e  psíquicos/afectivos 

33
dados à criança. Estes comportamentos, solicitados pela criança e prestados pelos pais, ou 
seus substitutos, são sustentados por mecanismos evolutivos e biológicos. Podemos então 
dizer, como Wallon, um teórico francês importante da psicologia do desenvolvimento que 
o social é biológico. Ou seja, e de um modo simplista, o amor pode ser considerado um 
mecanismo de sobrevivência da espécie. 
Ainda antes do nascimento, mãe e bebé iniciam uma relação. O que a mãe pensa 
é  como  que  o  início  do  pensamento  do  bebé.  Todas  as  mães,  durante  a  gravidez 
«pensam»  o  seu  bebé.  Ele  tem  que  ser  adivinhado,  sonhado,  pensado,  pela  mãe.  Este 
«trabalho», que é feito durante o período de gestação, tem uma função de ajustamento e 
é  fundamental  para  o  posterior  desenvolvimento  da  relação.  A  mãe,  ao  transformar 
emoções  em  pensamentos,  é  uma  espécie  de  «continente»  que  oferece  um  espaço 
psicológico ao seu bebé, uma vez que o representa. O primeiro pensamento do bebé é a 
constatação de uma ausência. A ausência da mãe. 
É também por estas razões que os serviços de adopção, mesmo havendo crianças 
em  condições de  serem  imediatamente  colocadas na  família  que  a  vai  adoptar, dão aos 
pais,  um  período  de  «gestação»  do  futuro  filho  que  é  mais  ou  menos  de  6  meses.  Este 
período  serve  para  preparar  a  vinda  da  criança,  imaginando‐a  e  representando‐a,  quer 
dizer, ajustando‐se a ela. 
 
 

34
Tex to   4 :    
A Construção da Identidade 
 

A  identidade  pessoal,  que  pode  parecer  uma  noção  simples  e  evidente,  revela‐se 
um fenómeno complexo e multidimensional. Tem, antes de mais, uma significação objectiva: 
o facto de cada indivíduo ser único, diferente de todos os outros pelo seu património genéti‐
co. Contudo, tem sobretudo um sentido subjectivo: remete para o sentimento da sua indivi‐
dualidade («eu sou eu»), da sua singularidade («eu sou diferente dos outros e tenho estas e 
aquelas  características»)  e  de  uma  continuidade  no  espaço  e  no  tempo  («eu  sou  sempre  a 
mesma pessoa») 
Este sentimento é o do sujeito, mas também o dos outros, do seu meio: nós espe‐
ramos de cada um que ele manifeste uma certa coerência e uma certa constância no seu ser, 
nas suas atitudes e nos seus comportamentos («eu conheço‐te bem…»). Uma grande variabi‐
lidade a esse nível é sentida como patológica (inconsistência, fragilidade identitária ou per‐
sonalidades múltiplas). 
Fenómeno  complexo,  a  identidade  é  igualmente  paradoxal.  Com  efeito,  na  sua 
própria significação, ela designa o que é único: distingue‐se e diferencia‐se irredutivelmente 
dos outros. Mas qualifica igualmente o que é idêntico, isto é, o que é perfeitamente seme‐
lhante, mantendo‐se distinto. Esta ambiguidade semântica tem um sentido profundo. Sugere 
que a identidade oscila entre a semelhança e a diferença, entre o que faz de nós uma indivi‐
dualidade singular e o que, ao mesmo tempo, nos torna semelhantes aos outros. A psicolo‐
gia mostra bem que a identidade se constrói num duplo movimento de assimilação e de dife‐
renciação, de identificação com os outros e de distinção relativamente a eles. 
Lipiansky, E. L’Identité Personelle, 1997 

 
«Quem  sou  eu?»  é  uma  pergunta  que  acompanha  o  Homem  ao  longo  da  sua 
existência. Todos nós procuramos responder a essa questão. Parece que toda a nossa vida 
é uma procura incessante no sentido de tentarmos perceber quem é que somos. Somos 
boas ou más pessoas? Somos capazes ou somos uns incapazes da pior espécie? 
Conforme  nos  vamos  desenvolvendo,  vamo‐nos  modelando  aos  olhares  que 
espelham  a  nossa  imagem,  oferecida  pelos  outros  e,  ao  mesmo  tempo,  vamos  lidando 
com o que temos, com aquilo que já faz parte de nós. A construção da identidade é um 
processo que decorre ao longo da vida inteira, numa permanente relação dinâmica entre 
o que temos e o que nos é devolvido pelos outros. À medida que vamos crescendo, e para 
isso os outros desempenham um papel primordial, vai‐se tornando possível responder de 
uma forma mais completa à pergunta «quem sou eu». 
Como  podemos  verificar  pelas  palavras  de  Lipiansky,  acima  expressas,  o  termo 
identidade parece contraditório. A palavra identidade reúne a noção de semelhança e, ao 
mesmo tempo, de diferença. Cada um de nós define‐se por características comuns a todos 
os  outros  e  por  características  que  nos  distinguem  de  todos  os  outros.  Neste  sentido, 
podemos  afirmar  que  a  identidade  engloba  quer  a  ideia  de  um  «eu  próprio»  quer  o 
contexto social e cultural onde nascemos e vivemos. 

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Uma das particularidades da dinâmica identitária é que ela resulta do confronto 
de tendências contraditórias. Procuramos ser, ao mesmo tempo, plurais e singulares, con‐
formamo‐nos,  mas  afirmamos  a  nossa  individualidade,  fazemos  prova  de  uma  certa 
continuidade,  naquilo  que  somos  e  na  forma  como  nos  comportamos  e,  ao  mesmo 
tempo,  tendemos  a  mudar.  Estas  contradições  resultam  também  da  coexistência,  e  às 
vezes do confronto, de diferentes papéis sociais. Podemos ser, ao mesmo tempo, pai de 
família,  apreciador  de  boa  comida,  inspector  de  impostos,  adepto  de  uma  equipa  de 
futebol, membro de uma associação artística. A cada um destes papéis corresponde uma 
identidade e comportamentos específicos. Temos de gerir esta diversidade, mantendo a 
coerência. 
Podemos então definir a identidade como o conjunto de características que uma 
pessoa considera suas e às quais dá valor para se afirmar, reconhecer e ser reconhecido 
socialmente. A identidade é produto da interacção do particular com o social. 
O  conceito  de  identidade  inclui  um  outro  aspecto,  o  autoconceito.  O 
autoconceito é a forma como nos percebemos a nós próprios e inclui a auto‐imagem e a 
auto‐estima.  A  auto‐imagem  é  a  forma  como  nos  vemos  fisicamente,  corresponde  à 
imagem corporal e é, provavelmente, a primeira parte do autoconceito que se forma. A 
auto‐imagem  é  mediada  por  valores  culturais  que  influenciam  o  grau  de  satisfação  que 
sentimos  com  o  nosso  corpo.  A  auto‐estima  é  o  valor  que  sentimos  ter,  o  quanto 
gostamos de ser como somos. Todas estas percepções de nós próprios são construídas e 
reconstruídas, ao longo do processo de desenvolvimento, na relação com os outros.  
A partir do texto que se segue, analisemos agora o modo como, na adolescência, 
se organiza a identidade. 
 
 
 
Apresentação 
  A mais importante consequência psicossocial da puberdade, no quadro da teoria 
psicanalítica, é a desvinculação e a separação das pessoas mais significativas, dos pais e da 
família.  Mesmo  os  autores  que  sublinham  o  processo  de  redefinição  da  relação  com  os 
pais, mais do que a separação, acentuam a aquisição da autonomia como tarefa primor‐
dial do adolescente. 
  Paralelamente, ocorrem mudanças no funcionamento cognitivo com a emergên‐
cia do raciocínio formal, o que inclui a capacidade de pensar hipoteticamente, de imaginar 
uma série de possibilidades em relação a si próprio e ao futuro. Estas competências per‐
mitem ao adolescente repensar criticamente os seus valores, crenças e imagens do mun‐
do anteriormente definidos pelas pessoas a quem estava afectivamente ligada. 

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  Estas mudanças encorajam o adolescente a procurar um sentido de autonomia e 
preparam‐no para uma melhor compreensão de si próprio e dos outros, o que constitui 
alicerces para a construção da sua identidade. 
  Há  quem  considere  que  o  principal  desafio  com  que  se  confrontam  os 
adolescentes  reside  na  tarefa  de  desenvolvimento  da  identidade  do  EU.  Têm  sido 
identificados  dois  aspectos  do  Eu  intimamente  ligados:  o  Eu  como  sujeito  e  o  Eu  como 
objecto.  O  Eu  como  sujeito,  autor  e  actor,  timoneiro,  o  conhecedor  e  avaliador  e  o  Eu 
como objecto do seu próprio conhecimento e avaliação; o sujeito que tem de se constituir 
como existente, separado dos outros e o objecto constituído pelas categorias ou teorias 
pessoais a construir para se definir a si próprio. 
  Desde  já  se  assinale  que  uma  tónica  comum  a  todas  as  perspectivas  é  a  da 
importância da interacção social e do conhecimento dos outros para a construção do Eu, 
como sujeito e como objecto e, portanto, da identidade. 
 
Desenvolvimento do Eu 
  O Eu seria o integrador das diferentes ideias e experiências pessoais bem como 
das  expectativas  sociais  e  o  organizador  da  acção  humana.  Loevinger  (1970,  1983) 
apresentou um modelo de desenvolvimento das estruturas do Eu, desde a mais simples à 
mais complexa. Este modelo faz referência a dez estádios do desenvolvimento. 
 
1. Pré‐social. Caracteriza o indivíduo numa fase autista, cuja primeira tarefa é a sua 
diferenciação dos outros e do que o rodeia, e tem o seu início com a construção 
da realidade, permanência e conservação dos objectos. 
2. Simbiótico.  Apesar  da  sua  diferenciação,  o  indivíduo  permanece  numa  relação 
simbiótica  com  o  meio.  A  aprendizagem  da  linguagem  torna‐o  capaz  de  se  ver 
como uma pessoa separada. 
3. Impulsivo. Os impulsos do indivíduo ajudam‐no a afirmar‐se como uma entidade 
separada,  embora  a  necessidade  dos  outros  permaneça  muito  forte,  o  que  se 
manifesta por comportamentos de dependência. Os outros são vistos como fonte 
de  recompensa  e  punição.  A  orientação  é  quase  exclusivamente  virada  para  o 
presente e não para o passado e futuro. 
4. Auto‐protecção. Verifica‐se o primeiro passo para o auto‐controlo dos impulsos, 
o  indivíduo  é  capaz  de  antecipar  punições  e  recompensas  a  curto  prazo. 
Compreende  que  há  regras,  contudo  a  regra  mais  importante  é  «não  te  deixes 
apanhar»  e  não  é  capaz  de  ser  responsável  pelas  suas  acções.  Este  estádio 
caracteriza‐se, assim, por um hedonismo oportunista. 

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5. Conformismo. O indivíduo identifica o seu bem‐estar com o do grupo, mas para 
que isto aconteça é necessário que tenha atingido um nível de confiança básico 
suficiente.  Tem  medo  da  desaprovação  dos  outros,  percebe  as  normas  e 
obedece‐lhes porque são aceites pelo grupo. É capaz de observar diferenças de 
grupo,  no  entanto,  é  insensível  às  diferenças  individuais.  os  seus 
comportamentos e valores existem em unção de influências externas e portanto 
de aceitação social. 
6. Auto‐consciência.  Período  de  transição  do  conformismo  à  tomada  de 
consciência.  Caracteriza‐se  fundamentalmente  por  um  aumento  desta  assim 
como  pel  capacidade  em  perceber  múltiplas  perspectivas  e  alternativas,  o  que 
permite  ao  indivíduo  sair  do  controlo  exclusivamente  externo,  assim  com 
reconhecer diferenças individuais e múltiplas formas de pensar, sentir e agir. 
7. Tomada de consciência. O indivíduo tem regras e valores interiorizados, é capaz 
de se ver como aquele que toma decisões, que age e tem relações empáticas e 
de  mutualidade,  sendo  capaz  de  apreciar  nos  outros  diferentes  emoções  e 
perspectivas.  Neste  estádio,  os  elementos  básicos  da  consciencialização  dos 
adultos  estão  presentes:  auto‐avaliação  de  objectivos  e  ideais,  autocrítica, 
sentido de responsabilidade. 
8. Individuação. Período de transição para o estádio da autonomia. Caracteriza‐se 
essencialmente  por  um  aumento  do  sentido  da  individualidade,  consciência  de 
conflitos  emocionais  envolvidos  nas  relações  dependência/independência.  O 
indivíduo  é  mais  tolerante,  consigo  e  com  os  outros,  reconhecendo‐os  na  sua 
complexidade.  Está  consciente  das  diferenças  entre  processo  e  resposta,  das 
discrepâncias entre a realidade interna e aparência externa e entre respostas de 
ordem psicológica e fisiológica. 
9. Autonomia o que distingue este estádio é a capacidade de conhecer e lidar com 
conflitos internos. A complexidade conceptual é a característica mais saliente: o 
indivíduo  vê  a  realidade  como  complexa  e  multifacetada  e  é  capaz  de  integrar 
duas ideias aparentemente contraditórias e ambíguas. Tem consciência clara dos 
seus papéis e está interessado no seu desenvolvimento e progresso. Reconhece a 
autonomia aos outros e a sua interdependência. 
10. Integridade.  Neste  estádio,  o  indivíduo  transcende  os  conflitos  do  autónomo, 
adquirindo um sentido integrado da sua identidade. É de salientar que é pouco 
frequente encontrarmos indivíduos neste estádio. 
 
Num  estudo  realizado  junto  de  250  estudantes  universitários  do  Porto,  a  fre‐
quentarem  o  segundo  ano,  verificou‐se que  trinta por cento  se  encontravam  no  estádio 

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do conformismo ou próximo e cerca de sessenta por cento estavam a transitar para o da 
tomada de consciência ou já aí se encontravam. Resultados idênticos têm sido encontra‐
dos em estudos realizados noutros países. 
 
A identidade segundo Erikson 
  Erik  Erikson  foi  um  dos  primeiros  autores  a  debruçar‐se  seriamente  sobre  o 
fenómeno da construção da identidade. O seu trabalho baseou‐se, embora divergindo em 
pontos importantes, na perspectiva freudiana do desenvolvimento.  
Erikson  conceptualiza  e  define  a  identidade  de  uma  forma  interdisciplinar  em 
que  a  construção  biológica,  a  organização  pessoal  da  experiência  e  o  meio  cultural  dão 
significado,  forma  e  continuidade  à  existência  do  indivíduo.  Situa  o  desenvolvimento  do 
indivíduo  num  contexto  social  dando  ênfase  ao  facto  de  ocorrer  na  interacção  com  os 
pais, a família, as instituições sociais e uma cultura num momento histórico particular.  
O autor apresenta um esquema do desenvolvimento numa sequência fixa de oito 
estádios,  cada  um  correspondendo  a  um  período  cronológico  específico  e  envolvendo  a 
aquisição  de  um  estilo  consistente  de  organização  da  experiência,  de  reestruturação  da 
identidade desde a infância e de incorporação de novos papéis oferecidos pela sociedade. 
Cada  um  destes  estádios  é  caracterizado  por  um  dilema  ou  crise  particular  em 
que o indivíduo desenvolve atitudes básicas que contribuem para o seu desenvolvimento 
psicossocial.  Estas  atitudes  básicas  surgem  em  cada  estádio  como  orientações  polares, 
isto  é,  o  indivíduo  pode  emergir  em  cada  um  deles  com  um  sentido  de  si  próprio 
reforçado  ou  debilitado.  Estas  orientações  polares  são  conflitos  nucleares  ou  seja, 
momentos  de  crise  e  de  síntese  activa  do  Eu,  nos  quais  está  perante  soluções 
contraditórias  que  implicam  decisões  cuja  natureza  depende  do  balanço  de  vários 
factores  de  desenvolvimento  (maturidade  cognitiva,  crescimento  físico…).  Estas 
orientações polares não significam que uma exclui a outra, mas que em cada estádio se 
verifica  uma  dialéctica  entre  ambas.  Quer  dizer,  o  resultado  será  a  síntese  dos  pólos 
negativo e positivo de cada estádio. 
A teoria de Erikson embora organizada em estádios não é uma teoria estrutural. 
Isto significa que a emergência de um estádio é independente da resolução com sucesso 
do estádio anterior. Contudo, a qualidade da resolução está dependente da resolução de 
estádios precedentes. 
A tarefa por excelência do adolescente é a construção da sua identidade. O ado‐
lescente preocupa‐se com a definição de si próprio, quem é, o que quer ser e fazer, qual 
seu papel e função no mundo, quais os seus projectos para o futuro. Tenta dar um signifi‐
cado coerente à sua vida, integrando as experiências passadas e presentes e procurando 
um sentido para o futuro. 

39
A  formação  da  identidade  tem  uma  função  dupla:  psicológica  e  social.  Por  um 
lado,  a  construção  da  identidade  surge  da  necessidade  do  indivíduo  organizar  e 
compreender  a  sua  individualidade  de  uma  forma  consistente  e  sem  contradições.  Por 
outro, é um processo social que surge de pressões externas para que o indivíduo escolha e 
invista em papéis familiares, profissionais e sociais o que lhe dará um estatuto e posição 
na sociedade. 
Porque  a  identidade  psicossocial  serve  estas  duas  funções,  a  tarefa  do 
adolescente  é  duplamente  complexa.  Por  um  lado  tem  de  possuir  um  desenvolvimento 
psicológico  adequando  à  realização  desta  tarefa  e,  por  outro,  a  construção  da  sua 
identidade tem de ser realista e adaptada à sociedade onde está inserido, em constante 
mudança.  
Se é verdade que a construção da identidade ocorre essencialmente no período 
da adolescência, não se inicia e termina aí. É um processo contínuo ao longo do ciclo de 
vida.  
O  processo  de  desenvolvimento  da  identidade  depende  e  inicia‐se  no  primeiro 
encontro com a mãe, em que o sentido do Eu emerge de um jogo de confiança durante a 
infância. É da experiência de uma relação segura que a criança se reconhece como distinta 
dos outros. A interiorização e a identificação às figuras mais significativas são as primeiras 
formas de estruturação do Eu. Só quando o adolescente se torna capaz de as seleccionar, 
sintetizar  e  organizar  é  que  a  formação  da  identidade  ocorre.  São  a  integração  e 
organização  de  aspectos  do  Eu  num  conjunto  coerente  e  distinto  que  vão  definir  a 
identidade. 
• Assim, o primeiro estádio tem como requisito a aquisição de um sentimento de 
confiança básica em oposição à desconfiança. Ao longo do primeiro ano de vida, 
a relação da criança com o adulto facilita ou dificulta o desenvolvimento de uma 
segurança íntima em relação a si próprio e ao mundo. É através da relação entre 
a  mãe  e  a  criança  que  se  desenvolve  um  sentido  rudimentar  do  Eu.  É  também 
através desta relação que a criança tem o seu primeiro encontro com a cultura, 
ou seja, com as regras educacionais dessa cultura, presentes no comportamento 
da  mãe.  O  sentimento  de  confiança  em  si  e  nos  outros  e  a  capacidade  de  ser 
idêntico e distinto são os resultados esperados desta crise. 
• A  criança  começa  progressivamente  a  explorar  o  mundo,  aprende  que  pode 
dominar o seu corpo e explorá‐lo sem medo. Se o controlo externo é demasiado 
rígido  e  precoce  não  facilitará  um  sentimento  de  auto‐domínio,  o  que  poderá 
resultar  numa  propensão  para  a  dúvida  e  a  vergonha.  Este  segundo  estádio, 
autonomia/vergonha  dúvida  depende necessariamente  da  confiança básica  fir‐

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memente desenvolvida e do estímulo que o meio dá à criança para realizar coisas 
sozinha. 
• Consciente  da  sua  independência,  tenta  imitar  os  adultos,  a  sua  curiosidade 
aumenta,  uma  variedade  de  preocupações  e  interesses  por  questões  da 
sexualidade surgem. O sucesso neste terceiro estádio, iniciativa/culpa parece ser 
fulcral para o desenvolvimento da identidade a medida em que o indivíduo sente 
sem culpabilidade que pode ser o que imagina ser. O balanço adequado entre os 
sentimentos  de  iniciativa  e  de  culpabilidade  é  temperado  pela  consciência  dos 
limites impostos pelas convenções culturais apreendidas no meio social em que 
vive. 
• No  quarto  estádio,  indústria/inferioridade,  a  criança  sente  que  é  competente, 
que é capaz de fazer e fazer bem. Sem iniciativa, autonomia e confiança no meio 
não  é  capaz  de  produzir  coisas  com  perseverança,  de  auto‐reconhecer  as  suas 
capacidades e de se fazer reconhecer pelos outros. Neste estádio, a dificuldade 
pode  estar  relacionada  com  o  insucesso  de  tarefas  anteriores.  O  pânico  de 
perder a mãe, o medo de crescer porque isso implica sair de casa são comuns em 
crianças cujas famílias não as preparam para o mundo exterior. Os professores e 
os pais têm de ser sentidos como alvos de confiança de forma a permitir a sua 
identificação positiva a figuras que fazem e sabem coisas que ela ainda não sabe, 
e  a  não  ter  medo  de  crescer  e  de  se  confrontar  com  o  mundo  exterior  porque 
tem  a  segurança  de  não  estar  só.  O  sentimento  de  incapacidade  não  permite 
criar objectivos de vida possíveis, mas o sentimento de que se pode fazer tudo, 
sem consciência das limitações, pode também levar à incapacidade de realização. 
• Neste processo de aquisição de competências, estas funcionam como peças que 
contribuem  progressivamente  para  a  aquisição  da  identidade.  O  adolescente 
precisa agora de uma moratória que lhe permita a integração dos elementos da 
identidade  já  adquiridos.  É  a  recapitulação  e  redefinição  desses  elementos  que 
caracteriza a crise da adolescência. Se a procura de confiança em si e nos outros 
ainda for importante, o adolescente terá necessidade de procurar elementos que 
proporcionem essa confiança. Mas, se já tiver criada a necessidade de uma defi‐
nição de si pelo que pode ser e querer livremente, então procurará condições e 
oportunidades  para  tomar  decisões  que  vão  no  sentido  dessa  definição.  Por 
outro  lado,  os  pais  e  professores  pressionam  o  indivíduo  para  tomar  decisões, 
particularmente no que respeita às áreas escolar e profissional. É a convergência 
de mudanças internas e de pedidos externos que define a tarefa psicossocial de 
aquisição  da  identidade.  O  adolescente  adquire  um  sentido  subjectivo  de  si, 

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caracterizado  pela  unidade  e  continuidade  que  permite  reconhecer‐se  no  pre‐
sente, no passado e no futuro. A identidade é também um fenómeno interpes‐
soal, na medida em que se baseia na forma como os outros percebem o indivíduo 
e o avaliam. 
Deste modo, a identidade envolve três características fundamentais: 
1. Um sentido de unidade entre diferentes concepções de si próprio nas diferentes 
situações, o que implica a integração de vários papéis. 
2. Um sentido de continuidade desta concepção ao longo do tempo. Quer dizer que 
apesar  das  mudanças  em  aspectos  físicos,  psicológicos  e  sociais,  o  indivíduo 
percebe que é o mesmo. 
3. Um  sentido  de  mutualidade  em  relação  aos  outros,  existindo  uma  interrelação 
entre a percepção de si próprio e a que os outros têm de si. 
Quando  não  adquire  uma  identidade  adequada,  o  adolescente  permanece  num 
estado  de  confusão  de  identidade,  sem  um  sentido  em  relação  ao  passado  e  ao  futuro, 
como um estranho no seu próprio corpo.  
• É  do  desenvolvimento  da  identidade  que  emerge  a  competência  do  indivíduo 
para  estabelecer  relações  de  partilha  e  cooperação.  O  sexto  estádio 
intimidade/isolamento  é  a  tarefa  psicossocial  do  jovem  adulto.  Para  Erikson,  a 
intimidade  é  muito  mais  do  que  a  capacidade  de  realização  sexual.  No  final  da 
adolescência  ou  início  da  idade  adulta,  quando  o  jovem  não  é  capaz  de  ter 
relações íntimas com outros, as suas relações tenderão a ser estereotipadas com 
um profundo sentimento de isolamento. As relações na adolescência têm apenas 
a  função  de  auto‐definição  e  não  de  intimidade.  Muitas  relações  e  mesmo 
casamentos funcionam como pontes para a resolução da identidade, quer como 
forma  de  separação  das  figuras  parentais,  quer  para  resolver  a  sua  identidade 
através do companheiro. 
• O  adulto  é  caracterizado  mais  pela  necessidade  de  dar  e  de  ensinar.  O  sétimo 
estádio,  generatividade/estagnação,  é  definido  pela  necessidade  do  indivíduo 
em orientar a geração seguinte, de investir na sociedade em que está inserido. A 
estagnação surgirá se o indivíduo se focalizar apenas em si próprio. 
• No  último  estádio,  integridade/desespero,  o  indivíduo  tem  necessidade  de 
interioridade, de integrar as imagens do passado através da aceitação do sentido 
vital, tornando‐se mais capaz de compreender os outros. Em muitas situações, a 
sociedade  não  facilita  este  processo  e  a  confrontação  com  a  diminuição  de 
algumas  capacidades  pode  levar  o  indivíduo  não  à  integridade,  mas  ao 
desespero. 

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Daqui resulta que enquanto a infância é o alicerce da construção da identidade, a 
idade  adulta  acrescenta  componentes  e  o  indivíduo  define‐se,  progressivamente,  como 
sendo «aquele que ama, aquilo para que contribui e aquilo que viveu». 
 
A adolescência é, de facto, o período por excelência desta crise determinada de 
múltiplas  formas  pelo  que  ocorreu  antes  e  determinante  em  grande  parte  do  que  vai 
ocorrer  posteriormente.  Falamos  em  crise  no  sentido  de  um  ponto  decisivo  no 
desenvolvimento  e  de  um  período  de  grande  vulnerabilidade.  É  neste  período  que  o 
indivíduo  é  confrontado  com  a  maturação  genital,  a  incerteza  de  papéis  a  assumir  na 
entrada no mundo adulto, a preocupação mórbida com o que possa parecer aos olhos do 
outro  e  a  busca  e  um  novo  sentido  de  unidade  e  de  continuidade.  Além  disso,  tem  de 
enfrentar de nova as crises de anos anteriores, antes de encontrar a sua identidade. 
  A  sociedade  facilita  ao  adolescente  um  período  de  moratória  que  lhe  permite 
lidar com estes problemas. Mas é preciso referir que esta moratória psicossocial pode não 
ser o tempo que o indivíduo necessita para este trabalho de definição da sua identidade. 
Se a pressão social para fazer investimentos é necessária, quando demasiado forte pode 
obrigar  o  adolescente  a  optar  precocemente  ou  a  escolher  o  caminho  da  difusão  da 
identidade. 
  O  período  de  moratória  é  governado  por  instituições  e  estruturas  sociais  que 
podem  facilitar  ou  inibir  a  experimentação  de  papéis.  Erikson  chama  a  estas  estruturas 
moratórias  institucionalizadas que dão ao jovem modos de socialização para o ajudar a 
resolver a sua crise de identidade (rituais, aprendizagens escolares…) 
  A  crise  de  identidade  decorre  então  neste  período  de  moratória  psicossocial  e 
num  contexto  de  moratória  institucionalizada.  Mas  para  que  uma  crise  de  identidade 
ocorra, são necessárias quatro condições: 
1. um certo nível de desenvolvimento intelectual; 
2. que a puberdade tenha ocorrido; 
3. um certo crescimento físico; 
4. pressões culturais que conduzam à reestruturação da identidade. 
  As  características  da  crise,  ou  seja,  o  seu  aparecimento,  duração  e  intensidade 
variam com factores individuais, sociais, históricos e económicos.  
Nas  sociedades  ocidentais  contemporâneas  industrializadas,  este  período  de 
moratória é cada vez mais longo, tornando o adolescente mais dependente durante um 
período de tempo mais alargado. Este prolongamento deve‐se, em parte, à necessidade 
de realizar uma aprendizagem mais especializada para a sobrevivência num mundo tecno‐
lógico e de retardar a entrada na vida profissional e no mundo dos adultos. Assim, a idade 

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em que os adolescentes se tornam adultos e assumem papéis de adulto independente e 
autónomo á cada vez mais tardio. 
A  confusão  da  identidade  não  sendo  anormal  por  si  só.  Para  Erikson,  grande 
parte dos comportamentos característicos de uma confusão da identidade não são mais 
do  que  manifestações  da  incapacidade  do  indivíduo  de  mobilizar  a  energia  interior  e  a 
sociedade  para  a  construção  da  sua  identidade.  A  confusão  da  identidade  pode  ser 
verificada  na  sobreposição  de  imagens  de  si  próprio,  de  papéis  e  oportunidades 
contraditórias. Enquanto o processo de aquisição da identidade não está completo, a crise 
e a confusão permanecem. 
 
Os estatutos da identidade do Eu 
  Apoiado  na  perspectiva  de  Erikson,  Marcia  (1966,  1980,  1986)  verificou  a 
necessidade de trabalhar critérios psicossociais para determinar momentos ou modos de 
aquisição  da  identidade.  Neste  sentido,  postulou  a  existência  de  quatro  estatutos  de 
identidade  que  representam  estilos  diferentes  de  lidar  com  esta  tarefa  psicossocial.  Os 
quatro  estatutos  são  definidos  pela  presença  ou  ausência  de  exploração  e  de 
investimento  em  áreas  específicas:  profissional,  ideológica  (religiosa  e  política) 
interpessoal/sexual (atitudes sobre os papéis sexuais e sobre as relações). 
  A  dimensão  exploração  refere‐se  ao  questionar  activo  para  tomar  decisões  e 
atingir  objectivos.  Um  indivíduo  em  exploração  evidencia  uma  actividade  dirigida  ao 
recolher a informação necessária à tomada de decisão.  
• Um indivíduo encontra‐se em exploração quando sente necessidade de trabalhar 
questões  referentes  à  sua  identidade  com  o  objectivo  de  tomar  decisões  e  se 
empenha na análise das várias alternativas. No início da exploração, a excitação, 
antecipação  e  curiosidade  caracterizam  o  estado  emocional  da  pessoa.  Com  o 
decorrer  da  crise  vive  uma  sensação  de  desconforto  pela  indefinição  dos  seus 
objectivos  e  valores  o  que  pode  provocar  sentimentos  de  frustração,  intolerân‐
cia, ambiguidade e ansiedade. A intensidade destas emoções varia de indivíduo 
para  indivíduo.  Dado  o  desconforto  há  um  desejo  iminente  de  fazer  escolhas. 
Continuar indefinidamente na ambiguidade faz crer que as alternativas não estão 
a ser consideradas num sentido real e activo. Contudo, a escolha nem sempre é 
viável, as respostas podem não ser encontradas e surgir a desistência. 
• Após  a  exploração  o  indivíduo  passou  por  uma  fase  de  valorização  activa  de 
vários elementos de identidade, mas já a ultrapassou com sucesso se daí emergiu 
um  firme  sentido  de  direcção  para  o  futuro,  ou  com  insucesso,  se  a  tarefa  foi 
abandonada sem ter atingido uma conclusão significativa. 

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• A  ausência  de  exploração  significa  que  o  indivíduo  não  sente  necessidade  de 
escolher  objectivos,  crenças,  valores  e  alternativas,  quer  porque  já  estão 
definidos  por  outrem  e  foram  incondicionalmente  aceites,  quer  por  falta  de 
estímulos que permitam encontrar e ponderar outros. 
  A dimensão investimento implica, por um lado, escolhas relativamente firmes e, 
por  outro,  acções  dirigidas  para  as  implementar,  tendo  assim  aspectos  internos  e 
externos.  Para  se  dizer  que  há  investimentos  não  basta  a  verbalização  de  ideias 
socialmente apropriadas: é preciso que haja uma influência directa na vida do indivíduo e 
uma preparação para papéis futuros consistentes com objectivos e valores anteriormente 
definidos.  Esta  dimensão  não  se  refere  apenas  ao  aqui  e  agora,  mas  fornece  um 
mecanismo  de  integração  do  passado  com  o  presente  e  do  presente  com  o  futuro.  Isto 
não significa que os vários elementos da identidade continuem imutáveis, mas que existe 
um sentido de continuidade e projecção no futuro. 
  Em  função  destas  dimensões  (exploração  e  investimento)  Marcia  define  quatro 
modos de estar perante a tarefa da identidade: 
1. os  indivíduos  não  apresentam  qualquer  investimento,  nem  passaram  por 
qualquer  período  de  exploração  ou  se  alguma  das  questões  foram  levantadas, 
não  foram  capazes  de  as  resolver  e,  por  isso,  abandonaram‐nas;  nestes 
indivíduos  encontram‐se  diferentes  padrões  emocionais  desde  a  passividade  e 
apatia  à  agressividade  não  focalizada;  normalmente  respondem  às  pressões 
externas  pelo  caminho  de  menor  resistência,  com  aceitação  e  rejeição  das 
normas  sociais  convencionais  sem  apresentar  formas  alternativas;  estão  em 
difusão da identidade; 
2. os indivíduos que não passaram nem estão a passar um período de exploração, 
mas  que,  no  entanto,  fazem  investimentos  que  normalmente  são  o  reflexo  de 
escolhas  e projectos  de  outras  figuras  significativas  ou de  autoridade;  os  indiví‐
duos aceitam sem questionar o seu leque limitado de alternativas uma vez que 
procurar outras criaria uma situação de conflito com essas figuras de identifica‐
ção; a sua identidade é como outorgada pelas pessoas significativas; estes sujei‐
tos  levantam  barreiras  à  comunicação  com  o  mundo  exterior,  escolhem,  por 
defesa ou por impossibilidade, a segurança do não confronto com outras alterna‐
tivas e, normalmente são vistos como imperturbáveis, dogmáticos, autoritários e 
rígidos em relação às suas atitudes e intolerantes perante a posição dos outros; 
3. os indivíduo que estão a vivenciar um período de exploração de alternativas para 
tomar  decisões;  são  sensíveis,  ansiosos,  flexíveis,  vacilantes,  emocionalmente 
instáveis, respondem alternadamente com optimismo e pessimismo, evidenciam 

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frustração e incerteza e manifestam uma grande necessidade de ultrapassar esta 
situação de moratória; 
4. os  indivíduos  que  passaram  por  um  período  de  exploração  e  realizaram 
investimentos relativamente firmes, construindo a sua identidade pessoal; estes 
indivíduos  reflectem  sentimentos  de  confiança,  estabilidade,  optimismo  em 
relação  ao  futuro  e  consciência  das  dificuldades  de  implementação  dos 
elementos de identidade escolhidos. 
Esta  classificação  reflecte  formas  de  resolução  da  identidade  e, 
simultaneamente,  uma  sequência  de  desenvolvimento.  Poderíamos  dizer  que,  num 
primeiro momento, todos os indivíduos passam por um período de difusão de identidade 
e  todos  tiveram,  em  determinado  momento,  investimentos  que  lhe  foram  outorgados 
numa  ou  outra  área  de  vida.  Os  dois  modos  ou  momentos  ideais  em  termos  de 
desenvolvimento são a exploração e a construção pessoal da identidade. No entanto, um 
indivíduo com uma identidade outorgada pode estar bem adaptado no contexto em que 
está inserido. 
Archer e Waterman afirmam que, embora por definição os indivíduos em difusão 
não mostrem investimentos e não estejam a trabalhar questões de identidade, se podem 
encontrar  diferentes  grupos  se  analisarmos  as  suas  motivações  e  posições  perante  a 
tarefa da identidade. 
• Um  primeiro  grupo  de  adolescentes  em  difusão  manifesta  certas  semelhanças 
com os que se encontram em exploração; foge ou evita investimentos, insiste em 
não  investir;  provavelmente a  motivação  para  este  tipo de  comportamento  é  o 
medo de que qualquer investimento mais permanente seja insatisfatório. 
• Um  segundo  grupo  caracteriza  os  adolescentes  que,  embora  conscientes  da 
necessidade  de  trabalhar  questões  relacionadas  com  a  identidade,  não  sente 
urgência  em  iniciar  a  tarefa;  como  se,  na  ausência  de  pressões  externas,  adias‐
sem em permanência a elaboração do projecto; o desenvolvimento psicossocial 
nos estádios anteriores foi bem sucedido, o que faz pensar que, mais cedo o mais 
tarde, esta situação será ultrapassada. 
• Um terceiro grupo exprime um desinteresse total em fazer investimentos, quer 
agora  quer  no  futuro.  Isto  parece  mascarar  uma  insegurança  em  relação  à 
capacidade  de  realização  bem  sucedida  desta  tarefa.  Embora  possam  existir 
problemas em estádios anteriores, parece haver uma relação especial com a falta 
de  confiança  em  si  e  nos  outros;  a  apatia  é  a  única  resposta  possível  para  a 
manutenção da estima de si próprio. 

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• Adolescentes  há  que  não  estando  interessados  em  definir  objectivos,  valores  e 
crenças,  quer  agora  quer  no  futuro,  se  distinguem  do  grupo  anterior  pela 
expressão  intensa  da  agressividade  em  relação  à  tarefa  da  identidade.  Esta 
agressividade é exteriorizada e dirigida contra os outros que possam pressionar a 
criação  de  investimentos.  Estes  indivíduos  parecem  ter  tido  dificuldades 
fundamentalmente no estádio da autonomia/vergonha, pois é neste estádio que 
o negativismo surge como resposta à autoridade parental. 
• Enquanto estes adolescentes expressam a sua difusão de identidade pela apatia 
ou  agressividade,  são no  entanto  capazes de  encontrar um caminho, ainda  que 
marginal,  e  não  apresentam  problemas  evidentes.  No  entanto,  outros  há  que 
apresentam  desequilíbrios  que  não  são  apenas  uma  resposta  às  dificuldades 
experimentadas  na  tarefa  de  formação  da  identidade,  mas  o  produto  de 
inúmeras circunstâncias. 
• Um  último  grupo  mantém  certas  semelhanças  com  a  identidade  outorgada  e 
caracteriza‐se  por  uma  ligação  marginal  a  elementos  de  identidade.  Fazem 
investimentos em diferentes domínios da identidade, mas falta‐lhe investimento 
suficiente nas escolhas. Podem possuir potencial para responder às expectativas 
do  meio  e,  então,  as  suas  ideias  são  suficientemente  boas  até  qualquer  coisa 
melhor surgir. Ou, se tiverem tido dificuldades no estádio da iniciativa/culpa, em 
vez  de  escolherem  o  caminho  para  a  sua  identidade,  depositam  nos  outros  o 
sentido da sua direcção. São extremamente influenciáveis e sem um verdadeiro 
significado da vida. 
 
Factores de desenvolvimento da identidade 
  Podemos  definir  três  categorias  gerais  de  possíveis  influências  no 
desenvolvimento da identidade: individuais, interpessoais e sociais. 
 
Individuais  
  A  maturidade  corporal  precoce  parece  ter  consequências  na  formação  e  uma 
identidade prematura na medida em que estes adolescentes têm uma aparência de mais 
velhos  em  relação  aos  seus  companheiros.  Mudanças  de  altura  e  de  peso  e  o 
aparecimento  de  características  sexuais  secundárias  têm  implicações  ao  nível  do  auto‐
conceito, isto é, na forma como os adolescentes se vêem e na forma como sentem que os 
outros  os  vêem.  As  mudanças  físicas podem  afectar a  auto‐estima  o  que  será  reforçado 
pela percepção dos outros como negativa. 

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  A  adolescência  é  marcada  pelo  pensamento  abstracto  que  permite  considerar 
possibilidades que não estão imediatamente presentes bem como diferentes hipóteses de 
escolhas  viáveis  para  atingir  os  objectivos.  O  que  facilita  aproximar  o  ideal  do  Eu  do  Eu 
real. O pensamento abstracto permite desenvolver e testar hipóteses, ponderar sobre o 
possível e o impossível criando o sentimento de ser mais criativo e ter mais controlo na 
sua  vida.  Permite,  ainda,  desenvolver  estratégias  para  a  resolução  dos  seus  problemas. 
Isto  envolve  planificação,  definição  do  problema,  desenvolvimento  de  estratégias  e 
capacidades  de  as  implementar  e,  finalmente,  tentar  outras  alternativas  caso  as 
escolhidas falhem. Esta capacidade dá ao adolescente a possibilidade de se assumir como 
aquele que controla a sua própria vida. 
  Parece  plausível  prever  uma  relação  directa  entre  a  aquisição  das  operações 
formais  e  a  construção  da  identidade.  No  entanto,  enquanto  alguns  autores  verificaram 
que  os  adolescentes  não  parecem  usar  o  pensamento  formal  para  resolver  a  sua 
identidade, outros constataram a existência de uma relação entre pensamento formal e 
identidade. Rowe e Marcia (1980) referem que as operações formais permitem mas não 
garantem níveis superiores de identidade. 
 
Interpessoais 
  Ao longo do ciclo de vida, o indivíduo tem, sucessivamente, diferentes formas de 
compreender  o  mundo  que  resultam  da  sua  interacção  com  o  meio  social  e  físico.  É  na 
confrontação  progressiva  com  diferentes  realidades  sociais  que  o  indivíduo  tem 
necessidade  de  escolher  novas  formas  de  perspectivar  o  mundo  e  de  interpretar  novas 
experiências. Este conflito produzido na área interpessoal encoraja o indivíduo a tomar a 
perspectiva dos outros e, portanto, a alargar o seu leque de referências e pontos de vista. 
Contextos de interacção por excelência são a família e escola e, por isso, têm sido objecto 
de estudos que analisam a sua influência no desenvolvimento da identidade. 
  O impacto da família no desenvolvimento parece estar relacionado com o tipo de 
interacção  familiar  encorajadora  da  compreensão  dos  pontos  de  vista  dos  outros.  Os 
estudos  realizados  constatam  que  uma  ligação  emocional  (atitudes  de  apoio,  coesão  e 
aceitação)  e  a  individualidade  (atitudes  de  desacordo)  na  interacção  familiar  estão  rela‐
cionadas com o desenvolvimento da identidade. A ligação emocional, quando adequada, 
parece estar relacionada positivamente com o desenvolvimento da identidade enquanto 
que níveis elevados de aceitação e abertura parecem inibir a exploração. Os adolescentes 
que  estão  em  níveis  superiores  de  identidade  percebem  a  interacção  familiar  como  um 
envolvimento  positivo  moderado  e  activo  em  que  os  membros  da  família  são  livres  de 
estar em desacordo. Assim, níveis moderados de conflito e aceitação parecem ser as con‐

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dições  necessárias  para  que  o  adolescente  possa  explorar  alternativas  e  desenvolver  a 
capacidade de se colocar na perspectiva do outro. 
  Por sua vez, os adolescentes em difusão de identidade parecem ter uma ligação 
emocional aos pais caracterizada pela insegurança e conflito, são menos independentes e 
sentem‐se rejeitados pelos pais que se mostram, inactivos, ausentes e pouco envolvidos 
emocional. 
  Finalmente,  os  adolescentes  com  uma  identidade  outorgada  pertencem  a 
famílias cujos pais são muito possessivos, dominadores e desencorajadores da expressão 
afectiva.  Estas  famílias  caracterizam‐se  ainda  por  uma  posição  tradicionalista  no  que  se 
refere aos papéis sexuais. 
  Parece  então  que  as  experiências  familiares  têm  um  papel  importante  na 
formação  da  identidade.  No  entanto,  não  podemos  interpretar  estes  resultados  como 
uma  relação  de  causa  e  efeito,  mas  como  uma  correlação.  Ou  seja,  sabemos  que  um 
número importante de adolescentes com uma identidade outorgada pertencem a famílias 
autoritárias  e  tradicionais,  mas  não  podemos  dizer  que  estes  aspectos da  família  são  os 
causadores deste estilo de identidade. 
  A escola não é apenas uma instituição social com funções gerais de socialização e 
de instrução, mas também como um meio de desenvolvimento do indivíduo. No período 
escolar há três variáveis importantes para o desenvolvimento da identidade: a confiança 
no apoio parental, o sentido de indústria e a auto‐reflexão sobre o seu futuro. 
• A  criança  tem  comportamentos  de  exploração  se  sente  uma  ligação  forte  e 
segura  com  os  pais.  Também  o  adolescente  tem  necessidade  de  sentir  o  apoio 
parental para experimentar autonomia e individuação. A sua segurança depende 
fortemente  da  convergência  entre  a  família  e  o  desconhecido  (a  escola)  e  da 
confluência e continuidade destes laços. 
• O sentido da indústria é desenvolvido pelo indivíduo no contexto escolar, o que 
requer  uma  avaliação  de  si  como  pessoa  trabalhadora.  Competência  e  mestria 
são garantes da estima de si próprio ao longo do ciclo vital e a escola apela espe‐
cialmente para estas características. Será difícil para um adolescente investir na 
área  profissional  se  este  sentido  de  competência  não  existe.  A  escola  tem  aqui 
uma função importante criando condições de exploração e acção e favorecendo 
feedback aos seus alunos. 
• A auto‐reflexão sobre o futuro não significa tomar decisões, mas a capacidade de 
falar sobre si próprio, de interpretar, de construir hipóteses de alternativas futu‐
ras. Aqui também a escola tem um papel importante favorecendo imagens de ida 

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como  homem  e  como  mulher,  facilitando  possibilidades  de  analisar  diferentes 
papéis no sentido de desenvolver uma perspectiva social. 
  Neste  período  etário,  a  escola  parece  então  ter  uma  função  importante  para  o 
desenvolvimento da identidade. Muitos estudos sugerem que determinadas práticas edu‐
cativas  são  promotoras  da  construção  da  identidade.  A  formação  escolar  deve  ser  uma 
experiência com significado pessoal, o que envolve componentes afectivas e cognitivas. A 
escola deve criar condições para que a curiosidade não seja inibida, mas antes incentiva‐
da.  Mas  mais  importante  do  que  o  encorajamento  à  exploração  é  a  permissão  desta.  A 
outra dimensão do processo de desenvolvimento da identidade é o investimento, o que 
envolve riscos. O adolescente precisa de sentir apoio que lhe dê a segurança de que um 
fracasso pode ser ultrapassado. 
  O desenvolvimento da identidade passa por um período de exploração antes do 
investimento. A dependência do professor e do livro não favorece o desenvolvimento da 
autonomia, emocional e instrumental do estudante e, consequentemente, um sentido de 
competência, auto‐estima e identidade. 
  A  independência  emocional  é  facilitada  pelas  oportunidades  de  confronto  de 
trabalho e de saber com outros adultos que não são os seus próprios pais. Estas oportuni‐
dades  devem  ser  oferecidas  num  contexto  relacional  de  respeito  mútuo  o  que  permite 
desenvolver um sentido de interdependência e reciprocidade. Pelo contrário, quando os 
currículos são rígidos, quando a aprendizagem requer apenas a memorização da informa‐
ção e quando o sucesso depende do conformismo com o sistema, a independência emo‐
cional dificilmente acontece. 
  Por sua vez, a independência  instrumental é conseguida através do sucesso do 
indivíduo na realização de uma variedade de tarefas e problemas, pela aquisição da mobi‐
lidade suficiente para procurar e usar diferentes fontes. A valorização da mera «aprendi‐
zagem» da informação não dá oportunidade de experimentação de diferentes realidades. 
  Quando o produto é o mais valorizado, a competição entre alunos torna‐se fre‐
quente e as relações interpessoais são afectadas. Pelo contrário, quando a cooperação é 
estimulada,  então  a  diversidade  de  competências,  de  perspectivas  e  de  informações, 
variáveis importantes para o desenvolvimento da identidade, facilitam o desenvolvimento 
de  competências  de  comunicação,  de  perspectiva  social,  de  cooperação,  de  partilha  de 
objectivos e, finalmente, de um sentido de competência e auto‐estima. 
  Em resumo, podemos dizer que o sentido de competência, autonomia e identi‐
dade se desenvolve: 

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• Ao  nível  curricular,  se  a  experiência  responsabilizada  e  as  tarefas  significativas 
são valorizadas e as possibilidades de áreas de estudo e as fontes de informação 
são múltiplas. 
• Ao nível das práticas pedagógicas, se não são centradas no professor, se os con‐
teúdos desenvolvem diferentes valores, crenças e ideologias e se as turmas fun‐
cionam como grupos de discussão, entre alunos e entre alunos e professores, em 
que as discussões de experiências pessoais, sentimentos e comportamentos têm 
um espaço de análise. 
• Ao nível da avaliação, se a pressão para a aquisição de conhecimentos académi‐
cos é adequada, a realização bem sucedida de tarefas específicas é recompensa‐
da e o feedback for constante e descritivo. 
 
Sociais 
  As normas sociais podem facilitar ou não a crise de identidade. Parece evidente 
que quanto mais institucionalizada for a moratória no sentido da preparação instrumental 
para papéis adultos, maior facilidade haverá na resolução da crise. No entanto, se esta for 
demasiado simplificada a personalidade adulta poderá vir a reter características da infân‐
cia. Neste caso, as crises psicossociais posteriores serão mais problemáticas. Pelo contrá‐
rio, um contexto social não estruturado pode levar a uma crise de identidade mais agra‐
vada. 
  A hierarquia social, por sua vez, está inerente à possibilidade ou não de experi‐
mentação de papéis que actualizem as potencialidades de um indivíduo, o que, como já 
foi referido, é um factor importante para o desenvolvimento a identidade, assim como a 
valorização de determinadas características e a desvalorização de outras que interferem 
na imagem que o indivíduo tem de si em comparação com os outros (raça, género, reli‐
gião, classe social). 
  Finalmente a importância para a formação da identidade de variáveis relaciona‐
das  com  um  determinado  momento  histórico  (guerra,  recessão  económica,  epidemia) 
parecem evidentes. Não é possível separar o desenvolvimento pessoal da transformação 
comunitária,  assim  como  não  poderíamos  separar  a  crise  de  identidade  individual  do 
desenvolvimento  histórico  porque  ambos  se  definem  mutuamente  e  estão  relacionados 
entre si. 
Adaptado de Costa, M. E., «Desenvolvimento da Identidade».  
In Paiva‐Campos, B., Psicologia do Desenvolvimento e Educação de Jovens, 1990 

 
 
 

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