Perturbação bipolar, será a vida que nos leva a esse exercício
circular dos opostos? Porque é que alguns de nós não somos
capazes de travar essa guerra e mantermo-nos lúcidos?
A afectividade é um sector fundamental de toda a vida psicológica humana. As
emoções e os sentimentos são o regente primordial da acção do Homem, desenrolando-se num duplo plano: externamente, sendo muitas vezes observáveis e traduzindo-se em comportamentos; internamente assumindo também um vivenciar muito próprio, influenciando todo o mundo psicológico do indivíduo .É na articulação desta duplicidade, que podemos encontrar uma afectividade patológica. De facto, estão actualmente categorizadas diversas Perturbações da Afectividade ou do Humor (PAH) sendo uma delas a Perturbação Bipolar. Sendo uma perturbação altamente lesiva e incapacitante para o individuo, afectando-o quer a nível social quer físico e psicológico. O nome Perturbação Bipolar é uma expressão recente fixada pelos norte- americanos até aí foi conhecida por “folie circulaire” e mais tarde depois de Fabret ter demonstrado que os acessos de mania e melancolia, até então considerados como duas doenças distintas, passíveis de vitimar um mesmo indivíduo, correspondiam na verdade a duas fases da evolução cíclica de uma mesma doença ,Emil Kraepelin chamou-lhe psicose maníaco-depressiva. O início deste transtorno acontece geralmente por volta dos 20 ou 30 anos mas também pode começar aos 70. O inicio tanto pode ser pela fase maníaca, iniciando-se gradualmente ao longo de semanas, meses ou abruptamente em poucos dias e já com sintomas psicóticos o que muitas vezes confunde com” síndromes psicóticas.” Além destes quadros depressivos e maníacos, há também os quadros mistos (sintomas depressivos simultâneos aos maníacos) O que confunde muitas vezes os médicos retardando o diagnóstico da fase em actividade. Normalmente aceitam-se dois tipos de transtorno bipolar: o tipo I e o tipo II. O tipo I é a forma clássica em que o indivíduo apresenta episódios de mania alternados com os depressivos. As fases de mania não precisam necessariamente de serem seguidas pelas depressivas, nem o contrário. Geralmente acontece que um individuo tem mais crises de um tipo e poucas de outro. O tipo II caracteriza-se por não apresentar episódios de mania mas de hipomania com depressão. A fase maníaca leva uma ou duas semanas para começar e quando não é tratado pode demorar meses. O estado do humor está elevado o que significa uma alegria contagiante ou uma irritação agressiva. Em conjunto com este estado aparecem outros sintomas como sentimentos de grandiosidade que podem chegar a manifestações delirantes de grandeza, considerando-se uma pessoa especial, dotada de poderes especiais ou encarnando personagens especiais. A nível físico também se dá um aumento da actividade motora apresentando grande vigor físico. Ficam com uma enorme hiperactividade não conseguindo ficar sentados ou parados mais do que alguns minutos ou relaxar. Sexualmente ficam muito desinibidos e mesmo promíscuos. O sentido de perigo fica comprometido e podem envolver-se mesmo em actividades que apresentam risco para a sua integridade física. Os pensamentos correm de forma incontrolável o que se traduz em confusão de ideias não chegando a completar temas. A maneira de falar geralmente dá-se em tom elevado e cantar é um gesto frequente nestes pacientes. A necessidade de sono nesta fase é menor, com poucas horas o paciente restabelece-se e fica durante todo o dia e quase toda a noite em hiperactividade. Mesmo estando alegres podem acontecer explosões de raiva provocada por algum motivo externo, mas tal como aparece, desaparece. Na fase depressiva acontece o oposto da fase maníaca. Aqui o paciente fica com sentimentos irrealistas de tristeza, desespero e auto estima baixa. O paciente cansa-se à toa, tem pouca energia para as suas actividades habituais, não se interessa pelo que costumava gostar ou ter prazer. Também tem dificuldades para dormir, os pensamentos são negativos, sempre em torno da morte ou doença. O apetite fica inibido e pode ter perda de peso significativa. A memória também fica prejudicada e apresenta grande dificuldade em concentrar-se. Entre uma fase e outra a pessoa pode ser normal, tendo uma vida como outra pessoa qualquer; outras pessoas podem apresentar leves sintomas entre as fases, não alcançando uma recuperação plena. Há também pacientes embora uma minoria que não recuperam, tornando-se incapazes de levar uma vida normal e independente. A denominação Transtorno Afectivo Bipolar será adequada? Até certo ponto há autores que acham que sim, embora pensem que aquele nome implica que os pacientes tenham as duas fases, e isso nem sempre é observado. Há pacientes que só apresentam fases de mania, exaltação de humor, e que mesmo assim são diagnosticados como bipolares. E mania em psiquiatria significa apenas exaltação de humor, estado patológico de exaltação injustificada. Qual é a causa da doença? Ninguém sabe ao certo o que se pensa é que há factores que influenciam ou precipitam o seu surgimento, como parentes que apresentam esse problema, traumas, incidentes ou acontecimentos fortes como mudanças, troca de emprego, fim de casamento, morte de pessoa querida. Sabe-se por estudos efectuados que normalmente em 80% a 90% dos casos os pacientes apresentam algum parente na família com transtorno bipolar. Li há dias num artigo de revista que talvez sejamos todos um pouco bipolares . Talvez a bipolaridade seja uma dimensão de nós mesmos que no fundo acarinhamos. Onde gostamos de ir regularmente. Onde nos sentimos vivos depois de nos sentirmos mortos. Será?