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yp DM giw/ M4: ? INSTITUTO SUPERIOR DE PSICOLOGIA APLICADA. MESTRADO EM PSICOLOGIA EDUCACIONAL TESE DE MESTRADO Os Problemas de Adicio e Subtraccio nos Manuais Escolares do 2° Ano de Matemitica Maria Jodo Silva N° 13471 ORIENTADOR: Ana Cristina Silva Instituto Superior de Psicologia Aplicada SEMINARIO DIRIGIDO POR: Margarida Alves Martins Instituto Superior de Psicologia Aplicada 2004/2006 “Para um espirito cientifico todo conhectmento é uma resposta a uma pergunta. Sendo existir pergunta ndo pode haver conhecimenio cientifico. ‘Nada vem sozinho, nada é dado. Tudo é construido.” Bachelard, citado por Charnay (1996) iit Agradecimentos A Professora Doutora Ana Cristina Silva, por estar sempre presente, por me ter ajudado a crescer ao longo destes tiltimos anos, pela exigéncia ¢ reflexdo, e sobreiudo, pela amizade e carinho. Obrigado por tudo. ‘A Professora Doutora Margarida Alves Martins, pela disponibilidade, pelas sugestoes ¢ pelo incentivo. A Professora Dowtora Gloria Ramatho, pela sugestio do tema, foi assim que tudo comegou.. ‘Aos meus pais, irmd e av6, por estarem sempre presentes € por terem contribuido para ser 0 que sou! ‘Ao Marco, por todo o amor, carinho, apoio ¢ por seres aquilo que és. Por seres incansavel e estares sempre ao meu lado. Por acordares a pensar se faria sentido ou nio analisar os dados daquela forma. Por tudo isto e muito mais. ‘Ao Pedro, por toda a disponibilidade, na recolha ¢ na anilise dos dados, por seres um colega e amigo sempre presente. A Fétima Silva, por me teres criado 0 gosto pela educagdo, pela disponibilidade na recolha ena andlise dos dados. Sem ti, tudo teria sido muito mais dificil. A Inés, pela disponibilidade em rever o texto e por teres ajudado a melhoré-o, Vv A Sofia, por todos os fogos que sempre ajudaste a apagar e pela tua amizade. A Patricia, pelo apoio, pela disponibilidade do “lapis” sofisticado, por perguntares sempre “Como estas?”, pelo teu beijinho de boa noite, por seres a amiga que és. ‘A todos os meus outros amigos, por estarem sempre la, cada um a sua maneira, ¢ pelo vosso carinho. As Professoras, pela disponibilidade e colaboragiio, sem isso nada disto seria possivel. ‘Aos Alunos, por me fascinarem com o seu mundo e me ensinarem sobre o modo como pensam e aprendem a Matematica. FE... a quem jé nfio estando, sempre estara Resumo © conhecimento que a crianga vai adquirindo resulta das suas experiéncias quotidianas, do conjunto de situagdes que Ihes vai proporcionando esquemas de pensamento acerca do mundo que a rodeia. Perante situagdes que ela nao consegue explicar ou resolver, ela vai colocando hipéteses © explorando diversas formas de resolugiio. No caso dos conhecimentos matemiticos, esta situagio nfo é diferente, A crianga vai construindo teoremas-em-acgiio de modo a resolver situag: problemiticas localizadas, dando inicio fa elaboragio de nog6es mateméticas, como representar, relacionar e operar com quantidades, por exemplo, Com a entrada para a escola, a crianga vai sendo confrontada com um saber institucional “decretado” ¢ transmitido por alguém mais competente. Muitas vezes, acontece, as criangas tentarem adaptar os seus esquemas ao conhecimento transmitido, o que pode originar dificuldades na aprendizagem. E através da confrontago com problemas para (os quais nao tem uma solugfio e que nao servem as ideias que foi construindo, que a crianga vai alterando as suas concepgdes ¢ evoluindo para teoremas mais abstractos & adequados. Perante a resolugo de diferentes categorias de problemas, nos quais se fazem variar as relagdes seméinticas, a posig&o da incégnita, a posigdo da pergunta a investigar, entre outros aspectos, a crianga domina diferentes propriedades do mesmo conceito. No caso deste estudo, os conceitos a dominar so 0 de adigo e o de subtracefio. E também documentado, por vi investigagées acerca das praticas pedagégicas levadas a cabo dentro da sala de aula, que os manuais escolares desempenham um papel fundamental por vezes orientador, destas priticas e do conhecimento a adquirir pelos alunos. Centrando-se nestas perspectivas, 0 presente estudo pretendeu analisar os manuais escolares do 2° ano de escolaridade, da disciplina de Matematica, mais utilizados pelas escolas portuguesas, em relago as categorias de problemas aditivos ¢ subtractivos que apresentavam. Estabelecendo-se duas andlises distintas: por um lado, comparar os manuais entre si, no que respeita, A proporgao de problemas aditivos subiractivos em relagao ao nimero de exercicios aditivos e subtractivos e as categorias de problemas aditivos e subtractivos que apresentavam (analisados segundo a tipologia de problemas de Vergnaud, 1982); por outro, averiguar se as diferengas entre os manuais se reflectiam em diferengas significativas nos desempenhos das criangas que tinham o ensino da ‘Matematica, baseada naqueles manuais. ‘A amostra do estudo compreendeu um total de 60 criangas, do 2° ano de escolaridade, da regitio de Lisboa, com uma média de idade de 7 anos € 11 meses, divididas por trés ‘grupos, consoante os manuais em anilise: Amiguinhos, Fio-de-Prumo e Eu e 0 Bambi. De modo a homogeneizar os grupos, consideraram-se os resultados das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven. ‘A anélise feita aos manuais consistiu na contagem do nimero de exercicios ¢ de problemas aditivos e subtractivos, existentes nos manuals em estudo, e na categorizagio desses problemas, baseada na tipologia de problemas de Vergnaud (1982). Para alguns dos manuais, foi ainda averiguada a posigo da incégnita para todas as categorias de problemas. Os desempenhos dos participantes foram analisados segundo 0 processo de resolugio de quatro categorias diferentes de problemas aditivos e subtractivos, a saber: composigtio de duas medidas (categoria 1), transformagdo unindo duas medidas (categoria I), relagdo estdtica entre duas medidas (categoria IN), e composigito de duas transformagées (categoria IV) (Vergnaud, 1982). A andlise estatistica efectuada (teste paramétrico tstudent) e para um nivel de significdneia de a= 0,05, confirmou a existéncia de diferengas significativas no desempenho dos participantes de cada grupo, na resoluc&o de problemas de duas categoria de problemas (composi¢iio entre duas medidas e relagdo estitica entre duas medidas), em fungio da posi¢&o da inoégnita. val Contudo, a andlise estatistica efectuada para avaliar os desempenhos dos participantes na resolugo de problemas de adigdo e de subtracgiio, (teste paramétrico ANOVA, para ‘uma nivel de significancia de = 0.05). revela que nao existem diferencas significativas entre os grupos definidos pelo manual. As grandes ilagdes retiradas do estudo sio as seguintes: a marcada predomindncia de exercicios de célculo em detrimento de problemas aditivos ¢ subiractivos; também, a predomindncia de uma determinada categoria de problemas, nos manuais analisados; ¢ a auséncia de diferengas significativas no desempenho dos diferentes grupos nas varias categorias de problemas, mas a presenga de diferengas significativas na resolugto de problemas de cada categoria, em fungdo da posigio da incégnita. indice Introdugio Os Manuais Como Tradugiio do Curricula Definigéio e Fungdes do Manual Escolar: Os Manuais ¢ as Praticas Pedagégicas. Avaliagado de Manuais Escolares ‘Manuais de Matemitica. Resolugaio de Problemas Classificagao de Problemas Estratégias de Resolugiio Objectivos da Investigagao - 2 ‘Método Participantes .... Matrizes Progressivas Coloridas de Raven Instrumentos Andlise dos Manuais Avaliagéto dos Desempenhos das Criangas ... Prova de Resolugiio de Problemas de Adigdo e Subtraceao Procedimentos. Andlise dos Manuais Escolares Avaliagdo do Nivel Cognitivo dos Participantes vill w13 16 18 26 30 37 54 62 64 64 66 69 69 14 4 16 16 1 “Avaliagao do Desempenho dos Participantes na Resolugtio de Problemas Aditivos e Subtractivos. 8 Resultados Caracterizagéio dos Manuais Andlise dos Cinco Manuais mais Escothidos pelas Escolas Portuguesas. Andlise dos Problemas em Relagiio a Natureza da Incégnita Manual Amiguinhos Manual Fio-de-Prumo Manual Eu ¢ 0 Bambi Aniilise dos Desempenhos dos Participantes Resultados da Prova de Resolueito de Problemas de Adicao e de Subtraceéo Problemas de Composi¢do de Duas Medidas (Categoria 1) Problemas de Transformagito que Une Duas Medidas (Categoria I) Problemas de Relagéio Estatica entre Duas Medidas (Categoria I1l). Problemas de Composicdo de Duas Transformacdes (Categoria IV)... Discussio Concluses Referéncias Bibliograficas Anexos Anexo A - Comparagito das Classificages de Problemas Anexo B - Outup com a Caracterizagéio dos Grupos. Anexo C - Prova de Resolueiio de Problemas Aditivos e Subtractivos. Anexo D - Folha de Resposta das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven. Anexo BE - Folha de Resposta ét Prova de Resolugao de Problemas Aditivos € Subtractivos. Anexo F - Output dos Resultados Obtidos na Prova de Resolugao de Problemas Aditivos e Subtractivos 79 19 80 84 85 86 87 87 88 89 91 92 106 109 116 7 119 322 125 127 132 Anexo G - Outup dos Resultados Obtidos na Categoria de Problemas de Composi¢ao de Duas Medidas (Categoria I) 134 Anexo H - Output dos Resultados Obtidos na Categoria de Problemas de Composigéio de Duas Medidas, em Relagito a Natureza da Incégnita.... se 38 “Anexo I- Output dos Resultados Obtidos na Categoria de Problemas de Transformagio Unindo Duas Medidas (Categoria Il)... 142 Anexo J - Output dos Resultados Obtidos na Categoria de Problemas de ‘Transformagdo Unindo Duas Medidas, em Relagito & Natureza da Incégnita.......146 Anexo L - Output dos Resultados Obtidos na Categoria de Problemas de Relagdo Estatica entre Duas Medidas (Categoria Ill) - a eee Anexo M - Output dos Resultados Obtidos na Categoria de Problemas de Relacao Estética entre Duas Medidas, em Relagéio & Natureza da Incégnita ... 156 Anexo N - Output dos Resultados Obtidos na Categoria de Problemas de Composigao de Duas Transformagées (Categoria IV) oe ve oven 160) Quadro 1 Quadro 2, Quadro 3, Quadro 4. Quadro 5. Quadro 6. Quadro 7 Quadro 8. Quadro 9, indice de Quadros Caracterizagiio da amostra em relagio a variavel idade. Caracterizagdio da amostra em relagio aos resultados da Prova Matri: Progressivas Coloridas de Raven... Tipologia de problemas aditivos e subtractivos (Vergnaud, 1982) exemplos presentes nos cinco manuais em estudo. Caracterizagio de Prova de Resolugtio de Problemas Aditivos e Subtractivos em relagdio as operagses que mobilizam. Percentagem de problemas em relagdo a totalidade de exercicios que requerem as operagGes de adigao e de subtraccao. Frequéncia e percentage de exercicios de adigiio ¢ de subtraceao presentes nos manuais. Frequéncia ¢ percentagem de problemas por categorias existentes nos cinco manuais. Frequéncia e percentagem de inedgnitas por categorias de problemas no manual Amiguinhos. Frequéncia e percentagem de inedgnitas por categorias de problemas no manual Fio-de-Prumo.... Quadro 10. Frequéncia e percentagem de incégnitas por categorias de problemas no manual Ex e 0 Bambi Quadro 11. Desempenho das criangas na resolugao de problemas de composi¢ao de duas medidas (categoria 1) Quadro 12. Desempenho das criangas aos problemas de composigiio de duas ‘medidas (categoria 1), em relagdo & natureza da incégnita. Quadro 13. Desempenho das criangas na resolugio de problemas de transformagiio que une duas medidas (categoria 1). x 66 68 10 15, 80 81 82 86 87 88 90 Quadro 14. Desempenho das criangas aos problemas de ‘ransformagaio unindo duas medidas (categoria TI), om relagdo & natureza da incégnita. Quadro 15. Desempenho das criangas na resolugdo de problemas de relagdo estética entre duas medidas (categoria 111) Quadro 16. Desempenho das criangas aos problemas de relagdo estética entre duas medidas (categoria IM), em relagao 4 natureza da incégnita..... Quadro 17. Desempenho das criangas na resolugio de problemas de composiciio de duas transformagées (categoria IV) XI 90 91 92 Introdugao ‘Varios estudos na érea do desenvolvimento do raciocinio matemitico enfatizam o papel preponderante da resolugdo dos problemas na apropriagéo das nogdes mateméticas. Quando a crianga é confrontada com uma situagio problemética perante a qual nao conhece a solugio e tem de mobilizar estratégias com o objectivo de a encontrar, vai alargando as suas conceptualizagdes e adquirindo novos conhecimentos. Exemplificando, ¢ perante a resolugtio de diferentes categorias de problemas, ¢ dos diferentes problemas dentro de cada categoria, que a crianga compreende os diferentes significados que as operagdes de adigdio e de subtrac¢o podem ter. As primeiras concepgées infantis de adigS0 e de subtracgo consistem em aumento ¢ diminuigao, ¢ sfio claramente insuficientes. ‘Assim, a resolugfo de problemas entendida como ferramenta contextualizadora das diferentes operagées aritméticas. No actual Curriculo Nacional do Ensino Basico (MLE., 2001), para a disciplina de matematica, é evidente o destaque atribuido a resolugio de problemas. Ainda que seja esperado que as criangas, durante os primeiros quatro anos do Ensino Basico, sejam capazes de dominar o sistema de numeraco de forma a relaciona-los com os algoritmos das quatro operagdes, representar ¢ relacionar os ntimeros inteiros decimais © recorrer &s operagées para uma realizagdo econémica de célculos em situagdes concretas, a énfase ¢ colocada na resolugio de problemas (M.E,, 2001). Quer isto dizer que, a referéncia é assente na concepedo de um ensino assente na resolugao de situagSes problematicas, para que a crianga compreenda e domine esses aspectos 4 Das diversas competéncias gerais enunciadas para que um aluno se tome matematicamente competente, a resolugdo de problemas surge como fonte de raciocinio matemético, possibilidade de comunicar descobertas e ideias matemiticas, desenvolver processos de resolugdo e estruturas abstractas, e capacidade critica para decidir sobre a razoabilidade dos resultados (M.E., 2001). ‘A literatura revela-nos, também, que o meio privilegiado de expresso dos curriculos, muitas vezes, da-se pela “voz” dos manuais escolares. E através deles que o curriculo ganha corpo e que as praticas pedagégicas, os conteiidos e a natureza das actividades que ocorem na sala de aula sio determinados (Ballér, 1990; Chassapis, 1997; Castro, 1999; Duarte, 1999; Jitendra, Grifin, Deatline-Buchman, Dipipi-Hoy, Sczesniak & Xin, 2005; Morgado, 2004; Reys, Reys, & Chiver, 2004; Yahhontova, 2001). Estudos desenvolvidos no nosso pais acerca das priticas pedagdgicas levadas a cabo dentro da sala de aula, referem que os manuais constituem instrumentos: auxiliares privilegiados dessas priticas (Castro, 1999; Duarte, 1999; Morgado, 2004; Santos, 2001). Numa altura em que é implementado um Plano de Acgfio Para a Matemitica, cujo objectivo tltimo ¢ melhorar os desempenhos dos alunos do Ensino Misico nesta disciplina, 0 Ministério da Educag&o Portugués propée cinco principais acgbes, operacionaveis num conjunto diversificado de medidas, sendo a avaliagfio dos manuais, escolares, uma destas acgdes. Desta forma, este estudo centrar-se-i no modo como os manuais escolares de Matematica do 1° Ciclo do Ensino Basico, do 2° ano de escolaridade, tratam a resolugao de problemas aditivos ¢ subtractivos e possibilitam 0 desenvolvimento do pensamento infantil em relago as operagdes de adig&o e subtracgo. ‘A formulago da questiio de investigagaio deste estudo surge apés a anilise de alguns estudos desenvolvidos sobre a andlise de manuais escolares e do desenvolvimento de competéncias mateméticas nas criangas em idade escolar (Brissiaud, 1989, 1994; Carpenter & Moser, 1982, 1983; Carraher, 1989; Carraher, Carraher, & Schliemann, 1988; Fayol, 1996, Fuson, 1982, 1986; Gérard & Roegiers, 1998; Resnick, 1983; Riley, Greeno & Heller, 1983; Vergnaud, 1982, 1986, 1997; entre outros). Concretizando, temos entdio a seguinte questo de investigagtio: Como abordam os ‘manuais escolares, do Ensino Basico do 1° Ciclo, da disciplina de Matematica, do 2° ano de escolaridade, a resolugiio de problemas de adigao e de subtracgdio? Baseando-nos na formulagio desta questo sertio elaborados os objectivos do estudo que, por sua ver, irfio centrar-se na andlise do tipo de problemas aditivos ¢ subtractivos presentes nos manuais escolares, no mimero de exercicios aditivos e subtractivos versus os problemas aditives ¢ subtractivos, e no desempenho das criangas na resolugio de alguns desses problemas. Conhecida a dificuldade em transpor para a sala de aula os resultados das investigagdes, eas diferengas entre a pratica pedagogica e o discurso dos curriculos, este estudo parte das dinémicas ocorridas na sala de aula para a andlise do seu efeito no desempenho das criangas na resolugéo de problemas aditivos e subtractivos. Contudo, algumas das limitagdes metodoldgicas (garantias de um ensino puramente baseado num determinado manual, por exemplo) serdo tidas em conta nas conclus6es a retirar. De seguida far-se-a uma revisio de literatura que sustenta a problematica deste estudo, ‘mencionando 0s quadros tedricos referentes (3): andlise de manuais escolares, suas fungdes e sua avaliagaio, de modo geral, e dos de matemitica, em particular; resoluetio de problemas aditivos ¢ subtractivos, com elucidagao do que é um problema e como estes podem ser caracterizados; estratégias de resolugio e os erros que ocorrem durante a resolugio de algoritmos. 16 0s Manuais Como Tradugao do Curriculo Em Portugal, as competéncias essenciais da educagio esttio definidas no Curriculo Nacional para o Ensino (ME, 2001), enquanto as competéncias que os alunos devem adquirir ao longo dos nove anos do Ensino Basico, so expressas em objectivos de aprendizagem na Organizagio Curricular e Programas (ME, 1998/2004). Segundo diversos autores, estes documentos assumem expresstio nos manuais escolares, porque so eles que diio ‘voz’ ao que ¢ seleccionado pelos programas como sendo 0 conhecimento itil que os alunos devem aprender na escola (Castro, 1999; Choppin, 1992; Farquin, 1993, Mendes, 1999, Zabala, 1990, citados por Morgado, 2004), Mas, Ballér (1990), refere que 0 curriculo, tanto pode ser visto como: 0 contetido do ensino numa determinada area deniro do sistema escolar que ¢ seleccionado na base de consideragdes educacionais, organizado ¢ estruturado segundo t6picos de orientagdes principais: ou como o elemento globalizador que contém os objectivas. assuntos. prazos, materiais e resultados esperados da aprendizagem, expressando-os numa listagem oficial, mais ou menos estandardizada, geralmente adoptada pelas autoridades educacionais. lustra ainda a relagtio existente entre curriculo ¢ manual, consoante 0 sistema educacional que esteja em debate. Assim, por um lado, num sistema educacional centralizado, onde a grande preocupagio é a homogeneidade cultural, apenas existe um manual por disciplina e ano de escolaridade que ¢ produzido pelas autoridades educacionais. Por outro, nos sistemas educacionais descentralizados & dada autonomia as escolas para efectuarem esta escolha de modo a que possam servir melhor a sua populago, no entanto, isto fez. com que a publicago de manuais se tomasse num negocio comercial (Ballér, 1990). ”7 Morgado (2004) refere que alguns manuais so construidos na base de uma visio claramente etnocéntrica, pois veiculam valores ¢ atitudes aceites por determinados grupos sociais dominantes, ndo figurando 0 padréio cultural que normalmente as escolas portuguesas exibem. Sendo o curriculo resultado de uma determinada selecgfo cultural, enti o manual pode protagonizar essa selecefo, se se limitar a incorporar os contetidos minimos obrigatérios, preseritos pela administrag0 central através dos programas escolares. Os principais intéxpretes dos programas oficiais para cada ano ou ciclo de escolaridade sfo, assim, os autores dos manuais escolares, trabathando os conteitdos ai propostos (Morgado, 2004), Mas, as editoras também desempenham um papel importante ao nivel da concepgio porque se esté na mio do Estado conceber o discurso curricular e regulé-lo politicamente, ¢ as editoras, que cabe 0 papel de o (re)interpretar © apresentar aos professores (Morgado, 2004) Ora, 0 curriculo desde que se prescreve até que alcanga o seu verdadeiro significado nas aprendizagens que 0s alunos realizam, passa por uma série de modificagdes resultantes de um conjunto de decisées tomadas a diferentes niveis e por varias instincias administragao central, editores, escolas, professores, entre outras (Gimeno, 1988, cit. por Morgado, 2004). Noutro exemplo de como a cultura dominante influéncia a elaboragao dos manuais, ‘Yakhontova (2001), compara os manuais universitarios de Inglés americanos com os ucranianos, caracterizando os primeiros como tendo uma abordagem pragmatica comunicativa, caracteristica da linguagem anglo-saxénica, bem diferente da atitude romiintica das culturas eslavas, presente nos segundos, ¢ que, inevitavelmente, se reflecte nas nogdes especificas nacionais da escrita enquanto processo interactivo ou como arte do mundo 18 Os manuais contém a informagiio necesséria para os alunos satisfazerem os requisitos minimos exigidos para serem aprovados numa determinada disciplina (Morgado, 2004). Torres (1998, cit. por Morgado, 2004), considera que os manuais facilitam a “reprodugéo do conhecimento académico”, necessario quer para progredir ao longo dos ciclos de ensino, quer para sobreviver no interior de uma instituigdo escolar, mas muito pouco para a realizago de acgSes na sua comunidade © aplicagio de saberes no seu quotidiano. Dai anecessidade de se utilizar outros instrumentos pedagdgicos. Definigiio e Fungdes do Manual Escolar © Decreto-Lei n® 369/90, de 26 de Novembro, define manual escolar como sendo um instrumento de trabalho, impresso, estruturado e dirigido ao aluno, que visa contribuir para o desenvolvimento de capacidades, para a mudanga de atitudes ¢ para a agulsigéo dos conhecimentos propostos nos programas em vigor, apresentando a informagiio basica correspondente as rubricas programéticas, podendo ainda conter elementos para o desenvolvimento de actividades de aplicagdo.e avaliagao da aprendizagem efectuada (art. 2°). Gérard e Roegiers (1998), apresentam uma defini¢gio mais centrada na melhoria da eficécia do proceso de aprendizagem, acrescentando que 0 manual escolar pode ser caracterizado por “proencher diferentes fungSes associadas & aprendizagem” e “incidir em diferentes objectos de aprendizagem” (p. 19). Santos (2001), acrescenta a estas definigdes a intencionalidade da concep¢iio de suportes escritos para uma determinada disciplina no seio de uma instituigdo escolar. Para Castro (1999), “os manuais escolares siio objectos particularmente complexos, caracteristica para que contribuem decisivamente a rede de relagdes intertextuais em que sfo posicionados, a natureza plural dos seus destinatirios, a multiplicidade de objectivos que a sua utilizagiio persegue, bem como todos os tipos de condicionalismos que marcam a sua produgiio e difusto” (p.189). 19 Para Ballér (1990), os manuais so vistos como um produto de um processo tecnol6gico, que especifica e interpreta o contetido do curriculo e estrutura-o de tal forma que serve para o ensino e para a aprendizagem. Choppin (1992), refere que é através dos manuais que os alunos estruturam, adquisem e avaliam a esmagadora maioria dos seus conhecimentos. O que thes da um estatuto proprio & serem um produto de consumo, um suporte de conhecimentos escolares, um veiculo transmissor de um sistema de valores, de uma ideologia, de uma cultura ¢ um instrumento pedagogico, aspectos esses que os caracterizam. ‘A complexidade dos manwais, que Choppin (1992) sistematiza, atribuindo-lhes marcas de objectos pedagégicos, culturais ¢ de produtos de consumo, provoca miltiplos olhares que neles podem privilegiar diferentes dimensGes, nomeadamente, relativas as fungdes culturais, ideologicas e pedagégicas que podem desempenhar. Como supra citado, 0 curriculo resulta de operagies de selecefio de uma determinada cultura e de entre 0 conhecimento disponivel, isto é, so efectuadas escolhas: e nestas escolhas os manuais escolares podem ser descritos em fungaio dos conhecimentos que comportam e dos principios que subordinaram as inclusdes ¢ exclusdes efectuadas (Castro, 1999). © manual escolar constitui, nfio s6 um auxiliar de suporte de conhecimentos para alunos @ professores, como um elemento de ligagdo entre a escola e a familia. Desta forma, apresenta para além da fungiio de regulagiio da pritica pedagogica uma fungao recontextualizadora, sobretudo de programas disciplinares (Santos, 2001). Castro (1999), considera que os manuais desempenham importantes fungdes pedagégicas, j4 que estes constituem um repositério dos conteiidos legitimados na escola ¢ para a escola, e so, também, uma tecnologia para a transmissio daqueles, integrando 20 aspectos relativos & sequéncia e ao ritmo da sua transmissfio através das actividades que propdem e dos modos de avaliar as aquisi¢des realizadas. Estas fungdes pedagogicas e culturais que os manuais realizam, considera Castro (1999), no sto dissocidveis da sua natureza de “bem de consumo”. Sendo vejamos, algumas das opgdes tomadas por autores ¢ editores, as miltiplas estratégias de sedugo que sto desenvolvidas, nao podem estar desarticuladas das caracteristicas do “mercado” em que 18m que concorrer. Contudo, corre-se 0 risco de se radicar mais em preocupagées comerciais do que pedagogicas e das caracteristicas do(s) pablico(s) alvo. Gérard e Roegiers (1998), fazem referéncia as fungdes do manual escolar, sob o ponto de vista do aluno e do professor, pois consideram que este pode desempenhar diferentes fungdes, dependendo do seu utilizador, da disciplina e do contexto em que é elaborado. Os manuais escolares que esto mais orientados para a fungio de transmissio de conhecimentos, de desenvolvimento de capacidades e competéncias, de consolidagao de aquisig6es e/ou avaliag&o dessas aquisiges, so manuais, segundo Gérard ¢ Roegiers (1998), orientados para as aprendizagens escolares. Servindo aquele que ¢ 0 principal objectivo do ensino, e opondo-se as fungdes supra citadas, estes autores enunciam ainda as que so orientadas para a vida quotidiana © profissional, sdo elas: ajuda na integrago das aquisigdes, referéncia ¢ educagiio social © cultural ‘Ainda que estas funges surjam discriminadas no texto, nfo significa que existam manuais exclusivamente orientados para uma dinica fungio, sendo rarissimo esta situagio se dar (Gérard & Roegiers, 1998). Os manuais cuja fungao principal soja transmitir conhecimentos, pelo menos de forma implicita, pretendem, também, desempenhar uma fungao de desenvolvimento de capacidades e de competéncias. Pode- 2 se entfo afirmar que um manual tem uma fungiio priméria e uma ou mais fungdes secundarias. No que respeita as fungGes dos manuais do ponto de vista do professor, Gérard e Roegiers (1998), enunciam as seguintes: informagio cientifica e geral; forma pedagégica: ajuda nas aprendizagens e na gestiio das aulas, ¢ ajuda na avaliaglo das aquisigdes. Os manuais escolares servem 0 objectivo de contribuirem com instrumentos que permitem um melhor desempenho da acgo docente, contudo, isso implica que os seus autores contribuam com novas pistas, novos instrumentos e préticas que contemplem a evolugtio dos conhecimentos pedagégicos, a sensibili especificidade dos contextos (Gérard & Roegiers, 1998). de dos professores e a Santos (2001), reforga estas ideias a0 mencionar que os manuais desempenham uma fungaio fortemente reguladora das priticas pedagégicas, sociais e éticas, pois sto elementos que auxiliam na organizagio da recolha de informagées e ajudam a construire aestruturar as aquisigdes. AA literatura acerca do papel que os manuais desempenham no ensino é consensual, as acti idades desenvolvidas dentro da sala de aula so maioritariamente orientadas a partir do manual adoptado e constituem a principal fonte de informagiio para os alunos e de referéncia para o ensino (Beishuizen, Stoutjesdijk & Putten, 1994; Jitendra, et al., 2005; Morgado, 2004; Nathan, Long & Alibali, 2002; Reys, et al., 2004; Vilela, 1991). ‘Assim, por exemplo, Duarte (1999), acerca da investigago sobre o ensino da ciéncia, sob 0 ponto de vista das influéncias dos manuais escolares, cita alguns investigadores que consideram que 0 manual escolar constitui o principal determinante da natureza da actividade cientifica desenvolvida na sala de aula (Hofstein & Lunetta, 1982, cit. por Duarte, 1999), da organizagdo do curriculo e da forma como os professores concebem, n por exemplo, o desenvolvimento da ciéncia (Chiappetta, et al., 1991, cit. por Duarte, 1999). Segundo alguns autores, © manual escolar determina a natureza da actividade cientifica desenvolvida na sala de aula e constitui um dos recursos educativos mais utilizados pelos professores (Johnsen, 1993, Stinner, 1992; citados por Duarte, 1999). Os Manuais e as Praticas Pedagégicas Morgado (2004), defende que os manuais escolares estimulem o papel dinémico interventivo que os alunos devem ter na construgio do seu proprio saber. Ja que a aprendizagem 6 um processo de construgo pessoal, que nfo pode ser determinado & priori, de um modo linear e rigido, sob pena de produzir efeitos muito perversos contrarios ao que a educagdo deve ter. Sarramona (2002, cit. por Morgado, 2004), refere que a escola nflo pode ser 4 margem das formas de comunicaggo e dos instrumentos de aprendizagem que fora dela se constituem, sob pena de deixar de cumprir uma das suas principais finalidades: preparar para a vida. Morgado (2004), distingue uma escola onde o principal objectivo é conhecimentos, de outra escola cujo principal objectivo é a promogiio eo desenvolvimento cultural, social, afectivo e psicomotor da crianga. Esta distingZo é feita para mencionar a utilizagao divergente que ¢ dada aos manuais escolares. Ou seja, na primeira escola, os métodos de aprendizagem privilegiam a memorizagio e a repetiglio, adaptam-se a existéncia de ‘um programa rigido para cada disciplina, donde existe recurso a um manual tinico. No caso da segunda, 0 método de aprendizagem repousa na (re)construgao de conhecimentos ¢ 0 manual ¢ conjugado com outros instramentos curriculares altemnativos. 2 Uma escola que nao descura o conjunto de aprendizagem tidas como necessirias para todos e aceita partir dos conhecimentos que os alunos possuem, das suas experiéncias de vida e de recorrer a situagdes ¢ problemas locais, é uma escola que faz cumprir os objectivos do ensino supra citados (McCombs & Whisler, 2000) Torres (1989, cit. por Morgado, 2004), considera que alguns manuais escolares néo tém om conta as diferentes formas e ritmos de aprendizagem dos alunos, a que se associam a falta de experiéncias interdisciplinares e globalizadoras, a néo mobilizago de experiéncias e conhecimentos que os alunos ja possuem, a auséncia de contraste entre 0s conhecimentos abordados ¢ a realidade em que os jovens se inserem, e a falta de incentivos a sua curiosidade ¢ iniciativa. ‘Também Imbemén e Casamayor (1985, cit. por Morgado, 2004), consideram que existe uma certa tendéncia para o recurso a uma linguagem impessoal e abstracta para transmitir os conhecimentos preestabelecidos nos programas escolares. Finley (1994, cit. por Duarte, 1999), refere constituir uma tarefa descomunal, esperar que os alunos abandonem as suas proprias ideias ¢ aceitem outras com base na autoridade do texto. ‘Yakhontova (2001), refere que, apesar de ser um requisito pedagégico importante © padronizado, a adequago dos manuais as necessidades dos alunos ¢ ao contexto s6cio- cultural da sua utilizagdo, ainda existem situagdes em que este requisito ¢ negligenciado ou intencionalmente violado. ‘Acrescenta, ainda, que esta situago tende mais a acontecer quando os materiais de ensino so utilizados para educar alunos cujos objectivos ndo se relacionam totalmente com os objectivos dos materiais, ou para aqueles que estiio a estudar em contextos educacionais e culturais diferentes daqueles que foram inicialmente estabelecidos pelos autores (Yakhontova, 2001). Estes aspectos levam-nos a reflectir sobre a discrepéncia que pode existir entre os objectivos do ensino e 0 meio utilizado para o implementar, Para muitos professores os manuais escolares siio encarados como instrumentos de trabalho auxiliares da pritica pedagdgica e um meio facilitador da aprendizagem dos intérpretes privilegiados das fidelidades ¢ das infidelidades curriculares, j4 que reimem as propriedades pedagdgicas necessérias alunos. Para outros, os manuais escolares s para que os alunos desempenhem o seu papel, quer na escola quer em casa (Morgado, 2004) Para além de simples instrumentos de trabalho para professores e alunos, os manuais escolares envolvem e desenvolvem um sistema complexo de relagdes sociais, na medida em que estruturam dispositivos de controlo social sobre o trabalho docente, como os conteiidos e estratégias didécticas (Santos, 2001; Correia & Matos, 2001, cit. por lo, 2004). Contudo, isto também pressupde uma pritica quotidiana dentro de sala de aula contréria ao papel meramente técnico do professor que se limita a debitar contetidos curriculares propostos para uma determinada disciplina Os professores usufruem de autonomia ¢ responsabilidades para organizarem a sua pritica pedagégica como melhor entenderem (Morgado, 2004). Contudo, Morgado (2004) refere que © que se tem verificado ¢ que as escolas de formagéio inicial de professores continuam a formé-los sob uma perspectiva tyleriana, sintetizada no tridngulo objectivos-actividades-avaliagéo, 0 que se reflecte numa abordagem racionalista do curriculo, Morgado (2004), vai ainda mais longe, questionando sé os manuais ndo so auténticos armazéns de respostas que os professores administram quando julgam mais conveniente, se nao valorizardo essencialmente a transmissio de conhecimentos e a prossecugio de objectivos previamente delineados e se no valorizardo, eles, mais os produtos que os processos educativos, Mas, considerando a autonomia e responsabilidade que os professores tém sob a sua acgiio docente, estes podem optar por: limitarem-se a implementar aquilo que outros decidiram e organizaram ou, ao invés, assumirem um papel interventivo, procurando trilhar caminhos que, embora mais Arduos, garantam a competente valorizacio profissional (Morgado, 2004). Correia e Matos (2001, cit. por Morgado, 2004), alertam-nos para a possibilidade dos manuais escolares se constituirem como “instrumento simbélico de desresponsabilizagio dos professores” (p. 51), se os considerarmos como ferramentas imprescindiveis para 0 desenvolvimento da autonomia e do sentido de responsabilidade dos alunos ¢ determinantes do sentido da acgdo pedagégica. Castro (1999), num trabalho de investigag&o sobre as representagées dos professores acerca dos manuais escolares de portugués, refere da andlise de um manual desta disciplina, que so fomecidos a estes profissionais varios conhecimentos que deveriam resultar de decisées profissionais especializadas (e.g. devem ser fornecidos dados clementares do funcionamento da lingua; devem ser dados a conhecer o significado de certas palavras ou expresses), ou seja, confirma uma concepeio de um elevado grau de desprofissionalizagaio dos professores. Morgado (2004), considera que muitos professores nfio conseguem problematizar convenientemente as quest6es relativas aos contetidos, nfo s6 porque se apoiam em determinadas priticas instituidas na escola, que se preocupam mais com os produtos (cg, certas priticas de avaliagto que, normalmente, fazem apelo mais directo a aspectos periféricos, tais como a memorizaglo © a compreensdo de factos, a assiduidade e a participagio) do que com o processo de construcao do conhecimento. Num trabalho de investigagaio conduzido por Morgado (2003, cit. por Morgado 2004) acerca da acgaio educativa no nosso pais, chegou-se 4 conclusdo que esta acgéio se reduz. a interacgbes pergunta-resposta, que geram um leque de pseudodidlogos que acabam por servir mais ao professor do que aos alunos, deixando subjacente a ideia de que o mais importante, portanto, siio os produtos. ‘Avaliagdo de Manuais Escolares ‘Avaliar significa “recolher um conjunto de informagées suficientemente pertinentes, vilidas e fidveis; examinar 0 grau de adequagdo entre este conjunto de informagdes e um conjunto de critérios adequados aos objectives definidos partida ou ajustados no decurso do processo; para se tomar uma decisfio” (De Ketele, 1989, cit. por Gérard & Roegiers, 1998, p. 95). ‘Morgado (2004), considera que os manuais podem ser analisados a dois niveis distintos explicito (em relagdo ao que pretendem transmitir de forma consciente, existe uma clara intencionalidade de fazé-1o), e implicito (em relago as mensagens latentes, “do jinconsciente, dada a auséncia de intencionalidade na sua transmissao ~ curriculo oculto). Gérard e Roegiers (1998), referem que os manuais podem ser avaliados sob o ponto de vista da qualidade do manual e da sua utilizago, ou seja, sobre 0 proceso global de elaborag&o e realizagdo do manual, ou sob o ponto de vista das aquisigoes dos alunos. Sejam quais forem os objectivos da avaliago, ou os indicadores em que assenta, este é sempre um processo complexo ¢ moroso. No entanto, nao se pode ignorar a pertinéncia de ser levada a cabo, tendo em vista a qualidade cientifica e pedagdgica dos manuais escolares que sto disponibilizados para professores e alunos. Concretizamos de seguida a. complexidade deste processo. Para que seja levada a cabo qualquer avaliagio é necessario colocar algumas questées como “que tipo de deciso podemos ser obrigados a tomar?” e em fungao da resposta a esta questiio “que objectivos devem ser visados para preparar esse tipo de deciséio?” (Gérard & Roegiers, 1998, p. 97). No decurso de um proceso de avaliagiio pode ser nevessirio 0 reajustamento dos objectives definidos priori, pois a informagio recolhida durante 0 processo pode conduzir a uma necessidade de redefinigio dos propésitos da avaliagio, Mas a definigao de objectivos por si s6 pode nfo ser suficiente, sobretudo, nos casos em que o avaliador no é responsavel pela tomada de decisio. Neste caso é necessério que existam critérios adequados aos objectivos definidos, para que o decisor possa tomar uma boa decisio (Gérard & Roegiers, 1998). ‘A informagaio recolhida durante o processo de avaliagio pode ser de dois tipos: baseada em factos, ou em representagies. A primeira remete mais para uma avaliagio de natureza quantitativa, enquanto a segunda para uma mais qualitativa, Em qualquer dos casos, a informagio tem de estar de acordo com os objectivos definidos, ser feita com instrumentos adequados e nfo dependenie da subjectividade do avaliador, ou soja, tom de ser pertinente, valida e fiavel (Gérard & Roegiers, 1998) Mas quando se trata da avaliagiio do projecto global de elaboragio e de execugio de um manual, Gérard e Roegiers (1998), distinguem quatro tipos de avaliag&o que remetem para as diferentes fases por que passa um manual, siio elas: processo de elaborago; qualidade do manual; da sua utilizagaio e dos efeitos junto dos utilizadores (professores alunos). Podemos entiio dizer que, a avaliago deste projecto se baseia, por um lado, no processo de elaboragao, por outro, no produto. A administragio central, através do Decreto-Lei n° 369/90, de 26 de Novembro, define uma politica de manuais escolares baseada em sete principais objectivos, Sucintamente, estes assentam na estabilidade do mercado dos manuais escolares sem que 0 processo de inovagdo pedagogica seja comprometido; na qualidade cientifica e pedagégica destes recursos, cabendo as escolas a escolha dos manuais a adoptar, formecendo um sistema de 8 apreciag&o ¢ de controlo; ¢ a divulgagdo dos manuais adoptados, assim como a disponibilizagao de informagdes, aos autores e editoras, para que seja a qualidade do manual (ME, 1998), egurada a O sistema de apreciago e de controlo disponibilizado para as escolas é estabelecido pela Direcgao-Geral de Inovagio e do Desenvolvimento Curricular e consiste numa grelha com quatro critérios, 2 saber: organizagiio e método; informagio; comunicagiio © caracteristicas materiais. Estes so, depois, concretizados em formulagdes genéricas que podem conduzir a tantas interpretagdes quantas as conceptualizagées de quem as preenche, neste caso dos professores (Duarte, 1999). E ainda disponibilizado, por esta mesma Direcedo-Geral, uma grelha de registo de incorrecgSes detectadas ao nivel da adequagiio ao programa/orientagdes curriculares, & qualidade cientifica e adequagao a faixa etdria dos alunos, Contudo, Santos (2001), considera esta politica pouco clarificadora de um conjunto de medidas que reforcem a qualidade cientifica e pedagégica dos manuais, pois 0 cendrio de escolha de manuais, que verificou no seu trabalho de investigagiio, mostra que este & baseado, sobretudo, em critérios estéticos, ‘Alerta, ainda, para a necessidade da criagdo de instrumentos de apreciagiio dos manuais, para que os professores, agentes que so chamados a avaliar os manuais, consigam levar a bom termo © num tempo exequivel esta tarefa, Cabe aos servigos centrais néio se esconderem sob uma falsa autonomia ¢ tomarem medidas, considera Santos (2001). ‘Apesar da documentagiio acerca de técnicas e normas de elaboragaio de manuais ser bastante extensa, Santos (2001), refere que séo raras as anélises realistas, profundas fundamentadas do discurso, da forma de ler ¢ utilizar os manuais escolares, 29 Johnsen (1993, cit. por Duarte, 1999), refere, com base na revisdo de diferentes estudos, que 0 professores, frequentemente, consideram dificil a seleog%o do manual escolar, especialmente porque no descobrem os aspectos maus e bons do manual antes de o terem utilizado. Vilela (1991), considera um conjunto de tépicos orientadores da avaliagdo de um manual, que se prendem com os seguintes aspectos: autores e editores; apresentagio; ilustragbes; legibilidade; contetdo; apresentagio dos contetidos; matematica; auxiliares de ensino ¢ avaliagio. Professores mais esclarecidos estarflo com certeza mais preparados ndo s6 para fazerem uma selecedio criteriosa do manual escolar, mas também para exercerem melhor o papel de mediadores em relago & ilizago do manual escolar na sala de aula por forma a facilitarem aos alunos uma aprendizagem mais significativa (Duarte, 1999). Como ao processo de concepelio, execucio, divulgagZo e utilizagio de manuais escolares nio sto alheios interesses de ordem financeira e comercial, niio nos surpreende que as editoras idealizem um “produto que possa ser vendido ao maior némero possivel de professores’, esmerando-se para conceber trabalhos o mais fundamentados ¢ 10 e n<10. Aqui parece que, em alguns casos, os sujeitos recorrem sistematicamente a0 decréscimo (Wood, Resnick & Groen, 1975, cit. por Fayol, 1996). ‘Ao longo dos primeiros anos do primeiro ciclo, as criangas vaio progressivamente passando da contagem, inicialmente auxiliada pelos dedos (estratégia reconstrutiva), para o recurso da recuperagio em memoria a longo prazo (M.L.P.) (estratégia reprodutiva) para resolverem adig&es simples (Sekuler & Mierkiewicz, 1977; Svenson & Hedenborg, 1979; Aschcraft, 1982; Ascheraft & Fierman, 1982; Siegler & Shrager, 1984; Baroody & Ginsburg, 1986, citados por Fayol, 1996; Carpenter & Moser, 1983). Svenson e Hedenborg (1979, cit. por Fayol, 1996), através da anilise dos comportamentos ¢ das verbalizagdes de 12 criangas, durante os trés primeiros anos da escolaridade priméria, chegaram & conclusio que: a proporgdo das recuperagées directas de respostas na M.L.P. cresce linearmente do final do jardim-de-inffincia ao final do 2° ‘ano; ¢ a utilizagdo dos dedos aumenta, num primeiro momento (do jardim-de-inffincia. 0 primeiro ano) para, em seguida, diminuir rapidamente. ‘As criangas mais jovens execulam processos de resolugo que tendem a simular as acdes descritas nos enunciados, assim os problemas dificeis de serem transformados em actos revelam-se significativamente mais dificeis de serem resolvidos. Neste nivel nfio hA recurso a operagdo aritmética, adigo ou subtraccao (Fayol, 1996), mas sim, a esquemas de resolugao. 37 ‘Na etapa seguinte (fim do 1° ¢ 2° ano), as simulagées subsistem, mas interiorizam-se progressivamente e tomam-se cada vez mais abstractas — contagem mental. Dé-se assim a passage gradual do “contar a partir do primeiro termo” (3+6) para 0 “contar a partir do maior dos termos” (6+3). No entanto, modificagdes na formulagio t&m um forte impacto na escolha de um ou outro processo. No terceiro ano, os processos de contagem dio lugar, pouco a pouco, & recuperagio directa dos resultados em meméria a longo prazo. Supdem que os sujeitos tenham anteriormente identificado a operago aritmética, sem necessariamente se referirem a uma simulagio qualquer da situagio deserita. Carpenter e Moser (1982), Lindvall ¢ Gibbons-Ibarra (1980, cit. por Resnick, 1983) mostraram que as criangas sfio capazes de resolver determinadas classes de problemas utilizando procedimentos de contagem. ‘As criangas quando confrontadas com o resolver uma adigiio, numa fase inicial, tendem ‘a enumerarem todas as entidades. Fazem uma de duas coisas: ou a soma ¢ determinada pela contagem do numero total de entidades expressas nos dois conjuntos (counting all), ou a enumerago comega na palavra do primeiro niimero e continua até chegar & enumeragito do segundo nimero (countig on), Uma forma mais eficaz. de counting on & comegar a contagem pelo nimero maior dos dois (e.g.: 5+3 + (5) 6, 7, 8) Fuson, 1982) Baroody e Ginsburg (1986, cit, por Fayol, 1996) subdividem ainda em quatro categorias, ‘a contagem mental, sto elas: contar tudo a partir do 1° dado (counting all starting with the first addendy; contar a partir do 1° dado (counting on from the first addend), contar tudo a partir do maior dos dados (counting all starting with the larger term), e contar a partir do dado maior (counting on from the larger term). 38 A estratégia contar tudo, comegando pelo primeiro termo (counting all starting with the first addend), caracteriza-se por se tratar de uma forma de “‘conservagdo da lembranga do ja contado”, nele hé, simultaneamente, aumento de um em um, ¢ contagem den, senfio veja-se, para a adigfo 2+4, a crianga conta “1, 2, 3... 1 amais), 4(2 a mais), 5 (3 a mais), 6(4 a mais)”. Na segunda estratégia, contar a partir do primeiro termo (counting on from the first addend), 3+5 6 resolvido comegando pelo cardinal do primeiro termo: 3, 4 (+1), S( 42)... 8 G5), Ainda que este processo alivie a carga de trabalho mental em relagio estratégia anterior, no reduz 0 nimero de etapas necessirias & “conservagio da Jembranga” dos resultados obtidos. A carga cognitiva pode ser diminuida encadeando os passos da contagem a partir do maior dos dois termos. A estratégia contar tudo comegando pelo maior dos dois termos (counting all starting with the larger term), reduz. elementos da “conservagiio da lembranga” do que ja foi contado, e.g., 2+6 serd contado assim: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 (+1), 8 (+2). ‘A tiltima estratégia, enunciada por Baroody e Ginsburg (1986, cit. por Fayol, 1996), contar a partir do maior dos dois termos (counting on from the larger term) diminui duplamente a carga cognitiva: “conservando a lembranga” somente pelos termos menores, e ordenando a contagem pelo cardinal maior, por exemplo, na adigao 3+5, a crianga conta 5, 6 (+1), 7 (+2), 8 (+3). Estas estratégias sfio, sobretudo, usadas pelas criangas para resolverem os problemas de Transformagito unindo duas medidas ¢ de Composigao de duas medidas (Vergnaud, 1982), ou de Mudanca e de Combinagdo na classificagio de Riley ¢ colaboradores (1983), ou Reunidio e Parte-parte-todo, na classificagao de Carpenter e Moser (1982). quando estes implicam uma operagiio aditiva, 39. Quando os problemas remetem para uma operagio subtractiva, nos problemas de Composigao de duas medidas (Vergnaud, 1982), ou de Combinagao (Riley, et al., 1983), ou Parte-parte-todo, (Carpenter & Moser, 1982), a escolha da estratégia reflecte a ambiguidade dos problemas, porque as criangas também escolhem estratégias aditivas para os resolverem. Escolhem, sobretudo, estratégias que representam a estrutura do problema, ou entio utilizam também a estratégia de contar a partir da maior quantidade (Carpenier & Moser, 1982). Esta estratégia, em conjunto com a estratégia adding on (comegar na quantidade menor até & maior e a quantidade acrescentada fomece o resultado), também 6 muito usada pelas criangas para resolverem os problemas de Transformacdio unindo duas medidas (Vergnaud, 1982), ou Mudanga (Riley, et al, 1983), ou Reunidio (Carpenter & Moser, 1982), que implicam uma operagio subtractiva. As estratégias de contar para irds ¢ separar de (esta tiltima s6 possivel pela presenca de objectos, que consiste em representar a quantidade maior retirar-Ihe a menor) so mais utilizadas nos problemas de Transformagiio unindo duas medidas (Vergnaud, 1982), ou ‘Mudanca (Riley, et al., 1983), ou Separagdo (Carpenter & Moser, 1982). Nos problemas, que remetem para operagdes subtractivas, de Comparagéio (Carpenter & Moser, 1982; Riley, et al., 1983), ou Relagdo estatica entre duas medidas (Vergnaud, 1982) as estratégias adoptadas dependem da utilizagio ou no de objectos. Se as criangas dispdem de objectos, entio utilizam, sobretudo, a estratégia de matching (fazem dois conjuntos que representam as quantidades, emparelham os objectos de cada conjunto, ¢ os que nio forem emparelhados fornecem 0 resultado). Caso néo utilizem ajudas externas recorrem mais as estratégias de contar a partir da maior quantidade ou de adding on (Carpenter & Moser, 1983) 60 Os resultados da investigagao de Siegler e Shrager (1984, cit. por Fayol, 1996), mostram que as criangas de 4/5 anos recorrem a ajuda externa, sobretudo, para as adigdes mais dificeis (4+5, eg.) Outta estratégia, definida por De Corte e Verschaffel (1987, cit. por Brissiaud, 1994) (forward strategie), consiste em reduzir 0 problema a uma adigéo cuja resposta a erianga sabe de cor (e.g., se 0s dados dos problemas sfo 4 ¢ 7, ela encontra a solugo 3 porque sabe que 4+3=1) Um procedimento tipico que as criangas utilizam para a subtracglio é: contar um conjunto para coincidir com 0 némero maior (diminuendo); depois contar desde este conjunto 0 mimero de objectos especificados no menor nimero (subtraendo), e por fim contar os objectos restantes no conjunto original (Resnick, 1983), Sintetizando, as criangas resolvem problemas de adigiio © de subtracgtio através de (ayol, 1996): a) separar de (separating from); do maior conjunto, a crianga retira em seguida 0 menor e conta 0 que resta. Pela contagem sem objecto, este processo equivale a contar para tris a partir (counting down from) do maior dos termos diminuindo de um em um até ter retirado o menor dos termos, sendo 0 ultimo numero fomecido a resposta; b) separar até (separating (0): equivale ao anterior, com a diferenga de que os elementos sao retirados do maior conjunto até deixar subsistir somente 0 néimero que corresponde ao menor dos dois termos fomecidos. Equivale ao contar para tras até (counting down to), ©) adiggo: partir da menor das quantidades forecidas e ir até a maior, aumentando de um em um; 0 nimero de elementos acrescentados fomece a resposta. O processo pode ser feito por manipulagdes (adding on) ou por contagem mental (counting up from given), a 4) estabelecimento de correspondéncias (matching) entre elementos de dois conjuntos, depois enumerando os que restam. $6 possivel com objectos/representages fisicamente presentes; e) eseolha de um processo misto, consistindo em utilizar ora (a), ora (c) em funga0 das caracteristicas numéricas dos dados fornecidos; £) ow recuperaciio directa em meméria a longo prazo. ‘Segundo Groen e Parkman (1972, cit. por Fayol, 1996), os sujeitos resolvem adigdes elementares utilizando ou uma estratégia reprodutiva (recuperam da memoria a longo prazo os resultados das adigGes armazenadas), ou uma estratégia reconstrutiva (recorrem um procedimento de calculo que permite reconstituir a resposta). 'A estas estratégias esta associado um conhecimento declarative para o caso da recuperagaio directa do resultado da adigo na meméria a longo prazo, @ um conhecimento processual quando 0 individuo tem de recorrer a algoritmos para chegar & solugéio. 0 esquema geral de evolugdio dos processos de resolugdo de subtracgées mentais é de uma complexidade muito maior quando comparado com o da adigdo. Esta complexidade de resolugao das subtracg6es diz respeito, para além da operagio mental executada, também, ao tratamento escrito da operagdo. Resnick (1982), fala de trés procedimentos chave para realizar os algoritmos eseritos: a regra da leitura da direita para a esquerda, 0 transporte e 0 empréstimo. O facio das criangas nao serem capazes de usar 0 seu conhecimento seméntico para suportar os procedimentos escritos da aritmética é que leva as criangas a errarem nestes procedimentos. Quando as quantidades dos problemas aumentam de forma que seja dificil usar objectos ou desenhos para chegar & solugiio, as criangas tendem a aplicar uma regra implicita que 2 diz *Para resolver um problema, tém de se escolher a operagio aritmética correcta” (Schoenfeld, 1983; Frank, 1988, citados por Brissiaud, 1994). ‘As criangas utilizam uma estratégia de resolugio de problemas onde traduzem directamente alguns elementos do enunciado do problema, as “palavras-chave”, em operagdes aritméticas (Nesher & Teubal, 1974; Paige & Simon, 1966; Sowder, 1988, citados por Brissiaud, 1994). Por exemplo: no problema “Eric compra mais alguns doces”, j4 que a frase refere-se a uma aumento da quantidade, as criangas escolhem a adigio. Esta escolha é baseada no isolamento de um elemento do enunciado. Quando as criancas t8m de escolher uma operacio aritmética elas falham intensivamente eo erro mais comum ¢ escolher a adigdio em detrimento da subtracgaio (Carey, 1992; Ermel, 1993; Audigier, et al., 1979, citados por Brissiaud, 1994). Para Fayol (1996), quem tem a tarefa da formagdo das criangas depara-se com varios problemas, por um lado tem de entender a experiéncia das criangas fomecendo-lhes a ocasidio de construir ou afinar “micromundos” nos quais se associem conhecimentos declarativos e processuais ¢ as suas condigdes de desencadeamento, por outro através de situagdes significativas, conduzi-las A elaboragaio de algoritmos para, a pouco e pouco, automatizé-las apés estar assegurada a sua compreensio, ¢ ainda conceber situagdes susceptiveis de incitar, ¢ até mesmo obrigar, as criangas a coordenarem, através de uma estrutura de controle mais abstracta, diferentes “micromundos”. Objectivos da Investigacao reconhecida a importincia da andlise dos manuais escolares, pois estes concretizam 0 curriculo oficial e definem grande parte dos conhecimentos que se ensinam na escola. 6 também reconhecida a importincia da aquisigo de competéncias matematicas para a formagaio de futuros cidadiios e profissionais. Santos (2001), citando Cachapuz e Praia (1996), refere que poucas sfio as vezes em que so valorizados manuais que resultam de investigagdes didécticas da area disciplinar correspondente, Aponta como justificagao para esta realidade, o facto de os autores dos manuais raramente estarem envolvidos em investigagio ou dificilmente terem acesso a ela, ‘A literatura enfatiza a importincia da resolugiio de problemas em detrimento de exercicios repetitivos e isolados, surge assim o primeiro objectivo que pretende: Qual a proporcato de problemas em relagéo @ totalidade de exercicios de célculo (aditivos subtractivos) propostos nos manuais, do 2° ano de escolaridade, mais utilizados em Portugal? Surge também um outro objectivo de trabalho: Como se caracterizam os manuais escolares de matemitica, do 2° ano de escolaridade, mais utilizados em Portugal, em termos dos problemas de adigdio e subtracgiio? Como vimos anteriormente, os aspectos semfnticos, a formulagio, as formas de apresentagdo e a estrutura do problema so determinantes das dificuldades que as criangas encontram na resolugo dos problemas. 1 a possibilidade de serem confrontadas com diferentes tipos de problemas que permite as criangas ultrapassarem essas mesmas dificuldades. Deste modo, o tereeiro objectivo tem a seguinte formulagéo: Como é que as diferengas nos manuais se reflectem em difereneas nos desempenhos das crianeas na resolugdo de problemas aditivos e subtractivos. 64 Método © presente capitulo pretende explicitar os procedimentos que foram levados a cabo de forma a analisar a proporgio de problemas em relagio a0 nlimero de exercicios aditivos ¢ subtractivos, e as categorias de problemas aditivos e subtractivos que esto presentes nos manuais de Matematica do 2° ano de escolaridade, do 1° Ciclo do Ensino Basico. Pretende, também, analisar 0 desempenho de criangas do 2° ano, na resolugio de diferentes categorias de problemas em fungio dos manuais escolares em estudo. Participantes 'As criangas seleccionadas frequentavam 0 2° ano de escolaridade, do 1° Ciclo do Ensino Basico, da regifio de Lisboa, A escolha deste ano de escolaridade, mais do que com a faixa etéria das criangas, prende-se com a altura em que ¢ introduzida no curriculo a resolugio de problemas aditivos e subtractivos. Antes de seleccionarmos a nossa amostra, fizemos um levantamento dos manuais escolares, do 2° ano de Matemética, mais utilizados nas escolas portuguesas, por indicagio de uma editora, Fizemos também um levantamento dos manuais adoptados, para o ano e disciplina em estudo, em todas as escolas do 1° ciclo, da cidade de Lisboa. Nao foi possivel obter esta informagio para 3 das escolas listadas. Este levantamento permitiu seleccionar © conjunto de escolas que adoptaram os manuais mais utilizados que foram objecto do nosso estudo. Foram entio seleccionadas 4 escolas do conjunto de cada um dos manuais em estudo, ou seja, 4 escolas que tinham adoptado o manual Amiguinh 4 do manual Fio-de-Prumo, 65 e 4 escolas do manual Eu e 0 Bambi. Depois deste processo de amostragem aleatéria, foi solicitada autorizagaio as escolas para a recolha da informago necesséria junto dos seus alunos [As criangas foram seleccionados segundo um processo de amostragem aleatéria por conglomerados (Maroco, 2003), ou seja, de um conjunto de escolas, foram retirados 6 alunos (3 raparigas e 3 rapazes), aleatoriamente de cada sala do 2° ano, até perfazer um mimero total de 60 participantes. Contudo, tendo em vista a rentabilizagdio do tempo de recolha, e nas escolas, que ‘autorizavam o estudo e que tinham mais de uma turma do 2° ano, optou-se por avaliar as criangas das diferentes turmas. Nas turmas em que 0 docente referia que existiam criangas ao nivel de um 1° ano de escolaridade, apesar de estarem matriculadas no 2° ano, e que no Ihes era leccionada a matéria do ano de escolaridade em estudo, essas criangas foram excluidas da amostra. ‘As criangas que apresentavam um desempenho abaixo da média na prova de desenvolvimento cognitivo, nfo foi administrada a prova de desempenho de resolugao de problemas aditivos e subtractivos e, consequentemente, foram retiradas da amostra Assim, a amostra é composta por 60 alunos (30 raparigas 30 rapazes), do 2° ano, do 1° Ciclo do Ensino Basico, da regido de Lisboa, com idades compreendidas entre os 7 anos e 1 més e 05 9 anos e 3 meses, sendo a média das idades de 7 anos e 11 meses, aquando da recolha dos dados (Quadro 1). Visto que os participantes foram seleccionados, tendo em conta o manual que era utilizado para leccionar a disciplina de matemética, temos ts grupos distintos em anélise, cada um composto por 20 criangas (10 rapazes e 10 raparigas), consoante 0 manual adoptado pela escola, 66 Quadro 1: Caracterizagio da amostra em relagdo 4 varidvel idade. aT ae a Grupo 2 (Fio-de-Prumo) 792 OAD Grupo 3 ue 0 Bambi) Geral da amostra ‘Temos assim que, 0 grupo 1 (Manual Amiguinhos) caracteriza-se por apresentar uma média de idades de 7 anos ¢ 10 meses; a crianga mais nova ter 7 anos e 6 meses, ea mais velha 8 anos e 3 meses (Quadro 1). © grupo 2 (Manual Fio-de-Prumo) apresenta uma média de idades de 7 anos ¢ 11 meses; sendo 0 intervalo de idades compreendido entre os 7 anos e 5 meses e os 9 anos @ 3 meses (Quadro 1). Por iiltimo, o grupo 3 (Manual Eu e 0 Bambi) caracteriza-se por ter uma média de idades de 7 anos e 11 meses, sendo o minimo das idades de 7 anos e 1 més, e o maximo de & anos e 7 meses (Quadro 1) (ver Anexo B). Matrizes Progressivas Coloridas de Raven © motivo da escolha da prova Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (1956), prende-se com os seguintes aspectos: a faixa etéria da populagtio alvo do estudo (ctiangas entre os 7 ¢ 9 anos); a validade e a fidelidade da prova, Por se tratar de uma populagio muito jovem, que pode apresentar tempos de atengdio reduzidos, esta prova apresenta cada problema de cor viva impresso sob um fundo branco. Desta forma pretende-se atrair e manter a atengdo das criangas, 0 que faz. com or que a natureza do problema a resolver seja mais evidente, sem que contribua para a sua solugao (Raven, 1956). 'As Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (1956), si compostas por 3 conjuntos de pranchas (A, Ab e B), cada um com 12 pranchas. Cada prancha apresenta uma situago problemdtica: uma figura incompleta, com seis possibilidades de preenchimento (onde 6 uma delas esté correcta). Esta prova foi estabelecida de forma a permitir avaliar 0 desenvolvimento cognitivo de criangas dos 3 aos 10 anos, com uma maior dispersao de resultados, tendo por objectivo a diminuigdio da possibilidade de encontrar a solugdio por acaso. ‘A escolha da edigio revista prende-se com o facto desta estar mais apta para seleccionar ‘8 sujeitos que, por uma razo ou por outra, tém um nivel mental inferior a média, que tm debilidade, deterioragdo mental ou retardada Esta edigio tem uma série intermediiria (Ab) de doze problemas que foi intercalada entre as séries Ae B das Matrizes de 1938. Os problemas dessa série foram concebidos para ter uma dificuldade intermédia entre a dificuldade dos problemas 7 ¢ 10 da série A e a dos problemas 1 a 7 da série B. Foram estabelecidos de maneira a que, pelas trés séries combinadas, as criangas dos 3 aos 10 anos pudessem resolver mais trés problemas por ano de idade suplementar (Raven, 1956). Desta forma pretendia-se assegurar a equivaléncia dos grupos, ao nivel da varidvel nivel intelectual, de modo a garantir que as diferengas nos desempenhos dos participantes na resolugio de diferentes problemas de adigo © subtracgaio nfo eram influenciadas por diferengas cognitivas entre os sujeitos. © Quadro 2, mosira-nos que a média geral da amostra na prova de desenvolvimento cognitivo situa-se no valor 24,55, o que significa que situam-se no percentil 84,75. O grupo 1 (Manual Amiguinhos) tem um percentil médio de 84 valores, enquanto que, 0 68 grupo 2 (Manual Fio-de-Prumo) apresenta um percentil médio de 87 valores, e por iiltimo, 0 grupo 3 (Manual Eu e 0 Bambi) tom um percentil médio de 83 valores (ver Anexo B). Quadro 2: Caracterizagio da mostra em relagZo aos resultados da Prova Matrizes Progressivas de Raven Grupo 1 miguinhos) Grupo 2 iode-Pramoy Grupo 3 ue 0 Bambi) Geral da amosira Pelos critérios de selecgio da amostra acima descritos néio foi possivel garantir a equivaléncia entre os grupos em relaco A variavel nivel socio-econémico. Dados como a escolaridade dos pais, o rendimento per capita, se a crianga usufruia de acco social escolar, entre outros, no foram possiveis de obter. Apenas se obtiveram informagoes, a partir de conversas informais com os professores responsaveis da turma, acerca do estatuto socio-econdmico dos participantes. Ainda que os grupos apresentem valores médios muito préximos em relagiio as varidveis idade e nivel cognitivo néio podemos afirmar que os grupos so equivalentes entre si quanto & variavel nivel sécio-econdmico. Em suma, neste estudo exploratério, pretendia-se, analisar os cinco manuais mais escolhidos pelas escolas portuguesas, para 2° ano de escolaridade, para a disciplina de Matematica e analisar 0 desempenho de criangas do 2° ano, em fungo do manual utilizado para leccionar a disciplina de Matematica, sendo entio varidvel independente do estudo 0 manual 69 Jnstrumentos © presente estudo pretendeu analisar nos manuais de Matemética, sobretudo, trés aspectos: a proporgio de problemas em comparago com o niimero de exercicios existentes nos cinco manuais escolares de Matematica, do 2° ano de escolaridade; as categorias de problemas de adig&io e de subtraccdo presentes nestes manuais, identificando, também, a natureza da incognita; e, se a utilizagiio de um determinado manual interfere ou nao nos desempenhos das criangas, quando sfio confrontadas com a resolugdo de diferentes categorias de problemas. De modo a analisarmos as categorias de problemas de adig#io e de subiracgtio presentes nos manuais em estudo recorreu-se 4 tipologia de problemas de adigo e de subtrac¢io de Vergnaud (1982), que por sua vez. serviu de base a construgio do instrumento de avaliagio do desempenho das crianeas. Andlise dos Manuais 0s cinco manuais mais adoptados a nivel nacional no 2° ano de escolaridade, para a disciplina de Matematica, entre anos lectivos 2004/2005 a 2006/2007, segundo informagdes conseguidas junto de uma das editoras, foram: 1. “Fio-de-Prumo”, da Livraria Amado; 2. “Amiguinhos”, da Texto Editores; 3. “A Matematica do Jodo”, das Edigdes Gailivro; 4, “Caminhos”, da Porto Editora; 5. “Bue o Bambi”, da Porto Editora Através do processo simples de contagem, foi registado o nlimero de exercicios de adiges e de subtracgdes que os manuais supracitados apresentavam, desde os exercicios que remetiam para a decomposi de mimeros; passando por aqueles em que se procurava estabelecer comparagées (as criangas tinham de colocar os sinais de maior, menor ou igual) e tinham de efectuar as operagies de adigo ¢ de subtracgo (por 10 exemplo, 3+4 () 6 ou 5-2 (1 341); até aos que continham as duas operagées ou exercicios simples de digo e de subtracgao. Os problemas de adig&io © de subtracgiio, que estes manuais apresentavam, foram analisados utilizando a metodologia de andlise de conteiido, tendo por base a tipologia de problemas de Vergnaud (1982). Apresenta-se a seguir a grelha que permitiu categorizar os problemas (Quadro 3). Através das categorias de problemas pretendia-se comparar os diferentes manuais Quadro 3. Tipologia de problemas aditivos e subtractivos (Vergnaud, 1982) e exemplos presentes nos cinco manuais em estudo. Tipos de problema ‘Composicao de duas medidas (Cat_I) 1. X tem seis bolas no seu bolso direito ¢ oito no esquerdo, Tem 14 bolas no total. 2X tem seis bolas no seu bolso direito e algumas no esquerdo. Tem 14 bolas no total 3, X tem algumas bolas no seu bolso direito e oito no esquerdo. Tem 14 bolas no total ‘Exemplos de problemas da categoria I: - 1. A fruteira tem 8 macas, 2 péras ¢ 9 figos. Quantas pegas de fruta tem no | total? (Fio de Prumo, manual, p. 14) 2. Amie e 0 pai do Raul tém, em conjunto, 67 anos. A mée tem 31. Qual 6a} idade do pai do Raul? (Fio de Prumo, cademo de fichas ~ 2°P, p. 6) 3. De um livro com 28 paginas ja se leu meia dezena. Quantas paginas faltam ler? (A Matemética do Jot, manual, p. 14) | ‘Transformacdo unindo duas medidas (Cat_II) 4, X tinha 3 bolas, Em seguida Y deu-lhe 5. Quantas bolas tem X agora? 5. X tinha 8 bolas. Depois deu 5 a Y. Quantas bolas tem X agora? 6. X tinha 3 bolas. Y deuthe algumas bolas. Agora X tem 8 bolas, Quantas bolas ¥ deu aX? 7. X tinha 8 bolas. Ele dou algumas a Y. Agora X tem 3 bolas. Quantas bolas deuaY? 8 X tinha bolas, Y deu-the mais 5. Agora X tem 8 bolas. Quantas bolas X tinha? 9, X tinha bolas. Deu 5 a Y. Agora X tem 3 bolas. Quantas bolas ele tinha? | Exemplos de problemas da categoria I 4, © Tiago tinha 21 cromos. Um amigo deu-the 8. Com quantos cromos ficou 0 | ‘Tiago? (Caminhos, livro de fichas, p. 5) 5. Num aviio havia 87 para-quedistas. Saltaram 23. Quantos para-quedistas ainda esto a bordo? (Caminhos, manual, p. 93) 6. Havia oito rosas num grande ramo. A florista colocou-lhe mais rosas. O ramo ficou com dezena e meia de rosas. Quantas rosas Ihe colocou a florista? (A Matematica do Joo, manual, p. 135) 7. No prato havia 18 rabanadas, Ficaram 12, Quantas rabanadas se comeram? (Fio de Prumo, livro de fichas - 1° P, p. 32) 8, (Nenhum exemplo encontrado nos manuais analisados) 9. Dei dois lapis ao Pedro e trés @ Marta. Fiquei com quinze lapis. Tinha __lépis, (Eu e o Bambi, livro de fichas, p. 26) Relacii estiitica entre duas medidas (Cat_IIl) 10. X tem 8 bolas. Y tem 5. Quantas bolas X tem a mais que Y? 11. X tem 8 bolas. Y tem 5. Quantas bolas ¥ tem a menos que X? 12. X tem 3 bolas. Y tem 5 bolas a mais que X. Quantas bolas Y tem? 13, X tem 8 bolas. Y tem 5 a menos. Quantas bolas Y tem? 14, X tem 8 bolas. Tem 5 bolas a mais que Y. Quantas bolas Y tem? 15, X tem 3 bolas. Tem 5 bolas a menos que Y. Quantas bolas ¥ tem? Exemplos de problemas da categoria IIT: 10. O Tiago esté a organizar a sua colecgdo de berlindes. Contou-os e fez registo numa tabela, Quantos berlindes pequenos tem a mais do que grandes? n (Caminhos, livro de fichas, p. 14) 11. A Rita tem 95 céntimos, O Jofo tem 80 céntimos. O Joao tem menos _ céntimos do que a Rita. (Eu e o Bambi, manual, p. 119) 12. A Sandra tem 9 anos e o pai tem o quédruplo da sua idade. A avé tem mais 23 anos que o pai da Sandra, Quantos anos tem a avé da Sandra? (A Matematica do Jodo, livro de fichas, p. 76) 13. O Jodo tem 15 cromos. O Francisco tem menos 2 cromos do que o Jodo. } Quantos cromos tem o Francisco? (Eu e 0 Bambi, livro de fichas, p. 21) 14, (Nenhum exemplo encontrado nos manuais analisados) 15. (Nenhum exemplo encontrado nos manuais analisados) ‘Composicio de duas transformacées (Cat_IV) 16. X ganhou seis bolas esta mani. Perdeu nove a tarde, No total perdeu trés bolas. 17. X ganhou seis bolas de manha. Perdeu algumas 4 tarde. Em todo o dia perdeu trés bolas. 18. X ganhou algumas bolas esta manha. Perdeu nove a tarde. Em todo o dia perdeu 3 bolas. Exemplos de problemas da categoria IV: 16. O Diogo tinha 78 cromos. Perdeu uma dezena e deu cinco ao seu colega Com quantos cromos ficou? (A Matematica do Joao, manual, p. 42) ados) | 18, Venderam-se 25 revistas infantis num dia e no dia seguinte venderam-se 43. 17. (Nenhum exemplo encontrado nos manuais an: Sobraram 2 revistas. No quiosque havia_ dezenas de revistas infantis. (Eu e ‘o Bambi, manual, p. 42) | Transformacio entre duas relacées estiticas (Cat_V) 19, X devia seis bolas a Y. Ele devolve quatro. X deve ainda duas bolas a Y. 20. X devia 6 bolas a Y, Devolveu-lhe algumas. X ainda deve duas bolas a Y. 21. X devia algumas bolas a Y. Devolvew-the quatro. X ainda deve duas bolas a | y. Exemplos de. problemas da categoria V: (Nenhum exemplo encontrado nos manuais | analisados) | Composieto de duag relagies estitieas (Cal_VD) 22. X deve oito bolas a Y. Mas Y deve seis bolas aX. X deve duas bolas a Y. 23, X tem sete bolas a mais que Y. Y tem trés bolas a menos que Z. ¥ tem quatro bolas a mais que Z. Exemplos de problemas da categoria VI: (Nenhum exemplo encontrado nos manuais| analisados) Foram encontradas redundéncias na estrutura de alguns manuais no que se refere as varias categorias de problemas, pelo que ao nivel do desempenko infantil nas categorias no existiriam diferengas, e optimos por analisar apenas 3 manus. Depois desta andlise averiguou-se como se caracterizavam os problemas aditivos subtractivos nos manuais em relagdo & variavel natureza da incégnita. Como a literatura nos diz, as criangas tém mais dificuldade em resolverem problemas cujo estado inicial ¢ desconhecido, isto quando so problemas que implicam transformagdo que une duas medidas. J4 nos problemas de composigfo de duas medidas, por exemplo, as criangas resolvem mais facilmente os problemas quando tém de encontrar o total (Carpenter & Moser, 1982, 1983; Vergnaud, 1982). Com esta andlise pretendemos analisar o grau de dificuldade dos problemas aditivos e subtractivos dos manuais escolares em estudo Contabilizaram-se entfio, para as caiegorias de problemas, a natureza da incégnita, da seguinte forma: composieiio de duas medidas (categoria 1), existem duas hipéteses de incégnita, encontrar o total ou uma das medidas; transformagdo unindo duas medidas (categoria TD, a incégnita pode ser encontrar o estado final, a transformago ou o estado inicial; relagdo estética entre duas medidas (categoria TH), as hipéteses podem ser encontrar o total ou uma das medidas, e na composig@o de duas transformacoes 1" (categoria IV), a incdgnita pode remeter para encontrar o estado final, a transformagio icial (Vergnaud, 1982). ou oestado ‘Nao surge a categorizagiio dos problemas transformacdo entre duas relagoes estiticas (categoria V) ¢ composiedo de duas relagdes estiticas (categoria V1), em relagao & natureza da incdgnita porque nfo existem problemas destas categorias nos manuais analisados. Avaliagdo dos Desempenhos das Criancas Com 0 objectivo de avaliar 0 desempenho das criangas do 2° ano de escolaridade, na resolugdo de diferentes categorias de problemas de adigilo e subtracgo elaborou-se um instrumento de avaliagdo. De seguida, designar-se-4 o referido instrumento, as suas caracteristicas, assim como, a anilise estatistica realizada, para apurar se as diferengas encontradas seriam significativas ou néo. Prova de Resoluedio de Problemas de Adicéio e Subtracedo Tendo por base a tipologia de problemas de adigdo e subtracgio de Vergnaud (1982), foram escolhidos 16 dos 23 problemas possiveis de definir segundo esta tipologia. Na escotha destes problemas foram tidos como critérios as relagdes que se definem em fungo dos conceitos de medida (composigdo de duas medidas; transformagdo unindo duas medidas; relaciio estdtica entre duas medidas), ¢ de transformagdes temporai (composicdo de duas transformagoes), visto serem estes os aspectos que caracterizavam os problemas presentes nos manuais em estudo. A partir desta base de trabalho, elaboraram-se 16 novos problemas: 3 problemas da categoria I, ‘composigdo de duas medidas’; 6 da categoria Il, ‘transformagdo unindo duas medidas’; 6 da categoria IIL, ‘relacdo estdtica entre duas medidas’, ¢ 1 problema da categoria IV, ‘composi¢ao de duas transformagdes’. Ainda que existam trés possibilidades de problemas desta iiltima categoria, optou-se por apenas colocar um 5 porque nio foram encontrados mais problemas destes nos manuais em anélise e também de jo a faixa etéria dos participantes. ‘As quantidades em relagdo, nos problemas formulados, no excediam as dezenas, quer isto dizer que dos dados fornecidos, assim como das operagdes a efectuarem, as criangas no tinham de operar com niimeros com mais de dois digitos. Outro dos aspectos tidos em conta foi o recurso 20 transporte no caso da adicao, e do empréstimo no caso da subtracga0, Assim, optou-se por colocar os problemas mais simples de cada categoria com esta variavel. Veja-se no quadro seguinte quais os problemas que mobilizam transporte e empréstimo, assim como, as operagdes que as criangas teriam de efectuar. Quadro 4. Caracterizagio da Prova de Resoluedo de Problemas Aditivos e Subtractivos em relagio as operagSes que mobilizam, [_Probiemas D 1 Depois de formulados os problemas das diferentes categorias, estes foram aleatoriamente colocados na prova, ficando assim esta definida, tal como pode ser vista no Anexo C. A Prova de Resolugéio de Problemas de Adicio e de Subtraceao foi aplicada no final do 3° periodo, durante o més de Maio. 6 De modo a averiguar a significdncia das diferengas encontradas nos desempenhos dos participantes, consoante o manual que tinham tido no ensino da Matemética, recorreu-se a tratamento estatistico, a saber a uma ANOVA, para um nivel de significdncia de o= 0,05. A escolha deste teste estatistico prende-se com a anélise da média dos trés grupos, dai a andlise das varifincias (Maroc, 2003). Outro aspecto analisado, nos desempenhos dos participantes, prende-se com a variavel: natureza da incégnita, Deste modo, para cada categoria de problemas, analisou-se a existéncia de diferengas nos desempenhos dos participantes consoante 0 manual adoptado, se a incognita variasse. Coneretizando, pretendeu-se elucidar se para os problemas de transformacdo unindo duas medidas, para os problemas onde se tem de encontrar o estado inicial, existe algum grupo de participantes que os resolvem com maior facilidade, por exemplo. © tratamento estatistico utilizado foi um t-student (Maroco, 2003), para um nivel de significdncia de a= 0,05. Procedimentos De seguida serio clarificados os procedimentos levados a cabo na analise dos manuais, na avaliagio do nivel cognitivo ¢ do desempenho das criangas na resolugéio de problemas aditivos e subtractivos. Anélise dos Manuais Escolares ‘A identificagdo dos 5 manuais escolares, da disciplina de Matemética do 2° ano de escolaridade, mais escolhidos pelas escolas portuguesas, possibilitou a andlise das categorias de problemas de adigo e de subtracgdo que so mais trabalhados no ensino da Matemética. Num primeiro momento, procedeu-se & contagem do nimero de exercicios de adi¢ao de subtracgdo que cada manual apresentava. Apés a identificagiio dos problemas que estavam presentes em cada manual, efectuou-se uma anélise de contetido, baseada na tipologia de problemas de Vergnaud (1982), de forma a classificé-los. Essa analise foi posteriormente aprofundada categoria a categoria em fungdo da natureza da incognita. Num segundo momento, elaborou-se a prova de avaliagéo da resolugdio de problemas aditivos € subtractivos, problemas estes definidos segundo a tipologia de Vergnaud (1982), tendo em vista @ anélise dos desempenhos das criangas do 2° ano de escolaridade, do 1° Ciclo do Ensino Basico Apés 0 contacto com as escolas, e facultada a autorizagao dos encarregados de educagio dos alunos envolvidos, foram seleccionados os participantes do estudo. Por se ter trabalhado com criangas muito novas, e de modo a evitar constrangimentos que pudessem enviesar os resultados, destinou-se um pouco do tempo inicial com a crianga para a familiarizagao desta com o entrevistador. Avaliagio do Nivel Cognitivo dos Participantes Durante o periodo de familiarizagiio, dizia-se & crianga que também nos andiivamos na escola, que tinhamos de fazer um trabalho sobre a Matematica e que para isso precisivamos da ajuda dela, Comegava-se por dizer que ‘amos fazer um jogo, introduzindo-se assim a prova Mairizes Progressivas Coloridas de Raven. Mostrava-se a primeira prancha e dizia-se “Estds a ver este desenho aqui? Falta-the um bocadinho, tens de procurar nestes quadradinhos aqui, Explicava-se também a légica da prova, ou seja, nessa primeira prancha remetia-se a crianga para procurar 0 quadrado que tinha 0 mesmo padréio do desenho principal. Para garantir que a crianga tinha percebido a prova, mostrava-se a segunda prancha ¢ perguntava-se “E aqui, qual achas que é?”. Se a crianga errasse nesta resposta, repetia- se o procedimento; caso a crianga desse a resposta correcta, iniciava-se a prova, voltando 4 primeira prancha, registando as respostas da crianga na folha de resposta (ver Anexo D). 8 “Avaliagdo do Desempenho dos Participantes na Resolugao de Problemas Aditivos e Subtractivos Concluida a prova Matrizes Progressivas Coloridas de Raven, solicitava-se crianga que resolvesse um conjunto de problemas (Prova de Resoluedo de Problemas de Adicio e Subtracedo, ver Anexo C). Para evitar erros de compreensio, os problemas eram todos lidos pelo entrevistador, dizendo este & crianga que “Para ser mais répido eu leio-te 0s problemas.”, $6 nas situagdes em que as criangas, por iativa propria, comecavam a acompanhar a leitura ou se antecipavam a leitura do entrevistador, e liam correctamente os enunciados, era pe ido que fossem elas a lerem os problemas. A crianga era ainda fornecida uma folha de resposta para que escrevesse a resoluco de cada problema em espago proprio (ver Anexo E). Depois da leitura de um problema a crianga resolvia-o logo na folha de resposta, nos casos em que as criangas davam logo a solugdio do problema, ou nfo recorriam aos algoritmos escritos, o entrevistador tomava nota da resposta dada pela crianga. 7» Resultados © presente capitulo pretende explicitar os resultados encontrados nas duas andlises efectuadas: a anélise dos manuais e a andlise dos desempenhos das criangas na resolugdo de problemas aditivos ¢ subtractivos. Por manual deve entender-se o manual propriamente dito e o respectivo livro de fichas, na medida em que, actualmente, em Portugal, os manuais escolares so quase sempre acompanhados de outro(s) livro(s), que so os livros de fichas, compostos por exercicios da matéria apresentada no livro principal (manual). Para o presente estudo, foram considerados estes dois elementos, assim a cada referéncia que se fizer ad manual, o conceito deve ser entendido como a jungao do manual ¢ do(s) respectivo(s) livro(s) de fichas. Caracterizagéio dos Manuais Com base na grelha de classificagio de problemas de Vergnaud (1982), foram clasificados todos os problemas que apareciam nos 5 manuais em estudo. Foram excluidos da classificagio os problemas que: apresentavam a(s) operagao(6es); no enunciado indicavam também a operago a efectuar; solicitavam a indicagfio do maior ‘ou do menor, ou apenas a leitura de dados (fornecidos por um gréfico ou tabela de dupla entrada); remetiam para uma estimativa do resultado, e/ou nao cabiam na classificagao escolhida. Apés esta primeira anilise, chegou-se entdo a categorizago dos problemas aditivos e subtractivos, que os diferentes manuais apresentavam. 80 Andlise dos Cinco Manuais mais Escolhidos pelas Escolas Portuguesas Em relag&o ao primeiro objectivo do nosso estudo, ou seja, a percentagem de exercicios ¢ problemas aditivos ¢ subtractivos presentes em cada manual, podemos observar que existe uma grande predomindncia de exercicios em detrimento dos problemas (Quadro 5). Em todos os manuais existem muitos mais exercicios de adig&o e de subtrac¢lio do que problemas. ‘Quadro 5. Percentagem de problemas em relago a totalidade de exerefcios que requerem as operagoes de adigao e de subtracgio. iematica do Tue o Bambi (Manual 3) (Manual 5) 'N Problemas NPINE % WoNomero, NE= Numero de xercson, NPNumero de Problems Da leitura do quadro 5, podemos verificar que o manual Matemética do Jodo (manual 3) 0 manual Caminhos (manual 4) so os manuais que apresentam um maior nimero de problemas quando comparado com 0 niimero de exercicios. Claramente se percebe a grande predominancia de exercicios presentes nos diferentes mant Constatou-se que 0s exercicios presentes nos manuais escolares, em estudo, so de 5 categorias diferentes, a saber: adigfio; subtracedio; mistos (com adigdes ¢ subtracgées); decomposigao/composigéio, ¢ de comparagio (indicar se ¢ >, < ou =) recorrendo a operagiio de adigo ou de subtracgdo (Quadro 6). ‘A andlise do quadro 6, revela-nos ainda que, em todos os manuais mais de 50% dos exereicios sto exercicios de adig&o, logo seguidos dos exercicios de subtracgtio. Apesar dos exercicios de comparagdio, em que as criangas tém de colocar os sinais de >, < ou, depois de efectuarem operagies de adigdo ou de subtracgéio, serem em menor nimero, também nestes exercicios as adigGes so em maior ntimero do que as subtracges. Tree | fe | [Pres [1 z : 817 | 59.81 1090 | 64,46 | 7: 377 | 27,6 | 204 | 2702} 332 | 19,63 } 242 | 21,21 nm | 631 50 | 662 o | o 93 | 5,50 86 | 509 f 30 | 263 70 | 5,12 1s | 444 TB | 534 15 | 089 29 | 22 Como vimos anteriormente, os problemas nfio se dis operagtio que implicam, mas sim pelas suas caracteristicas seménticas. A tipologia de problemas que serviu de base para a andlise dos problemas, presentes nos cinco manuais em estudo, foi a classificagdio de Vergnaud de 1982. Esta classificagao pée em evidéncia o célculo relacional que pode existir entre os dados, Jar as relagées em seis categorias distintas. Relembramos, que dai que seja possivel estas relagdes sto agrupadas segundo trés tipos principais de conceitos, a saber: medidas, transformagées temporais e relagbes estiticas. composicéio de duas medidas Desta forma temos as seguintes categorias de problema: (Cat_); transformagao unindo duas medidas (Cat_Il); relagdo estética entre duas medidas (Cat_IIl) (nestas categorias, 0 conceito principal é uma medida); composi¢do de duas transformagées (Cat_1V) (nesta categoria sio as transformagdes_temporais); transformacio entre duas relacdes estiticas (Cat_V) © composigdo de duas relagdes 2 estéticas (Cat V1) (€ nas tiltimas categorias, os conceitos sfio as relagGes estiticas) (Vergnaud, 1982). Desta forma, respondendo ao segundo objectivo do estudo, podemos observar, no quadro 7, como & que os cinco manuais se caracterizam no que respeita ds categorias de problemas. Rapidamente verificamos que nenhum dos manuais apresenta problemas que implicam transformagdo entre duas relagBes téticas (categoria V) e problemas que remetem para a composigaio de duas relagdes estdticas (categoria V1) (Quadro 7). © manual que mais se destaca em comparagio com os outros, por possuir poucas categorias de problemas é 0 manual Amiguinhos. Este manual s6 tem duas categorias de problemas: composigdo de duas medidas (categoria 1) ¢ transformagao unindo duas medidas (categoria 11). O manual Fio-de-Prumo apresenta trés categorias de problemas, € of restantes apresentam quatro categorias diferentes, segundo a classificagdio de ‘Vergnaud (1982) (Quadro 7). Quadro 7, Frequéncia epercentagem de problemas por categoria existentes nos cinco manuas. FiodePruno | Aniguinhos [| Mat doJodo | Caminhas | Eweo Bambi jal farual2) | (Manual 3)_|_ (Manual 4) | (Manual as | 4s | at 2s | 397 | % % u | 33 66 Categoria I Categoria It 12 | 255 Categoria II 3 | 64 Categoria IV Categoria V Categoria VI ‘TOTAL Castors Compestio de dues medidas, Categona il Transfoonayso unin duss medidas” Categoria I~ Relayao eaica ‘sire iss medidas, Categoria TV. Composigio de dias tansformagées, Categoria V ~ Tranformaggo enre dua relapdes sttcas: Categoria VI Composigo de dus relapdes estes. 8 Da analise do quadro 7, podemos também observar que a grande predomindncia de problemas so da categoria I, ou seja, nos cinco manuais 0 maior nimero de problemas Jio os de composicdo de duas medidas (Vergnaud, 1982). Ainda que no manual Caminhos, surja um problema da categoria composi¢do de duas transformagées, quando comparado com os outros manuais, esse valor niio é muito significativo. Apesar dos manuais Matemdtica do Jodo ¢ Eu e 0 Bambi terem quatro categorias diferentes de problemas, nomeadamente das categorias relagdo estdtica entre duas medidas ¢ composigdo de duas transformagées (categorias Ill e IV, respectivamente), nenhuma delas assume valores superiores a 25% (Quadro 7). Podemos entio sintetizar, caracterizando os cinco manuais em anilise em termos da diversidade de categorias dos problemas da seguinte forma: - 0 manual Amiguinhos tem apenas duas categorias de problemas, sendo que mais de 73,3% sto problemas de composiciio de duas medidas (categoria I), da classificagio de Vergnaud (1982) (Quadro 7); = 0s manuais Fio-de-Prumo e Caminhos apresentam trés tipos diferentes de problemas; ainda que 0 4° manual tenha um problema da categoria IV (composicdo de duas transformagées), consideramos que este no & significativo (representa 2,1% dos diferentes problemas), para além de que estes manuais apresentam mais de 50% de problemas (63,3% © 66%, respectivamente) da categoria I (composicdo de duas ‘medidas, Vergnaud, 1982); - 0s manuais A Matematica do Jodo Eu e 0 Bambi apresentam quatro categorias de problemas (composicdo de duas medidas, transformagdo unindo duas medidas; relacio estética entre duas medidas; ¢ composigio de duas transformagées) com percentagens muito homogéneas, apresentando todas valores abaixo dos 50%. 84 Em sintese, da andlise dos varios problemas presentes nos vérios manuais em estudo retiramos que: existe uma maior predomindncia de exercicios de adigdio © subtracgio, em detrimento dos problemas aditivos e subtractivos; nenhum manual abrange todas as de categorias de problemas; mesmo os que apresentam variedade nas categorias de problemas, existe sempre uma prevaléncia por uma determinada categoria, ou seja, centram-se numa determinada categoria (neste caso, na categoria composi¢dio de duas medidas ~ categoria 1). ‘A andlise das categorias de problemas, presentes nos manuais, permite ainda perceber as semelhangas entre os manuais ¢ agrupé-los segundo este oritério. De seguida, iremos analisar os manuais sob o ponto de vista da natureza da incdgnita. Quer isto dizer que, para trés dos manuais, visto existir semelhangas entre eles, ser analisada a posig&io da incdgnita para cada categoria de problemas presentes nos manuais. Anélise dos Problemas em Relagéo & Natureza da Inedgnita Como vimos anteriormente existem quatro manuais que so parecidos entre si, dois a dois, em relagdo as categorias de problemas, que so os manuais: Fio-de-Prumo ¢ Caminhos, ¢ A Matematica do Jodo ¢ 0 Eu e o Bambi. Consideramos, 0 manual Fio-de- Prumo mais representativo do que o manual Caminhos por apresentar as trés categoria de problemas, ¢ © manual Ew e o Bambi, por apresentar uma maior homogeneidade de problemas ao longo das quatro categorias de problemas, em comparagao com manual A Matemética do Jodo. Assim sendo, iremos de seguida analisar em cada um dos manuais e para cada categoria de problemas, a natureza da incégnita. A literatura diz-nos que, para além do tipo de relagdes e de acgdes caracteristicas dos problemas, a posigéo da incdgnita também introduz dificuldades na compreenstio de um problema (Carpenter & Moser, 1982; Vergnaud, 1982). Uma coisa é encontrar um estado inicial, um estado final ou uma transformagio, nos problemas que implicam transformacdo unindo duas medidas e composigdo de duas transformacdes; outra coisa a ter em conta é que nos problemas de composicéio de duas medidas ¢ relagdo estética entre duas medidas, ¢ de complexidade diferente encontrar o total ou uma das medidas, por exemplo. Para obter valores mais reais, a percentagem de problemas, em relagdo a0 posicionamento da incégnita, ser encontrada a partir do mimero total de problemas existentes no manual. Manual Amiguinhos Como vimos anteriormente, 0 manual Amiguinhos apresenta apenas duas categorias diferentes de problemas, composigiio de duas medidas (categoria 1) © transformacao unindo duas medidas (categoria 11). Observando o quadro 8, verificamos que grande parte dos problemas de composi¢do de duas medidas, presentes neste manual remetem para encontrar o total, enquanto que para todos os problemas de transformagdo unindo duas medidas a incognita situa-se na procura do estado final. ‘Quadro 8: Frequéncia'e percentagem de incégnitas por catogorias de problemas no manual Amiguinhos. Composigiio de 2 Medidas (Cat_1) Transformagio Unindo 2 Medidas (Cat_l) ‘Natureza da Ineégnita Medida Total Estado Toad Transtformagio Estado Final TOTAL (15) Manual Fio-de-Prumo © manual Fio-de-Prumo apresenta trés categorias diferentes de problemas: composigao de duas medidas (categoria 1); transformagdo unindo duas medidas (categoria 11), © relagdo estética entre duas medidas (categoria Il). 86 Verificamos que nos problemas da categoria composiedo de duas medidas (categoria 1), no que respeita & natureza di \c6gnita, este manual apresenta mais problemas onde se tem de procurar o total do que uma das medidas. Em relago aos problemas que implicam a transformagéo unindo duas medidas (categoria 11), observando 0 quadro 8, apuramos que existe uma prevaléncia dos problemas que implicam encontrar 0 estado final; © para os problemas de relagdo estética entre duas medidas (categoria Ul) presentes no manual, observamos que tanto existem aqueles que remetem para encontrar uma das medidas, como para encontrar 0 total (Quadro 9). Quadro 9, Frequéncia e percentagem de incdgnitas por categorias de problemas no manual Fio-de-Prumo. Composigdo de 2 | Transformagiio Unindo | Relagdo Bxtdtica entre Nitureza da Incégnita | Medidas (Car_ly | 2 Medidas (Cat_tt) | 2 Medidas (Cat_II1) % Medida 12 Toial 102 Estado Inicial a Transformagio T 2 Estado Final 6 13s TOTAL 3 @3 7 143 1 24 Manual Eu eo Bambi Anteriormente, verificdmos que o manual Eu ¢ 0 Bambi apresenta quatro categorias diferentes de problemas, relembrando: composigio de duas medidas (categoria 1); transformagdo unindo duas medidas (categoria II); relagio estitica entre duas medidas (categoria III), e composigdo de duas transformagdes (categoria IV). Observando © quadro 10, um dos aspectos que ressaltam é a semelhanga com 0s outros dois manuais, nas duas primeiras categorias de problemas (composigao de duas medidas € transformagiio unindo dias medias) em relagfo & natureza da ineégnita, ou seja, 87 também neste manual a predomindncia € em encontrar o total ¢ o estado final nas categorias I e II, respectivamente. Mas, nas categorias relagdo estitica entre duas medidas (categoria III) e composigtio de duas transformages (categoria IV), observando 0 quadro 10, verificamos que neste manual surgem mais problemas que remetem para encontrar 0 total (relago estatica entre duas medidas), ¢ 0 estado final (composigao de duas transformagées). Quadro 10. Frequéncia e percentagem de incégnitas por categorias de problemas no manual Ku e 0 “Transformagio =| = : = = C Anilise dos Desempenhos dos Participantes Nesta secgio efectuar-se- uma andlise quantitativa, que remete para o numero de respostas correctas dadas pelos sujeitos de cada grupo, Nesta andlise serio comparados ‘os desempenho dos trés grupos de participantes para cada categoria de problemas, primeiro de uma forma geral, depois para a especificidade da natureza da incégnita. Resultados da Prova de Resolugéio de Problemas de Adigiio e de Subtracedo De seguida descrever-se-4 os resultados encontrados entre os grupos para as quatro categorias de problemas da Prova de Resoluedo de Problemas de Adi¢do e de Subiracgio, segundo a classificagdo de Vergnaud (1982). 88 Relembramos que, os problemas que compGem a categoria de composi¢ao de duas medidas, nesta prova, sf 0s problemas 1, 4 ¢ 11 (categoria 1); os da categoria transformagdio que une duas medidas s4o os problemas 5, 6, 9, 10, 12 ¢ 16 (categoria Il); enquanto que os problemas 2, 3, 7, 8, 13 e 14, sto todos da categoria relagdo estética entre duas medidas (categoria II), ¢ por iltimo, o problema 15 ¢ problema que ilustra a categoria composigdto de duas transformagées (categoria IV) Consoante 0 desempenho das criangas as suas respostas podiam ser cotadas com 0, se errassem na resposta; 1 se a operagao estivesse certa, mas com erro de calcul e, por liltimo, 2, se a operagio € 0 célculo estivessem correctos. ‘A andlise estatistica diz-nos que as diferengas encontradas no desempenho das criangas dos diferentes grupos na Prova de Resolugdo de Problemas de Adicao e de Subtraceao nio sii estatisticamente significativas (F(2.57)=0.390. p = 0.679) (ver Anexo F) Problemas de Composicio de Duas Medidas (Categoria I Em relago aos problemas da categoria I de Vergnaud (1982), ou seja, problemas que implicam a composieiio de duas medidas, analisando o quadro 11, verificamos que nfo existem grandes discrepfincias nos desempenhos das criangas dos diferentes grupos. Mas é de realgar que, as criangas que tiveram ensino da Matematica baseada no manual Eu e 0 Bambi (grupo 3), so as que tém um desempenho inferior no problema 1, da referida categoria Neste problema era solicitado as criangas que apurassem o valor de uma das medidas, sendo-lhes facultado o valor total do conjunto. Quadro 11, Desempenho das eriangas na resolugio de problemas de composigio de duas medidas (ategoria 1) Grupo? Grupos (Fio-de-Prumo) (Bue o Bambi) | ati oar 9 Problema 11 1,00, Total a Cateporiat | 415, 4 A anilise estatistica diz-nos que as diferengas encontradas no desempenho das criangas, na categoria de problemas de composigdo de duas medidas (Categoria 1), ou seja na resolugfio dos trés problema que compdem a categoria, nfio so estatisticamente significativas (F(2.57)=0.744. p = 0.480) (ver Anexo G). Se analisarmos 0 que acontece quando isolamos a variével natureza da incégnita, verificamos que os trés grupos de participantes apresentam desempenhos mais satisfat6rios no problema de composigdio de duas medidas (problema 4; 0 problema | ¢ 11 remetiam para encontrar uma das medidas), em que tinham de encontrar o total dos conjuntos (quadro 12). E de realgar que este é o problema mais facil desta categoria, Quadro 12, Desempenho das criangas aos problemas de composigdo de duas medidas (categoria 1), em relagio & natureza da incdgnita, Grupo Grupo 2 Grupos Armiguinkos) (Fio-de-Prumo) | (Ewe oBambi) i Des Média Pe Medida cat | 245 | 037 Total_ Cat, 340_| 021 Se analisarmos os desempenhos de cada grupo de criangas, em relagiio ao seu desempenho nos problemas em que tém de encontrar uma das medidas eo total, verificamos que as diferengas nos desempenhos so estatisticamente significativas (1(19) = -2,334, p = 0,031; 1(19) = -2,746, p = 0,013, ¢ t(19) = -3,813, p = 0,001) (ver Anexo HD). Problemas de -ansformacdo que Une Duas Medidas (Categoria I) ‘No que respeita aos problemas de transformagdo que une duas medidas (categoria Il, segundo Vergnaud, 1982), da anilise do quadro 13, verificamos que as oriangas dos trés grupos em estudo apresentam desempenhos muito semelhantes na resolugao destes problemas. 90 Quadro 13, Desempenko das eriangas na resolugdo de problemas de transformagdio que une duas medidas (categoria 1), Grupo Grupo? Grupos Amiguinhos jo-de-Prumo) iw eo Bambi) Desi | ayeqig | Deion Desviow 7 _[_oat 0,66 | 165 [049 Problema 6 145 [0.89 0.89 Problema 9 0.65} ot 055 Probiema 10 1s | 059 115 | 081 10 . Problema 16 A TE EO “Total da Categoria I ys.i0 | Para a totalidade dos problemas da categoria transformagdo que une duas medidas (Categoria 11), a anélise estatistica mostra-nos que os desempenhos das criangas, consoante 0 grupo a que pertengam, nfo sio estatisticamente significativas (F(2.57)0.690. p = 0,933) (ver Anexo I). 0 quadro~14>-mostra-nos-como-€-que-os-trés- grupos~de~participantes,-resolvem-os. diferentes problemas da categoria eransformagiio unindo duas medidas se os analisarmos segundo a variagio da posig&o da incégnita. Quer isto dizer que, as criangas que tiveram © ensino da Matematica com base no manual Ew ¢ 0 Bambi, resolvem melhor os problemas de sransformagao que une duas medidas quando tém de encontrar 0 estado inicial (estes so 0s problemas mais complexos desta categoria ~ problemas 6 ¢ 16). Ja as criangas dos outros dois manuais (Amiguinhos e Fio-de-Prumo) resolvem melhor os problemas que implicam encontrar 0 estado final da sransformagdo que une as duas medidas (problemas 5 e 10) Quadro 14, Desempenho das eriangas aos problemas de transfermagdo unindo duas medidas (categoria, 1), em relaglo @ natureza da incognita Grupo 1 Amiguinhos) Grupo 2 (Pio-de-Prumo) Grupo 3 (Bue o Bambi) Estado Inicial_ Cat a Para 0 grupo de criangas do manual Eu e 0 Bambi, nos problemas da categoria transformagao unindo duas medidas e considerando a posicao da incégnita, a andlise estatistica mostra-nos que as diferengas nos desempenhos das criangas sto estatisticamente significativas, apenas entre os problemas onde se tem de encontrar o estado final em comparagio com os de transformagaio (1(19) = 2,680, p = 0,015) ¢ entre 0s problemas de transformagtio ¢ os de estado inicial (1(19) = -3,359, p= 0,003). Para os restantes situagdes a andlise estatistica mostra-nos que no existem diferengas significativas nos desempenhos das criangas (t(19) = -1,277, p = 0,217; (19) = 1,876, p ,076, ¢ 1(19) = 0,547, p = 0,591, para o grupo do Amiguinhos; 1(19) = 0,484, p = 0,634, t(19) = -0,420, p = 0,679 e 1(19) = 1,031, p = 0,316, para o grupo do Fio-de- Prumo; (19 633, p = 0,119, para o grupo do Eu e o Bambi) (ver Anexo J). lemas de Relagio tica entre Duas Medidas (Categoria II!) As criangas que tiveram o ensino da matematica segundo 0 manual Fio-de-Prumo (grupo 2) sfio as que tém um melhor desempenho na resolucdo dos problemas da categoria relagao estitica entre duas medidas (Categoria I), em comparagio com os desempenhos das criangas dos outros dois grupos (Quadro 15). Quadro 15. Desempenho das eriangas na resolusio de problemas de relacdo estética entre duas medidas (Categoria IL), GripoT Gripo? Grupos (Amiguinhos) (Fio-de-Prumo) fu eo Bambi) ‘Desvio- ‘Desviow ‘ Desviow Média | padréo | Ma | padrio | Md | Pairdo Problema? 120 1.01 140 0.94) 105 0.99 Problema 3 1,70) 0.66 1.90 031 150 0.85 Problema 7 O85 ‘067 1,05 O51 O85 067 Problema 8 7,00 103 1,00 1.03 11s 0,99 Problema 15 170 0.56 1.90) 0.45; 170 O57 Problema 4 085 1,03 120 101 0.90 1,02 “Total da Categoria | 7.30, 2.62 8.45, 233 715 312 2 A andlise estatistica diz-nos, no entanto, que as diferengas encontradas no desempenho das criangas na categoria de problemas de relagdo estdtica entre duas medidas (Categoria Ill) nao sao estatisticamente significativas (F(2.57)=1.381. p = 0,260) (ver Anexo L). Quando consideramos a posigGo da incégnita no conjunto dos problemas de relagdo estitica entre duas medidas (Categoria 1H), verificamos que os desempenhos des criangas dos trés grupos em estudo sio muito idénticos (Quadro 156). Ou seja, as criangas dos trés manuais resolvem melhor os problemas de relagdio estética entre duas ‘medidas, quando tém de encontrar uma das medidas em relagio (problemas 2, 3, 8 e 13), ainda que os participantes do grupo que tiveram 0 ensino da Matemética com o manual Fio-de-Prumo, tenham valores um pouco superiores. Quadro 16, Desempenbos das criangas aos problemas de relagdo estitica entre duas medidas (categoria, 11D, em relagao A natureza da inobg (Amiguinhos) Y Analisando os desempenhos de cada grupo de criangas, em relagfio ao seu desempenho nos problemas de relagéo estética entre duas medidas, em que tém de encontrar uma das medidas ¢ 0 total, verificamos que as diferengas nos desempenhos sio estatisticamente significativas (t(19) = 2,438, p = 0,025; 1(19) = 2,874, p = 0,010, e t(19) = 2,820, p = 0,011) (ver Anexo M). Problemas de Composicéio de Duas Transformagées (Categoria IV) Em relago ao problema da categoria IV, da tipologia de Vergnuad (1982), que implica a composicito de duas transformagdes, observando 0 quadro 17, verificamos que os desempenhos das criangas dos trés grupos so muito idénticos entre si. Existe uma 3 grande dispersdo nos resultados, ou seja, as criangas tanto erram completamente na resolugdio do problema, como acertam parcial ou totalmente. Quadro 17, Desempenbo das eriangas na resoluefio de problemas de composigdo de duas transformagaes Creat) sr sr inhos) (Fio-de-Prumo) Eu eo Bambi) Problema 15 ‘A anilise estatistica diz-nos, mais uma vez, que as diferengas encontradas no desempenho das criangas na categoria de problemas de composico de duas transformagées (Categoria TV) nao sio estatisticamente significativas (F(2.57)=0.201. p = 0,819) (ver Anexo N). ‘Visto existir apenas um problema representativo desta categoria no faz sentido analisar ‘0 desempenho dos participantes, consoante a posigo da incognita 94 Discussaio © propésito deste estudo era analisar como os manuais escolares, do Ensino Basico do 1° Ciclo, da disciplina de Matematica, do 2° ano de escolaridade, abordavam a resolugdo de problemas de adigtio e de subtracgao. Para servir este intento estabeleceram-se trés objectivos principais orientadores da investigagio. De seguida iremos elucidar quais os principais resultados encontrados que respondem a cada um dos objectivos definidos assim como estes se contextualizam na literatura, Como foi referido anteriormente, a teoria enfatiza a importincia da resolugio de problemas em detrimento de exercicios repetitivos e isolados. Assim, o primeiro objectivo tinha a seguinte formulagio: Qual a proporgdo de problemas em relagao a totalidade de exercicios de calculo (aditivos e subtractivos) propostos nos manuais, do 2°ano de escolaridade, mais utilizados em Portugal? ‘A andlise dos cinco manuais escolares de Matematica, do 2° ano de escolaridade, do 1° Ciclo do Ensino Basico, mais escolhidos pelas escolas portuguesas, revelou-nos que & proporgdio de problemas é muito baixa em relagio a totalidade dos exercicios de célculo (aditivos e subtractivos). Esta proporgiio no chega a atingir valores superiores a 5%. Para além disso, verifica-se uma predominancia dos exercicios aditivos face aos subtractivos (os exercicios de adigaio assumem valores superiores a 55% em todos os manuais). O manual Eu e 0 Bambi, para além de ser o manual que apresenta um maior niimero de categorias de problemas, também & 0 que tem maior percentagem de exercicios de subtracedo (cerca de 32%), quando comparado com os restantes manuais. 95 A vasta investigagao no campo do desenvolvimento do raciocinio matematico revela-nos que as criangas antes do ensino formal da matemitica, j4 operam sobre as quantidades e criam esquemas de pensamento matemético a partir das situagdes do quotidiano (Vergnaud, 1986; Resnick, 1983). Exemplificando, o esquema parte-todo surge de diversas situagées quotidianas, um buraco num puzzle quase completo significa que falta. ‘uma parte, ou quando uma crianga tem um chocolate inteiro, dé apenas uma parte ao seu irmio. A estas ideias Vergnaud (1986, 1990, 1997), designou de teoremas-em-acefio. AS criangas vo criando um conjunto de ideias sobre o processo de resolugiio de problemas no espago, no tempo, no dominio das quantidades e das grandezas. Estas ideias apenas tm validade para si préprias, nfo necessitam de ter uma representagiio matematica ou qualquer outra forma de representagiio, permitem avaliar e analisar os conhecimentos das criangas ¢ englobam uma grande variedade de conteidos. Sabe-se que, aS concepgdes erradas das criancas 86 serdo alteradas se entrarem em conflito com situagdes que elas nfo permitam tratar. Toma-se, entio, essencial criar situagdes susceptiveis de levar as criangas a «acomodarem» os seus pontos de vista (Vergnaud, 1986), constituindo, desta forma, um grande desafio para o ensino transformar teoremas-em-ace&o em teoremas e vice-versa. Sendo veja-se, as competéncias encontram-se intimamente ligadas a determinadas concepgdes, ou seja, nfo existe nenhum procedimento que se desenvolva por si proprio sem estar relacionado com as representagdes das relagdes de que trata ou que implica Reciprocamenie, um conceito ou um teorema que niio possam ser utilizados em situagdes-problemas em que so pertinentes, permanecem vazios de sentido (Vergnaud, 1986, 1990). Vergnaud (1986), considera que o saber operatério tem a sua origem na resoluco de problemas, pois permite estabelecer correlagSes, hierarquias e situagées metaforicas. $6 96 se as criangas forem confrontadas com situagGes que nao resolyem por definigdes é que as suas concepgdes erradas poderiio ser alteradas Dai que as criangas vendedoras das feiras do Brasil no sejam bem sucedidas na resolugdio de problemas escolares, mas resolvam adequadamente problemas equivalentes se estes fossem enquadrados na sua pritica didria (Carraher et al., 1988). Ao resolverem estes problemas mobilizam as suas préprias estratégias, ou seja, poem em evidéncia os seus teoremas-em-acgdo. Também os estudos de Carpenter e Moser (1982; 1983), revelam que as criancas resolvem com sucesso, desde cedo, diversos problemas ¢ que ao longo da escolaridade, io bem sucedidas se utilizarem as suas estratégias. Vao ainda mais longe, documentando uma investigac%o que mostra que criangas de 9 anos operam mecanicamente na resolugdo de problemas sem que déem grande importincia a0 conteido do problema em questo (Carpenter, et al., 1980, cit. por Carpenter & Moser, 1982; 1983). Parece que de algum modo ao aprenderem os procedimentos da aritmética formal, muitas criangas deixam de analisar os problemas que tentam resolver. A hipétese que os autores levantam para explicar este facto reside na transigo dessas estratégias informais para a memorizago de algoritmos. Os resultados da investigagao de Carpenter ¢ Moser (1982; 1983) vaio ao encontro da perspectiva de que os problemas podem dar significado ’ adigdo e & subtracgio e constituem alternativas vidveis de desenvolver estes conceitos na escola. Alguns autores referem que a Matematica dada na escola ¢ diferente da Matematica utilizada no dia-a-dia (Carraher & Carraher, 1988; Carraher, et all, 1988; Serrazina, 1999; Vergnaud, 1986). Isto porque na escola, a Matematica é uma ciéncia, ensinada em um momento definido por alguém de maior competéncia; na vida, a Matematica é 7 parte da actividade de um sujeito que compra, vende, mede e encomenda pegas de madeira, que constréi paredes, que faz um jogo na rua. Desta forma, ao se veicular um ensino das operagdes por treino de algoritmos descontextualizados, estise a dificultar 0 dominio do processo de resolugio de problemas (Resnick, 1982; Carpenter & Moser, 1983; Fayol, 1996). Tal como Vergnaud (1986) considera, os algoritmos so formas mais abstractas de teoremas que pouco tém a ver com as estratégias que as criangas mobilizam para resolverem problemas. Privilegié-los é contrariar a forma natural de aquisi¢ao dos conhecimentos acima citado. Nao podemos também deixar de frisar que © proprio curriculo portugués, para a Matematica do 1° Ciclo, indica explicitamente os algoritmos como meios auxiliares de célculo, postura bem diferente de uma promogao activa da sua utilizagao. E mais, 0 enfoque central ¢ em situagées de exploragao, descoberta e de aplicagio, por outras palavras, de problemas. Nathan e colaboradores (2002), numa andlise dos manuais escolares de Matemética americanos, concluiram que as actividades de resolugo de problemas primeiro sto introduzidas numa forma simbélica (enquanto equagdes aritméticas), para passarem progressivamente para problemas de palavras (como os chamados histérias-problemas), Raramente eram introduzidas actividades com problemas verbais e desenvolvidas com raciocinio simbélico, ainda que existam evidéncias de que as capacidades de raciocinio verbal das criangas antecedam as suas aptiddes simbolicas (Case & Okamoto, 1996; Kalchman & Case, 1998; Nathan & Koedinger, 2000, citados por Nathan, et al., 2002). Estes aspectos levam-nos a questionar 0 modo como os manuais tém vindo a traduzir ea dar voz ao curriculo nacional @Ballér, 1990; Chassapis, 1997; Castro, 1999; Duarte, 1999; Morgado, 2004; Yakhontova, 2001) e como este, por sua vez, tem vindo a ser 98 trabalhado dentro da sala de aula (Castro, 1999, Nathan, et al., 2002; Jitendra, et al., 2005; Reys, et al., 2004), Como se caracterizam os manuais escolares de Mateméitica, do 2° ano de escolaridade. mais utilizados em Portugal, em termos dos problemas de adigo ¢ subtracgiio? Foi este o segundo objectivo nomeado para dar resposta 2o intento desta investigagio, Em relagdio as caracteristicas dos manuais de matemitica foi dada especial atenco aos problemas aditivos e subtractivos que os cinco manuais em estudo apresentavam. Para o efeito de categorizagiio dos mesmos, ou seja, para a definigio das diferentes categorias de problemas que os manuais apresentavam, foi seleccionada a tipologia de problemas de Vergnaud (1982). Com base nesta tipologia, foi possivel verificarmos que os cinco manuais em anélise sio muito distintos entre si, ja que a classificagdio dos mesmos clarificou-as-diferengas ¢-as semelhancas entre eles. Um dos manuais (dmiguinhos) apresentava apenas duas categorias diferentes de problemas, composig@o de duas medidas e transformagtio unindo duas medidas; dois dos manuais (Fio-de-Prumo e Caminhos) apresentavam, para. além das duas categorias anteriormente referidas, mais uma categoria de problemas, relagtio estética entre duas medidas (ainda que 0 manual Caminhos apresentasse um problema da TV categoria, nflo se considerou este valor expressivo); e 08 dois iiltimos manuais (Mateméitica do Jodo ¢ Eu e o Bambi), apresentavam quatro categorias distintas de problemas (composigao de duas medidas, transformagiio unindo duas medidas, relagiio estitica entre duas medidas © composigdo de duas transformagies) Esta andlise permitiu ainda verificar que, apesar de existirem alguns manuais com alguma variedade nas categorias de problemas, néo existe uma distribuigo homogénea pelas varias categorias, Quer isto dizer que, existe uma clara predomindncia de uma categoria especifica, a saber, a categoria de problemas de composigiio de duas medidas em detrimento das outras. As quatro categorias de problemas nao sdo tratadas com a mesma importincia ‘Apés 0 apuramento dos manuais que seriam mais representativos (apuramento esse, que teve como critério o manual que tinha uma maior expressiio de problemas das categorias de problemas), para uma andlise mais profunda, examinou-se também os problemas em relago & varidvel natureza da incdgnita (os manuais analisados foram: Amiguinhos, Fio-de-Prumo ¢ Eu e 0 Bambi). Esta andlise revela-nos que, de um modo geral, os trés manuais analisados optam por apresentar problemas com nivel inferior de complexidade, ou seja, 0 posicionamento da incdgnita para as diferentes categorias de problemas é nas formulagdes que acarretam menor dificuldade. Todos 0s manuais apresentam mais problemas de composigdio de duas medidas em que tem de se encontrar o total; para os problemas de @ransformactio que une duas medidas a predomindncia é para se encontrar o estado final; no manual Zu e 0 Bambi, que possui problemas da categoria composigéo de duas transformagoes, estes remetem mais para encontrar o estado final. Sé num dos manuais que apresenta problemas de relacito estética entre duas medidas (no Fio-de-Prumo) & que existe um mimero idéntico de problemas que remetem para encontrar uma das medidas ou para encontrar 0 total que diferencia os problemas no & a operacdo que implicam mas sim as suas caracteristicas seménticas, como ja foi referido anteriormente (Carpenter & Moser, 1982, 1983; Vergnaud, 1982, ; Riley, et al., 1983). Ainda que as tipologias de problemas consideradas, partam de diferentes dimens®: s para agrupar os diferentes problemas, a verdade é que se conseguem estabelecer paralelismos entre clas (ver na Introdugao deste trabalho 0 capitulo Classificagéo de Problemas), 100 Também vimos anteriormente, que a correspondéncia entre a operagaio numérica ¢ a estrutura da tarefa nio é simples, de um para um; numa mesma categoria de problemas existem varias possibilidades de problemas que remetem para operagdes distintas (Vergnaud, 1997), Através da exploragio destas diferentes categorias de problemas, as criangas conseguem adquirir as concepgbes correcias das principais operagbes (neste caso especifico, a adico e a subtracgo). A adigio e a subtracgo so mais do que aumentos ¢ diminuigdes que acontecem por se actuar sob as quantidades da mesma forma, ou seja, por ganho, compra ou consumo, perda, por exemplo (Vergnaud, 1982, 1986; Carraher & Bryant, 1987, cit. por Carraher, et al., 1988). Estas so as primeiras concepgSes infantis de adigdo ¢ de subtracgaio, e a tnica forma de elas alterarem estas concepgées é serem confrontadas com situagdes que entrem em contlito cognitivo com os seus modelos conceptuais. Uma forma eficaz disto acontecer 6 pé-las a resolverem, com regularidade, diferentes categorias de problemas (Vergnaud, 1982, 1986; Carpenter & Moser, 1983). Brousseau (1981, cit por Vergnaud, 1986), também enfatiza que as actividades de resolugto, de problemas ou do tratamento de novas situagdes deveriam ser largamente privilegiadas, uma vez que é verdade que existem diferentes categorias de problemas, ¢ que apelam 20 dominio de propriedades diferentes de um mesmo conceito. Anda que os manuais em estudo apresentem alguma diversidade de problemas estes so num nimero muito reduzido (quando comparados com o niimero de exercicios) ¢ parece existir uma prevaléncia de uma determinada categoria de problemas, em vez de existirem numa proporgio equilibrada, ou seja, existirem 0 mesmo niimero de problemas nas diferentes categorias, Se considerarmos 0 grau de complexidade dos problemas também confirmamos esta caracteristica, os problemas escolhidos siio de um nivel de dificuldade mais baixo no que se refere ao posicionamento da inedgnita 101 E recorrente encontrar na literatura sobre 0 ensino da Matematica, argumentos que reforgam a ideia de que os conhecimentos matematicos ensinados na escola pouco tém de aplicabilidade pratica, ou seja, de que as criangas tém dificuldade em transpor para 0 seu dia-a-dia os conhecimentos que adquirem na escola. O ensino, também, pouco tem em conta as concepedes que as criangas trazem com elas acerca do mundo que as rodeia (Vergnaud, 1986, 1997). Se aos aspectos referidos anteriormente, acerca do desenvolvimento do raciocinio matemético das criangas, juntarmos os resultados de diversas investigagdes, que demonstram que o fornecimento de bons manuais as escolas tem uma influéncia positiva nos resultados escolares dos seus alunos, percebemos a importincia da anilise dos manuais escolares, nomeadamente, na forma como abordam a resolugio de problemas, J que uma das principais fungdes destes é a transmissiio de conhecimentos (Seguin, 1989, cit. por Gérard & Roegiers, 1998). Gérard © Roegiers (1998), parecem ir ao encontro dos resultados encontrados por Carraher ¢ colaboradores (1988), a0 afirmarem que uma das principais preocupagdes de professores e de autores de manuais escolares deveria ser integrar os saberes adquiridos pelas criangas, J4 que, o insucesso escolar de muitas populagdes afastadas da cultura dominante, manifesta-se muitas vezes na incapacidade dos alunos em utilizarem os saberes escolares numa situagio apenas um pouco diferente das que encontram na escola. Carraher ¢ seus colaboradores (1998), colocam a ténica deste problema no desenvolvimento de materiais curriculares que respondam 4 diversidade dos alunos, para que estes se constituam solugdes psicolégicas para um problema que é psicolégico, social e cultural 102 Mas esta discusstio leva-nos a outro aspecto importante: as representagdes dos professores acerca da resolug&o de problemas e de como estes organizam as suas préticas pedagégicas (Serrazina, 1999), Vimos que as mudangas nas praticas dos professores nao ocorrem simplesmente por colocar a sua disposigao materiais inovadores, ou por alteragSes nas orientagdes curriculares, mas por iniciar e guiar o desenvolvimento da sua compreensio pedagégica (Manouchehri & Goodman, 2000, ct por Christou, et al., 2004) 0 terceiro objectivo, desta investigagao, concretizava-se da seguinte forma: Como é que as diferencas nos manuals se reflectem em diferencas nos desempenhos das criangas na resolugéio de problemas aditivos ¢ subtractivos? ‘A andlise comparativa dos desempenhos das criangas revela-nos que as diferencas encontradas nos manuais em estudo nao se reflectem em diferengas significativas nos ‘desempenhos das criangas na Tesolugdio-de diferentes categoria de problemas de adi¢ao e subtracedo, nem ao nivel do desempenho geral da prova, nem por categorias de problemas. No entanto, parece existir alguma tendéncia nos desempenhos das criangas em fungi do manual, ou seja, encontram-se desempenhos ligeiramente mais elevados nas categorias de problemas cujo manual tinha maior percentagem de problemas dessa categoria Por exemplo, 0 manual Amiguinhos € 0 que apresentam maior percentage de problemas composigao de duas medidas (categoria I, da tipologia de Vergnaud, 1982) e sio as criangas deste grupo que acertam mais na resolugiio destes problemas, A iinica excepeiio a esta constatagiio é na categoria de problemas de transformagao que une duas medidas (Categoria Il, da tipologia de Vergnaud, 1982), em que nao s&o as criangas do manual Eu ¢ 0 Bambi que tém um melhor desempenho na resolugao destes 103 problemas, ainda que seja este o manual que apresenta maior percentagem deste tipo de problemas Mas quando consideramos a natureza da incdgnita nos desempenhos das criangas a Ieitura dos resultados no ¢ tio clara, As eriangas dos trés grupos 18m desempenhos muito idénticos nos problemas da categoria composigdo de duas medidas, pois resolvem melhor os mais iceis, os que implicam encontrar o total. Mas, nos problemas de transformagao unido duas medidas, 0 mesmo s6 se verifica em dois dos grupos de participantes (nos participantes que tiveram ensino da Matematica segundo o manual Amiguinhos ¢ os do Fio-de-Prumo, ja que os participantes do manual Eu ¢ 0 Bambi resolvem melhor 0s problemas que se tem de encontrar o estado inicial). E para os problemas de relagiio estética entre duas medidas, curiosamente, os trés grupos resolvem melhor os problemas que implicam encontrar uma das medidas No entanto, existe uma diferenga que é evidente e confirmada pela andlise estatistica, Em todos os grupos de participantes € para duas categorias de problemas (composicao de duas medidas e relagéo estética entre duas medidas), existem diferencas significativas quando se faz variar a natureza da incégnita. $6 nos problemas de transformagao unindo duas medidas & que se encontram diferengas significativas, para 0 grupo de participantes do manual Eu ¢ 0 Bambi, para os problemas onde se tem de encontrar o estado final ¢ o estado inicial em comparaciio com os de transformagiio. Isto vai ao encontro do que a literatura nos diz. acerca das dificuldades com que as criangas se deparam na resolugao de problemas da mesma categoria mas cuja incégnita varia, Nos problemas de transformagao unindo duas medidas, as criangas resolvem. melhor os problemas que implicam encontrar o estado final, depois a transformagio e, por tiltimo, 0 estado inicial, por exemplo (Carpenter & Moser, 1982; Nesher, 1982, Riley etal, 1983; Vergnaud; 1997). 104 E também reforga a importincia de existir uma maior diversidade de categorias de problemas, assim como das suas diferentes possibilidades, nos manuais escolares, de modo a forecer as criangas ferramentas mais eficazes para a aprendizagem dos conceitos de adigao e de subtraccao, Nao € © dinamismo da situag%o implicada, por exemplo, nos problemas de transformagiio, que determina a facilidade com que as criangas resolvem os problemas. Nem sempre os problemas que implicam transformag6es siio mais faceis de resolver em comparago com os problemas que implicam relagdes estiticas (Vergnaud, 1982; Carpenter & Moser, 1983). So as relagbes entre os elementos em jogo num determinado problema que dificultam ou facilitam a resolugao da crianga e a forma como cla representa essa relagéio (Fayol, 1996), Exemplificando, as criangas tém mais dificuldade em encontrar o estado inicial de um problema de transformagiio (Carpenter & Moser, 1982; Nesher, 1982; Riley, et al., 1983; Vergnaud, 1997), pois este esquema assenta num teorema-em-acgiio que implica a diferenciagaio de quatro conceitos diferentes em acco: estado inicial, estado final, a transformagao directa e a transformagio inversa (Vergnaud, 1997). Sabe-se que as criangas mais jovens executam processos de resolugiio que tendem a simular as acgdes descritas nos enunciados, assim os problemas dificeis de serem ‘transformados em actos revelam-se significativamente mais dificeis de serem resolvidos, pelos seus esquemas de resolucaio. Por isso, a passagem da utilizago destes esquemas de resolugo idiossincriticos para 0 recurso aos algoritmos de adigao e de subtraceo pode dar-se através do aumento das quantidades dos problemas de forma a tomar dificil a utilizagiio de objectos ou desenhos para chegar a solugio. Desta forma, as criangas tendem a aplicar a regra implicita de escolher a operactio adequada para encontrarem a solugao para o problema (Brissiaud, 1994). 10s Varias wvestigagSes empiricas apontam que é muito mais sensalo voltar &s mesmas coisas ano apés ano indo um pouco mais profundamente, introduzindo situagdes cada vez mais complexas contendo novos aspectos, mais poderosos, de um mesmo conjunto de conceitos, do que 0 contririo, que & mais frequente (quando um capitulo de Matematica estudado 6 compreendido, pelo menos por uma parte importante dos alunos, no ano seguinte podemos considerélo como adquitido). Esta morosidade no desenvolvimento dos conhecimentos, segundo Brousseau (1981, cit. por Vergnaud, 1986), é perigosamente subestimada pelos professores, pelos pais e pelos programas. Estes resultados parecem confirmar 0 que a teoria reforca sobre o ensino da Matematica se basear na resolugiio de problemas e da importincia de confrontar as criangas com diferentes categorias de problemas (Vergnaud, 1982, 1990, Carpenter & Moser, 1983; Jitendra, et al., 2005). As diferengas encontradas nos desempenhos das criangas nao séio significativas, mas isto pode acontecer porque a aposta dos manuais ndo é na resolugio de problemas de adigao e de subtraceio, nem ao nivel da quantidade, nem da variedade. Existe uma décalage incontestivel entre o que a literatura testemunha acerca da resolugio de problemas @ o que é veiculado pelos manuais. O nimero de problemas de adigdo ¢ de subtracco presentes nos manuais em anilise sfio infimamente mais pequeno do que 0 niimero de exercicios de adigao e de subtraccio. Existe uma clara tendéncia nos manuais em estudo, para uma valorizagio dos instrumentos de resolugo em detrimento do processo de resolugdo, que parece surgir mais como contexto de aplicagdo dos primeiros, ou seja, os problemas surgem depois de serem abordados os aspectos ligados aos algoritmos. A resolugao de problemas nos manuais em estudo é encarada mais como um elemento para ireino dos algoritmos anteriormente elucidados, Conclusdes Este trabalho permitiu identificar os cinco manuais mais escolhidos pelas escolas portuguesas, para a disciplina de Matematica, do 2° ano, do 1° Ciclo do Ensino Basico, stio eles, pela respectiva ordem: Fio-de-Prumo, Amiguinhos, A Matemdtica do Joao, Caminhos e Eu e 0 Bambi ‘A anélise dos mesmos permitiu tirar duas principais conclusdes, em relaglo & forma como abordam 0s problemas ¢ 0s exercicios de adigdo e de subtracetio. A primeira grande conclusao é que existe uma grande incidéncia de exercicios em todos os manuais, em detrimento da resolugio de problemas que aparecem em muito menor numero. A proporgio de problemas em relago ao nimero de exercicios é diminuta. ‘A segunda conclusio prende-se com a resolugiio de problemas, sendo que é dada uma importincia menor a este aspecto nos manuais analisados, visto 0 ntimero de problemas que apresentam ser muito diminuto, E se considerarmos as diferentes categorias de problemas, concluimos que apesar dos manuais serem muito diferentes entre eles neste aspecto, os problemas que contém so de um nivel de complexidade muito baixo, no que se refere & posiggo da incdgnita, Outra caracteristica importante realgada nesta andlise, & que parece existir a predomingncia de uma determinada categoria de problemas (Vergnaud, 1982), nio existindo 0 mesmo numero de problemas para cada categoria como seria desejavel. (A tiltima conclusao retirada deste estudo resulta da tentativa de apuramento da relagfio entre os problemas que surgem nos manuais ¢ os desempenhos das criangas na resoluc’io de diferentes problemas. Ainda que os dados nfo confirmem esta relagio, e baseando- nos na literatura disponivel, podera haver uma tendéncia para que as criangas que 107 estejam mais familiarizadas com uma determinada categoria de problemas sejam mais bem sucedidas na sua resolugiio do que aquelas que no o sko. ‘A inexactidiio desta tltima conclustio poder prender-se com aspectos metodolégicos, que naturalmente limitam as ilagdes que se podem retirar dos resultados encontrados, nomeadamente, a dimenstio da amostra, a equivaléncia dos grupos em relagiio & proveniéncia sécio-econémica dos participantes e a garantia de um ensino da Matematica centrado, exclusivamente, no manual. Por outro Iado, 0 predominio dos exercicios de célculo ¢ resolugao de algoritmos face aos problemas aditivos e subtractivos, faz com que 0 confronto com as varias categorias de problemas seja proporcionalmente diminuto, 0 que sem davida teré influéncia na auséncia de diferengas significativas nos desempenhos das criangas. Contudo, a resolugo de problemas é apontada como sendo uma competéncia transversal e essencial is diferentes areas @ uma das ferramentas fundamentais” para se ser ‘matematicamente competente. A resolugdo de problemas pode ser vista, assim, como uma fonte de aprendizagem rica em significado ¢ que pode proporcionar a crianga uma postura activa na procura da solueao. © processo de elaborago de um manual, desde a sua redacedo, edigo, impressio © distribuigdo, estima-se que dure entre 6 a 10 anos (Seguin, 1989, cit. por Gérard & Roegiers, 1998). Isto revela a complexidade deste trabalho, no entanto, na realizagio de um manual escolar nio podem ser descuradas as exigéncias de qualidade cientifica, didactica e estética (Santos, 2001). A actual autonomia na escolha dos manuais poderd implicar algumas desvantagens, pois os professores no dispdem de estudos de avaliagdo critica sobre os manuais. Santos (2001), considera fundamental a existéncia de “uma politica que assegure a qualidade cientifica e pedagégica dos discursos dos manuais (...), que accione um sistema facilitador da apreciagao e do controle que facilite as escolas uma selecgdio mais reflectida” (p. 133), Mas neste processo reside um ponto delicado que é 0 isolamento dos factores que contribuem para os desempenhos dos alunos, 0 que provém da contribuigao do manual & © que provém de outros elementos. Gérard © Roegiers (1998), aponta como uma possivel solugiio, uma avaliago comparativa dos desempenhos dos alunos que utilizam (ou utilizaram) 0 manual com alunos de turmas similares que nao utilizam (ou nfo utilizaram) 0 manual. Parece portanto, fundamental desenvolver outros estudos sobre a temética, tendo como objectivo fundamental averiguar a qualidade cientifica dos manuais e 0 seu impacto na qualidade do ensino em Portugal. Algumas das dimensGes da andlise da qualidade cientifica dos manuais escolares poderia passar pela forma como é trabalhado 0 valor posicional do nimero; as operagdes aritméticas multiplic geometria e de medida, entre outros. e divisiio; as nogées de 109 Referéncias Bibliograficas Ballér, E. (1990). ‘Textbooks and curriculum, In International Encyclopedia of Educational Evaluation (p. 205-206). Oxford, England: Pergamon Press Beishuizen, J., Stoutjesdijk, E., & Putten, K. (1994). 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