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Mimosa boca errante

Mimosa boca errante


superfcie at achar o ponto
em que te apraz colher o fruto em fogo
que no ser comido mas frudo
at se lhe esgotar o sumo clido
e ele deixar-te, ou o deixares, flcido,
mas rorejando a baba de delcias
que fruto e boca se permitem, ddiva.

Boca mimosa e sbia,


impaciente de sugar e clausurar
inteiro, em ti, o talo rgido
mas varado de gozo ao confinar-se
no limitado espao que ofereces
a seu volume e jato apaixonados
como podes tornar-te, assim aberta,
recurvo cu infindo e sepultura?

Mimosa boca e santa,


que devagar vais desfolhando a lquida
espuma do prazer em rito mudo,
lenta-lambente-lambilusamente
ligada forma ereta qual se fossem
a boca o prprio fruto, e o fruto a boca,
oh chega, chega, chega de beber-me,
de matar-me, e, na morte, de viver-me.

J sei a eternidade: puro orgasmo.

Carlos Drummond de Andrade

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