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Teoria dos Direitos Fundamentais Cole de Albuquerque Mello. Daniel Sarmento Gustave Amaral ‘Marcio Monte Rais Mauaici Andreiulo Rodrigues Ricardo Almeida Fibro da Silva Ricardo Labo Torres Teeta Negri: Vicente de Paulo Barreto Orgunizador Ricardo Labo Torres TEMAS VAR. Os Principios Constitucionais ¢ a Ponderagao de Bens Daniel Srmento “La coesistensa di vole ¢ princip, ulla quale, necessa- iament, una costiturione opps deve fndare per poter rendetsi non tenunciaariarspto alle sue preanon’ di tunita intgracione «al contempe, non tncompaibile com la sua base material pluralist, vichide che ciaseano 4 tal valor e tal princi sa astunto in uno valensa non asoluta, compatible com quali con i quali deve convivere" (Gustavo Zagrebelsky') INTRODUGAO. A teoriajuridica tradicional concebe o Diteito como um sistema unitivio, completo e coerente, etruturado em for 1 MDirae te Torino: Fina 1992, tna de pirdmide, em cujo venice ¢ situada a Consttuied © predicado da coeréncia do ordenamento juridico impe- dle, segundo tal concepcio, a existencia de antinomias reais fentre as suas normas’ Todos os confitos normativos 530 ‘onsiderados como meramente aparentes, devendo ser re- solvidos através de critérios formais,definidos de antemaio pelo ordenamento. Assim, seria sempre possivel precisar, fain base em procedimentas puramente logics, a norma aplicavel a cada easo concreto, de modo que, definidos os fates, poderseia através de simples silogismo, extrair todas as tas conseqiencias juridicas ‘Sem dlivida, esta imagem rigida ¢ formal do Dircito é Ueibutiria de una cosmovisio que teve 0 seu apogeu no Estado Liberal, e que hoje encontinse bastante desacredi- tada A andlise da dinimica do sistema judicial demonstra que nem sempre & a logiea formal que reina nesta seara, endo imanente no fenémeno juridico a existéncia de certa dose de criatvidade por parte dos seus operadores, sobre: tudo ne campo consitucional. Profundamente infltrada pela politica, a Constituigdo alberga um grande miimero de ormas enninciadas de modo wage e aberto, franqueando ao intérprete um largo espaco para valoracaes subjetivas, nnae quiais inevitavelmente o fator ideol6gico acaba aflo- rando, Neste contexto, tornasefreqilente a eclosio de confltes centre as normas da Let Fundamental, méxime em paises ue, como o Brasil, adotaram constituicdes compromissé- Fins. Estas sio cartas nas quais @ processo constituinte no se desenvolveu sob 0 signe do consenso, traduzindo, 20 revés, a sintese dialética de coucepcdes ¢ ideais politicos 1 Ver, rexpcito, HOBBIO, Norbert, Faria de Ondenament uri Tadueio de Maia Calee Cordezo Leite dos Sanion Bria: Ed ivesdade de Brass, 1996 “4 liversiicados. Assim, tais constituigdes acabam sbrigando rnormnas derivadas de malrizesideologicas antaganicas, que, a0 incidir sobre casos coneretos, podem indicar solucoes dinmetralmente oposias Inobstante, € certo que a Lei Fundamental constiui lunidade O principio da unidade da Constituicio, ‘encarecido pela Corte Suprema alem como 0 einone mais importante da hermenéntica constiticional, impée a0 itt Uérprete a tarefa, nem sempre trivial, de buscar a harmonia centte 0s ditames da Lei Maior, soucionanda as situagaes de tensio que tendein a se delagrar em seu sei. Em vista disso, tomase ocioso risa a importincia vital {que a questio da colisio entre os cinones constitucionals assume ne nosso ordenamento Entretanto, a doutrina ¢ a jjisprudéncia nacionais ndo tém devotade a este torment toso problema a atengio mevecida Sem a pretensio de exaurir o tema, o presente trabalho objetiva estudar o papel do métado da posideragio de bens como eritéio de solucio dos confitos entre prineipios cons- titucionais. Pretendese, em um primeiro momento, de- ‘moustrar a insuficiéncia dos métodos wradicionsais de reso- Ido de antinomias para o equacionamento das tensGes fenite prineipios constitucionais. Em seguida, « partir da constatagio de que © método da ponderagio € absoluta- mente necessirio para a resolugio dos easos mais comple- x08 do Direito Constitucional, almejase analiar os seus Imecanisinos préprios,e verificar a acolhida que tal método tem recebido no direito comparade e em noseo pas, 3 Ver{GE 19, 206 (220), ep STERN, Klaus Doncha del Exed de 1 Repub RetAtaene Tradugho de Jer Perce Royo e Peete (Gaur Villain Mads Centro de Estos Contucionale, 1997, a” 1 — AINSUFICHENCIA Dos METODOS CLASsICOS DE RESOLUCAO DE ANTINOMIAS PARA A COMPOSIGAO DOS CONFLITOS ENTRE PRINGIPIOS CONSTITUCIONAIS: — 0s Principios Constitucionais entram em conflito? Uma questio que necestariamente ver & tona quando se discute 4 convivencia entre principios constitucionais, Consiste em saber se € posse, através de delimitagSes rigidas do contetido de cada principio, esta a eclosio de Confit entre eles nos casos conerctos, Em outras pata Sindagacio que se far € no sentido da possibilidade de se Imodelaro perl dos canones consincionas, fora de qual ‘quer hipotese conereta, de a sorte que se asegure uma Coexistincia absolutamente harméniea entre eles certo que, em mstor casos, asimples demarcagio dos confine do tmbito normative de cada principio €suicente para obstara deflagragao de antinomias Para al finalidade, Eeevidente que o conteddo de cada principio constituconal nido pode ser inferido apenas do texto normativo que Consigra, com a desconsideragio do sistema no qualoprin- Cipio se insere. A Consutsigao ndo configura um simples repertévio de normas solaas, traduzindo antes um sistema luni, cujos elementos sio imterdependentes. Asim, a ‘usa dos limites sigificados de cada principio tem de Considerar também as outras normas e valores plasmados nna Lei Fundamental ‘Ademareagio do campo normasvo dos principis cons- situcionas € de grande importncia no estudo dos di Tundamentais, onde a doutrina formulou 0 conce “limites manenves”. Tals mites, que representam a fron tcira externa dor direitos fandamentais, podem estar def xpressamente na Consuelo, ou dela decorrerem {mpliciamente, sendo neste caso infrides da andlise da protegio outorgada pela Lei Mair a outs diteltosevalo- os res da mesma estatura De qualquer forma, a fixagio dos limites imanentes € anterior resolucio dos confit, pois 6 se caracterizaré o contlito se a siuiagio concreta se co tiver no interior dos limites imanentes de maisde um direito fundamental. José Carlos Vieira de Andrade exemplifica bem alguns casos de limiees imanentes: * Por explo, podersed invocaraliberdaderligose pare sfetuar sacrifiios humans ou para casar mais de ume ‘ee? Ou invocar a liberdade artisica ara legtinar @ morte de xm actor no paleo, para pintar no mao da rua, ‘ou ora furtar 0 material nacesério dexecucdo de ume ‘obra de one? Ou inwocar 0 diveto de ropriadade pore ‘ndo pagar impostos, wo diet de air d pas pera ndo Cumprir 0 servigo mir, ow o diet de ebucar os fas (para os expancarvioletamente? (..) Nats, como em muitos outros casos, ndo se deve far propriamente de ssn confito entre 0 diet ineocada € ‘utr dreas ov valores, for veces exprsios através de avers fndamentais & que we trta de algo @ mais ov ‘de alo a menos do que iso. 0 prio prcets consti> tucional gue no protege eas ormas de exci do direto ‘fundamental, é« priria Consituic que, ao exunciar 0s dies, exci da rexpetivaesfera narmativa ese ipo de situagdo™* Porém, pela prépria extrutura aberta¢flexive dos prin- que no posiem um campo de incidéncia rigida- mente delimitado, tornase por vezes muito érdua, seno impossivel, a tarefa de estabelecer priori as fronteiras dos seus Ambitos normativas com seus congeneres. Por isto, a 01 Diets Pandamentis na Conus Poriagues de 1976, Co bras Almedina, 1887, p 216.217 acomodacio das cens0es entre os prineipios constitucionais hem sempre se exaure na tarefa de demareagio dos respec- tivos limites imanentes ‘Vejamse, por exemplo, os prineipios que regem a or- ddesn econdmica brasileira, inzertos no art. 170 da Lei Fun damental Sera possivel, fora de qualquer contexto fitico espectfico, realizarse 0 mapeamento de prinespios abertos tais como 9 da livre iniciativa, da busca de pleno emprego, da defesa do consumidor, ete, de modo & evitar a possibil dade de conflitas no caso concreto? A resposta tem de set nnegativa, Em muitos casos, ointérprete constatard que cer {as situagbes juridicas mobilizam concomitantemente a in cidéncia de viries principios, ada um acenando para uma, directo diferente ‘Questiona-se entdo se a situagées deste genero podem ser rexolvidas através dos eritérios cradicionais de solu dde antinomias Segundo a ligio cassia, slo trés estes crté- Flos cronolagico,hierirquico e de especialidade. O erité Flo cronoldgico € aquele que postula que entre duas normas incampatives, deve prevalecer a posterior: lee posterior daw {gat priori O criteria hierdrquieo, por seu turn, determina {que no confronto entee regras juridicas inconciiives, deve feraplicada ade esiatura superior: B, finalmente, oertério de expecialidade impBe que na colisio entre duas regras pprevalega a mais especial, em detrimento da mais gera: lex ‘speciale drogat genera Examinasse, a seguir, se tals crtérios clisicos dio conta dda resolugio das colisSes entre principios constinucionais, (8 se, 20 contrario, a tensio entre tis cinones desafia 0 tuso de uma técnica mais aberta e lexivel 5 NORHERIO BOBBIO, Tea de Onenanent fri, i, p. 926 Seguintes — Gritério Gromolégico Com relagao ao critério cronolégico, beira 6 tise a afirmagio de que ele no se presta a soluigio das tensies consttucionais, uma vee que a narmas da Constituigao s30 ‘editadas em um nico momento, com a promullgacio da Lei Maior Alinica excegio possivel é representada pelas emendas ‘constitucionais, que sio editadas apés o advento da Consti- tuigio.E possvel que uma emenda i Consttuigdo introduza novo principio consttucional, que se figure total ou pat= epecial Observese, a propésito, que as antinomias podem ser classifcadas, conforme a extensio, em trésespécies:ttalto- {ak parciakparcial totalparcial’, A antinomia totaltotal se ‘manifesta quando as normas em contradigio possuem exa- tamente © mesmo Ambito de validade, de modo que qual quer aplicacio dada a uma delascontraria necessariamente outta €0 que ocorre com as supostas normas E proibido famar no cinema” e "E permitido fumar no cinema"). A antinomia parcialparial dis, por sua vez, quando a8 no%- ‘mas em conflito ostentam ambitos de validade em parte ‘gual e em parte diferente. Neste caso, cada norma tem um ‘campo onde pode ser aplicada sem ocasionar conflto com 2 outra,¢ um campo onde o conflito necessariamente ocor Fe (€ 0 que acontece com as supostas normas “E proibido tsar caleas brancas nos fins de semana’ ¢ “E obrigat6rio ‘sar roupas braneas nos domingos"). Finalmente, aantino- mia otalparcalsucede quando o ambito de validade de uma das normas esté compreendido no interior do immbito de validade da outra. Nesta hip6tese, a norma com campo de validade mais extenso pode, em certos casos, ser aplicada sem entrar em contraste com a norma de ambito mais reduzido, mas esta, sempre que aplicada, entra em colisio ‘com a norma mais extensa (€ 0 que se di entre com as ‘normas hipotéticas “E proibido pisar na grama” ¢*E per pisar na grama descaleo"). corre que 0 método de especialidade 36 pode ser utlizado nas antinomias do tipo fatalparcie pois 36 nestas se estabelece entre as normas em confronto uma relagio do 4 Este ext fo vido por AUF Ros em sua obra On Law and Jus conforme noticia NORBERTO BOBSIO, Terie d Orenanent ‘eri ee, p88. e Lipo geal + eipecal Tal espécie de antinomia nlo é comum ‘no campo constitucional, sendo muito mais usual a ocor- réncia de "intersecdo parcial” entre ot dominios normati- vos dos cinones constitucionais, configueando antinomia do tipo poral parcial, 2 qual nao enseja a aplicagio do imétodo de especialidade 4 — 0 Gatésio Hlerdrquico © critério hierérquico tampouco pade ser utilizado?, pois todas as normas constitucionais desutam formalmen- fe da mesima esatura, afigurandose arbtrdrio auibuir a gualquer uma delas @ primazia absoluta com relagio as demas. Nao se pretende negar, com esta afirmagio, 0 fato e que algumas normas cintlam com maior destaque no ordenamento consttucional, ocupando posigées estrutural: ‘mente mais importantes dentro do sistema, Porém, dai nio decorre que, sem autorizagio expressa a Constituicio, se possa escalonar em diferentes graus hierirquicos as normas editadas pelo poder constitwinte origindrio. Neste sentido, Luis Roberto Barroso" salientou, com propriedade, que ” (..) em dia, Merarguia radia @ iddia de que uma norma colle 0 seu fundaento de validade em ‘outa que the superior Nao iso que se pasa entre normas promulgadasoriginariamente com a Constitigdo” GE NORBERTO BOBBIO, Tere do Ondenanent Juric, 5 697 1) Excepcionase apenas o cto das norms intrude pelo poder Constitute derivado, at quis exo nites aos limites tater, formals crcunsaneas impos pelo poder consitunte origieio. Neste senso, pode amar que ext herrquis entre at emensas 4 Gonstuicao'ealgumas normasinserias na lat Rindamental 1 Intrpitaie« Apayso da Conti Sto Paul: Sarai, 1996, pas o Demais,é bem de ver que a inexisténcia de hierarquia absolut entre as normmas tadicadas na Lei Fundamental configura corolirio inafativel do principio da unidade da Constigio, pois, como observou! Canotitho, a pretensio de validade absoluca de certos principios acarreta o acrif= cio completo de outros, com 0 conseqiente comprometi- mento da unidade normativa da Lei Maior Existem: basicamente duas concepgSes distintasda hierar: ‘quizagio das normas constitucionais: uma estitia e a outra indica 4.1 Hierarquia esttica: normas constitucionaie A concepeio estitica preconiza que se duas normas cconstitucionais colidirem, 2 de estaura inferior deve ser climinada do sistema, decretandose a sua invalidade, Um ‘exeinplo desta concepcéo € fornecido pela polemica tese ‘das normas constitucionais inconstitucionais, que teve em ‘Ow Bachof o seu maior arauto Bachof formulou a sua controvertida teoria a partir de aula inaugural proferida na Universidade de Heldelberg, em 1951, que se transformau no livro inscalado, no origi- nal, Verfssungsuidrige Vrfassungsnomen?® Sustentou 0 pro- fessor germinico que existe uma hipétese em que a norma ‘da Constituigio pode afigurarse inconstitucional: quando ela contrariar prineipios transcendentes supralegais, posit: vados no texto da Constiuigio. Neste caso, competiria 3 Corte Constitucional declarar a inconstitucionalidade da norma constitucional em questio, “Transparece dos ensinaments de Bachot uma concep- co jusnaturalista, segundo a qual existriam certos direitos DinitoCouttconal Coimbra: Aimeina, 1992, p 198 197 Nese wabalho, fot consuls a tradi poruiguet icles ‘Normat Canara Incnataconnst Coimbra: Ate, 1977 superiores ao ordenamento positive, cuja emunciagio na Constituigao nio teria caréter constitutvo, mas meramente eclaratério. Tals direitos nao poderiam ser violados sequer- pelo poder constituinte originaio, sab pena de inconsti- rionalidade ‘Na Alemana, a Corte Constitucional chegow a admitir, nna hipétese aventada por Bachol, a possbilidade tedrica da declaragio de inconstitucionalidade de norma constitucio- nal, ao salientar: “A adordo do postulado segundo 0 qual 0 constituinte ‘poe tudo pode signficay wna rcaida na coneréainte- lectual dum positivism despido de valores, ha mito superado pola pisprudéncia Exalamente a expeiéncia com orgime nxsia ensinownos quo legilador & capa de perperar inusticas graves, de modo que a pica do exerci do diveto nao pode fear indifrente a eves de- Senvolviments histries, sedadies Het, nos easor ex Uienas,presrvar a iddia de justica material dante do principio da segwanca juridica Tamim 0 costtuinte onigindrio pode ulropassar os Leite da ustiga”® Porém, é mister resaltar que neste proprio acérdio, a Corte alemi frisow a absoluia excepcionalidade desta situa- ‘0 nos Estados de Direito, airmando que a declaracio de inconstitucionalidade das normas constiucionais originé- vias nas democracias lberais € quase una impossibilidade pritica. © tema suscitou e ainda suscita candentes debates na doutrina, nos quais alloram questies profundas de Teoria, a Constituigao e de Filosofia do Direito, No nosso enten- ddimento, a razao esti com Jorge Miranda’, quando salienta 1s BVeHE 5,295, cf Gilmar Ferrers Mendes, oct, p 116. 1 Manual de DisateContcianal Intango&Taia da Contd Coimbra: Coimbra Ed, 1908, p00. © 201 ‘que as constituigdes também se sujeltam a valores éticos transcendentes, que les impdem limitagbes intranspont veis Porém, a vulneracto de tas limites ndo traduz questio de inconstitucionalidade, mas de ilegitimidade da norma ‘constitucional, nao devendo ser aferida por érgios jurisdi- quirirem a concretizagio das regras. Tal coneretizagio no se di auavés de um simples processo l6gicoformal, no qual sejuin os principios mis especiicor deduridos dos mais igerais O que acorre na verdade é um procedimento dialé- tieo, no qual cada subprincipio em que se desdobra o prin- cipio original adiciona a este novas dimensdes © possibil MAREINERELORTILLO, Lorenzo & PARDO, tgnatio de Ouo y Dowho Funda Conaiion Madi Ed Citas, 109, p.125 4 CF Gaottho, op Gt, p 631 esegintes ry teoria€ perfithada, entre outras autores, por Canotitho® © {José Carlos Vieira de Andrade® ‘A teoria relatia sustemta, por sua vez, que © mticleo fundamental s6 pode ser delineade a luz do caso concreto, mediante a ponderacio dos direitos em jogo Dita teoria acaba reconduzinde a protecio 20 niles fundamental 20 préprio principio da proparcionalidade. Entre seus adep- tos, figuram Robert Alesy"" «Peter Haberle™ Observes, 2 propésto, que cerlas questées concretas podem afetar a0 meso tempo 0 cere de dois direitos Tundamentais contrapasios, evando o juiz ao dilema de ter dle optar por um deles em detrimento do outro. Para casos desta espécie, a teoria absolutacria uma situagao insusten tivel para o julgador, que se nio a flexiilizar, € foreado 3 profetir 0 odioso non liquet Formulemos um exemplo: urn jomal descobre que certo politica importante € homosse- xual ¢ planeja publicar reporagem sensacionalista a tal respeito. O politico toma conhecimento deste plana, e, antes da publicagio, propée medida judicial postulando a proibicio da reportagem, a0 argumento de que ela viola 0 seu direito de privacidade, e que se for publicada ocasionara ddano moral impassivel de recomposicio por via patrimo nial. O jornal defende-se com base no principio que asse- gura a liberdade de imprensa_ Ao juiz do caso, enti, ree tardo duas alternativas: vedar a reportagem, prestigiando 0 dlizeito privacidade em desfavor daliberdade de imprensa, ‘ou permitir a publicacio, consagrando a liberdade de int: prensa em detrimento do direito& privacidade. Teiuom non dar 2, id, p 688 Op ait, p 246 235. HC Op tp 286 seguintes 4 Le Lib Fondaweal ne SaeCostaionale Tatas de Als ‘andro Fillo e Ramla W Rost Roms La Now hala Sieniten, 1983, p85 e sequites a Portanto, nos parece que a teoria relaiva do nticleo essencial dos direitos undamentais €a mais correta, por ser ‘a que mais se adapta 8 dindmica do processa decisorio das ‘questdes constitucionais mais complexas 5 — Ponderagio de Bens © o Método Hermenéatico Concretizador de Interpretacio Constitacional Uma das polémicas hoje mais acesas no campo const lucional consiste na dspata entre os diversos métodos de ierpretagio da Consiui¢io Segundo Canouilho', os m&- todos principas hoje discutids pelos dousinadores 80 0 clissico, 0 t6pico, 0 cientcoespiriual, 0 concretzador e ‘onormativo estrturante™ Dent estes, interessasos mais de perto o método hermenéutico concretzador, dada 4 coiiidéneia dos seus presnupostes com o métode da pon: deragéo de bens ora esudado™ O método ein questi, que tem em Konrad Hesse o set principal expostor, sustenta que toda interpretagio cous {cional & conereizagio. Tal metodo vislumbra a interpre: taeao como tim proceso criativo, no qual 0 sentido da ‘norma interpretats £6 e obtém em face do problema cow 44 OP yp. 218. seuinies © Oeapsga limita deste ext nio petmite que se descrevam © Analsem agul tals mdtoder Aconselhaae ae intcresadoe no Tema & Teitura de BOCKENFORDE, EenseWolfgangBsorsnneDenehas Fue dlanmoierTraducio de Jan Lale Cages Ignacio Menénder. Ba denBaden: Nomar Veriagageelichal, 198, p 13 e419 So Sem embargo, é moter econhecer que Konrad Hee tee crieas 4 céeniea da ponderagio de bens, alegando que a poniblidade que fa consagra, de reltaeio de um bem a ata do outo, pode sae fear a proprin unidage da Constiuiglo Porem, ese mesmo autor suite validade da posderagio deste que arenas exeusiramnen- te a parts da propa Consttuiedo (Ester de Dowlo Costiucnal 1p 45/40) @ «reio sobre o qual ela incide, pois, segundo Hesse, “wo existe ‘nterpretacién desvincuada de les problemas coneretos°® Nconeretizacia da norma constitucional pressupde a sua pré-compreensio, que consiste na formulagga de uma idéia amtecipada sobre o seu contetido e limites, de modo absirato. A partir da précompreensio, o intérprete aproxi- nase do caso concieto, através de uma aluagio t6pica, crientada a0 problema mas limitada pela norma, Porém, ho se trata de um processo composto de dias fses suces sivas, onde primeiro se alcance o sentido dla norina para s6 depois aplici-la a hipétese concreta,e sim de win procedi- ‘mento unitiio, coeso e “circular” Na coneretizacio, os elementos fornecidos pelos méto- dos classicos de interpretacio — literal, sistemlico, hist rico € teleoldgico — bem como pelos prinipins expeciticos de interpretacio constivucional, — da unidade da Const twigio, da efetividade, da concordaneia pritica, ete, — sio considerados como lopoi (pomtos de vista), devendo ser stubmetidos a discusséo, e “al juag de ox ofiniones en for y Contra y frndamentay le decsién de fa manera mds claficadora {yconvincente posible" Tais elementos prestaiese 8 solucao ‘do caso concreto, apenas na medida em que fornecerem [remissas justas e razodveis para o problema Nesse sentido, o método concretizador aproximase da 1método t6pico de Theodor Viehweg", que também volta as 8 Op sit, pad 0, bids p 48 5 A formstacS terica do métedo pico enconusse no lito de Viehweg Tepe enspradtcepublcado na Alea em 1958, que ero inensasdscures, so pretender recperar para oDiteto forma de pensamento depress pe dogma taional. At pics comteta 0 monopdbe do vacioeinio sremicn no Direto, sr lientando que ete deve Biearse tes tm tecnica angusnentati voladas pars a busea do ta” no cao concreto Semana topo importante no Direto €"pensr 0 problema” Vale nua ‘suas atengdes para o caso concreto, cousiderando a herme néitiea constitucional como *(.-) um procesio aberto de argumentagao entre os virios participantes (pluralismo de intérpretes) através da qual se tenta adaptar ou adequar 2 norma constiicional ao problema conereto "™ Porém, & hhermenéutica concretizadora distinguese da t6pica, pois cenquanto esta preconiea o primado do problema perante a norma, aqua se assenta ho pressuposto do primado da ttorina eta face lo problema” Com eleito, ao contririo do que ocorte na t6pica, na hermenéutiea coneretizadora a Iiberdade do intérprete na formulacio e eleigio dos tpoi moves apenas dentro do capo fanqueado peo texto da Enfim, o método da ponderacao de bens tem em coma com a hermenutica concretizadora o fato de se alicergarem snlbes sabre os mesmos pilases preoeupagio especial com © «aso concreio (problema), sem descuido das dimensbes nnormativas da Constitui¢io, Ambos partem das normas conse ‘itucionais pastas, mas 56 se aperfeicoam em vista do proble- ma conereto sobre o qual sio chamados aatuar. 6 — Constimicio Aberta e Ponderagio de Bens ‘A Yabertara® da Constituicéo & um dos temas recorren- tes da modema teoria constiticional, frato sobrewudo da obra dos juristas germanicos Peter Haberle ¢ Konrad Hes- se® Em apertada sintese, o conceito de abertura eonstiun respite, slém do proprio Vichweg, Topic Junipndénin Traducio de Tercio Sampaio Ferraz Jr rasta: Departamento de Imprensa Niconal,197-a cru formule al mete pa Cave Wile, (Canara ip 248 e veguines 2 Canaui, @p at, p 219, 5 bd, 9.280 Cl KONRAD HESSE, op ot, p44 22 No campo ilostco »teari da consituiSo aber & tributes cioual exprime a necessidade da Lei Fundamental nic re. ‘gular de forma gids e minuciosa todas ae matévias a que se dedica, para nao enclausurar em “camisadeforga” 0 legishdor e as demais instineiae politics A Constituicio no deve waduzirse nun eédigo global da sociedad, s0b pena de se converter em instrument totalitrio, que soca as foreas socials, a0 amputarthes 0 espaga vital de atiagio © epicentre da ideia de constituigao aberta & 0 plura Tismo™ A Lei Fundamental deve ser dotadla de lasticidade material suficiente para abrigar sob 0 seu manto ideologias cosmovisdes diferentes, sem optar le mado definitive por nnenhuma delas. O constiuinte nio deve engessa a socie- dade, mas antes fomentar o embate entre idéias e projetos dlvergentes, convertendo-se com isso em agente eatalizador do ideal democratico e pluralista, Comm efeito, & indispensivel que a Constituigio fr queie aos seus destinatitios un s8zodvel espaca de acomo- dacio, outorgandothes certa liberdade politica le acio Como observau Konrad Hesse, “EL Derecto constucional crea rglas de actuacén y de «isién politica properiona a la politica divercesy pn tos de orenteciin, pero sin que pueda subttuirla. Por slo la Consttwcn deja espacio para la actunbzacién de las fuersaspoliicas. Cuando la Consttuciin no regula numerosascuestions de la uide politica, ola hace silo a grandes rasgo, no hay que wer en ell solamente une renuncia a su rgulacin 9 wn remissén dela mara at lo racionalismo enti, sobretdo da obra de POPPER, Kash So aie Aba eeu unger, cao trees principale ex fered tts no value sobre Popper da colegio Or Poveda So Pasi ‘Abs Curl, 1950 PETER HARERLE, Vos os Oetiker Pes pd BONA- IDES, Paulo Plc eCnuin os Camas da Dense Bio de Jere: Ea Forense 1985, 154 proceso de actualizacén yconcrticacién, sino que, edemds de elo, hay que ver com frnguencia también en dicka ‘actitu une gaveniia conshtuconal dela Bbre dscusion 4 dela libre decision de estas cuestiones” Na Constiuicio aberta a interpretacao consstucional tomnasse plistiea 0 bastante para permit a acomedacio harméniea doe valores divergentes plasmados na Lei Maior ‘io incompativeis com 0 seu idedtio as bierarquias rigid entre prineipios constitucionais, que sacrificam integral mente alguns valores para salvaguarda de outros (wg. eon siderar que em hipteses de colisio, os direitos individuais \ém preferdncin absoluta sobre o direitos sociais, ou view vers) Daf se vé que o método da ponderacio de bens ponten: cializa em alto grau a ideia da Constiuicio aberta, na me- dida em que tal método objetiva justamente possibitar 0 convivia entre valores e principios constiticionais antagé: nicos, Na ponderagao de bens, a decisto judicial € tomada através de’ um procesto em que sio examinadas todas as normas e valores envolvidos na questio, sendo 0 abjetivo maior do imérprete o de lograr, na medida do possivel, 2 “concordineia pritica” entre os mesmios, de modo a que cada umn deles 6 sejarestringido no estrto limite necessiio A garantia dos demais, Calba, a propésito,aligio de Antonio E Perez Lufio que, conquanto formulada tendo em mira 2 Constituigio espanhola, vale igualmente paraa nossa Carta: “Nuestro estatuto de derechos y tiberades se hall, de este ‘modo, funciado en un ven poli pluralist, auords com tuna rciedad aberia Esta estructura plualita ex fa que Tegisma alos representantes parmentaris pore un eo certizacién y desarallo legislation de fos derechos funda Op ci, p ‘mentale, acorde com las aspiracionesexprsadas por as mayorias. De igual mods, el propre proceo hermencatico ct come un cauce abierto a las distintasexigencas y alternations pndctias, decir, coma na instenesa eric capas de ‘ponderar los bene’ afin de resolorycanalizar (os conflctos que pusdam dayseenre ls deres valores fe interests tlelados por la narmativa conatitucional”* 7 — Ciiticas & Ponderagio de Bens Em que pese a sua franca aceitagio pela doutrina ¢ Jjurisprudénciaestrangeiras, a teoria da ponderagao de bens hndo esti isenta de crfticas, Poderfamos sintetizar as mais comuns em trés argumentos bésicos. © primeiro argumento relaciona-se com 0 alegado es. variamento dos direitos fundamentais que o método da ponderagio acarretaria, 20 tormilos relatives e subordina- dos a uma espécie de “reserva de ponderagio” Entre os que 0 sustentam estdo os juristas alemies Peter Lerche e Richaed Thoma” (0 segundo argument voltae contra a pretensa incon: sisténcia metodoldgica da ponderacio de bens, aduzindo que esta traduz apenas um procedimento formal, que néo oferece ao intérprete pautas materiais para solucio dos ‘esos concretos. Segundo esta linha de argumentacio, 0 método da ponderacéo de bens néo impde critétios racio- nais e objetivos de decsio, conferindo ao juz uma margem | ‘exagerada de discricionariedade na eleigio dos principios {que devem prevalecer no caso conereto Esta argumentacio @ esposada, entre outros, por Friedrich Maller® 0 Les Dwele: Fendanentler Madd: Teco, 199, p18 © 185, 33 CE CARA, jan Carts Gaeara de. Dent Pandan» Desa ‘els Lepiatiso — La Garena del Codeido Excl te or Dreher Fundanevttes ols Le Pondaentl de Bon Mar: Centro de Be roe Conaiiionaes, 194, p 293, a Finalmente, o terceiro argumento sustenta que o méto- do da ponderagio de bens implica na outorga de um poder excessivo a0 Judicidrio, em detrimento do Legislativo, et jgendrando por isso um déficit de legtimidade demoeratica hho processo decisdrio, uma vez que os miembros do Poder Judicidrio em regra néo sio eleitos Segundo tal entendi- mento, a ponderagio de bens transfere para o juizo poder de realizar opgies politcas acerea dos valores interesses 4 serem prestgiados nos conflites entre principios comsti- tucionais, sendo tal atribuigao essencialmente legislativa. Entre 0s eriticos desta linhagem, € posi aqueles que imegram a corrente do ism nos Estados Unidas, assim como Ernst Forsthofl na Aleman (© primeito argumento, relative a0 suposto “esvazi ‘mento" dos direitos fundamentais, nao procede, pois 0 Le Dizows de a Mths frie Teadug de Olver Jonanun Paris Presses Unvesiates de France, 1998, p89 Nos Estados Unidos, «polémien mai inten no Dieto Const fucional €2 que difde os jrbtas entre “interpreta” "no Interpretacvtas™ Em termos muito gertiz podese dizer que ot “inerpretauts” defendem que 2 Canto deve set incrpre- tad com pradénciae especial atencio aa se endo Iera, devendo preominar, na auséncia de uma dre consttcionl clr 00 fade do legtador Os" nto interpre 2 possibidade ea necesidade do wo de valores substantios (stig, igualdade, iberdade), no controle de consteacionaldade,recnihe- endo um papel mais advo para Judleano ma erdem poten A Posiglo "nterprestiia” ex hoje fortemente wrocads to conser “rdorimo no Diet, eentze ar aus defenores figura Wiss: Reh {ito atual Presidente da Suprema Core norteameriant. A visio “io interpretive ase sumo, etd ligada so defenses do anim jedi, e dos stores mcs progresisan do pensamento “ontitocional notteamercano. Sabre 0 toma, ale const obra ‘specifica de FLY, John Hart Denomary and Dis — A They of Jodiil Reve Caridge: Harvard University Pres 1980. 2 Zar hetingen Staton sin Vefesnogsis, 1968, p. 160, apud ROBERT ALEX, op at p 17 método da ponderagio de bens tem justamente & preocu pacio de evitara possibilidade deste fenémeno, que decerto DScorveria caso se adotaste ama hierarquia normativa entre 0s principios consttucionais. Como jfse disse antes, a hie- rarquizagio absoluta des principios tornaria quase letra morta os cinones que o intéeprete, por predilegio pessoal sinuasse em um etcalio mais baixo ( fato & que a coexisténcia de diversos direitos funda- mentais, ao lado de outros prineipios constinicionais igual- mente relevantes, impie inexoravelmente a relaivizacao de cada um, como imperativo da convivéncia harménica entre fs mesmos Tal circunstincia nenhuma teoria séria pode ‘deixar de teconhecer, como nio o faz a teoria da ponders: ‘ao dos bens As objegder de ordem metodoldgica (segundo argu: mento) contra a ponderagio de bens sio mais consistentes, De fato, seria negar o ébvio pretender que a ponderacio de bens nio concede certa discricionatiedade 20 julgador, ‘arreando alguma dose de inseguranca a ordem juridica Porém, nio se vslumbra outta saida melhor para solucao os conflits entre os principios constitucionais Com efeito, 2 realidade dos fats desmente a crenca, algo pueril, de que seja possivel equacionar more geomainco todos os contrastes potenciais entre as normas da Consituie fo, delimitando rigidamente 0s campos normativos de cada uma. Por isto, esté certo Klaus Stera a0 afiemat que * (Jen ninguna parte wn ordenantento juridico pode prescindir de a ponderaesin de bons ridin" De resto, 2 discussio sobre o subjetivisma na aplicacao do Direito nio € nova, nem esti adstrita 4 questio da pon: dderagio de bens. Rios de tinta jé correram ¢ continuario & corer a este respeito. A idgia do juit neutra © passivo, aplicador mecinico e seri das normias editadas pelo Poder 60 0p a, p 24 Legilaivo, nada mas € do que um mito do Estado fibers, ‘que nao retrata nem munca retratou a realidade Js 0 las Sico Ferrara adverua que" (..) endo devaaceditar que @ Aetiviade judicial we rebus a ua simples opr Bien, pore ‘a opin d dra enram cin fairs pigs ere (ie de interes, xeiaente no dternar enti da, 0 Juz munca deve de ser uma peromalidade que pea ten con Gini ontad, pra se dgradar num aunt de desis" No plano constitucional, € natural que esta carga de subjetilsmo das decides judicial tomese ainda mais acen- tuada do que nos outros moe juridicos, seja porque se lida com quests coloridas por ui forte mats politico, ja por predominarem na Consituicio a normas bers, ej ex trutaca franquela ao intérprete um expaco mais ample para as valoragées pesoais Tal eircunsanea, porém, Bio per inite que se disolva a normatividade da Les Fundamental ‘num mero voluntarismo do exegeta Conquanto nes por ‘am realizarse plenamente, objetividade e racionalidade das decisoes jridicionas sio metas que devem ser pers suidas De qualquer forma, é certo que no método de ponde- racio de bens avaldade da decisio pode ser aferida através de erérios racionas e, anto quanto possitel,cbjetvos, a parr da fundamentacio decisria A leitimidade da deci So deve ser aquilatada através dajustiicago das rests ‘impostas a cada hem jurdico em confronto, que tm de observar o principio da proporcionaidade em sua tiplice dimensio Ademais,o resultado final do proceso pode ser analisado sob o pra da sua conformidade comm tiboa de valores consagrados na Consiuigio. B evidente que “umas se atingir a objetividae plena no processo de pon- + Ferrara, Manuel FrancencoInrprlas Aptar dat Leis 1997, pe 0 deragio, mas data afirmarse que tal processo é puramente subjetiva e irracional, vai uma longa distancia, Por outro lado, a inseguranca juridica inerente 20 mé- todo de ponderacao de bens tende a diminuir com o passar do tempo, na medida em que casos semelhantes v0 aflo- rando na jurisprudéncia, ¢ esta vai consagrando solucées €

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