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Patentes em

FEDERAÇÃO EUROPEIA DE

Biotecnologia BIOTECNOLOGIA

l Novas formas de vida

l O debate sobre patentes em biotecnologia GRUPO DE TRABALHO SOBRE


AS PERCEPÇÕES PÚBLICAS
l Desenvolvimentos internacionais DA BIOTECNOLOGIA

l Directiva da CE na protecção das invenções


biotecnológicas

INFORMAÇÃO
As técnicas de manipulação genética permitem animais. O desenvolvimento inicial centrou-se Para mais informações sobre os Boletins
a introdução de novas características em sobretudo em microrganismos devido à relativa Informativos e outras publicações e
organismos vivos. No entanto, debate-se até que simplicidade da sua estrutura. Actualmente, actividades da Federação Europeia de
ponto formas de vida alteradas como resultado uma grande diversidade de processos Biotecnologia, Grupo de Trabalho sobre as
da biotecnologia poderão ser registadas em comerciais usam microrganismos Percepções Públicas da Biotecnologia,
patentes. As leis em vigor nos Estados Unidos geneticamente “programados” para produzir solicitamos que contacte:
permitem que se registe a patente de qualquer substâncias que estes não produziriam
forma de vida alterada, quer esta seja um naturalmente (como, por exemplo, a insulina, a Prof. John Durant (Presidente)
microrganismo, planta ou animal (não-humano). hormona de crescimento e certos enzimas). Research and Information Services
Na Europa, está em consideração uma proposta National Museum of Science and
da Comissão Europeia para a criação de uma No que se refere às plantas, as intenções do Industry
Directiva, na qual se propõe a instituição desses produtor tradicional, que usa a enxertia, e do GB-SW7 2DD London
mesmos direitos nos países da União Europeia engenheiro genético são as mesmas - inserir no Tel: +44 171 9388201
(UE). ou modificar o genoma de modo a introduzir Fax: +44 171 9388213
uma nova característica. A vantagem adicional Email: j.durant@nmsi.ac.uk
Este boletim informativo é uma actualização da engenharia genética advém da sua
do boletim informativo “Patentear a Vida”, capacidade de controlar com maior precisão a Dr. J. Bennett (Secretário)
publicado em Junho de 1993. Nele, introdução de novas características, para além Secretariat, EFB Task Group on Public
consideravam-se os avanços científicos que da possibilidade de introduzir material genético Perceptions of Biotechnology
culminaram na possibilidade de registo de de espécies não relacionadas de plantas e de Oude Delft 60
patentes de organismos vivos ou os seus outros organismos nas plantas. As plantas NL-2611 CD Delft
produtos, e as preocupações que suscitavam. geneticamente alteradas incluem variedades Tel: +31 15 2127800
A lei das patentes, e as considerações éticas e com determinadas características, tais como Fax: +31 15 2127111
comerciais relativamente à manipulação resistência a herbicidas, pragas ou doenças, Email: efb.cbc@stm.tudelft.nl
genética de substâncias que ocorrem conteúdo nutritivo melhorado e novas gamas de
coloração floral. http://www.kluyver.stm.tudelft.nl/efb/home.htm
naturalmente na natureza, microrganismos,
plantas e animais diferem consideravelmente © Copyright EFB Task Group on Public
e, portanto, cada categoria é considerada A manipulação genética de animais e peixes de Perceptions of Biotechnology, 1996.
independentemente. O objectivo principal reprodução está ainda em fase experimental. Os Este Boletim Informativo destina-se
deste boletim informativo é de informar objectivos desta investigação consistem na unicamente a informar e não representa as
devidamente e avançar o debate público resistência à infecção e no aumento da taxa de
opiniões da Federação Europeia de
sobre estes assuntos. crescimento. Um método para a produção de
produtos farmacêuticos, através do leite obtido a Biotecnologia ou qualquer outro organismo.
O texto resulta da contribuição conjunta de partir de animais de reprodução, encontra-se em Esta publicação apenas pode ser reproduzida
peritos em patentes, cientistas, industriais e fase avançada de desenvolvimento. O rato para fins de estudo ou investigação, com a
representantes de grupos ambientais e de oncológico (oncomouse), geneticamente expressa autorização escrita do autor.
defesa do consumidor de toda a Europa. predisposto ao cancro, foi a primeira patente
registada de um animal geneticamente O Grupo de Trabalho reconhece
Novas formas de vida manipulado. O rato oncológico presta-se a fins e agradece o apoio e
de investigação médica - no ensaio de novos financiamento continuado da
O termo “tecnologia do DNA(1) recombinado” fármacos ou substâncias químicas para o Comissão Europeia, Direcção-
refere-se a uma série de técnicas que podem ser tratamento de cancro. Geral XII, por este e outros
usadas na manipulação genética, através das temas.
quais se pode alterar o código genético de um Actualmente, os métodos de DNA recombinado
organismo vivo por inserção (ou remoção) de são preferencialmente utilizados no diagnóstico
secções de DNA. Após a sua primeira de doenças humanas causadas por defeitos Boletim Informativo

1
demonstração em 1973, estas técnicas foram genéticos (a fibrose quística, por exemplo). Em
rapidamente exploradas na introdução de novas 1984, nos Estados Unidos, realizou-se a
características em microrganismos, plantas e primeira tentativa de alteração de células
1 Nota do tradutor: O termo DNA (do inglês humanas de um paciente, com recurso à técnica
deoxyribonucleic acid) em português é traduzido para ADN, de transferência de genes (terapia de gene Segunda Edição, Setembro 1996
ácido desoxiribonucleico. Dado a vulgarização que o termo
DNA tem sofrido a nível global, optou-se neste boletim por
somática). Algumas células da medula óssea, traduzido a partir do
adoptar os termos e abreviaturas anglo-saxónicas. O mesmo incapazes de produzir um enzima essencial ao original em Inglês
se procedeu com outros termos tratados neste boletim. sistema imunitário, foram removidas do
2 Boletim Informativo no 1

PASSOS NA ALTERAÇÃO GENÉTICA pedido de registo de patente na disponibilizadas pela primeira vez, para além de
Europa pode fazer-se através ser necessário desenvolver um processo para a
Fontes de Diversidade Genética Métodos de Controlar e dos organismos nacionais sua produção de modo a que possam ser
Introduzir Genes competentes ou através do empregues de forma útil. Isto aplica-se quer a
• Bactérias • Plantas Instituto Europeu de Patentes substâncias inanimadas, quer a matérias vivas.
• Fungos • Animais • Plasmídeos • Vírus (EPO, European Patent Office) Em determinadas circunstâncias, estas
• Insectos • O Homem • Microinjecção em Munique. Através do EPO é substâncias não são apenas classificadas como
possível requerer a protecção meras descobertas, sendo consideradas
Identificação e Isolamento Desenvolvimento do Método de em todos, ou apenas em alguns, invenções por parte do EPO e outras autoridades
do Gene Identificação e Isolamento dos países signatários da legais.
Convenção Europeia sobre
Patentes (EPC, European
Gene e Novo Elemento Patent Convention)(2). A prática Actualmente, a concessão de patentes de
Genético Controlador nos Estados Unidos e Japão é microrganismos nos Estados Unidos, Europa e
também de considerável Japão é uma prática comum. Embora tenha sido
Transferência do Elemento Genético relevância para os inventores e concedida a Pasteur, em 1873, uma patente nos
para o Organismo Vivo empresas da União Europeia Estados Unidos por “levedura livre de germes
(UE), pois os Estados Unidos infecciosos como artigo de manufactura”, os
representam, geralmente, o tribunais americanos mais tarde consideraram
Organismo Modificado Geneticamente
maior mercado único para que a “descoberta de obras da natureza” não
produtos desenvolvidos na UE. era passível de ser patenteada. No caso
paciente. Essas células foram posteriormente Do mesmo modo, a protecção por patentes de Chakrabarty, em 1980, o Supremo Tribunal dos
modificadas para incluir o gene que codifica produtos de uma empresa dos Estados Unidos Estados Unidos decidiu que não podia impedir-
para o enzima em falta e recolocadas na medula. ou Japão nos seus mercados domésticos afecta a se o registo de patente de um microrganismo
Esta tentativa falhou, mas em 1990 recorreu-se, sua capacidade de competir noutros mercados. apenas por este estar vivo. Deste modo, uma
com sucesso, a um método semelhante para bactéria Pseudomonas, manipulada para conter
modificar geneticamente os glóbulos brancos. As tentativas de harmonização internacional da mais do que um plasmídeo e que controla a
Desde então mais de cem protocolos clínicos legislação sobre patentes e práticas não têm sido degradação de hidrocarbonetos (e portanto mais
envolvendo a terapia génica foram inteiramente bem sucedidas. Por exemplo, eficaz na dispersão de manchas de óleo do que o
recomendados, e decorrem presentemente actualmente os Estados Unidos concedem um organismo natural, que contém apenas um
vários ensaios clínicos em muitos países. A período de graça de um ano entre a publicação desses plasmídeos), foi considerada “uma nova
proposta para a terapia génica germinal é, da invenção pelo inventor e o prazo limite para bactéria com características marcadamente
contudo, mais radical e controversa. Esta a entrega do pedido de registo de patente nos diferentes de qualquer outra existente na
manipulação altera o “genetic make-up” dos Estados Unidos. Em oposição, qualquer natureza”. Deste modo, a bactéria não foi
óvulos ou esperma produzidos por cada divulgação pública de uma invenção antes da considerada uma obra da natureza mas do
indivíduo, manifestando-se perpetuamente nas entrega do pedido de registo de patente é inventor, e portanto a objecção como “produto
gerações futuras. Na Europa, a opinião pública usualmente fatal às perspectivas de protecção da natureza” falhou e o organismo modificado
em geral manifesta-se discordante relativamente nos países europeus. Ainda outro exemplo, os foi patenteado. Esta decisão foi determinante
à terapia génica germinal. Estados Unidos resolvem disputas sobre a para que na maioria dos restantes países
prioridade entre pedidos de registo de patentes desenvolvidos esta situação esteja agora
Inovações como estas são indiscutivelmente rivais para uma mesma invenção por contemplada na lei.
importantes, para além de serem industrial e comparação das datas de invenção, enquanto
potencialmente úteis para a sociedade. As que, noutros países, prevalecerá quem primeiro É ainda possível registar patentes de plantas
empresas de biotecnologia consideram essencial tiver entregue o pedido de registo de patente. nos Estados Unidos, Europa e Japão. O “Plant
a protecção legal destas inovações, como está Deste modo, as patentes incentivam o Patent Act” dos Estados Unidos, de 1930,
patente nos avultados acordos negociados em secretismo até ao momento de entrega do pedido restringe-se a plantas que se reproduzem
acções judiciais de violação de patentes. As de registo de patente, mas garantem a assexualmente. Mais de 6500 destas patentes
empresas insistem, portanto, que não deveria publicação da informação após o deferimento foram concedidas (maioritariamente a rosas e
existir discriminação sobre a protecção legal do pedido, tornando assim a informação árvores de fruto). No caso Hibberd (1985),
nesta área, em comparação com as medidas de disponível para fins de investigação. seguindo o princípio estabelecido no caso
protecção instituídas noutras áreas tecnológicas. Chakrabarty, decidiu-se que os modelos de
A protecção da propriedade intelectual através Outra diferença reside nos diferentes utilidade dos Estados Unidos poderiam ser
de patentes confere ao inovador a oportunidade significados atribuídos ao termo “invenção”. A concedidos a outros tipos de plantas, como, por
de recuperar o forte investimento na lei das patentes nos Estados Unidos confere ao exemplo, a plantas modificadas geneticamente.
investigação e, deste modo, continuar a termo o significado de invenção ou descoberta,
investigação necessária para melhorias futuras, enquanto na lei europeia a “descoberta” Na Europa, a lei das patentes foi originalmente
por exemplo, na saúde e nutrição humana e distingue-se da “invenção” e não é passível de considerada desadequada para a protecção de
animal. ser patenteada. No entanto, a distinção não é novas variedades de plantas desenvolvidas pelos
fácil de definir. Uma descoberta envolve novo métodos tradicionais de enxertia. Assim,
Patentes conhecimento enquanto que uma invenção é estabeleceram-se em alguns países, nos anos
uma aplicação prática de conhecimento. 1960, Leis Nacionais especiais sobre os direitos
A lei das patentes, tal como a legislação sobre a Considere-se o seguinte exemplo: a elucidação dos produtores de plantas, também chamadas de
protecção de marca registada e direitos de autor, apresentada por Crick e Watson sobre a Direitos de Protecção das Variedades de Plantas
é uma importante área da legislação sobre a estrutura em dupla hélice do DNA, considerada (PVR - Plant Variety Rights). Também se
protecção da propriedade intelectual. No caso descoberta, não foi passível de ser patenteada. estabeleceu a “International Union for the
das patentes, a legislação permite a protecção Não obstante, posteriores utilizações desse Protection of New Varieties of Plants” (UPOV,
das invenções que verifiquem as necessárias conhecimento para produzir DNA artificial, ou 1961). Para evitar confusão jurídica, a lei das
características de novidade, utilidade e novas formas de DNA, deram origem a muitas patentes na Europa excluiu, subsequentemente,
suficiente divulgação. O deferimento de um patentes. a possibilidade de registo de patentes de
pedido de registo de patente confere, ao seu variedades de plantas. Nomeadamente, o Artigo
titular, o direito civil de impedir outros de EPC 53(b) deixa de fora as patentes para
explorar o que nela é reclamado, excluindo o As substâncias que ocorrem naturalmente, “variedades de plantas e animais” como tais e
seu uso para fins de investigação. No entanto, o presentes como componentes de misturas “processos essencialmente biológicos para a
mesmo não confere ao titular o direito de complexas de origem natural, podem, em produção” de plantas e animais. A Convenção
explorar a sua própria invenção (por exemplo, o princípio, ser patenteadas. Para tal, têm de ser UPOV foi revista em 1991, e actualmente não
titular de uma patente deve cumprir as normas isoladas do seu ambiente natural, identificadas e impede a protecção dual pela PVR ou através de
nacionais no que diz respeito ao uso da 2 Um único pedido de registro de patente pode englobar patentes. Esta revisão aguarda ainda ratificação
invenção), nem confere nenhum direito de todos os países da União Europeia, a Suíça, o Liechtenstein e pelos Estados Membros, não se encontrando,
propriedade sobre os materiais patenteados. O o Mónaco. por isso, ainda em vigor.
Patentes em Biotecnologia 3

Os direitos dos produtores de plantas de enxerto desenvolvimento. Alguns destes


têm sido particularmente bem sucedidos na sua grupos têm-se oposto formalmente
própria esfera. No entanto, os peritos legais a algumas patentes europeias e EXEMPLOS DE PATENTES DO EPC E DOS ESTADOS
reconhecem hoje, em geral, que a lei das exigido a sua revogação. Muitos UNIDOS SOBRE ORGANISMOS E GENES
patentes está mais adequada à protecção de destes grupos consideram que não é Número de Patente
métodos recombinantes para a produção de ético, por princípio, “patentear a Isolamento da sequência do gene que codifica para
plantas transgénicas e seus produtos resultantes. vida”. A oposição estende-se a enzima envolvida na biossíntese da penicilina US 4,885,251
O EPO tem concedido patentes deste tipo, também a possíveis alterações Isolamento da sequência do gene que codifica para a
reclamando métodos e produtos per se. estruturais na indústria agrícola que eritropoietina humana, uma hormona que estimula o
podem surgir da biotecnologia, e crescimento dos glóbulos vermelhos US 4,703,008
As criações de animais produzidas pelos especialmente da aquisição, por EP 148,605
métodos tradicionais (cruzamento de espécies) parte de grandes grupos, dos Plasmídeos recombinantes e microorganismos transformados
não têm um sistema legal para a sua protecção direitos legais sobre os progressos que expressam os percursores da enzima quimosina (renina) EP 077,109
comparável aos direitos dos produtores de que têm sido alcançados. Pseudomonas com múltiplos plasmídeos para a degradação
plantas. Com base nos precedentes no registo de de hidrocarbonetos (Chakrabarty, ver texto) US 4,259,444
patentes de microrganismos e plantas, a Questões legais e morais: Uma Estirpe Bacillus thuringiensis insectisida EP 178,151
Comissão de Patentes dos Estados Unidos base jurídica permissível de Transferência de genes pesticidas (inibidor de tripsina) de
declarou, em 1987, que seriam concedidas objecção é o facto de os genes macunde (feijão-de-corda) para cereais US 5,306,863
patentes nos Estados Unidos a “organismos serem entidades que ocorrem Gene de planta/promotor EP 122,791
vivos multicelulares não-humanos e que não naturalmente, e de os métodos para Planta e semente de milho enriquecidos com
ocorram naturalmente na natureza, incluindo os transferir para plantas ou triptofano (Hibberd) US 4,581,847
animais”. A primeira patente de um animal animais serem bem conhecidos e de Onco-rato (Harvard, ver texto) US 4,736,866
transgénico foi concedida, em 1988, à fácil execução. Este facto é um EP 169,672
Universidade de Harvard. A patente reclama a desafio ao conteúdo inventivo de Rato imunodeficiente para estudo de doenças auto-imunes US 5,175,384
protecção do rato oncológico, no qual foi determinada patente em questão, e Expressão de fármacos em leite de animais de reprodução US 5,322,775
introduzido um oncogene de forma a tornar o é um argumento que os Plantas resistentes a herbicidas EP 242,236
animal mais susceptível ao cancro, e portanto competidores industriais usam, por
mais sensível ao teste de possíveis vezes, contra os pedidos de registo
carcinogénios. A patente europeia foi deferida de patentes dos seus rivais, mas por
após relutância inicial do EPO em a conceder (e enquanto não teve grande sucesso. O argumento forma a acelerar a velocidade de crescimento,
um bem sucedido apelo de recurso à Comissão encontra também eco no seio daqueles que, foi bem sucedida, embora tenha provocado
de Recurso). Actualmente, a patente é pelas suas convicções religiosas, têm objecções efeitos secundários inesperados, incluindo
fortemente contestada pelos grupos de defesa morais quanto ao registo de patentes de genes. artrite. Os grupos de defesa dos direitos dos
dos direitos dos animais e grupos de anti- Eles encaram o pedido de direitos de invenção, animais argumentam que as patentes
vivissecção. Já deram entrada mais de 300 em vez de descoberta, equivalente à pretensão incentivarão mais investigação sobre alterações
pedidos de registo de patentes de animais de ser Deus. genéticas em animais, à qual se opõem por
transgénicos, mas até agora apenas alguns foram princípio e invocam o possível sofrimento dos
deferidos (3 pelo EPO, 6 nos Estados Unidos). Algumas pessoas pensam que o registo de animais. A legislação, cuja intenção é de
patentes de seres vivos muda a relação entre a prevenir o sofrimento desnecessário, requer a
As patentes de genes encontram-se em todas as humanidade e o resto da natureza. E isto é concessão de licenças e a inteira divulgação das
áreas da biotecnologia. Para invenções de DNA particularmente sensível no que respeita a experiências e seus resultados para a prática da
recombinado, a patente reclama a sequência de animais, em que as patentes são encaradas como experimentação animal.
nucleótideo que codifica a proteína; os vectores, conferindo “posse”, minando assim o direito dos
isto é, os plasmídeos contendo esta sequência; animais à independência de existência e A livre criação de animais e plantas é,
os microrganismos ou organismos superiores relegando-os para o estatuto de um mero segundo alguns grupos, ameaçada pelas patentes
transformados com a sequência; e, em objecto. As plantas e os animais são posse dos de animais e plantas transgénicas. Os produtores
determinados casos, o produto da expressão produtores e criadores, respectivamente, que os gozavam anteriormente, no PVR, do chamado
proteica (geralmente apenas se o produto for criam e os usam como mercadorias agrícolas. “privilégio dos produtores” ou “isenção de
novo per se). O processo tecnológico Contudo, estes proprietários, investigação”. Esse privilégio conferia-lhes não
correspondente é, também, reclamado. O registo independentemente de possuírem, ou não, só a liberdade de utilizarem variedades de
de patentes de sequências de DNA de função organismos vivos patenteados, são obrigados a plantas protegidas nos seus programas de
desconhecida é questionável e controverso. A respeitar a legislação do bem estar animal. reprodução, mas também de comercializar
Organização do Genoma Humano (HUGO) futuras variedades desenvolvidas a partir das
aceita a concessão de patentes a sequências de Os opositores podem levantar a questão moral primeiras sem qualquer obrigação do
genes completas (full length genes), mas opõe- onde a lei das patentes o permite. Na Europa pagamento dos direitos de exploração da patente
se à concessão de patentes a secções de pode invocar-se o Artigo EPC 53(a), que proíbe ao titular da patente sobre a variedade inicial. A
sequências de DNA que não têm utilidade patentes para invenções cuja “publicação ou Convenção UPOV estendeu, com a revisão de
estabelecida. exploração seja contrária à ordem pública ou à 1991, o âmbito dos direitos do produtor da
moralidade”. A objecção moral é actualmente variedade inicial para incluir o que é
invocada contra a patente Europeia do rato denominado de “variedades essencialmente
O debate sobre patentes em biotecnologia oncológico (a patente “onco-rato”). A derivadas” (ambos os termos, “essencialmente
programação genética de um animal para derivadas” e “variedades”, estão definidos). O
As indústrias que utilizam a biotecnologia estão experiências laboratoriais que levem à morte é alargamento deste direito não é automático, e
convencidas de que a protecção da propriedade moralmente repugnante para estes grupos de depende da ratificação pelos Estados Membros
intelectual deveria ser possível para as oposição, que se sentem obrigados em das legislações PVR nacionais, em
invenções que decorrem das actividades de consciência a protestar. Não obstante, os conformidade com a Convenção UPOV de
investigação e que detêm um potencial animais, desde há muito tempo, vêm sendo 1991.
comercial. Os investigadores em biotecnologia usados como cobaias de doença. A resposta dos
das instituições académicas têm apoiado cada Institutos de Registo de Patentes poderá O direito à investigação e comercialização: O
vez mais esta argumentação, face à sua depender da condenação, ou não, do uso do rato direito à investigação está protegido através da
necessidade de obtenção de financiamento para oncológico à luz da aceitação pública de animais lei das patentes e também pela legislação PVR.
as actividades que desenvolvem, em parte de teste na investigação, com o intuito de No entanto, o direito de comercializar os
condicionada pela possibilidade de registo de encontrar a cura para doenças humanas graves. produtos resultantes da investigação depende da
patentes. Um sério desafio a esta argumentação violação, ou não, das pretensões das patentes ou
surgiu de vários grupos de interesse A objecção ao sofrimento animal poderá do facto de os produtos serem “essencialmente
preocupados com múltiplos aspectos, desde aplicar-se também às alterações genéticas nos derivados”, de acordo com a legislação PVR.
questões de ecologia, direitos e bem-estar dos animais de reprodução. Uma das primeiras Assim, o reforço do tipo de protecção
animais, questões morais e os interesses de experiências para inserir um gene responsável consagrada na Convenção UPOV aproximar-se-
pequenos produtores e dos países em pela hormona de crescimento num porco, de ia da forte protecção conferida pelas patentes.
4 Boletim Informativo no 1

Nenhum dos sistemas representa uma ameaça exploração da invenção deve ser impedida para EPC, e a legislação da maioria dos Estados
ao livre uso do germoplasma existente, pois proteger “a ordem pública”, a vida ou saúde Membros, já contém uma exclusão semelhante
estes direitos não podem, em circunstância humana, animal e vegetal, ou para evitar danos (por exemplo, o Artigo 53(a) do EPC já
alguma, monopolizar material conhecido como sérios ao ambiente. mencionado anteriormente). No entanto, o
tal. Mais uma vez, até que a revisão da Artigo 9 especifica ainda exemplos particulares,
Convenção UPOV seja ratificada nas O TRIPS confere a liberdade, aos Estados que por esta razão não podem ser patenteados.
legislações nacionais, os agricultores que Membros signatários, de estabelecerem Parafraseando o texto actual, estes incluem (a)
utilizem legitimamente sementes de uma exclusões à possibilidade de registo de patentes, métodos de terapia génica por linha germinativa
variedade protegida podem, de acordo com a lei, semelhantes às encontradas no EPC (ver texto humana(3), e (b) qualquer modificação genética
guardar uma parte das sementes da primeira anterior). Não obstante, os Estados Membros de animais que cause sofrimento
colheita para sementeira nas suas próprias devem providenciar meios de “protecção das desproporcionado ao benefício esperado ao
quintas, e produção de uma segunda e variedades de vida vegetal, ou através de homem ou ao animal.
subsequentes colheitas (o “privilégio dos patentes ou por um sistema eficaz sui generis,
produtores”). Com o reconhecimento de que o ou ainda pela combinação das duas”. (Um
actual grau de uso das sementes guardadas sistema sui generis é um sistema concebido para O Artigo 10 confirma que uma patente de um
destitui assim o produtor da variedade inicial de um propósito específico.) material biológico (ou um processo para a sua
rendimentos significativos, o direito produção) engloba a primeira e subsequente
reformulado na versão de 1991 da Convenção gerações de material obtidas por multiplicação
UPOV obrigaria a prévia autorização do Directiva da UE para a protecção das ou propagação, desde que as características
produtor. No entanto, os Estados Contratantes invenções biotecnológicas fundamentais do material original sejam retidas.
podem “re-introduzir” este direito nas suas Os direitos sobre as patentes do produto
legislações nacionais “dentro de limites A versão preliminar proposta pela Directiva da esgotam-se normalmente quando o produto é
razoáveis e sujeitos à salvaguarda dos legítimos UE na Protecção Jurídica das Invenções comercializado pelo titular da patente ou
interesses do produtor”. Biotecnológicas (Legal Protection on detentor de licença. No entanto, para um
Biotechnological Inventions) foi publicada produto que pode ser multiplicado
Desenvolvimentos internacionais originalmente em 1988. Após vários anos de biologicamente, o comprador pode obviamente
debate, uma comissão conjunta do Parlamento propagar o produto adquirido para o propósito
(1) A Convenção das Nações Unidas sobre Europeu (PE), do Conselho Europeu e da implicado na venda, mas o Artigo 12 proíbe que
Diversidade Biológica, decretada em Junho de Comissão Europeia chegou a acordo numa o material resultante seja usado em ciclos
1992 e em vigor desde Dezembro de 1993, foi, versão desta proposta. Não obstante, esta versão adicionais de multiplicação ou propagação. O
até Agosto de 1996, ratificada por 157 nações. foi chumbada numa sessão plenária do Artigo 13 estabelece uma excepção importante a
Esta Convenção procura garantir a conservação Parlamento Europeu em Março de 1995. A esta regra, permitindo aos agricultores que
da diversidade biológica, o uso sustentável dos Comissão Europeia publicou uma proposta cultivem sementes guardadas da primeira
recursos genéticos e a partilha justa e revista em Dezembro de 1995. Com esta colheita. Não obstante, este “privilégio dos
equilibrada dos benefícios que advêm da sua Directiva pretende-se harmonizar as legislações produtores” na lei das patentes deve ser limitado
utilização. nacionais sobre patentes com o EPC, e garantir para que esteja de acordo com a provisão
uma interpretação jurídica uniforme de alguns correspondente na regulação da UE dos direitos
Os recursos genéticos foram no passado artigos de especial relevância para os sistemas dos produtores de plantas. Os novos direitos dos
declarados “uma herança comum da vivos. produtores de plantas estabelecem o pagamento
humanidade a ser preservada, e livremente de royalties sobre as sementes guardadas,
disponível a todos, para uso em benefício das A Directiva consigna aspectos das patentes “sensatamente menor” que os royalties sobre
gerações presentes e futuras”. No entanto, o relacionadas com o “material biológico”, que é sementes certificadas compradas. Também os
Artigo 15 da Convenção reconhece actualmente definido, no Artigo 2, como qualquer material criadores de animais são livres de criar a partir
os direitos soberanos das nações sobre os seus que contenha informação genética e capaz de se dos animais patenteados para renovação do seu
recursos naturais, a sua autoridade na auto-reproduzir ou de ser reproduzida num próprio gado.
determinação do seu acesso, e a necessidade do sistema biológico. Esta definição abrange
acesso ser sujeito a consentimento prévio e necessariamente a matéria viva, os vírus e
O Artigo 14 cobre a situação em que uma
informado e em termos acordados mutuamente. genes, e outros tipos de DNA e RNA. Embora o
terceira entidade criou uma nova variedade de
Como recompensa por permitir o acesso aos Artigo 3 exclua patentes sobre o corpo humano
planta a partir de uma planta transgénica
seus recursos genéticos, um país dador deverá e os seus elementos no seu estado natural, é
patenteada, com o consentimento do produtor da
ser beneficiado através de qualquer um dos três possível registar patentes de elementos isolados
variedade original. Se, para explorar a
mecanismos: do corpo, ou de outro modo produzidos por um
variedade, o produtor necessitar de uma licença
processo técnico, se tiverem aplicação
do titular da patente da variedade original e esta
• participação na investigação, de acordo industrial. O Artigo 4 garante que não seja
lhe foi recusada, uma licença ser-lhe-à
com o Artigo 15(6); recusado o direito ao registo de patente pela
obrigatoriamente concedida, “sujeita ao
única razão de a invenção conter material
pagamento dos royalties apropriados”. No
• partilha dos resultados da investigação e biológico. Este princípio foi confirmado durante
entanto, a licença só será concedida sob
rendimentos provenientes da exploração muitos anos na jurisprudência sobre patentes
condição de a variedade constituir um
comercial, de acordo com o Artigo 15(7); nos principais países industrializados. O Artigo
“progresso técnico significativo” e da licença
4 estabelece a possibilidade de registo de
ser “ditada pelo interesse público”. O Artigo 14
• acesso a, e transferência de, tecnologia patentes de plantas e animais e suas partes,
é contestado pela indústria agro-biotecnológica
derivada, de acordo com o Artigo 16(1). excepto para “variedades de plantas e animais”.
porque diminui o direito estabelecido nas
patentes de uma forma inaudita.
A Convenção reconhece uma função legítima Pode requerer-se, em determinadas
para a propriedade intelectual na obtenção circunstâncias (geralmente como material
destes objectivos. purificado), o registo de patente de produtos As reacções gerais à proposta revista são
naturais que tenham uma utilidade biológica. O confusas. A Comissão dos Assuntos Jurídicos
(2) O encontro do Uruguai para o Acordo Geral Artigo 8 da Directiva confirma que as patentes (Legal Affairs Committee) do PE, por exemplo,
de Tarifas e Comércio (GATT - General para estes produtos não devem ser consideradas, levantou uma série de dúvidas ao texto
Agreement on Tariffs and Trade) estabeleceu por princípio, apenas como meras proposto, enquanto que a Aliança Europeia de
um Acordo subsidiário em Aspectos dos “descobertas”. Deste modo, a presença de um Grupos de Apoio à Genética (European Alliance
Direitos de Propriedade Intelectual relacionados produto como parte de um material pré- of Genetic Support Groups) é a favor. A
com o Comércio (TRIPS - Agreement on Trade existente não é, por si só, razão suficiente para Greenpeace, por sua vez, manifestou-se
Related Aspects of Intellectual Property Issues). recusar a sua patente. negativamente quanto à proposta. A proposta da
Qualquer país que ratifique o GATT aceita a Comissão Europeia pretende que os Estados
obrigação de estabelecer padrões mínimos de De acordo com o Artigo 9 da Directiva, as Membros implementem a Directiva o mais
propriedade intelectual. O registo de patentes invenções não são passíveis de serem tardar a 1 de Janeiro do ano 2000.
deve ser possível em todas as áreas patenteadas quando a sua exploração for 3 Estes métodos são já excluídos pelo EPC e pelas legislações
tecnológicas, excepto aquelas em que a contrária à “ordem pública” ou moralidade. O nacionais Europeias.

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