Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
AnaliseRn Notasdeaulav01 PDF
AnaliseRn Notasdeaulav01 PDF
OLIVAINE S. DE QUEIROZ
Departamento de Matemática
Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica
UNICAMP
Campinas
2015
Capítulo 1
Revisão de Topologia em Rn
Neste capítulo inicial vamos apresentar conceitos básicos essenciais que necessitaremos no decorrer do curso.
Outros produtos internos em Rn também podem ser considerados. São 4 as principais propriedades do produto
interno.
3
4 CAPÍTULO 1. REVISÃO DE TOPOLOGIA EM RN
Observe que as coordenadas a ji do vetor T (ei ) (com relação à base ( f1 , . . . , fm )) aparecem na i-ésima coluna de A.
Por linearidade obtemos então que o vetor y = T (x) = T x pode ser encontrado pela expressão
y1 a11 . . . a1n x1
.. .. .. .. .
. = . . .
ym am1 . . . amn xn
Reciprocamente, se A é uma matriz m × n então T (x) := Ax, x ∈ Rn , define uma transformação linear de Rn
em Rm .
Assim, existe uma relação biunívoca entre o conjunto L (Rn , Rm ) das transformações lineares de Rn em
m
R com o conjunto das matrizes m × n.
Definição 1.2.1 Um conjunto X é chamado de espaço métrico se existe uma função d : X × X → R satisfazendo
as seguintes propriedades para quaisquer x, y, z ∈ X:
Qualquer função d que satisfaz as três propriedades acima é chamada de métrica (ou distância).
As vezes utilizamos a notação (X, d) significando que X é um espaço métrico com métrica d.
Das propriedades de produto interno segue que (Rn , d1 ) é um espaço métrico. Além disso, podemos ainda definir
Verifica-se sem muitas dificuldades que (Rn , d2 ) é também um espaço métrico. As métricas d1 e d2 são chamadas
de métrica euclidiana e métrica do sup, respectivamente. Elas estão relacionadas de várias maneiras. Em particular,
√
|x − y| ≤ kx − yk ≤ n|x − y|, para quaisquer x, y ∈ Rn .
1.2. ESPAÇOS MÉTRICOS 5
Exemplo 1.2.3 Seja X qualquer conjunto não vazio. Dados x, y ∈ X defina d(x, y) = 1 se x 6= y e d(x, x) = 0.
Então, apesar de parecer meio artificial, d define uma métrica em X.
Suponha que d seja uma métrica em X e que Y ⊂ X. Então existe automaticamente uma métrica dY em Y (e
portanto (Y, dY ) é um espaço métrico) definida pela restrição de d à Y × Y , isto é,
dY = d |Y ×Y .
˜ y) ≤ π
d1 (x, y) ≤ d(x, d1 (x, y), para quaisquer x, y ∈ S2 .
2
Recorrendo à noção de distância podemos definir os conceitos fundamentais de conjuntos abertos e fechados.
Observação 1.2.6 Seja (X, d) um espaço métrico e Y ⊂ X. Então uma ε -vizinhança de um ponto x0 ∈ Y na métrica
dY é dada por U(x0 , ε ) ∩Y , sendo essa última entendida na métrica d.
Proposição 1.2.7 Seja (X, d) um espaço métrico e {Uα | α ∈ A} uma coleção de subconjuntos abertos de X, onde
S
A é um conjunto de índices qualquer.
Tk
Então o conjunto α ∈A Uα é aberto de X. Se supormos que que A é finito,
isto é, A = {1, . . . , k}, então α =1 Uα é aberto.
Corolário 1.2.8 Se Y ⊂ X e A é aberto em Y com relação à dY , então existe um conjunto aberto U em X tal que
A = U ∩Y .
Demonstração. Sendo A aberto em Y , para qualquer x ∈ A existe εx > 0 tal que U(x, εx ) ∩Y ⊂ A. Definamos
[
U= U(x, εx ).
x∈A
Temos então pela Proposição 1.2.7 e pela Observação 1.2.6 que U é aberto de X. Note que U ∩Y ⊂ A. Além disso,
como a união é tomada em todo x ∈ A, temos que A ⊂ U. Logo, A ⊂ U ∩Y . Conclui-se que A = U ∩Y .
n
Em R as ε -vizinhanças nas duas métricas d1 e d2 que vimos anteriormente recebem nomes especiais. Se
x0 ∈ Rn , a ε -vizinhança de x0 na métrica euclidiana d1 é chamada de bola aberta de centro x0 e raio ε , e é denotada
por Bε (x0 ). A ε -vizinhança de x0 na métrica do sup é chamada de cubo aberto de centro x0 e raio ε , sendo denotado
por Cε (x0 ). Pelo Exemplo 1.2.2 temos que
para qualquer x0 ∈ Rn e qualquer ε > 0. Podemos refrasear este fato na maneira apresentada no próximo resultado.
Proposição 1.2.9 Um subconjunto U ⊂ Rn é aberto com relação à métrica d1 se, se e somente se, é aberto com
relação à métrica d2 .
6 CAPÍTULO 1. REVISÃO DE TOPOLOGIA EM RN
Definição 1.3.1 Nas condições acima, dizemos que f é contínua em x0 se, dado ε > 0, existe um δ > 0, δ = δ (ε ),
tal que
dY ( f (x), f (x0 )) < ε sempre que dX (x, x0 ) < δ .
Dizemos que f é contínua se f é contínua em todo x0 ∈ X.
Uma formulação alternativa para a definição de continuidade pode ser apresentada na forma de teorema.
Teorema 1.3.2 A função f : X → Y é contínua se, e somente se, para qualquer subconjunto aberto U de Y, a
pré-imagem f −1 (U) é aberta em X.
Definição 1.3.3 Uma função f : X → Y é chamada de homeomorfismo se ela é inversível e ambas, f e f −1 , são
contínuas. Os espaços métricos (X, d) e (Y, d) são homeomorfos se existe um homeomorfismo de X em Y . Duas
métricas d e d ′ definidas no mesmo conjunto X são equivalentes se existe um homeomorfismo de (X, d) em (X, d ′ ).
Definição 1.3.4 Seja A ⊂ X e f : A → Y . Seja ainda x0 um ponto limite do domínio A de f . Dizemos que o limite
de f em x0 é y0 se, para cada ε > 0, existe um δ > 0 tal que
Limites e continuidade de funções em espaços métricos satisfazem as mesmas propriedades que limites e
continuidades de funções em R com relação à soma, produto e composição.
Int A := (Ac )c
é chamado interior de A.
Note que x ∈ IntA se, e somente se, existe ε > 0 tal que U(x, ε ) ⊂ A, e assim o interior de A é aberto.
Definição 1.4.2 O exterior de A é o conjunto ExtA := Int(Ac ). O bordo, (ou fronteira) de A é o conjunto
∂ A := X \ (ExtA ∪ IntA).
1.5 Compacidade em Rn
Passamos a relembrar nesta seção o importante conceito de subconjuntos compactos. Como usual, denotaremos
por (X, d) um espaço métrico.
Seja A ⊂ X. Uma
S
cobertura de A é uma coleção de subconjuntos {Uα | α ∈ I}, sendo I um conjunto de
índices, tal que A ⊂ α ∈I Uα . Se cada Uα é aberto, então dizemos que a cobertura é aberta.
Definição 1.5.1 Um subconjunto A ⊂ X é chamado de compacto se toda cobertura aberta de A possui uma
subcoleção finita que também forma uma cobertura aberta de A.
Um subconjunto B de um espaço métrico (X, d) é dito limitado se existe uma constante M > 0 e x0 ∈ X tal
que d(x, x0 ) ≤ M para qualquer x ∈ B.
Em Rn os compactos são caracterizados como sendo os subconjuntos fechados e limitados. Uma parte desse
resultado possui uma demonstração simples e daremos a seguir. Na verdade, enunciamos somente para Rn mas ele
vale para qualquer espaço métrico.
Teorema 1.5.2 Seja X um subespaço compacto de (Rn , d1 ) ou (Rn , d2 ). Então X é fechado e limitado.
Em particular, o conjunto {UN | N ∈ Z+ } é uma cobertura aberta do compacto X, existindo assim uma quantidade
finita de inteiros positivos N1 , . . . , Nk tais que
k
[
X⊂ UN j .
j=1
Novamente, usando a compacidade de X obtemos que existe uma quantidade finita de subconjuntos VN1 , . . .VNl
que cobrem X. Tomando M = maxi Ni obtemos que X ⊂ VM e em particular CN ∩ X = 0.
/ Notando que x0 ∈ IntCM
temos que Rn \ X é aberto.
Para finalizarmos a caraterização dos subconjuntos compactos em Rn necessitaremos ainda de um fato básico.
Demonstração. Seja A uma coleção de abertos que cobrem X. Adicionemos a esta coleção o aberto Rn \X. Temos
assim uma cobertura aberta de Rn . Como X é limitado, podemos tomar um retângulo Q como no Lemma 1.5.5
tal que X ⊂ Q. Em particular a cobertura aberta de Rn cobre o compacto Q. Extraímos então uma subcobertura
finita que ainda cobre Q. Se esta subcobertura de Q ainda conter Rn \ X, tiramos este conjunto obtendo ainda outra
subcoleção da cobertura inicial A . Tal subcoleção pode não cobrir Q, mas certamente cobre X já que o conjunto
Rn \ X descartado não contém pontos de X.
S
Definição 1.5.7 Seja X ⊂ Rn . Dado ε > 0, o conjunto x∈X Bε (x) é chamado de ε -vizinhança de X na métrica
euclidiana. Similarmente, substituindo Bε (x) por Cε (x) definimos a ε -vizinhança de X na métrica do sup .
Teorema 1.5.8 Sejam X ⊂ Rn um subespaço compacto e U ⊂ Rn um aberto que contém X. Então existe ε > 0 tal
que a ε -vizinhança de X está contida em U (em qualquer métrica d1 ou d2 ).
Demonstração. Por equivalência das métricas, basta demonstrarmos o resultado para a métrica do sup .
Dado um subconjunto C ⊂ Rn , para cada x ∈ Rn definimos a distância entre x e C pela expressão
Como f é contínua e X é compacto, pelo Teorema 1.5.4 temos que f assume um mínimo. O valor mínimo de f
deve ser positivo, caso contrário, f (x0 ) = 0 para algum x0 ∈ X, o que mostraria que x0 ∈ Rn \ U, pois este último
conjunto é fechado, obtendo assim uma contradição. Segue que existe ε0 > 0 tal que f (x) ≥ ε0 para qualquer x ∈ X
e assim a ε0 -vizinhança de X está contida em U.
Falta mostrarmos que x 7→ d(x,C) é contínua de Rn em R. Sejam x, y ∈ Rn e c ∈ C. Então, pela desigualdade
triangular,
d(x,C) − |x − y| ≤ |x − c| − |x − y| ≤ |y − c|.
Tomando o ínfimo em c na desigualdade acima obtemos
O Teorema 1.5.8 não é válido se retirarmos a hipótese de compacidade em X, como verificaremos nos exer-
cícios deste capítulo.
Demonstraremos a seguir um resultado familiar.
∆ := {(x, x) | x ∈ X},
o qual chamaremos de diagonal de X × X. Notemos que ∆ é um subconjunto compacto de R2n já que é imagem de
X pela aplicação contínua h(x) = (x, x).
Consideremos a função g : X × X → R definida por
Notemos que g é contínua já que pode ser escrita com soma e composição das funções contínuas f e d1 . Segue
que, dado ε > 0, o conjunto V dos pontos (x, y) ∈ X × X para os quais g(x, y) < ε é aberto em X × X e, como tal,
deve ser escrito como a intersecção de um aberto U ⊂ Rn × Rn com X × X. Como ∆ ⊂ V , temos que ∆ ⊂ U.
A compacidade de ∆ e o Teorema 1.5.8 implicam na existência de um número δ > 0 tal que a δ -vizinhança
de ∆ ainda está contida em U. Note que, se x, y ∈ X são tais que kx − yk < δ , então
ou seja, (x, y) pertence à δ -vizinhança de ∆. Segue que (x, y) ∈ U e assim g(x, y) < ε , como desejado.
A demonstração para o caso da métrica do sup segue por equivalência das métricas.
1.6 Conexidade em Rn
Nesta seção daremos a definição de espaços conexos e apresentaremos algumas propriedades que necessitaremos.
Definição 1.6.1 Um subconjunto Y de um espaço métrico X é conexo se ele não é igual à união de dois subcon-
juntos abertos, disjuntos e não vazios.
uma decomposição.
Teorema 1.6.3 Os únicos subconjuntos de R que possuem mais que um ponto e são conexos são o próprio R e os
intervalos (abertos, fechados ou semi-fechados).
1. X é conexo;
Demonstração. Se f (X) não fosse conexo, pelo Teorema 1.6.4 existiria uma função g : f (X) → {1, 2} contínua e
sobrejetora. Assim, a composição g ◦ f : X → {1, 2} seria também contínua e sobrejetora, contradizendo o fato de
X ser conexo.
Em particular, uma função contínua de um espaço métrico conexo X com valores em R assume todos os
valores entre dois quaisquer pontos de sua imagem.
Uma importante classe de conjuntos conexos em Rn é dada pelos conjuntos convexos, que passamos a definir.
Dados x1 , x2 ∈ Rn , o segmento de reta unindo x1 a x2 é dado por t 7→ x1 + t(x2 − x1 ), 0 ≤ t ≤ 1. Um
subconjunto A ⊂ Rn é convexo se o segmento de reta unindo quaisquer de seus pontos está inteiramente contido
em A. Notemos que qualquer subconjunto convexo de Rn é conexo.
(ii) No caso em que temos igualdade, é verdade que f = λ g para algum λ ∈ R? E se f e g forem contínuas?
(iii) Existe alguma relação entre a desigualdade do item (i) com a desigualdade do Exercício 2?
A transformação linear T : Rn → Rn preserva ângulo se T é bijetora e ∠(T x, Ty) = ∠(x, y) para vetores não
nulos x e y.
(ii) Suponha que exista uma base {x1 , . . . , xn } ortonormal de Rn e números λ1 , . . . , λn tais que T xi = λi xi , i =
1, . . . , n. Demonstre que T preserva ângulo se, e somente se, |λi | são todos iguais.
1.7. EXERCÍCIOS DO CAPÍTULO 11
Exercício 7 Se T : Rm → Rn é uma transformação linear, mostre que existe uma constante M > 0 tal que
kT xk ≤ Mkxk,
para qualquer x ∈ Rm .
Sugestão: estime kT xk em termos de kxk e das entradas da matriz de T .
Exercício 8 Seja X um espaço métrico e suponha que a11 , . . . , amn sejam mn funções contínuas de X em R. Para
cada p ∈ X, seja A p a transformação linear de Rn em Rm cuja matriz é (ai j (p))m×n . Mostre que p 7−→ A p é
contínua de X em L(Rn , Rm ).
Exercício 10 Seja f : Rn → R uma função contínua. Suponha que f (x) > 0 para qualquer x 6= 0 e que f (cx) =
c f (x) para qualquer x ∈ Rn e qualquer c ∈ R, c > 0. Mostre que existem constantes a > 0 e b > 0 tais que
Exercício 11 Seja (X, d) um espaço métrico. Mostre que, para cada M > 0, existe uma métrica dM tal que
dM (x, y) ≤ M, para quaisquer x, y ∈ X e ainda (X, d) e (X, dM ) são homeomorfos. Equivalentemente, todo espaço
métrico é homeomorfo a um espaço métrico limitado.
Mostre que C é fechado e que não existe conjunto aberto no qual C seja denso.
Observação: uma das propriedades interessantes do conjunto de Cantor é que ele nos dá um exemplo de
conjunto não enumerável de medida nula, conceito que trabalharemos mais adiante no curso.
y = α x + (n − α m),
n′ 1 1
0< − α < ′2 e ′ < ε .
m′ m m
Este fato pode ser utilizado sem a demonstração (consulte [8]).
12 CAPÍTULO 1. REVISÃO DE TOPOLOGIA EM RN
1
a) Mostre que a função contínua f : R+ → R dada por f (x) = é limitada mas não possui máximo nem
1+x
mínimo.
1
b) Mostre que a função contínua g : R+ → R dada por g(x) = sen é limitada mas não uniformemente contí-
x
nua em R+ .
Exercício 15 Sejam X = (−1, 1) × {0} ⊂ R2 e U = B1 (0) ⊂ R2 . Note que X ⊂ B1 (0). Mostre que não existe ε > 0
tal que a ε –vizinhança de X em R2 esteja contida em U.
Exercício 16 Uma função f : Rn \ {0} → R é dita positivamente homogênea de grau d ∈ R se f (tx) = t d f (x),
para qualquer x 6= 0 e todo t > 0. Suponhamos que f seja contínua. Demonstre que, se f possui uma extensão
contínua para todo Rn , então o seguinte ocorre:
a) se d < 0, então f ≡ 0;
Diferenciabilidade
Neste capítulo vamos estudar o cálculo diferencial de funções f : Rn → Rm . As vezes, chamaremos uma função
de várias variáveis com valores em Rm de uma aplicação. A teoria se baseia na aproximação linear local dessas
aplicações como no caso em que m = n = 1. Dentre os resultados que obteremos está o que trata da diferencia-
bilidade da composta de duas funções (Regra da Cadeia). Além disso, sendo a derivada uma aproximação linear
de uma função em um ponto onde ela é diferenciável, estudaremos que tipo de informações qualitativas podemos
obter analisando somente a derivada. Os principais resultados nessa direção são o Teorema da Função Inversa e o
Teorema da Função Implícita. O primeiro destes teorema ainda nos fornecerá consequências importantes que são
as Formas Locais das Imersões e das Submersões e o Teorema do Posto.
Primeira aula ↓
Exemplo 2.1.3 Seja f : Rn → R dada por f (x) = kxk2 e u ∈ Rn qualquer vetor fixado. Então
f (x + hu) − f (x) = hx + hu, x + hui − kxk2
= kxk2 + 2hhx, ui + h2kuk2 − kxk2
= 2hhx, ui + h2kuk2 .
13
14 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
Ao tentarmos obter informações sobre a continuidade de uma função analisando suas derivadas direcionais
encontraremos alguns problemas.
∂f ∂f
Então (0, 0) = (0, 0) = 1. Entretanto, f não é contínua na origem. Note ainda que, para qualquer direção
∂x ∂y
u = (a, b), com a 6= 0 e b 6= 0, temos que
No exemplo anterior a derivada direcional não existia em direções diferentes daquelas dadas pelos eixos.
Existem ainda funções que possuem derivadas direcionais em todas as direções em um dado ponto x0 mas que
supreendetemente são descontínuas em x0 .
Segue que
′ b2 /a se a 6= 0,
f (0, 0; u) =
0 se x = 0.
Assim, existem as derivadas direcionais de f em (0, 0) em todas as direções. Entretanto, f não é contínua em
(0, 0). De fato, f (0, 0) = 0 mas, se calcularmos o limite de f em (0, 0) sobre a parábola x = y2 obteremos 1/2.
Para obtermos continuidade necessitamos de um conceito mais forte que derivadas direcionais que é a dife-
renciabilidade. Recordemos o caso de funções de R em R.
Dada uma função f : R → R, definimos a derivada de f por meio do limite (se ele existir)
f (x + h) − f (x)
f ′ (x) := lim .
h→0 h
Definamos
f (x + h) − f (x)
g̃(h) := − f ′ (x).
h
Então g̃ não está definida em h = 0, mas
lim g̃(h) = 0.
h→0
Podemos então verificar que, se f é diferenciável, existe uma função g tal que
f (x + h) − f (x) = λ h + |h|g(h),
(2.2)
lim g(h) = 0.
h→0
Se h 6= 0 temos que
f (x + h) − f (x) |h|
= λ + g(h).
h h
Logo, tomando o limite h → 0 na expressão acima e observando que
|h|
lim g(h) = 0,
h→0 h
Definição 2.1.6 Seja A ⊂ Rn e f : A → Rm . Suponha que A contenha uma vizinhança de x0 . Dizemos que f é
diferenciável em x0 se existe uma matriz B, do tipo m × n, tal que
f (x0 + H) − f (x0) − B · H
lim = 0.
H→0 |H|
Na Definição 2.1.6 utilizamos a norma do sup, mas poderíamos ter utilizado a norma euclidiana sem nenhuma
perda. Para que esta definição faça sentido devemos observar que a matriz D f (x0 ), quando existe, é única.
Demonstração. Suponha que B e C sejam duas matrizes que satisfazem a condição na definição de derivada.
Segue que
(C − B) · H
lim = 0.
H→0 |H|
Fixado u 6= 0, tomamos H = tu e fazemos t → 0. Segue que (C − B) · u = 0 e, como u é qualquer, C = B.
No caso em que a derivada de f : A ⊂ Rn → Rm existe em todo ponto do aberto A dizemos que f é diferen-
ciável em A. Neste caso a aplicação derivada de f é a aplicação
Exemplo 2.1.8 Qualquer matriz B ∈ L (Rn , Rm ) pode ser vista ais simplesmente como uma função entre esses
espaços. Mas por linearidade, B(x0 + H) − B(x0) = B(H). Segue que DB(x0 ) = B
Mostremos que a definição de diferenciabilidade que acabamos de dar, na qual a matriz D f (x0 ) é conheci-
da como derivada de Fréchet, é mais forte que o conceito de derivada direcional, conhecida como derivada de
Gâteaux. De fato, diferenciabilidade implica em continuidade.
Logo f é contínua em x0 .
D f (x0 ) = (λ1 . . . λm ).
∂f
(x0 ) = f ′ (x0 ; e j ) = D f (x0 ) · e j = λ j , j = 1, . . . , m.
∂xj
O resultado segue.
Fazendo o produto interno de ambos os lados da igualdade (2.4) com u j , j = 1, . . . , m, vemos que cada termo na
∂ fj
soma possui limite, o qual é justamente (x0 ), ou seja
∂ xi
m
∂ fj
∑ ∂ xi (x0 )u j = f ′ (x0 ; ei ) = T (ei ).
j=1
Tal matriz é chamada de Jacobiana de f em x0 , sendo denotada por D f (x0 ). Ela está definida em qualquer
ponto de Rn onde f é diferenciável.
Segunda aula ↓
a) A função f é diferenciável em x0 ∈ A se, e somente se, cada uma de suas componentes f1 , . . . , fm são
diferenciáveis em x0 .
para algum z ∈ (x, y). Entretanto esta relação não é válida em geral para funções de Rn em Rm . Vamos demonstrar
que uma versão corrigida do teorema é válida. Utilizaremos a seguinte notação: para x, y ∈ Rn , definimos
Teorema 2.2.1 (Teorema do Valor Médio) Sejam A ⊂ Rn um aberto e f : A → Rm diferenciável em todo ponto
de A. Sejam x, y ∈ A tais que L(x, y) ⊂ A. Então, para todo a ∈ Rm , existe z ∈ L(x, y) tal que
a, ( f (y) − f (x)) = a, D f (z) · (y − x) .
Demonstração. Seja u = y − x. Como A é aberto e L(x, y) ⊂ A, temos que existe δ > 0 tal que x + tu ∈ A, para
qualquer −δ < t < 1 + δ (basta usar o Teorema 1.5.8). Agora fixemos a ∈ Rm e definamos F : (−δ , 1 + δ ) → Rm
por
F(t) := a, f (x + tu) .
Notemos que
F(t + h) − F(t)
′
lim = a, f (x + tu; u) .
h→0 h
Em particular, F é diferenciável em (0, 1). Segue do Teorema do Valor Médio de uma variável que existe 0 < θ < 1
tal que
F(1) − F(0) = F ′ (θ ) = a, f ′ (x + θ u; u) = a, f ′ (z; y − x) = a, D f (z) · (y − x) ,
onde z := x + θ u ∈ L(x, y). O resultado segue notando que F(1) − F(0) = a, ( f (y) − f (x)) .
Observação 2.2.2 É interessante observar que o Teorema do Valor Médio 2.2.1 possui implicações simples, porém
já interessantes.
b) Tomando a = f (y) − f (x) podemos usar a Desigualdade de Cauchy-Schwarz do Exercício 2 para, após
dividirmos por k f (y) − f (x)k, obtermos do Teorema 2.2.1 que
onde M é a norma de D f (z), para algum z ∈ L(x, y). Em particular, se A é convexo e as derivadas parciais
de f são limitadas em A, então f é Lipschitz, uma vez que, para quaisquer y, x ∈ A, temos que L(x, y) ⊂ A.
Lema 2.3.1 Seja g : A ⊂ Rn → R uma função diferenciável no aberto A e considere φ (t) = g(x0 + tu). Para todo
t de maneira que φ esteja bem definida temos
Demonstração. Primeiramente notemos que é suficiente demonstrarmos o teorema no caso de uma função com
valores em R. De fato, a diferenciabilidade de f = ( f1 , . . . , fm ) é equivalente à diferenciabilidade de cada compo-
nente.
Dados x0 ∈ A e ε > 0, consideremos o pontos x ∈ A tais que |x − x0 | < ε . Seja H = (h1 , . . . , hn ) ∈ Rn com
0 < |H| < ε . Consideremos então os seguintes pontos de Rn que são vértices de um paralelepípedo retângulo
centrado em x0 :
p 0 = x0 ,
p 1 = x0 + h 1 e1 ,
..
.
pn = x0 + h1 e1 + . . . + hnen = x0 + H.
Podemos escrever
n
f (x0 + H) − f (x0) = ∑ f (p j ) − f (p j−1) . (2.5)
j=1
Suponhamos h j 6= 0 e definamos φ (t) := f (p j−1 + te j ), t ∈ [−δ , h j + δ ], para algum δ > 0. Notemos ainda
que φ é diferenciável em t pelo Lema 2.3.1 (pois as derivadas parciais de f existem e são contínuas). Aplicando o
Teorema do Valor Médio à φ concluimos que
∂f
f (p j ) − f (p j−1) = φ (h j ) − φ (0) = φ ′ (c j )h j = (q j )h j , (2.6)
∂xj
para algum c j ∈ (0, h j ), onde q j = p j−1 + c j e j . Notemos que se h j = 0, então (2.6) vale automaticamente. Substi-
tuindo (2.6) em (2.5) obtemos
n
∂f
f (x0 + H) − f (x0) = ∑ (q j )h j . (2.7)
j=1 ∂ x j
Subtraindo h∇ f (x0 ), Hi em ambos os lados da igualdade (2.7) e dividindo por |H| chegamos na identidade
Fazendo H → 0, vemos que q j → x0 . Usando a continuidade das derivadas pariciais e a limitação do quociente
h j /|H| obtemos o resultado.
Uma função f : A ⊂ Rn → Rm cujas derivadas parciais existem e são contínuas em A é chamada de conti-
nuamente diferenciável ou de classe C1 em A, ou ainda f ∈ C1 (A, Rm ). No decorrer deste texto usaremos ainda a
notação
∂f
D j f (x) := .
∂xj
Suponha que f : A ⊂ Rn → Rm e que as derivadas pariciais das componentes de f , dadas por D j fi , existam.
Estas são, novamente, funções de A em R. Podemos então considerar as suas derivadas parciais
Dk (D j fi ) = Dk, j fi ,
que são as chamadas derivadas parciais de segunda ordem de fi . Similarmente definimos as derivadas de terceira
ordem, e assim por diante. Se as derivadas parciais de fi até ordem r existem e são contínuas para i = 1, . . . , m,
dizemos que f é de classe Cr e escrevemos f ∈ Cr (A, Rm ). Dizemos ainda que f é de classe C∞ se as derivadas
parciais de todas as ordens de todas as componentes de f existem. Notemos que C∞ (A, Rm ) = ∩r∈NCr (A, Rm ).
20 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
∂f f (x, y) − f (0, y)
(0, y) = lim = y lim g(x, y),
∂x x→0 x x→0
o que nos dá
∂2 f y limx→0 g(x, y)
(0, 0) = lim = lim lim g(x, y),
∂ y∂ x y→0 y y→0 x→0
∂2 f
(0, 0) = lim lim g(x, y).
∂ x∂ y x→0 y→0
Segue que
∂2 f ∂2 f
(0, 0) = 1, (0, 0) = −1.
∂ x∂ y ∂ y∂ x
O Teorema de Clairaut-Schwarz nos dá condições sob as quais temos a igualdade das derivadas parciais de
segunda ordem mistas Dk, j f e D j,k f .
Dk D j f (x0 ) = D j Dk f (x0 ).
Demonstração. Iniciamos com o caso n = 2. Queremos então demonstrar que D1 D2 f (x0 , y0 ) = D2 D1 f (x0 , y0 ),
(x0 , y0 ) ∈ A fixado. Seja δ > 0 tal que a δ –vizinhança de (x0 , y0 ) esteja contida em A e consideremos s ∈ R pequeno
de maneira que a expressão abaixo esteja bem definida:
1
Q(s) := ( f (x0 + s, y0 + s) − f (x0, y0 + s) − f (x0 + s, y0 ) + f (x0 , y0 )) .
s2
Q(s) é chamado de quociente de diferença de segunda ordem. Definamos
para cada x ∈ R de maneira que (x, y0 + s), (x, y0 ) ∈ A. Observe que o domínio de g é um aberto em R que contém
o intervalo fechado [x0 , x0 + s]. Além disso,
1
Q(s) = (g(x0 + s) − g(x0)).
s2
Aplicando o Teorema do Valor Médio à g vemos que existe ξ ∈ (x0 , x0 + s) tal que
1 1
Q(s) = g′ (ξ ) = ( f1 (ξ , y0 + s) − f1 (ξ , y0 )).
s s
para cada y ∈ R de maneira que (ξ , y) ∈ A. Novamente, o domínio de h é aberto e contém o intervalo [y0 , y0 + s].
Além disso,
h′ (y) = f12 (xi, s)
Q(s) = f12 (ξ , η )
Q(s) = f21 (ξ ∗ , η ∗ ).
Portanto, no limite
lim Q(s) = f12 (x0 , y0 ) = f21 (x0 , y0 ),
s→0
j−1 j+1
φ (x, y) = f (x10 , . . . , xi−1 i+1
0 , x, x0 , . . . , x0 , y, x0 , . . . , xn ),
j
que está bem definida em algum aberto de R2 contendo (x)i0 , x0 ). Aplicando a primeira parte da demonstração à φ
encontramos
fi j (x0 ) = φ12 (xi0 , x0j ) = φ21 (xi0 , x0j ) = f ji (x0 ).
Observe que o Teorema 2.4.2 implica que, se f é de classe C3 , então f123 = f132 = f112 e assim por diante.
Terceira aula ↓
22 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
Demonstração. Pela continuidade de g em y0 , podemos tomar ε > 0 tal que g está definida no conjunto Cε (y0 ).
Similarmente, escolhemos δ > 0 tal que f esteja definida em Cδ (x0 ) e ainda, f (x) ∈ Cε (y0 ), para qualquer x ∈
Cδ (x0 ). Segue que a composta g ◦ f está definida em Cδ (x0 ).
δ ε
x0 y0
c
f g
onde
|z|
E(H) := Dg(y0 )E f (H) + Eg (z), H 6= 0, E(0) = 0.
|H|
A demonstração estará completa se tivermos que
lim E(H) = 0.
H→0
Notemos que z → 0 quando H → 0. Logo, E f (H) → 0 e Eg (z) → 0 quando H → 0. Vamos então mostrar que o
|z|
quociente está limitado quando H → 0, o que finalizará a demontração. Segue de (2.8) que
|H|
|z| |D f (x0 ) · H + |H|E f (H)|
= ≤ |D f (x0 )| + |E f (H)| ≤ |D f (x0 )| + M, (2.10)
|H| |H|
2.6. O TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA 23
onde |E f (H)| ≤ M.
Corolário 2.5.3 Sejam A ⊂ Rn aberto, f : A → Rm com f (x0 ) = y0 . Suponha que g é uma função definida em uma
vizinhaça de y0 com imagem em Rn que ainda satisfaz g(y0 ) = x0 e
g( f (x)) = x
Dg(y0 ) · D f (x0 ) = In .
Como a inversa a direita de uma matriz é também inversa à esquerda (Teorema 2.5 de [10]), temos o resultado.
1. f é um homeomorfismo;
2. tanto f quanto f −1 são de classe Cr .
Exemplo 2.6.2 Fixados a, b ∈ Rn , a aplicação Ta,b : Rn → Rn dada por Ta,b (x) = x + (b − a) é um difeomorfismo
de classe C∞ .
Exemplo 2.6.3 Dada uma matriz An×n não singular (det A 6= 0), a função TA : Rn → Rn dada por TA (x) = Ax é um
difeomorfismo de classe C∞ .
O seguinte resultado reflete o fato da existência de um difeomorfismo ser uma relação de equivalência entre
os subconjuntos abertos de Rn .
Teorema 2.6.5 (Teorema da Função Inversa) Seja W um subconjunto aberto de Rn e considere f : W → Rn uma
função de classe Cr , r = 1, 2, . . . , ∞. Se x0 ∈ W e D f (x0 ) é não singular, então existe uma vizinhança aberta U
de x0 , U ⊂ W , tal que V = F(U) é aberto e F : U → V é um difeomorfismo de classe Cr . Além disso, se x ∈ U e
y = f (x), então temos a seguinte fórmula para a derivada de f −1 em y:
−1
D f −1 (y) = D f (x) .
Para demonstrarmos o Teorema 2.6.5 ainda necessitamos alguns fatos, já que utilizaremos o Teorema do
Ponto Fixo de Banach.
Definição 2.6.6 Seja (X, d) um espaço métrico. Dizemos que {xn }n∈N ⊂ X é uma sequência de Cauchy em X
se d(xi , x j ) → 0 quando i, j → ∞. O espaço X é chamado de completo se toda sequência de Cauchy em X é
convergente.
Teorema 2.6.7 (Teorema do Ponto Fixo de Banach) Seja (X, d) um espaço métrico completo e T : X → X uma
função. Suponhamos que exista uma constante 0 ≤ λ < 1 tal que, para quaisquer x, y ∈ X,
d(T (x), T (y)) ≤ λ d(x, y).
Então T possui um único ponto fixo em X.
Demonstração. Aplicando T repetidamente temos que d(T n (x), T n (y)) ≤ λ n d(x, y).
Afirmação: se escolhemos x0 ∈ X arbitrário e definimos xk := T k (x0 ), então existe uma constante L ≥ 0
independente de k, j tal que d(xk , xk+ j ) ≤ λ k K. De fato,
Observação 2.6.8 Suponha que X seja um espaço de Banach e que φ : X → X seja uma aplicação não linear.
Dado y ∈ X, consideremos a equação
y = φ (x).
Podeos reescreve-la na forma
x = g(x), com g(x) = x − φ (x) + y.
Dessa forma, a equação y = φ (x) é equivalente a encontrar um ponto fixo de g. Se g for uma contração, o Teorema
do Ponto Fixo de Banach nos garante a existência de um ponto fixo e a convergência exponencial da sequência
(xn ) definida por
x0 ∈ X, xn+1 = xn − φ (xn ) + y,
para o ponto fixo de g.
2.6. O TEOREMA DA FUNÇÃO INVERSA 25
Passo (ii): existe um número real r > 0 tal que D f é não singular na bola fechada B2r (0) ⊂ W e, para quaisquer
x1 , x2 ∈ Br (0), temos que
1
|g(x1 ) − g(x2)| ≤ |x1 − x2 | (2.11)
2
e
|x1 − x2 | ≤ 2| f (x1 ) − f (x2 )|. (2.12)
Para verificarmos esta afirmação tomamos inicialmente r1 > 0 tal que B2r1 (0) ⊂ W . Além disso, como
det(D f (x0 )) é uma função contínua de x ∈ W e não se anula em uma vizinhança de 0, selecionamos r2 > 0 tal que
det(D f (0)) não se anula em B2r2 (0). Finalmente, como kDg(0)k = 0, podemos tomar r3 > 0 tal que kDg(x)k ≤ 1/2
para x ∈ B2r3 (0). Consideremos r = min{r1 , r2 , r3 }. A desigualdade (2.11) segue do item 2 da Observação 2.2.2.
A desigualdade (2.12) por sua vez segue substituindo g(xi ) por xi − f (xi ), i = 1, 2. De fato:
1
|x1 − f (x1 ) − x2 + f (x2 )| ≤ |x1 − x2|
2
por (2.11), e Pela continuidade da norma,
Passo (iii): se |x| ≤ r, então |g(x)| ≤ r/2, isto é, g(Br (0)) ⊂ Br/2 (0). Além disso, para cada y ∈ Br/2 (0), existe
x ∈ Br (0) tal que f (x) = y.
A primeira parte da afirmação segue de (2.11) tomando-se x1 = x e x2 = 0. Já a segunda parte necessitará do
Teorema 2.6.7. Para cada y ∈ Br/2 (0) e cada x ∈ Br (0) temos que
r r
|y + g(x)| ≤ |y| + |g(x)| ≤ + = r.
2 2
Segue que a aplicação Ty : Br (0) → Br (0) dada por Ty (x) := y + g(x) está bem definida. Além disso satisfaz
1
|Ty (x1 ) − Ty (x2 )| = |g(x1 ) − g(x2)| ≤ |x1 − x2 |.
2
Assim, como Br (0) é um espaço métrico completo, Ty possui um único ponto fixo x e Ty (x) = x se, e somente se,
y = x − g(x) = x − (x − f (x)) = f (x). Como isto é válido para qualquer y ∈ Br/2 (0), vemos que f −1 fica definida
neste conjunto.
Segue da continuidade de f que U = f −1 (Br/2 (0)) é aberto em W . Seja V = Br/2 (0).
Como a existência de f −1 segue do passo (iii), falta mostrarmos sua continuidade. Sejam x1 , x2 ∈ U e
y1 = f (x1 ), y2 = f (x2 ). Segue de (2.12) que
| f −1 (y1 ) − f −1 (y2 )| ≤ 2|y1 − y2|,
e f −1 : V → U é contínua.
Para finalizarmos a demonstração do Teorema da Função Inversa temos que demonstrar o seguinte:
Quarta aula ↓
Corolário 2.6.9 Se D f é não singular em todo ponto de W , então f é uma aplicação aberta, isto é, aplica W e
subconjuntos abertos de Rn contidos em W em subconjuntos abertos de Rn .
t y
2π g
˜
∆
x
c s
A seguir daremos um exemplo que mostra que a não podemos retirar a hipótese de continidade das derivadas
no Teorema da Função Inversa.
2xS − C = −α
1 2
2− 2 S− C = 0,
x x
1 1
possui solução, onde S = sen e C = cos . Por outro lado, pela Regra de Cramer,
x x
−2x
S=α ,
1 + 2x2
1 − 2x2
C=α .
1 + 2x2
Segue que
1 + 4x4
1 = S2 + C2 = α 2 ,
(1 + 2x2)2
e tomando x pequeno o bastante vemos que o lado direito da igualdade acima é menor que 1, obtendo uma contra-
dição.
Então existe uma vizinhança B de x0 em Rk e uma única função g : B → Rn tal que g(x0 ) = y0 e
Demonstração. Vamos construir uma função F que satisfaz as hipóteses do Teorema da Função Inversa. Defini-
mos F : A → Rk+n por
F(x, y) = (x, f (x, y)).
Note que F é de classe Cr em A e
Ik 0
DF = ∂ f ∂ f .
∂x ∂y
Utilizando desenvolvimento por meio de cofatores para o cálculo de determinantes temos que
∂ f
det(DF) = det .
∂y
Comparando as coordenadas temos que f (x, h(x, 0)) = 0 sempre que x ∈ B. Definimos então g : B → Rn por
g(x) := h(x, 0). Segue que g é de classe Cr e satisfaz f (x, g(x)) = 0 para x ∈ B. Além disso,
Como g(x0 ) ∈ V, pela continuidade de g0 temos que, diminuindo B0 se nevessário, g0 (x) ∈ V para todo x ∈ B0 , o
qual também vamos assumir conexo. Vamos demonstrar que se g0 coincide com g em u ponto x̃ ∈ B0 , então g0
30 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
coincide com g em uma vizinhança menor B̃ de x̃. Mas como g0 (B̃) ⊂ V, temos que f (x, g0 (x)) = 0 em B̃, o que
implica em
F(x, g0 (x)) = (x, 0),
ou seja,
(x, g0 (x)) = G(x, 0) = (x, h(x, 0)) = (x, g(x)).
Assim, g0 e g coincidem em B̃.
Segue que o conjunto B1 := {x ∈ B | |g0 (x) − g(x)| = 0} é aberto em B e, por continuidade, também é aberto
o conjunto B2 := {x ∈ B | |g0 (x) − g(x)| > 0}. Mas B0 = B1 ∪ B2 com B1 6= 0/ e B1 ∩ B2 = 0./ Pela conexidade de
B0 segue que B2 = 0/ e o teorema está demonstrado.
Quinta aula ↓
Definição 2.8.1 Seja A ⊂ Rk+n um aberto. Uma aplicação diferenciável f : A → Rn é chamada de submersão se,
para qualquer x ∈ A, a derivada D f (x) : Rk+n → Rn é sobrejetora.
A submersão canônica é a projeção π : Rk+n → Rn dada por π (x, y) = y. De fato, do ponto de vista local,
toda submersão se comporta localmente como a projeção.
Teorema 2.8.2 (Forma Local das Submersões) Sejam A ⊂ Rk+n um aberto e f : A → Rn uma função de classe
Cr , r ≥ 1. Suponha que, no ponto z0 ∈ A, a derivada D f (z0 ) seja sobrejetora. Consideremos uma decomposição
em soma k+n e escrevemos z = (x , y ) com x ∈ N e y ∈ E. Escolhemos N e E de forma que
direta N ⊕ E = R 0 0 0 0 0
D f (z0 ) E seja um isomorfismo. Então, existem abertos V,W e Z tais que
x0 ∈ V, V ⊂ N,
z0 ∈ Z, Z ⊂ A,
f (z0 ) ∈ W, W ⊂ Rn ,
Demonstração. Como já observamos anteriormente, este resultado já está essencialmente contido no Teorema da
Função Implícita, e portanto devemos seguir as idéias da demonstração daquele teorema.
Lembremos que, dada uma transformação linear k+n → Rn sobrejetora, existe uma decomposição
T: R
R k+n = N ⊕ E, dim N = k e dim E = n, e tal que T E é um isomorfismo. De fato, {Te1 , . . . , Tek+n } geram Rn
e assim podemos tomar neste conjunto n vetores linearmente independentes.
Podemos supor ainda que N = Rk e E = Rn . De fato, basta usarmos difeomorfismos que permutam as
coordenadas.
Agora procedemos como na demonstração do Teorema 2.7.1. Definamos F : A → Rk × Rn por F(x, y) =
(x, f (x, y)). Então DF(x0 , y0 ) é não singular e, se f (x0 , y0 ) = c0 , podemos aplicar o Teorema da Função Inversa
para escolhermos uma vizinhança de (x0 , y0 ) que é aplicada difeomorficamente em uma vizinhança V × W de
(x0 , c0 ). Aí definimos
Z = F −1 (V × W ), F −1 : V × W → Z.
2.8. SUBMERSÕES E IMERSÕES LOCAIS 31
z0 f (z0 )
Z
W
h A
y0 W
V x0
Notemos que F −1 (x, f (x, y)) = (x, y), ou seja, F −1 fixa a primeira coordenada. Seja h := F −1 . Segue que h(x, y) =
(x, h1 (x, y)). Mas assim, se (x, y) ∈ V × W,
Agora vamos considerar uma função diferenciável para a qual a dimensão do domínio é menor que a dimen-
são da imagem. Do ponto de vista da diferenciabilidade, o melhor que podemos esperar neste caso é que a derivada
seja injetora.
Definição 2.8.3 Seja A ⊂ Rk um aberto. Uma aplicação diferenciável f : A → Rk+n é chamada de imersão se,
para qualquer x ∈ A, a derivada D f (x) : Rk → Rk+n é injetora.
A imersão canônica é a inclusão i : Rk → Rk+n dada por i(x) = (x, 0). De fato, do ponto de vista local, toda
imersão se comporta localmente como a inclusão.
Teorema 2.8.4 (Forma Local das Imersões) Sejam A ⊂ Rk um aberto e f : A → Rk+n uma função de classe Cr ,
r ≥ 1. Suponha que, no ponto x0 ∈ A, a derivada D f (x0 ) seja injetora. Então, existem abertos V,W e Z tais que
f (x0 ) ∈ Z, Z ⊂ Rk+n ,
x0 ∈ V, V ⊂ A ⊂ Rk ,
0 ∈ W, W ⊂ Rn ,
Demonstração. Seja E = D f (x0 )(Rk ) e tomemos P qualquer subespaço complementar de E, isto é, Rk+n = E ⊕ P.
Por injetividade e compondo com difeomorfismos que permutam a base, vamos supor que E = Rk e P = Rn . Isto
nos permite definir G : A × Rn → Rk+n por
já que permutamos a base de maneira que D f (x0 )(Rk ) = Rk . Segue que DG(x0 , 0) é não singular. Pelo Teorema
da Função Inversa, G é um difeomorfismo de classe Cr de uma vizinhança de (x0 , 0), a qual escolheremos da forma
V ×W ⊂ A × Rn , em uma vizinhança de f (x0 ). Definamos Z := G(V ×W ) e h := G−1 : Z → V ×W . Uma vez que
G(x, 0) = f (x), temos que
h ◦ f (x) = h(G(x, 0)) = G−1 (G(x, 0)) = (x, 0),
para qualquer x ∈ V , demonstrando o teorema.
Da Álgebra Linear sabemos que o posto de T : Rk → Rn é igual a ρ se, e somente se, a matriz que representa
T possui um determinante menor de ordem ρ × ρ não nulo e todo determinante menor de ordem (ρ + 1) × (ρ + 1)
é nulo.
Exemplo 2.9.3 Seja f : R2 → R2 dada por f (x, y) = (x − y, −2x + 2y). Então D f (x, y) possui posto constante e
igual a 1 em todo R2 . Seja g1 (x, y) = (x + y, y). Então
o que nos diz que, a menos dos difeomorfismos g1 e g2 , a aplicação f não depende da variável y.
Antes de enunciarmos o Teorema do Posto, deixe-nos fazer um comentário sobre notação que utilizaremos
no decorrer da sua demonstração. Dada uma função f : A ⊂ Rn → Rm diferenciável, sejam f1 , . . . , fm suas funções
componentes. A matriz Jacobiana D f é também denotada por
∂ ( f1 , . . . , fm )
Df = .
∂ (x1 , . . . , xn )
Teorema 2.9.4 (Teorema do Posto) Sejam A0 ⊂ Rn um aberto e f : A0 → Rm uma função de classe Cr . Suponha-
mos que o posto de f seja constante e igual a k em todo A0 . Se x0 ∈ A0 e y0 = f (x0 ), então existem conjuntos
2.9. O TEOREMA DO POSTO 33
Demonstração. Vamos supor por simplicidade que x0 = 0 ∈ Rn e y0 = 0 ∈ Rm . O caso geral segue ao consi-
derarmos f˜(u) = f (u + x0 ) − y0 . Além disso, compondo com difeomorfismos que permutam as bases, podemos
assumir que o determinante menor de ordem k × k em D f (x0 ) que não se anula é justamente aquele dado pelas
primeiras k colunas e k linhas. Assim, se denotarmos fˆ = ( f1 , . . . , fk ), então o determinates menor que não se anula
é justamente ∂f
1
∂ u1 . . . ∂∂ uf1
k
. ..
D fˆ =
.. . ,
∂ fk
∂u . . . ∂∂ ufk
1 k
onde f = ( fˆ, fk+1 , . . . , fm ) e omitimos o ponto x0 no qual a matriz acima está sendo avaliada.
Definamos g : A0 → Rn por
Por outro lado, como Dg−1 é não-singular em U1 e g−1 (U1 ) = A1 ⊂ A0 , temos que o posto de D( f ◦ g−1 ) =
D f · Dg−1 em U1 é constante e igual ao posto de D f em A0 , isto é, igual a k. Logo, o determinante menor da matriz
D( f ◦ g−1 ) formado pelas k + 1 primeiras linhas e k + 1 primeiras colunas deve ser nulo. Este fato implica que
∂ f k+1
necessariamente devemos ter = 0 em U1 . Raciocinando indutivamente vemos que f k+i , i = 1, . . . , m − k,
∂ xk+1
dependem somente das variáveis x1 , . . . , xk .
Vamos agora definir o difeomorfismo h. Seja H uma função definida em uma vizinhança V1 de 0 ∈ Rm e dada
pela expressão
H(y) := y1 , . . . , yk , yk+1 + f k+1 (y1 , . . . , yk ), . . . , ym + f m (y1 , . . . , yk ) .
Note que o domínio V1 deve ser escolhido pequeno o suficiente de maneira que, para y ∈ V1 , as funções f k+i
estejam definidas em y.
34 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
h ◦ f ◦ g−1(x) = h( f ◦ g−1(x))
= h x1 , . . . , xk , f k+1 (x), . . . , f m (x)
= h x1 , . . . , xk , f k+1 (x1 , . . . , xk ), . . . , f m (x1 , . . . , xk )
= H −1 x1 , . . . , xk , 0 + f k+1 (x1 , . . . , xk ), . . . , 0 + f m (x1 , . . . , xk )
= (x1 , . . . , xk , 0, . . . , 0),
finalizando a demonstração.
Sexta aula ↓
Lema 2.10.1 Seja f : A ⊂ Rn → R uma função de classe Ck no aberto A, sendo k um inteiro positivo. Se x0 ∈ A e
H é um vetor fixado, definimos φ (t) = f (x0 + tH) com t pequeno de forma que x0 + tH ∈ A. Então
φ ′ (t) = (hH, ∇i) f (x0 + tH)
e, mais geralmente,
φ (k) (t) = (hH, ∇i)k f (x0 + tH).
Aqui, (hH, ∇i)k significa a composição dos operadores diferenciais.
Demonstração. Para o caso k = 1 basta uma aplicação simples da Regra da Cadeia. De fato,
Continuamos a demonstração utilizando indução. Supondo o resultado válido para k = r −1 temos φ (r−1) (t) =
(hH, ∇i)r−1 f (x0 + tH), então pelo que acabmos de demonstrar
d φ (r−1)
(t) = hH, ∇i(hH, ∇i)r−1 f (x0 + tH),
dt
que é a fórmula geral.
2.10. FÓRMULA DE TAYLOR 35
Suponhamos que H = x − x0 ∈ A. Então o domínio de φ contém o intervalo [0, 1]. A Fórmula de Taylor para
funções de uma variável implica que existe um número τ ∈ (0, 1) tal que
1 ′′ 1 1
φ (1) = φ (0) + +φ ′ (0) + φ (0) + . . . + φ k−1 (0) + φ (k) (τ ). (2.13)
2! (k − 1)! k!
Lema 2.10.2 (Fórmula de Taylor) Seja f uma função definida em um aberto A ⊂ Rn possuindo derivadas par-
ciais contínuas até ordem k. Seja x0 ∈ A e H ∈ Rn um vetor de forma que x0 + tH ∈ A, para qualquer t ∈ (0, 1).
Então existe τ ∈ [0, 1] tal que
(hH, ∇i) f (x0 ) (hH, ∇i)k−1 f (x0 ) (hH, ∇i)k f (x0 + τ H)
f (x0 + H) = f (x0 ) + + ...+ + .
1! (k − 1)! k!
Demonstração. Basta usar que φ (1) = f (x) e φ (0) = f (x0 ) e aplicar a fórmula (2.13).
i) x0 é um mínimo local se existe uma vizinhança B de x0 tal que f (x0 ) ≤ f (x) para todo x ∈ B;
ii) x0 é um mínimo local estrito se existe uma vizinhança B de x0 tal que f (x0 ) < f (x) para todo x ∈ B \ {x0};
iii) x0 é um mínimo absoluto se f (x0 ) ≤ f (x) para todo x ∈ A;
iv) x0 é um mínimo absoluto estrito se f (x0 ) < f (x) para todo x ∈ A \ {x0}.
As noções de máximo absoluto e máximo relativo são definidos similarmente trocando-se as desigualdades. Um
máximo ou mínimo é chamado de extremo.
Definição 2.11.2 Seja f : A ⊂ Rn → R uma função que possui derivadas parciais no aberto A. Um ponto x0 ∈ A
é chamado de ponto crítico de f se ∇ f (x0 ) = 0.
Se a função f for diferenciável, podemos nos restringir aos pontos críticos de f para encontramos os pontos
de máximo ou de mínimo relativos.
Demonstração. Seja H ∈ Rn um vetor fixado e definamos φ (t) = f (x0 +tH), onde t ∈ (−δ , δ ), para algum δ > 0.
Então φ possui um extremo local em t = 0 e, portanto, φ ′ (0) = 0. Como φ ′ (t) = h∇ f (x0 + tH), Hi, temos que
h∇ f (x0 ), Hi = 0 para todo H ∈ Rn . Isto implica que ∇ f (x0 ) = 0.
Suponhamos agora que x ∈ A não seja um ponto crítico. A derivada direcional de f em x na direção de v
satisfaz
h∇ f (x), vi ≤ k∇ f (x)kkvk
pela Desigualdaade de Cauchy. Além disso, a igualdade é válida somente quando v = v(x), onde
∇ f (x)
v(x) = .
k∇ f (x)k
Segue que o valor máximo da derivada direcional de f em x é atingido quando a direção v é a direção do vetor
gradiente de f em x. De fato,
1
h∇ f (x), v(x)i = h∇ f (x), ∇ f (x)i = k∇ f (x)k.
k∇ f (x)k
O polinômio quadrático Qx é chamado de forma quadrática correspondente à matriz n×n simétrica (pelo Teorema
de Clairaut-Schwarz) definida pelas derivadas de segunda ordem de f em x, isto é, ( fi j (x)).
Vamos escrever Qx ≥ 0 se Qx (H) ≥ 0 para todo H ∈ Rn e Qx > 0 se Qx (H) > 0 para todo H ∈ Rn \ {0}.
Similar notação para Qx ≤ 0 e Qx < 0.
i) Qx é positiva semidefinida se Qx ≥ 0;
ii) Qx é positiva definida se Qx > 0;
iii) Qx é negativa semidefinida se Qx ≤ 0;
iv) Qx é negativa definida se Qx < 0;
v) Qx é indefinida se Qx não possui sinal.
Fixemos um ponto x0 ∈ A e seja U ⊂ A uma vizinhança convexa de x0 suficientemente pequena. Para cada
x ∈ U seja H = x − x0 e consideremos os segmentos da forma x0 + sH, com s ∈ [0, 1]. Aplicando a fórmula de
Taylor para f em x0 com k = 2 obtemos facilmente que
1
f (x) = f (x0 ) + h∇ f (x), Hi + Qx0 +sH (H).
2
Se x0 é um ponto crítico obtemos
1
f (x) = f (x0 ) + Qx0 +sH (H). (2.14)
2
Segue que se f possui um mínimo local em x0 então Qx0 +sH é positiva semidefinida para todo x ∈ U. Vamos agora
melhorar este resultado. Necessitaremos de um lema técnico (veja o Exercício 10).
onde (ci j ) é uma matriz n × n. Se g(H) > 0 para todo H ∈ Rn \ {0}, então existe m > 0 tal que
Portanto,
n
G(H) = ∑ (Ci j − ci j )Hi H j + g(H)
i, j=1
Teorema 2.11.6 Seja f : A ⊂ Rn → R uma função de classe C2 no aberto A e x0 ∈ A um ponto crítico de f . Então:
i) se x0 é um mínimo local então Qx0 é positiva semidefinida;
ii) se Qx0 é positiva definida então x0 é um mínimo local estrito;
iii) se x0 é um máximo local então Qx0 é negativa semidefinida;
iv) se Qx0 é negativa definida então x0 é um máximo local estrito;
Demonstração. Suponhamos que f possua um mínimo local em x0 . Então existe uma vizinhança U de x0 tal que
f (x) ≥ f (x0 ) para todo x ∈ U.
Como ∇ f (x0 ) = 0, temos pela expressão que Qx0 +sh ≥ 0 para todo x ∈ U (se necessário, podemos diminuir U).
Como f é de lasse C2 , a aplicação x 7→ Qx (H) é contínua em A para H fixado. Suponhamos então que Qx0 (H0 ) < 0
para algum H0 ∈ Rn . Então existe uma vizinhança U1 ⊂ U de x0 tal que Qy (H0 ) < 0 para qualquer y ∈ U1 . Seja
x = x0 + s0 H0 para s0 pequeno de maneira que x ∈ U1 . Mas também podemos escrever x = x0 + H, para algum
outro H, que é justmente h = s0 h0 . Assim,
Qx0 +sH (H) = Qx0 +sH (s0 H0 ) = s20 Qx0 +sH (H0 ) < 0,
o que é uma contradição. Isso demonstra i).
Suponhamos agora que Qx0 seja positiva definida. Pelo Lema 2.11.5 e pal continuidade das segundas deri-
vadas de f obtemos que Qy também será positiva definida em uma vizinhança U de x0 . Tomando y = x0 + sH e
usando (2.14) chegamos que f (y) > f (x0 ). Isso demonstra que f possui um mínio local estrito em x0 , ou seja, vale
ii).
Os itens iii) e iv) seguem do que já foi demonstrado considerando a função − f .
O Teorema 2.11.6 nos fornece o Teste da Derivada Segunda utilizado frequentemente nas disciplinas de
Cálculo.
Definição 2.11.7 Para x ∈ A, a matriz ( fi j (x)) é chamada de Hessiana da função f em x e seu determinante é
chamado de determinante Hessiano. Um ponto crítico x0 de f é dito não degenerado se det( fi j (x0 )) 6= 0.
Vamos agora nos restringir ao caso de R2 e verificar que o comportamento de f próximo de um ponto crítico
não degerenerado (x0 , y0 ) é determinado pela forma quadrática Q(x0 ,y0 ) . Neste caso temos
Q(x0 ,y0 ) (h, k) = f11 (x0 , y0 )h2 + 2 f12 (x0 , y0 )hk + f22 (x0 , y0 )k2 . (2.15)
Para facilidade, vamos omitir o ponto (x0 , y0 ) na notação de fi j . Notemos que, sendo (x0 , y0 ) não degenerado,
2 6= 0.
necessariamente f11 f22 − f12
Suponhamos que f11 f22 − f12 2 > 0. Então temos
2 2
f11 Q(x0 ,y0 ) (h, k) = f11 h + 2 f12 f11 hk + f22 f11 k2
= ( f11 h + f12k)2 − f12
2 2
k + f22 f11 k2
= ( f11 h + f12k)2 + k2 ( f22 f11 − f12
2
).
Concluímos que:
1) se f11 (x0 , y0 ) > 0, então Q(x0 ,y0 ) (h, k) > 0 para (h, k) 6= (0, 0) em uma vizzinhaça de (0, 0) e f possui máximo
local em (x0 , y0 );
2) se f11 (x0 , y0 ) < 0, então Q(x0 ,y0 ) (h, k) < 0 para (h, k) 6= (0, 0) em uma vizinhaça de (0, 0) e f possui mínimo
local em (x0 , y0 ).
Supondo agora que f11 f22 − f122 < 0, vemos que a forma quadrática (2.15) representa localmente um hiper-
bolóide centrado na origem. Assim, Q(x0 ,y0 ) não possui sinal definido em uma vizinhança de (0, 0). Na verdade,
o plano (h, k) é dividido em 4 partes: duas onde Q(x0 ,y0 ) < 0 e duas onde Q(x0 ,y0 ) < 0. Neste caso dizemos que
(x0 , y0 ) é um ponto de sela para a função f .
2.12. NOTAS SOBRE AS REFERÊNCIAS 39
Exercício 22 Seja f : Rn → R uma função homogênea de grau 1 no seguinte sentido: f (tx) = t f (x), para todo
x ∈ Rn e qualquer t ∈ R.
Exercício 23 (Teorema de Euler) Seja f : Rn → R e p um número real dado. Dizemos que f é homogênea de
grau p se f (tx) = t p f (x), para todo x 6= 0 e qualquer t > 0.
Suponha que f seja diferenciável em Rn \ {0}. Mostre que f é homogênea de grau p se, e somente se,
h∇ f (x), xi = D f (x) · x = p f (x)
Sugestão para a parte “⇐": defina φ (t) := f (tx) e, fixado x, mostre que φ (t)t −p é constante.
Suponha ainda que Q(x) > 0 para x 6= 0. Considere f (x) = (Q(x)) p/2 , p > 0. Calcule ∇ f (x) e verifique se f é
homogênea.
40 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
Exercício 25 Seja u = x3 f (y/x, z/x), onde f : R2 → R é uma função diferenciável, (x, y, z) ∈ R3 . Mostre que
∂u ∂u ∂u
x +y +z = 3u.
∂x ∂y ∂z
Exercício 26 Seja f : Rn → R uma função de classe C1 e suponha que, para algum L > 0,
|D j f (x)| ≤ L, para todo x ∈ Rn .
para j = 1, . . . , n,
√
Demonstre que f é Lipschitz contínua com constante de Lipschitz igual a nL.
Exercício 27 Seja g : Rn \ {0} → R uma função de classe C1 e suponha que, para algum L > 0,
|D j g(x)| ≤ L, para j = 1, . . . , n, para todo x ∈ Rn \ {0}.
a) Demonstre que se n ≥ 2, então g pode ser estendida como sendo uma função contínua em todo Rn .
b) Demonstre que o item a) é falso se n = 1 dando um contra-exemplo.
Exercício 28 Mostre que a função f : R2 → R dada por f (x, y) = |xy| é diferenciável em (0, 0) mas não é de
classe C1 em qualquer vizinhança de (0, 0).
∂f
onde fxi = . Prove que f é de classe C1 em todo Ω com
∂ xi
Li = fxi (x0 ).
Exercício 34 Seja Ω ⊂ R2 um subconjunto aberto que possui a seguinte propriedade: para cada y ∈ R o conjunto
{x ∈ R | (x, y) ∈ Ω} é um intervalo. Demonstre que, se D1 f (x, y) = 0 para todo (x, y) ∈ Ω, então f é independente
de x.
Exercício 35 Seja g : A ⊂ Rn → Rn uma aplicação diferenciável. Dizemos que g é conforme se existe uma função
real µ : A ⊂ Rn → R, µ (x) > 0 para todo x ∈ A, tal que µ (x)Dg(x) é uma rotação de Rn para todo x ∈ A.
a) Demonstre que g é conforme se, e somente se, para todo x ∈ A, temos que: det Dg(x) > 0, as linhas da matriz
Jacobiana de g são duas a duas ortogonais e a norma (euclidiana) de cada linha é igual a 1/µ (x).
Sugestão: uma transformação L : Rn → Rn é ortogonal se, e somente se, os vetores coluna da matriz de L
formam uma base ortonormal de Rn .
b) Demonstre que, se g é conforme, então µ (x) = (det Dg(x))−1/n .
c) Seja n = 2 e g = (g1 , g2 ). Mostre que g é conforme se, e somente se, det Dg(x) > 0 e
g11 (x) = g22 (x), g12 (x) = −g21 (x),
para todo x ∈ A.
a) Demonstre que det Dg(s,t) 6= 0 para todo (s,t) ∈ R2 mas g não é injetora.
b) Seja Ω = {(s,t) ∈ R2 | 0 < t < 2π }. Demonstre que a restrição de g à Ω é injetora e encontre sua inversa.
c) Encontre g(R2 ).
d) Demonstre que g é conforme.
Exercício 37 (Nikaidô) Seja Ω ⊂ Rn um aberto convexo e g : Ω → Rn uma aplicação diferenciável tal que
n
∑ gij (x)hi h j > 0, para todo x ∈ Ω e qualquer h ∈ Rn , h 6= 0.
i, j=1
Exercício 38 Seja f : A ⊂ Rn → Rn uma aplicação de classe C1 ccom detD f (x) 6= 0 para todo x ∈ A. Dado
y 6∈ f (A), seja ψ (x) = ky − f (x)k2. Demonstre que ∇ψ (x) 6= 0 para todo x ∈ A.
Exercício 40 Sejam B(x, y) ⊂ R2 uma bola aberta e f : B(x, y) → R uma função diferenciável. Demonstre que
∂f ∂f
f (x1 , y1 ) − f (x, y) = (x1 − x) (x, y1 ) + (x1 − y) (x, y),
∂x ∂y
onde x ∈ L(x, x1 ) e y ∈ L(y, y1 ).
Sugestão: considere a função
g(t) = f (tx1 + (1 − t)x, y1) + f (x,ty1 + (1 − t)y).
42 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
Exercício 41 Seja L : Rn → Rn uma transformação linear e consideremos a equção y = Lx e g(x) = (Id − L)x + y.
Demonstre que g é uma contração se, e somente se, kId − Lk < 1. Além disso, demonstre que a solução de y = Lx
é dada por
∞
x= ∑ (Id − L)k y.
k=0
Exercício 42 (Método de Newton) Seja Br (x0 ) a bola de centro x0 ∈ Rn . Suponhamos que f : Br (x0 ) → Rn seja
de classe C2 e que kD f (x)k ≤ C para todo x ∈ Br (x0 ) com C ≥ 1. Suponhamos ainda que D f (x) seja inversível
para qualquer x ∈ Br (x0 ) e que kD f (x)k ≤ C em toda a bola Br (x0 ). Demonstre que existe δ > 0, δ = δ (r,C), tal
que, se k f (x0 )k ≤ δ , então a sequência definida por
está inteiramente contida em Br (x0 ) e converge para um elemento x tal que f (x) = 0.
Sugestão: demonstre indutivaente que
Exercício 44 Seja f : Rn → Rn dada por f (x) = kxk2 · x. Mostre que f é de classe C∞ e aplica B1 (0) em si mesma
bijetivamente. Entretanto, mostre que a inversa de f em B1 (0) não é diferenciável em 0.
Exercício 45 Seja f : R2 → R2 dada por f (x, y) = (ex cos y, ex sen y). Mostre que f é localmente inversível em
todo ponto de R2 mas não possui uma inversa definida globalmente.
Mostre que f é diferenciável mas não é inversível em uma vizinhança de 0. Qual hipótese do Teorema da Função
Inversa não se verifica?
Demonstre que g é contínua e diferenciável em todo ponto mas g′ não é contínua em x = 0 e g′ (0) 6= 0. Deonstre
ainda que g não é inversível em qualquer vizinhança de 0.
2.13. EXERCÍCIOS DO CAPÍTULO 43
(i) Mostre que existe ε > 0 tal que Φ(x0 , y) < 0 se y0 − ε ≤ y < y0 e Φ(x0 , y) > 0 se y0 < y ≤ y0 + ε .
(ii) Mostre que existe δ > 0 tal que Φ(x, y0 − ε ) < 0 e Φ(x, y0 + ε ) > 0 se |x − x0 | < δ .
(iii) Seja I := {(x, y) | |x − x0 | < δ , |y − y0 | < ε }. Escolha δ e ε de forma que Φy (x, y) > 0 para todo (x, y) ∈ I.
Mostre que se |x1 −x0 | < δ , então a equação Φ(x1 , y) = 0 possui exatamente uma solução y1 com (x1 , y1 ) ∈ I.
Seja y1 = φ (x1 ), o que define uma função de (x0 − δ , x0 + δ ) em R.
(iv) Mostre que φ é diferenciável e que
Φx (x, φ (x))
φ ′ (x) = − .
Φy (x, φ (x))
Exercício 53 Seja f : (a, b) → R uma função de classe Cr , para algum inteiro r ≥ 1. Suponha que para algum
ponto c ∈ (a, b) temos que
f ′ (c) = . . . = f (n−1) (c) = 0, mas f n (c) 6= 0.
Mostre que, se n for par, então f possui máximo local em c se f n (c) < 0 e mínimo local em c se f n (c) > 0. Se n
for ímpar, c não é ponto de mínimo nem de máximo local de f .
44 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
Exercício 55 Seja f : R2 → R com derivadas parciais até ordem 2 contínuas. Suponha ainda que f (0, 0) =
fx (0, 0) = fy (0, 0) = 0. Mostre que existem funções contínuas h1 , h2 e h3 tais que
Exercício 56 Mostre que se f : R2 → R é de classe C∞ , então existem funções de classe C∞ f11 , f12 , f22 : R2 → R
tais que
f (x, y) = f (0, 0) + fx (0, 0)x + fy (0, 0)y + x2 f11 (x, y) + xy f12 (x, y) + y2 f22 (x, y).
Exercício 58 Encontre um polinômio quadrático que aproxiama função f : R2 → R dada por f (x, y) = sen x sen y
próximo de (0, 0). Qual o valor do erro cometido nessa aproximção se |x| ≤ 0.1 e |y| ≤ 0.1?
(i) Mostre por indução que, para x > 0 e k ≥ 0 inteiro, a k-ésma derivada de f é da forma p2k (1/x)e−1/x para
algum polinômio p2k (y) de grau 2k em y.
(ii) Mostre que f é de classe C∞ e que f (k) (0) = 0 para todo inteiro k ≥ 0.
Exercício 60 Seja f : Rn → R definida por f (x) = φ (hv, xi), onde φ é uma função de classe C2 . Encontre todos
os pontos cíticos de f e classifique-os. Ilustre o resultado no caso em que n = 2 e f (x, y) = (x − y)2 .
Exercício 61 Seja x0 um ponto crítico não degenerado de uma função f de classe C2 . Demonstre que x0 é um
ponto crítico isolado, isto é, existe uma vizinhança U de x0 que não contém outros pontos críticos de f .
Sugestão: seja x um outro ponto crítico de f em uma vizinhança U de x0 ; aplique o Teorema do Valor Médio
para obter
n
0= ∑ fi j (yi )(x j − x0 j ), i = 1, . . . , n,
j=1
onde yi ∈ U para cada i; demonstre que se U é suficientemente pequeno, então det( fi j (yi )) 6= 0 e consequentemente
o sistema de equações acima possui como única solução o ponto x − x0 = 0.
2.13. EXERCÍCIOS DO CAPÍTULO 45
x4 y4
f (x, y) = + − 4xy2 + 2x2 + 2y2 + 3.
3 2
Com o auxílio de algum programa, plote o gráfico e as curvas de nível de f para vários valores, isto é, curvas da
forma
f (x, y) = c, c constante.
Sugestão de valores: c = 75, 30, 10, 3.74, 3.2, −1, −3, etc.
46 CAPÍTULO 2. DIFERENCIABILIDADE
Capítulo 3
Neste capítulo introduziremos o conceito de variedades diferenciáveis em Rn , que são objetos geométricos abstra-
tos que generalizam as superfícies em espaços Euclidianos. Mais especificamente, as variedades são objetos que
podem, via parametrizações locais que se sobrepõem de maneira compatível, serem deformadas em abertos de Rn .
Em várias áreas da Matemática essa abstração é importante, uma vez que muitos conjuntos com um certa estrutura
suave que surgem em problemas físicos, por exemplo, não são apresentados inicialmente como subconjutos de Rn .
Apesar de não adotarmos este tratamento mais geral, definindo as variedades como objetos topológicos abstratos,
a maneira concreta que apresentaremos as definições naturalmente levará a uma generalização para objetos que
não necessariamente “vivem” em espaços Euclidianos.
Sétima aula ↓
Definição 3.1.1 Fixemos inteiros 0 < n ≤ m. Um subconjunto M ⊂ Rm é uma variedade topológica de dimensão
n se todo ponto de M possui, na métrica relativa de Rm , uma vizinhança homeomorfa a um subconjunto aberto de
Rn .
Dada uma variedade topológica M e q um ponto de M, consideremos o par (U, ϕ ), onde U é um aberto
de M contendo q e ϕ é um homeomorfismo de U em um subconjunto aberto de Rn . Tal par é chamado de
vizinhança coordenada de q. Notemos que ϕ (q) = (x1 (q), . . . , xn (q)) ∈ Rn , onde cada xi , i = 1, . . . , n, é uma
função coordenada. É possível que q pertença a uma outra vizinhança coordenada (V, ψ ) e neste caso ψ (q) =
(y1 (q), . . . , yn (q)). Em particular, isto ocorrerá sempre que (U, ϕ ) e (V, ψ ) forem vizinhanças coordenadas com
U ∩V 6= 0. / Como ϕ e ψ são homeomorfismos, este caso nos dá um homeomorfismo
ψ ◦ ϕ −1 : ϕ (U ∩V ) → ψ (U ∩V ),
ou seja, sempre que duas vizinhanças coordenadas se sobrepõem podemos passar de uma coordenada para outra
de uma maneira homeomorfa. Esta passagem de uma coordenada para outra é chamada de mudança de coordena-
das. O caso em que estas mudanças de coordenadas são funções diferenciávis nos leva à definição de variedades
diferenciáveis.
Definição 3.1.2 Dizemos que (U, ϕ ) e (V, ψ ) são C∞ -compatíveis se ψ ◦ ϕ −1 e ϕ ◦ ψ −1 são difeomorfismos dos
conjuntos abertos ϕ (U ∩V ) e ψ (U ∩V ), sempre que U ∩V 6= 0/ (veja a Figura 3.1).
47
48 CAPÍTULO 3. NOÇÕES DE VARIEDADES DIFERENCIÁVEIS EM RN E SUBVARIEDADES
U q
M
ψ
ϕ
ϕ(q) ψ(V )
ψ ◦ ϕ−1 ψ(q)
ϕ(U )
Definição 3.1.3 Uma estrutura diferenciável C∞ em uma variedade topológica M é uma família U = {(Uα , ϕα )}
de vizinhanças coordenadas tais que
S
i) Uα = M;
ii) para quaisquer α , β , (Uα , ϕα ) e (Uβ , ϕβ ) são C∞ -compatíveis;
iii) qualquer vizinhança coordenada (V, ψ ) que é C∞ -compatível como todo (Uα , ϕα ) ∈ U pertence a U .
Uma variedadade topológica com uma estrutura diferenciável C∞ é chamada de variedade diferenciável.
Na prática, para verificarmos que uma variedade topológica é uma variedade diferenciável não é necessário
demonstrar a maximalidade da família de vizinhanças coordenadas como no item iii) da Definição 3.1.3. De fato, o
próximo resultado não será demonstrado no curso mas usaremos quando for necessário. Ele expressa o fato de que
a relação de compatibilidade entre vizinhanças coordenadas é uma relação de equivalência. Consequentemente,
toda estrutura diferenciável está contida em uma estrutura diferenciável maximal.
Proposição 3.1.4 Seja M uma variedade topológica. Se {(Uα , ϕα )} é uma cobertura de M por vizinhanças coor-
denadas C∞ -compatíveis, então existe uma única estrutura diferenciável C∞ sobre M que contém esta família.
Exemplo 3.1.5 O espaço Rn é uma variedade diferenciável com uma única vizinhança coordenada (Rn , In ), onde
In é a identidade.
Exemplo 3.1.6 Qualquer subconjunto aberto V de uma variedade diferenciável M é também uma variedade di-
ferenciável (de ∞
mesma dimensão). De fato, se {(U α , ϕα )} é uma estrutura diferenciável C para M, então
∞
{(Uα ∩V, ϕα Uα ∩V )} é uma estrutura diferenciável C para V .
com a métrica induzida por R3 . Isto siginifica que se U é um aberto de S2 , então U = Ũ ∩ S2 , onde Ũ é um aberto
de R3 . Para i = 1, 2, 3, definimos
Cada uma dessas aplicações é um homeomorfismo sobre o disco aberto de raio 1 em R2 . Segue que S2 é uma
variedade topológica de dimensão 2. Além disso, {(Ui± , ϕi± ), i = 1, 2, 3} é uma estrutura diferenciável C∞ . Por
exemplo,
q
ϕ3+ (x1 , x2 , x3 ) = (x1 , x2 ), (ϕ3+ )−1 (x1 , x2 ) = x1 , x2 , 1 − x21 − x21 ,
o que nos dá
q
ϕ1+ ◦ (ϕ3+ )−1 (x1 , x2 ) 2 2
= x2 , 1 − x1 − x1 .
Segue que ϕ1+ ◦ (ϕ3+ )−1 é de classe C∞ . Similarmente, ϕ3+ ◦ (ϕ1+ )−1 é de classe C∞ . Repitindo este processo para
cada par (Ui± , ϕi± ) vemos que estes formam uma estrtura diferenciável C∞ e S2 é uma variedade diferenciável de
dimensão 2.
R
f
M
q
f ◦ ϕ−1
ϕ
Figura 3.2: f : M → R.
Note que a definição de diferenciabilidade independe da vizinhança coordenada que escolhemos. De fato, se
(U, ϕ ) e (V, ψ ) são vizinhanças coordenadas de um ponto q ∈ M e f : W ⊂ M → R, então
f ◦ ψ −1 = ( f ◦ ϕ −1 ) ◦ (ϕ ◦ ψ −1 ).
50 CAPÍTULO 3. NOÇÕES DE VARIEDADES DIFERENCIÁVEIS EM RN E SUBVARIEDADES
Definição 3.2.2 Suponha que M e N sejam variedades diferenciáveis e que W ⊂ M é aberto. Seja F : W → N uma
aplicação. Dizemos que F é de classe Cr em W se, para todo q ∈ W , existem vizinhanças coordenadas (U, ϕ ) de
q em M e (V, ψ ) de F(q) em N, com U ⊂ W e F(U) ⊂ V , tal que
ψ ◦ F ◦ ϕ −1 : ϕ (U) → ψ (V )
é de classe Cr . F é de classe C∞ se é de classe Cr para qualquer inteiro positivo r.
Como no caso de funções de M em R, a definição de diferenciabilidade para aplicações entre variedades não
depende de uma particular escolha de vizinhança coordenada.
Esta definição estende o conceito de difeomorfismo previamente definido para funções de subconjuntos de
Rn .
Na Definição 3.3.1 precisamos mostrar que o posto é independente da escolha das vizinhanças coordenadas.
Este fato não será demonstrado, ficando como um exercício.
O Teorema 2.9.4 (Teorema do Posto) pode ser reformulado no caso de variedades da forma abaixo.
Teorema 3.3.2 Sejam M e N variedades diferenciáveis com dim M = m e dim N = n. Suponha que F : N → M
seja de classe C∞ e que o posto de F seja constante e igual a k em todo ponto de N. Se q ∈ N, existem vizinhanças
coordenadas (U, ϕ ) e (V, ψ ) de q e de F(q) respectivamente tal que ϕ (q) = 0 ∈ Rn e ψ (F(q)) = 0 ∈ Rm e
ψ ◦ F ◦ ϕ −1(x) = (x1 , . . . , xk , 0, . . . , 0), x = (x1 , . . . , xn ) ∈ Rn .
Além disso, podemos assumir que ϕ (U) = Cεn (0) ⊂ Rn e ψ (V ) = Cεm (0) ∈⊂ Rm , onde Cεk (0) é o cubo de centro 0
e raio ε > 0 em Rk .
Note que, pelo Teorema 3.3.2, uma condição necessária para que F : N → M seja um difeomorsfismo é que
dim M = dim N = posto de F.
Definição 3.3.3 Uma aplicação F : N → M de classe C∞ é chamada de imersão se posto de F = dim N em todo
ponto de N. F é chamada submersão se posto de F = dim M em todo ponto de N.
Suponha que F : N → M seja uma imersão injetora e seja Ñ := F(N). Então, se (U, ϕ ) é uma estrutura
diferenciável de classe C∞ em N, teremos que (Ũ, ϕ̃ ) será uma estrutura diferenciável de classe C∞ em Ñ, onde
Ũ := F(U) e ϕ̃ := ϕ ◦ F̃ −1 , sendo F̃ : N → Ñ com F̃(q) = F(q) (justifique!). Além disso, F̃ : N → Ñ será um
difeomorfismo.
Observação 3.3.5 Em geral, a topologia e a estrutura C∞ de uma subvariedade imersa Ñ dependem somente de
F e de N, isto é, Ñ não é necessariamente um subespaço de M. Isto ficará mais claro nos exemplos.
3.3. POSTO DE UMA APLICAÇÃO, IMERSÕES E MERGULHOS 51
Exemplo 3.3.7 Seja F : R → R2 dada por F(t) = (cos 2π t, sen 2π t). Então F é uma imersão e F(R) é o círculo
S1 = {(x, y) ∈ R2 | x2 + y2 = 1}. Esta imersão não é injetiva.
cos 2π t sen 2π t
Exemplo 3.3.8 Seja F : (1, ∞) → R2 dada por F(t) = , . Então kF(t)k2 = 1/t 2 , para t > 1. A
t t
imagem da imersão F será a curva espiral em torno de (0, 0).
(1 + t) cos2π t (1 + t) sen 2π t
Exemplo 3.3.9 Seja F : (1, ∞) → R2 dada por F(t) = , . Então a imagem de F
2t 2t
será novamente uma curva espiral, porém agora em torno do círculo de centro (0, 0) e raio 1/2.
Exemplo 3.3.10 Seja F : R → R2 dada por F(t) = 2 cos(t − π /2), sen2(t − π /2) . Então, quando t varia de 0
até 2π , a imagem de F faz um circuito completo na figura oito, iniciando na origem como mostram as as setas na
Figura 3.3.11. Notemos ainda que F é ma imersão não injetiva.
Exemplo 3.3.11 Construiremos agora uma função cuja imagem é novamente a figura oito, porém com uma im-
portante diferença: quando t varia no domínio dessa função, passaremos pela origem apenas uma vez (quando
t = 1/2). Seja g : R → R uma função monótona crescente e de classe C∞ tal que g(0) = π e
Este exemplo mostra que, mesmo que tenhamos que uma imersão F : N → M seja injetiva, ela não é neces-
sariamente um homeomorfismo de N em F(N) quando sua imagem é vista como subespaço de M.
(0, 1)
(0, −1)
Os exemplos que apresentamos nos levam a considerar uma definição mais restritiva.
Definição 3.3.13 Um mergulho é uma imersão F : N → M que é um homeomorfismo de N sobre sua imagem
F(N) = Ñ ⊂ M, quando consideramos Ñ como subespaço de M. Neste caso dizemos que Ñ é uma subvariedade
mergulhada.
3.4. SUBVARIEDADES 53
Oitava aula ↓
O próximo resultado nos diz que a diferença entre uma subvariedade imersa e uma subvarieadade mergulhada
é essencialmente global isto é, a diferença não depende da natureza local da aplicação F.
Teorema 3.3.14 Seja F : N → M uma imersão. Então cada ponto q ∈ N possui uma vizinhança U tal que F U é
um mergulho de U em M.
Demonstração. De acordo com o Teorema 3.3.2, podemos escolher vizinhanças coordenadas (U, ϕ ) de q ∈ N e
(V, ψ ) de F(q) ∈ M tais que ϕ (U) = Cεn (0) ⊂ Rn , ψ (V ) = Cεm (0) ⊂ Rm , ϕ (q) = 0 e ψ (F(q)) = 0. Ademais,
ψ ◦ F ◦ ϕ −1(x1 , . . . , xn ) = (x1 , . . . , xn , 0, . . . , 0).
Note que ψ ◦ F ◦ ϕ −1 é um homeomorfismo de Cεn (0) ⊂ Rn sobre sua imagem contida em Cεm (0) ⊂ Rm . Além
disso, ϕ e ψ são obviamente homeomorfismos. Por outro lado, como F(U) ⊂ V e V é um subconjunto aberto de
M, a topologia de F(U) é dada pela topologia de V e, consequentemente de M. Como homeomorfismo fornece
uma relação de equivalência temos que F é um homeomorfismo de U em F(U) com a topologia relativa.
3.4 Subvariedades
Nesta seção vamos discutir com mais detalhes o conceito de subvariedade. Até agora vimos a definição mais
geral que é a de subvariedade imersa e então o de subvariedade mergulhada. Desenvolveremos agora a noção de
subvariedade regular, que é um caso particular das demais porém mais natural, já que nesse caso a topologia e a
estrutura diferenciável são derivadas diretamente da variedade da qual ela é um subconjunto.
Definição 3.4.1 Seja M uma variedade diferenciável de dimensão m e n um inteiro com 0 ≤ n ≤ m. Um subcon-
junto N ⊂ M possui a propriedade de n-subvariedade se cada q ∈ N possui uma vizinhança coordenada (U, ϕ )
sobre M com ϕ (p) = (x1 (p), . . . , xm (p)), p ∈ M, tais que
ϕ(U ∩ N )
U ∩N
M = R3
Notemos que nem sempre uma subvariedade imersa possui a propriedade de n-subvariedade. Tome, por
exemplo, q = (0, 0) nos exemplos 3.3.11 e 3.3.12.
No lema abaixo, denotemos por π : Rm → Rn , n ≤ m, a projeção sobre as primeiras n coordenadas.
54 CAPÍTULO 3. NOÇÕES DE VARIEDADES DIFERENCIÁVEIS EM RN E SUBVARIEDADES
Lema 3.4.2 Seja M uma variedade diferenciável de dimensão m e n um inteiro satisfazendo 0 ≤ n ≤ m. Suponha
que N ⊂ M satisfaz a propriedade de n-subvariedade. Então N com a topologia relativa de M é uma variedade
topológica de dimensão n. Além disso, cada vizinhança coordenada (U, ϕ ) de M da forma apresentada na Defi-
nição 3.4.1, define uma vizinhança coordenada (V, ϕ̃ ) em N, com V = U ∩ N e ϕ̃ = π ◦ ϕ |V . Estas coordenadas
locais determinam uma estrutura diferenciável C∞ em N na qual a inclusão i : N → M é um mergulho.
Definição 3.4.3 Uma subvariedade regular de uma variedade diferenciável M é qualquer subespaço N de M
com a propriedade de n-subvariedade e com um a estrutura diferenciável C∞ dada pela Definição 3.4.1.
F(x) = kxk2 .
S = {(x, y, z) ∈ R3 | x2 + y2 = 4, z = 0}.
Assim, o posto de F é igual a 1 em U \ S. Note que F(S) = {0} ⊂ R. Assim, tomando c > 0, teremos que F −1 (c)
é uma subvariedade regular −1
√ de dimensão 2. Em particular, se 0 < c < 4, temos que F (c) é o toro gerado pela
rotação do círculo de raio c em torno do eixo z com centro percorrendo S.
3.5. ESPAÇO TANGENTE A UMA SUBVARIEDADE REGULAR DE RN 55
Exemplo 3.4.7 Seja f : R2 → R dada por F(x, y) = exy . Então ∇F(x, y) = (xexy , yexy ). Segue em R2 \ {(0, 0)} a
derivada de F possui posto constante e igual a 1. Além disso, F(0, 0) = 1. Assim, para qualquer c > 0, c 6= 1,
F −1 (c) é uma subvariedade regular de R2 de dimensão 1. Note que
Demonstração do Teorema 3.4.4. Seja A := F −1 (q). Como F é contínua e {q} é fechado em M temos que A é
fechado. Vamos mostrar que A possui a propriedade de (n − k)-subvariedade.
Seja p ∈ A. Então F possui posto constante e igual a k em uma vizinhança de p. Pelo Teorema 3.3.2 podemos
encontrar uma vizinhança coordenada (U, ϕ ) e (V, ψ ) de p e F(p) = q respectivamente tais que:
Assim, se F ◦ ϕ −1 (x) = q, devemos ter x1 = · · · = xk = 0, pois ψ (q) = 0. Em outras palavras, os únicos pontos de
U que são aplicados em q são aqueles para os quais as k primeiras coordenadas são nulas. Ou ainda:
A ∩U = ϕ −1 (ϕ ◦ F −1 ψ −1 (0))
= ϕ −1 {x ∈ Cεn (0) | x1 = · · · = xk = 0}.
Mas esta é justamente a propriedade de (n − k)-subvariedade. Segue que A é uma subvariedade regular de dimensão
n − k.
Décima aula ↓
Definição 3.5.1 Seja F : Rn → Rm uma aplicação de posto constante e igual a k em todo ponto de Rn . Seja q ∈
F(Rn ) e M := F −1 (q) uma subvariedade regular de dimensão n − k em Rn , como no Teorema 3.4.4. Em particular
M ⊂ Rn . Um vetor v ∈ Rn é dito tangente a M em p ∈ M se existe uma função diferenciável γ : (−δ , δ ) → Rn ,
δ > 0, tal que γ (−δ , δ ) ⊂ M, γ (0) = p e γ ′ (0) = v. O conjunto de todos os vetores tangentes a M no ponto p é
chamado de espaço tangente a M em p e denotado por Tp M.
Teorema 3.5.2 Seja F : Rn → Rm uma aplicação de posto constante e igual a k em todo ponto de Rn . Seja
q ∈ F(Rn ) e M := F −1 (q) uma subvariedade regular de dimensão n − k em Rn , como no Teorema 3.4.4. Dado
p ∈ M, o espaço tangente a M em p é
Tp (M) = ker(DF(p)),
isto é, Tp M é o núcleo da trasformação linear DF(p). A dimensão de Tp M é n − k.
56 CAPÍTULO 3. NOÇÕES DE VARIEDADES DIFERENCIÁVEIS EM RN E SUBVARIEDADES
O resultado segue.
Definição 3.5.3 Seja F : Rn → Rm uma aplicação de posto constante e igual a k em todo ponto de Rn . Seja
q ∈ F(Rn ) e M := F −1 (q) uma subvariedade regular de dimensão n − k em Rn . Um vetor w é chamado normal
à M em p se hw, vi = 0, para qualquer v ∈ Tp M. Assim, o espaço dos vetores normais à M é o complemento
ortogonal de Tp M.
Notemos que, nas condições da definição 3.5.3, o espaço dos vetores normais à M em p possui dimensão k.
Além disso, pelo Teorema 3.5.2 devemos ter
Como o posto de F é igual a k (constante), obtemos o resultado a seguir que é uma simples consequência do
Teorema 3.5.2 e dessas observações:
Proposição 3.5.4 Seja F : Rn → Rm uma aplicação de posto constante e igual a k em todo ponto de Rn . Seja q ∈
F(Rn ) e M := F −1 (q) uma subvariedade regular de dimensão n−k em Rn . Então o conjunto {∇F1 (p), . . . , ∇Fk (p)}
é uma base do espaço normal à M em p.
Definição 3.5.5 Seja F : Rn → Rm uma aplicação de posto constante e igual a k em todo ponto de Rn e tomemos
q ∈ F(Rn ). Seja M := F −1 (q) uma subvariedade regular de dimensão n − k em Rn . O plano tangente a M em p
é o conjunto
{x ∈ Rn | x = p + v; v ∈ Tp M}.
Teorema 3.6.1 (Multiplicadores de Lagrange) Nas condições que antecedem este teorema, um ponto p ∈ M é
um ponto crítico de f |M se, e somente se, existe λ ∈ Rk , chamado de Multiplicador de Lagrange, tal que
D f (p) = λ · Dg(p).
e p é um ponto crítico de f .
Reciprocamente, suponhamos que p deja um ponto crítico de f |M . Sem perda de generalidade, iremos supor
que q = 0. Localmente, existe uma vizinhança coordenada (U, ϕ ) de p tal que: ϕ : → U1 ×V1 ⊂ Rn = Rk × Rn−k ,
ϕ (U ∩ M) = {0} × V1 e ϕ (p) = (0, 0). Como o posto de g é k, temos
ou seja,
D f˜(0, 0) = (Dx f˜(0, 0)) · D(g ◦ ϕ −1)(0, 0)
Definimos λ = Dx f˜(0, 0) ∈ Rk . Usando a Regra da Cadeia e compondo com Dϕ (p) obtemos o resultado.
Exemplo 3.6.2 Consideremos o caso em que M = S2 ⊂ R3 e seja f : R3 → R dada por f (x, y, z) = z. Se g(x, y, z) =
x2 + y2 + z2 − 1, então S2 = g−1 (0). Para encontrarmos um ponto crítico de f |S2 devemos, pelo Teorema 3.6.1,
resolver o sistema
0 − 2λ x = 0,
0 − 2λ y = 0,
1 − 2λ z = 0,
2
x + y2 + z2 = 1.
Isto nos fornece λ = ±1/2 e pontos críticos (0, 0, 1) e (0, 0, −1). Notemos que o primeiro é ponto de máximo e o
segundo é ponto de m’inimo de f |S2 .
Exercício 65 Seja S = {(x, y) ∈ R2 | xy = 0}, isto é, a união do eixo x com o eixo y em R2 . Considere duas
“cartas” que aplicam cada um dos eixos em R : (x, 0) 7→ x e (0, y) 7→ y. O que falha na definição de variedade
diferenciável?
58 CAPÍTULO 3. NOÇÕES DE VARIEDADES DIFERENCIÁVEIS EM RN E SUBVARIEDADES
Exercício 68 (Veja [11], página 350) Seja Sn := {x ∈ Rn+1 | kxk = 1} e fixemos N = (0, . . . , 0, 1) e S = (0, . . ., 0, −1)
os polos norte e sul respectivamente. Definamos UN := Sn \ {S} e US := Sn \ {N}. Consideremos as funções
f : UN → Rn e g : US → Rn definidas por
1
f (x1 , . . . , xn+1 ) = (x1 , . . . , xn ),
1 − xn+1
1
g(x1 , . . . , xn+1 ) = (x1 , . . . , xn ).
1 + xn+1
Mostre que (UN , f ) e (US , g) determinam duas vizinhanças coordenadas de Sn e ainda que {(UN , f ), (US , g)}
formam uma estrutura diferenciável C∞ em Sn . f e g são as projeções estereográficas do polo norte e sul respec-
tivamente (veja a Figura 3.9: no caso de f , se considerarmos a reta que passa pelo polo norte N e por um ponto
x ∈ UN , então f (x) é justamente o ponto de intersecção dessa reta com o plano Rn ).
Sugestão: a função f˜(y1 , . . . , yn ) = t(y)y1 , . . . ,t(y)yn , 1 − t(y) , onde t(y) = 2/(1 + kyk2), é a inversa de f .
Qual a expressão para a inversa de g?
Rn
x
g(x)
f (x)
Exercício 70 Mostre que se c 6= 0, então o hiperbolóide x2 + y2 − 4z2 = c é uma subvariedade regular de dimensão
2. O mesmo acontece quando c = 0?
Exercício 72 Seja M = {(x, y) ∈ R2 | xy = yx , x > 0, y > 0, (x, y) 6= (e, e)}. Mostre que M é uma subvariedade
regular de dimensão 1.
Exercício 73 Seja f : A → R uma função de classe C∞ no aberto A ⊂ R2 . Mostre que M = {(x, y, f (x, y)) ∈ R3 |
(x, y) ∈ A} é uma subvariedade regular de dimensão 2.
3.7. EXERCÍCIOS DO CAPÍTULO 59
Exercício 74 Considere uma matriz (ci j )n×n com posto n e simétrica. Mostre que
n n o
M = x ∈ Rn | ∑ ci j xi x j = 1
i, j=1
Exercício 75 Seja f : M → N uma imersão injetiva. Demonstre que, se f −1 (K) é compacto em M sempre que K
é compacto em N, então f é um mergulho.
Verifique estas duas vizinhanças não são C∞ -compatíveis. Entretanto, demonstre que estas vizinhanças coordena-
das definem estruturas diferenciáveis difeomórficas em R.
∆ := {(m, m) | m ∈ M} ⊂ M × M
é uma subvariedade de M × M.
60 CAPÍTULO 3. NOÇÕES DE VARIEDADES DIFERENCIÁVEIS EM RN E SUBVARIEDADES
Capítulo 4
Integração
Como sabemos do curso de Cálculo I, a integral de uma função real sobre um conjunto é a generalização da noção
de soma. Vamos estudar neste capítulo a integral de Riemann de uma função de várias variáveis, a qual nada mais
é que a generalização da integral vista para funções de uma variável real.
Definição 4.1.1 Dado um intervalo fechado [a, b] ⊂ R, uma partição de [a, b] é uma coleção finita P de pontos
de [a, b], que contém os pontos a e b. Usualmente, indexamos os elementos de P em ordem crescente na forma
a = t0 < t1 < . . . < tk = b.
Cada intervalo [t j−1 ,t j ], j = 1, . . . , k é chamado de subintervalo determinado por P.
Definição 4.1.2 Dado um retângulo Q = [a1 , b1 ] × . . . × [an , bn ] ⊂ Rn , uma partição de Q é uma n-úpla P =
(P1 , . . . Pn ), onde cada Pi é uma partição de [ai , bi ], i = 1, . . . , n. Se, para cada i, Ii é um dos subintervalos
determinado por Pi , então um retângulo da forma
R = I1 × . . . × In
é chamado de subretângulo (de Q) determinado por P. A largura máxima desses subretângulos é chamada de
malha de P.
Definição 4.1.3 Sejam Q ⊂ Rn um retângulo e f : Q → R uma função limitada. Dada uma partição P de Q, para
cada subretângulo R determinado por P definimos
mR ( f ) = inf{ f (x) | x ∈ Q},
MR ( f ) = sup{ f (x) | x ∈ Q}.
61
62 CAPÍTULO 4. INTEGRAÇÃO
Com esta notação, a soma inferior e a soma superior de f em Q são definidas respectivamente por
L( f , P) = ∑ mR ( f )v(R),
R
U( f , P) = ∑ MR ( f )v(R),
R
Demonstração. Suponhamos que Q = [a1 , b1 ] × . . . × [an , bn ]. É suficiente demonstrar o lema para o caso em que
P ′′ é obtida adicionando-se um único ponto à partição P = (P1 , . . . , Pn ). Além disso, podemos supor, sem
perda de generalidade, que o ponto q será adicionado à partição P1 . Suponha ainda que P1 consiste dos pontos
RS = [t j−1 ,t j ] × S,
onde S é um subretângulo de [a2 , b2 ] × . . .× [an , bn ] determinado por (P2 , . . . , Pn ). A menos dos subretângulos da
forma RS , os demais subretângulos aparecem em ambas as partições P e P ′′ . Assim, ao considerarmos os termos
da forma RS da soma inferior L( f , P) desaparecem em L( f , P ′′ ), dando lugar a subretângulos da forma
′ ′′
RS = [t j−1 , q] × S e RS = [q,t j ] × S,
Como a desigualdade acima vale para qualquer subretângulo da forma RS , obtemos que
L( f , P) ≤ L( f , P ′′ ).
Agora verificaremos que ao refinarmos uma partição, a família de somas inferiores obtida será limitada
superiormente, enquanto a família de somas superiores será limitada inferiormente.
4.2. CRITÉRIO DE RIEMANN PARA INTEGRABILIDADE 63
′
RS ′′
RS
Lema 4.1.5 Sejam Q ⊂ Rn um retângulo e f : Q → R uma função limitada. Se P e P ′ são duas quaisquer
partições de Q, então
L( f , P) ≤ U( f , P ′ ).
Demonstração. Suponhamos que P = P ′ . Então facilmente vemos que mR ( f ) ≤ MR ( f ) para qualquer subretân-
gulo de Q determinado por P. Multiplicando por v(R) e somando obtemos o lema nesse caso particular.
Se P 6= P ′ , seja P ′′ o refinamento comum a P e P ′ . Pela primeira parte da demonstração e pelo Lema
4.1.4 temos que
L( f , P) ≤ L( f , P ′′ ) ≤ U( f , P ′′ ) ≤ U( f , P ′ ),
e o resultado segue.
Definição 4.1.6 Sejam Q ⊂ Rn um retângulo e f : Q → R uma função limitada. Definimos a integral inferior e a
integral superior de f sobre Q respectivamente por
Z Z
f = sup{L( f , P)} e f = inf{U( f , P)}.
Q P Q P
No caso em que as integrais inferior e superior de f sobre Q coincidem, dizemos que f é (Riemann) integrável
em Q e denotamos este valor comum por
Z Z
f (ou f (x)),
Q Q
Teorema 4.2.1 (Critério de Riemann) Sejam Q um retângulo e f : Q → R uma função limitada. Então
Z Z
f≤ f.
Q Q
64 CAPÍTULO 4. INTEGRAÇÃO
Além disso, a igualdade acontece se, e somente se, dado ε > 0, existe uma partição correspondente Pε de Q tal
que
U( f , Pε ) − L( f , Pε ) < ε . (4.1)
L( f , P) ≤ U( f , P ′ ),
Como P ′ é arbitrária, podemos tomar o inf sob todas as partições P ′ obtendo a primeira parte do teorema.
Agora asumimos que as integrais inferior e superior de f coincidem. Dado ε > 0, escolha P tal que
Z
0≤ f − L( f , P) < ε /2
Q
Portanto,
U( f , P ′′ ) − L( f , P ′′ ) ≤ U( f , P ′ ) − L( f , P) < ε .
Reciprocamente, assuma que as integrais inferior e superior de f não são iguais. Pela primeira parte do
teorema podemos definir
Z Z
ε := f− f > 0.
Q Q
Logo,
U( f , P) − L( f , P) > ε .
Assim, existe ε > 0 tal que, para qualquer partição P de Q, a condição (4.1) não é satisfeita, o que conclui a
demonstração do teorema.
Corolário 4.2.2 Sejam Q ⊂ Rn um retângulo e f : Q → R uma função constante, isto é, f (x) = c para qualquer
x ∈ Q. Então f é integrável e Z
f = cv(Q).
Q
Demonstração. Seja P uma partição de Q e R um subretângulo determinado por P. Como f é constante segue
que
mR ( f ) = c = MR ( f ).
4.3. MEDIDA NULA E CRITÉRIO DE LEBESGUE 65
Portanto,
L( f , P) = c ∑ v(R) = U( f , P),
R
e a condição no critério de Riemann (Teorema 4.2.1) vale trivialmente. Além disso,
Z
L( f , P) ≤ f ≤ U( f , P),
Q
Corolário 4.2.3 Seja Q um retângulo em Rn e {Q1 , . . . , Qk } uma coleção finita de retângulos que cobrem Q. Então
k
v(Q) ≤ ∑ v(Qi ).
i=1
Então, para qualquer partição P de [0, 1] e qualquer subretângulo R determinado por P, teremos que mR ( f ) = 0
e MR ( f ) = 1. Segue daí que L( f , P) = 0 e U( f , P) = 1v([0, 1]) = 1. Logo, a condição 4.1 no Teorema 4.2.1 não
será satisfeita para ε > 0 pequeno.
Concluiremos esta seção demonstrando que uma função contínua definida em um retângulo é integrável.
Demonstração. Como f é contínua e Q é compacto, temos que f é uniformemente contínua. Assim, dado ε > 0,
existe δ > 0 tal que, se x, y ∈ Q satisfazem |x − y| < δ , então | f (x) − f (y)| < ε /v(Q).
Escolha uma partição P de Q com malha menor que δ . Então, para qualuqer subretângulo R determinado
por P e todo x, y ∈ R, segue que |x − y| < δ , e pela condição de continuidade uniforme,
MR ( f ) − mR ( f ) < ε /v(Q).
Logo,
U( f , P) − L( f , P) = ∑(MR ( f ) − mR ( f ))v(R) ≤ ε .
R
Segue do Teorema 4.2.1 que f é integrável.
Definição 4.3.1 Dizemos que um subconjunto A ⊂ Rn possui medida nula (em Rn ) se, dado ε > 0, existe uma
quantidade enumerável de retângulos Q1 , Q2 , . . . de Rn tais que
∞
[ ∞
A⊂ Qi e ∑ v(Qi ) < ε .
i=1 i=1
66 CAPÍTULO 4. INTEGRAÇÃO
Em Análise é comum dizermos que uma certa propriedade ocorre quase sempre em um subcojunto Ω ou em
quase todo ponto de Ω (abreviadamente q.t.p. em Ω) se tal propriedade ocorre exceto em conjunto de medida nula
contido em Ω.
Se um subconjunto A ⊂ Rn possui medida nula e a dimensão do espaço está clara no contexto, utilizaremos
ainda a notação |A| = 0.
O próximo resultado reune algumas propriedade básicas de conjuntos de medida nula.
c) Um subconjunto A ⊂ Rn possui medida nula se, e somente se, para todo ε > 0, existe uma quantidade
enumerável de retângulos abertos Int Q1 , IntQ2 , . . . de Rn tais que
∞
[ ∞
A⊂ Int Qi e ∑ v(Qi ) < ε .
i=1 i=1
Segue que a coleção {Qij } cobre A e a soma dos volumes de cada retângulo Qij satisfaz
∞
ε
∑ 2i = ε .
i=1
Para provar c), suponhamos que os retângulos IntQ1 , Int Q2 , . . . cobrem A. É claro que os retângulos fechados
Q1 , Q2 , . . . também cobrirão A. Assim, a condição dada implicará que A possui medida nula. Reciprocamente, su-
′ ′
ponha que A possua medida nula e, dado ε > 0, cubra-o com uma quantidade enumerável de retângulos Q1 , Q2 , . . .
tais que
∞
′ ε
∑ v(Qi ) < 2 .
i=1
Agora, para cada i = 1, 2, . . ., escolha um retângulo Qi tal que tal que
′ ′
Qi ⊂ IntQi e v(Qi ) ≤ 2v(Qi ).
(Tente justificar a existência de tais retângulos). Segue que os retângulos abertos IntQ1 , Int Q2 , . . . cobrem A e
satisfazem
∞
∑ v(Qi ) < ε .
i=1
Na prova de d) escrevemos
Q = [a1 , b1 ] × . . . × [an , bn ].
Aí notamos que ∂ Q é a união das faces de Q, que são da forma
Cada subconjunto da forma acima pode ser coberto por um único retângulo em Rn da forma
que possui volume tão pequeno quanto desejarmos fazendo δ → 0. Logo, as faces possuem medida nula em Rn e
portanto |∂ Q| = 0 em Rn pelo item b).
Agora vamos supor que |Q| = 0 em Rn e chegarmos a uma contradição. Seja ε > 0 tal que ε < v(Q). Pelo
item c), podemos cobrir Q por retângulos abertos Int Q1 , Int Q2 , . . . satisfazendo
∞
∑ v(Qi ) < ε .
i=1
Pela compacidade de Q, existe uma quantidade finita destes retângulos IntQ1 , . . . , Int Qk que ainda cobrem Q.
Assim,
k
ε < v(Q) ≤ ∑ v(Qi ) < ε ,
i=1
o que é uma contradição.
Como vimos na Proposição 4.2.5, uma função contínua definida em um retângulo fechado é (Riemann)
integrável. Entretanto, podemos encontrar facilmente exemplos que nos mostram que a continuidade não é uma
condição necessária para integrabilidade. O que o Critério de Lebesgue nos diz é qual a quantidade de pontos
de discontinuidade uma função pode ser para ainda ser integrável. Tal resultado, como o sugere a nomenclatura,
foi demonstrado por Lebesgue. A idéia por trás da prova é examinar a condição de Riemann para integrabilidade
para ver que tipo de restrição podemos colocar nos pontos de descontinuidade da função. Notemos que a diferença
entre a soma superior e a soma inferior de uma função f para uma dada partição é
∑(MR ( f ) − mR ( f ))v(R),
R
e f será integrável se, e somente se, existem somas dessa forma arbitrariamente pequenas. Dividindo os retângulos
dessa soma como R1 ∪ R2 , onde R1 possui somente subretângulos onde f é contínua e R2 contém os subretângulos
restantes. Em R1 os termos da soma podem ser tomados pequenos pela continuidade de f . Em R2 , entretanto, a
soma não precisa ser pequena, porém é limitada por
C ∑ v(R),
R∈R2
e a soma será pequena se a soma dos volumes dos retângulos que contêm os pontos de descontinuidade de f é
pequena. Consequentemente, a soma será arbitrariamente pequena se o conjunto dos pontos de descontinuidade
de f possui medida nula.
Para controlarmos as somas inferior e superior nos pontos de continuidade utilizaremos ainda o conceito de
oscilação.
68 CAPÍTULO 4. INTEGRAÇÃO
Lema 4.3.5 Sejam Ω ⊂ Rn e f : Ω → R uma função. Então f é contínua em x0 ∈ Ω se, e somente se, ν ( f ; x0 ) = 0.
Demonstração. Notemos que sempre temos ν ( f ; x0 ) ≥ 0. Suponha que ν ( f ; x0 ) = 0. Portanto, dado ε > 0, existe
δ > 0 tal que
Mδ ( f ) − mδ ( f ) < ε .
Logo, se x ∈ Ω e |x − x0| < δ , então
mδ ( f ) ≤ f (x) ≤ Mδ ( f ).
Obviamente que o próprio x0 satisfaz tal propriedade, isto é,
mδ ( f ) ≤ f (x0 ) ≤ Mδ ( f ).
Segue que
| f (x) − f (x0 )| < ε .
Reciprocamente, suponhamos que f seja contínua em x0 . Então, dado ε > 0 escolhemos δ > 0 de maneira
que | f (x) − f (x0 )| < ε sempre que x ∈ Ω satisfaz |x − x0 | < δ . Logo,
Mδ ( f ) ≤ f (x0 ) + ε e mδ ( f ) ≥ f (x0 ) − ε .
Consequentemente, ν ( f ; x0 ) ≤ 2ε . Fazendo ε → 0 temos que ν ( f ; x0 ) = 0.
Teorema 4.3.6 (Critério de Lebesgue) Sejam Q ⊂ Rn um retângulo e f : Q → R uma função limitada. Então f
é integrável em Q se, e somente se, o conjunto dos pontos de descontinuidade de f possui medida nula em Rn , isto
é, se f é contínua q.t.p. em Q.
Suponhamos que |D| = 0 em Rn e, dado ε > 0, vamos encontrar uma partição P tal que U( f , P) −
L( f , P) < ε .
Pimeiramente, cobrimos D com uma quantidade enumerável de retângulos abertos IntQ1 , Int Q2 , . . . tais que
∞
∑ v(Qi ) < ε ′ ,
i=1
onde ε ′ > 0 será fixado mais tarde dependendo de ε . Para cada y ∈ Q \ D, escolhemos um retângulo aberto IntQy
contendo y e tal que
| f (x) − f (y)| < ε ′ para x ∈ Qy ∩ Q.
Então o conjunto {IntQi }∞i=1 ∪ {IntQy }y∈Q\D formam uma cobertura berta de Q. Pela compacidade, escolhemos
uma quantidade finita destes retângulos
Int Q1 , . . . , Int Qk , IntQy1 , . . . , IntQyl ,
que ainda cobrem Q. Notemos que os retângulos IntQ1 , . . . , Int Qk podem não cobrir D, mas isso não fará diferença.
′
Para facilitar, utilizaremos a notação Qy j = Q j . Além disso, sem mudança na notação, vamos trocar os retâgulos
′
Qi , i = 1, . . . , k, e Q j , j = 1, . . . , l, pela suas intersecções com Q. Estes retângulos ainda cobrem Q e satisfazem
k
∑ v(Qi ) < ε ′ , (4.2)
i=1
4.4. O TEOREMA DE FUBINI 69
e
′
| f (x) − f (z)| ≤ 2ε ′ , para x, z ∈ Q j , j = 1, . . . , l. (4.3)
Agora definimos uma partição P de Q usando os pontos extremos de cada intervalo componente de cada retângulo
′ ′ ′
Q1 , . . . , Qk , Q1 , . . . , Ql . Note que, dessa forma, cada retângulo Qi e Q j é união de subretângulos determinados
por P. Para encontrarmos as somas inferior e superior de f relativas à P, dividiremos a coleção de todos os
subretângulos determinados por P na união disjunta R1 ∪ R2 , onde cada retãngulo R ∈ R1 está contido em algum
′
retângulo Qi e cada retãngulo R ∈ R2 está contido em algum retângulo Qi . Observemos que
k
∑ (MR ( f ) − mR ( f ))v(R) ≤ 2M ∑ v(R) ≤ 2M ∑ ∑ v(R)
R∈R1 R∈R1 i=1 R⊂Qi
k
= 2M ∑ v(Qi ) < 2M ε ′ .
i=1
e que
Assim,
U( f , P) − L( f , P) < 2M ε ′ + 2v(Q)ε ′ ,
e a integrabilidade segue ao escolhermos ε ′ = ε /(2M + 2v(Q)).
Assumiremos agora que f : Q → R é integrável em Q e vamos mostrar que o conjunto dos pontos de descon-
tinuidade de f (denotado por D) possui medida nula em Rn .
Para cada m ∈ Z+ (inteiro positivo), seja
1
Dm := {y ∈ Q | ν ( f ; y) ≥ }.
m
Pelo Lema 4.3.5, sabemos que D = ∪∞ m=1 Dm . Mostraremos que cada Dm possui medida nula, e o resultado seguirá
da Proposição 4.3.2.
′
Fixemos m ∈ Z+ . Dado ε > 0, seja P uma partição de Q tal que U( f , P) − L( f , P) < ε /m. Seja Dm
′′
o conjunto dos pontos de Dm que pertencem à ∂ R, para algum subretângulo R determinado por P e seja Dm
′
o conjunto que contém os demais pontos de Dm . Segue da Proposição 4.3.2 que Dm possui medida nula, pois
′′
|∂ R| = 0. Resta-nos então mostrar que |Dm | = 0.
′′
Sejam R1 , . . . , Rk os retângulos determinados por P que contêm pontos de Dm . Dado i = 1, . . . , k, o retângulo
′′
Ri possui um ponto y ∈ Dm . Como y 6∈ ∂ Ri , existe δ > 0 tal que Ri possui uma vizinhança cúbica de raio δ e
centrada em y. Com isso,
1
≤ ν ( f ; y) ≤ Mδ ( f ) − mδ ( f ) ≤ MRi ( f ) − mRi ( f ).
m
Multiplicando por v(Ri ) e somando obtemos
1 m ε
∑ v(Ri ) ≤ U( f , P) − L( f , P) < m ,
m i=1
′′
ou seja, Dm pode ser coberto por retângulos cuja a soma dos volumes é menor que ε . Como ε é arbitrário,
finalizamos a demonstração do teorema.
definida no retângulo Q = [a, b] × [c, d] ⊂ R2 , então, para cada y ∈ [c, d], a função F(x) = f (x, y) será contínua, e
portanto integrável, em [a, b]. O valor da integral depende de y e, portanto, define uma nova função
Z b
G(y) = f (x, y)dx.
a
Verifica-se facilmente que G é contínua em [c, d], e consequentemente integrável neste intervalo. O fato é que
Z Z d Z dZ b
f= G(y)dy = f (x, y)dxdy,
Q c c a
fórmula que será obtida como consequência do Teorema de Fubini. A questão que surge é quando uma fórmula
similar é válida no caso em que f é meramente integrável em Q. Por exemplo, suponha que, para algum y0 ∈ [c, d]
fixado, f (x, y0 ) não seja contínua em ponto algum de [a, b], isto é, f é descontínua em todo ponto do segmento
y = y0 , c ≤ y ≤ d. Como este segmento possui medida nula em R2 , a descontinuidade de f neste conjunto não
afeta sua integrabilidade em Q. Em casos dessa forma, precisamos utlizar integrais inferiores e superiores para
uma generalização da fórmula de integrais iteradas. Este é o conteúdo do Teorema de Fubini.
Teorema 4.4.1 (Teorema de Fubini) Seja Q = A×B, onde A ⊂ Rk e B ⊂ Rn são retângulos. Suponha que f : Q →
R seja uma função limitada e escreva f (x, y) para representar o valor de f em x ∈ A e y ∈ B. Para cada x ∈ A,
definamos
Z Z
I(x) := f (x, y) e I(x) := f (x, y).
y∈B y∈B
Multiplicando por v(RA ), somando e usando o fato que v(RA )v(RB ) = v(RA × RB), segue que
L( f , P) ≤ L(I, PA ).
U( f , P) ≥ U(I, PA ).
Passo 4: Reunindo todas as comparações das somas inferiores e superiores para f , I e I obtemos
e
L( f , P) ≤ L(I, PA ) ≤ L(I, PA ) ≤ U(I, PA ) ≤ U( f , P), (4.5)
e estas desigualdades independem da escolha da partição P = (PA , PB ).
Passo 5: Como f é integrável em Q, dado ε > 0, existe uma partição P = (PA , PB ) tal que
U( f , P) − L( f , P) < ε .
estão todos entre os extremos U( f , P) e L( f , P). Comos estes dois últimos estão a uma distância ε um do outro
e ε é arbitrário, devemos ter Z Z Z
I= I= f,
A A Q
Corolário 4.4.2 Seja Q = A × B, onde A ⊂ Rk e B ⊂ Rn são retângulos. Suponha que f : Q → R seja uma função
limitada. Se f é integrável em Q e se Z
f (x, y)
y∈B
Precisamos verificar que esta definição não depende da escolha de um particular retângulo Q que contém S.
Proposição 4.5.2 Sejam Q e Q′ dois retângulos em Rn e f : Rn → R uma função limitada que se anula em Rn \
Q ∩ Q′ . Então a restrição de f à Q é integrável se, e somente se, a restrição de f à Q′ é integrável e, neste caso,
Z Z
f= f.
Q Q′
Demonstração. Suponhamos inicialmente que Q ⊂ Q′ . Seja E o conjunto dos pontos de Q nos quais f é descon-
tínua. Como f se anula em Rn \ Q′ , temos que f é contínua neste conjunto. Assim, usando um abuso de notação,
f : Q Z→ R e f : QZ′ → R são contínuas exceto nos pontos de E e possivelmente nos pontos de ∂ Q. Com isso,
tanto f quanto f existem se, e somente se, E possui medida nula. Assim, a existência de uma implica na
Q Q′
existência da segunda.
Agora suponhamos que ambas as integrais existem e vamos mostrar que são iguais. Seja P uma partição de
Q′ e seja P ′′ o refinamento de P construido adicionando-se os pontos dos extremos dos intervalos componentes
de Q. Se R é um subretângulo determinado por P ′′ que não está em Q, então f se anula em algum ponto de R e
portanto mR ( f ) ≤ 0. Segue que
Z
L( f , P) ≤ L( f , P ′′ ) = ∑ mR ( f )v(R) ≤ ∑ mR ( f )v(R) ≤ f.
R R⊂Q Q
No caso em que Q ou Q′ não estão necessariamente contidos um em outro, consideramos um terceiro retân-
gulo Q′′ que contém ambos e pelo que já provamos, como Q ⊂ Q′′ e Q′ ⊂ Q′′
Z Z Z
f= f= f,
Q Q′′ Q′
O próximo resultado lista as principais propriedades da integral de Riemann. A demonstração pode ser
encontrada em [10], Lema 13.2 e Teorema 13.3.
Vejamos agora algumas condições que implicam na existência da integral de uma função em um subconjunto
limitado S.
Teorema 4.5.4 Seja S ⊂ Rn um subconjunto limitado e f : S → R uma função contínua e limitada. Defina
Demonstração. Seja y ∈ Rn \ E. Vamos demonstrar que fS é contínua em y. Com isso, o conjunto dos pontos
de descontinuidade de fS estará contido em E. Se supormos que |E| = 0, então o resultado seguirá do Critério de
Lebesgue.
Se y ∈ IntS, então f e fS coincidem em uma vizinhança de y e, sendo f contínua nesse conjunto, fS também
será. Se y ∈ Ext S então fS se anula em uma vizinhança de y e portanto será contínua e y. Assim, nos resta analisar
fS em y ∈ ∂ S. Neste caso y pode pertencer ou não à S. Mas como y 6∈ E temos que
lim f (x) = 0.
x→y
Em particular, fS (x) → 0 quando x se aproxima de y por pontos de S. Mas fS (x) → 0 quando x se aproxima de y
por pontos de Rn \ S pela própria definição de fs . Como fS (x) = 0 ou fS (x) = f (x), devemos ter
lim fS (x) = 0.
x→y
Teorema 4.5.5 Seja S ⊂ Rn um conjunto limitado e f : S → R uma função contínua e limitada. Se A = Int S e f é
integrável em S, então f será integrável em A e
Z Z
f= f.
S A
Demonstração. Notemos que se fS é contínua em y então fA também será contínua em y e fS (y) = fA (y). De
fato, usto é fácil de ver se y ∈ Int S ou se y ∈ ExtS. Suponha que y ∈ ∂ S. Então a continuidade de fS em y implica
74 CAPÍTULO 4. INTEGRAÇÃO
que fS (x) → fS (y) quando x → y. Como y ∈ ∂ S, devemos ter fS (y) = 0, pois fS (x) = 0 se x 6∈ S. Mas note que
fA (x) = 0 ou fA (x) = fS (x) e a afirmação segue.
Agora suponhamos que f seja integrável em S. Segue que, dado um retângulo Q que contém S, o conjunto
dos pontos de descontinuidade de fS possui medida nula. Mas daí os pontos de descontinuidade de fA também terá
medida nula para afirmação que acabamos de provar e assim fA também será integrável. Note ainda que fS − fA se
anula somente em ponto de descontinuidade de fS e fA , que possui medida nula. Portanto
Z
( fS − fA ) = 0,
Q
Definição 4.6.1 Seja S ⊂ Rn um subconjunto limitado. Dizemos que S é retificável, ou ainda Jordan mensurável
se a função caractrística χS for integrável. Neste caso, o volume ou o conteúdo (de Jordan) de S é dado por
Z Z
v(S) := χS = 1.
S S
Observe que, se S for um retângulo, esta definição de volume coincide com a definição prévia que demos.
Seja S ⊂ Rn tal que v(S) = 0. Então, dado um retângulo Q contendo S e ε > 0, existe uma partição P de Q
tal que U(χS , P) < ε , uma vez que L(χS , P) = 0. Note que esta partição nos dá uma cobertura finita de S cuja
soma total dos volumes é menor que ε , diferentemente do caso em que S possui medida zero, onde procuramos
uma cobertura enumerável de S com a propriedade de que a soma total dos volumes seja menor que ε > 0 dado.
Teorema 4.6.2 Um subconjunto S ⊂ Rn é retificável se, e somente se, S é limitado e ∂ S possui medida nula em
Rn .
Demonstração. Note que a função χS é descontínua em x se, e somente se, x ∈ ∂ S. Assim, pelo critério de
Lebesgue, χS será integrável em um retângulo contendo S se, e somente se, |∂ S| = 0 em Rn .
Utilizando as propriedades de integrais que já vimos não é difícil demonstrar a proposição abaixo.
O Teorema 4.6.2 e a Proposição 4.6.3 nos ajudam a construir vários exemplos de conjuntos retificáveis.
Daremos à seguir um exemplo de um conjunto que não é retificável.
4.6. CONJUNTOS RETIFICÁVEIS OU JORDAN MENSURÁVEIS 75
Fixemos a ∈ (0, 1) e, para cada inteiro positivo i, escolhemos um intervalo (ai , bi ) ⊂ (0, 1) que contém qi e possua
comprimento menor que a/2i . Definimos
A := (a1 , b1 ) ∪ (a2 , b2 ) ∪ . . . .
Suponhamos que ∂ A possui medida nula. Notemos que [0, 1] = A = A ∪ ∂ A. Tomando ε = 1 − a, cobrimos ∂ A
com uma quantidade enumerável de retângulos cuja soma dos volumes seja menor que ε . Esta cobertura de ∂ A
juntamente com os subconjuntos (ai , bi ) nos fornece uma cobertura de [0, 1]. Mas a soma total dos volumes dos
subconjuntos dessa cobertura é ε mais a soma dos volumes dos intervalos (ai , bi ). Pela compacidade de [0, 1]
obtemos
∞
a
1 < ε + ∑ i = ε + a.
i=1 2
Assim, temos uma contradição e A não é retificável pelo Teorema 4.6.2.
Teorema 4.6.5 Seja S ⊂ Rn um subconjunto retificável e f : S → R uma função limitada. Então f é integrável se,
e somente se, o conjunto dos pontos de discontinuidade de f em S possui medida nula.
Demonstração. Seja Q um retângulo que contém S e fS : Q → R a extensão de f como sendo zero em Q \ S. Então
fS é integrável se, e somente se, o conjunto dos pontos de discontinuidade de fS possui medida nula. Mas, a menos
dos pontos de ∂ S, as discontinuidades de fS são as mesmas de f . Como |∂ S| = 0, o resultado segue.
Finalizamos esta seção com um resultado que nos será útil no estudo de integrais impróprias.
Teorema 4.6.6 (Exaustão) Dado um subconjunto aberto A ⊂ Rn , existe uma sequência C1 ,C2 , . . . de subconjuntos
de A que são compactos e retificáveis e satisfazem
∞
[
A= CN e CN ⊂ IntCN+1 para cada N.
N=1
DN
DN +1
para cada x ∈ DN , escolha um cubo fechado centrado em x e contido em Int DN+1 . O interior destes cubos cobrem
DN e escolhemos uma quantidade finita deles que ainda cobrem DN e seja CN a união desta quantidade finita de
cubos. Como CN é uma união finita de retângulos, ele será compacto e retificável (veja o Exercício 95). Note que,
como cada CN contém DN , a união dos CN ’s cobrem A. Além disso,
CN ⊂ IntDN+1 ⊂ IntCN+1 ,
Definição 4.7.1 Seja A ⊂ Rn um aberto e f : A → R uma função contínua. Suponha que f (x) ≥ 0 para todo x ∈ A.
A integral (estendida) de f sobre A é definida por
Z Z
f := sup f | D ⊂ A, D é compacto e retificável ,
A D
desde que o sup exista. Neste caso diremos que f é integrável em A (no sentido estendido).
Mais geralmente, se não supormos que f é não-negativa, definimos, para cada x ∈ A
Diremos neste caso que f é integrável em A se as funções não negativas f+ e f− forem integráveis, e definimos
Z Z Z
f := f+ − f− .
A A A
Observação 4.7.2 Quando for necessário distinguir a integral ordinária com a integral estendida utilizaremos a
notação Z ∗
f
A
para denotar a integral estendida de f : A → R.
Notemos que, no caso em que A ⊂ Rn é aberto e limitado, temos duas definições de integral de uma função
contínua neste conjunto. Verifiquemos que neste caso as definições coincidem.
4.7. INTEGRAIS IMPRÓPRIAS 77
Proposição 4.7.3 Suponhamos que A ⊂ Rn é aberto e retificável e seja f : A → R contínua. Se f for integrável
em A no sentido ordinário (Definição 4.5.1), então f é integrável no sentido estendido e
Z ∗ Z
f= f.
A A
Demonstração. Suponhamos que f (x) ≥ 0 para todo x ∈ A. Seja D ⊂ A um compacto retificável. Então
Z Z
f≤ f.
D A
Tomando o sup sob todos os compactos retificáveis de A obtemos que a integral estendida existe e que
Z ∗ Z
f≤ f.
A A
Vamos demonstrar a desigualdade inversa, que é um pouco mais delicada. Para tanto, seja Q ⊂ Rn um retângulo
tal que A ⊂ IntQ e seja fA a extensão por zero de f para fora de A. Pela definição de integral em subconjuntos
limitados temos que Z Z
f= fA .
A Q
Seja
k
[
D := Ri .
i=1
k k Z
L( fA , P) = ∑ mRi ( fA )v(Ri ) ≤ ∑ fA
i=1 i=1 Ri
Z Z Z ∗
= fA = f≤ f.
D D A
Utilizando a exaustão de um aberto A ⊂ Rn dada pelo Teorema 4.6.6 podemos dar uma formulação alternativa
para a definição da integral estendida.
78 CAPÍTULO 4. INTEGRAÇÃO
Teorema 4.7.4 Seja A ⊂ Rn um subconjunto aberto e f : A → R uma função contínua. Escolha uma sequência
{CN } de subconjuntos de A que são compactos e retificáveis que cobrem A e satifazem CN ⊂ IntCN+1 para cada
N. Então f é integrável em A (no sentido estendido) se, e somente se, a sequência de números reais
Z
|f|
CN
Demonstração.
Z Suponhamos inicialmente que f é não-negativa, o que implica que f = | f |. Como a sequência
f é crescente, temos que ela converge se, e somente se, é limitada.
CN
Suponhamos que f seja integrável em A. Como CN é um compacto retificável e está contido em A temos que
Z Z Z
f ≤ sup f | D ⊂ A é compacto e retificável = f .
CN D A
Z
Segue que a sequência f é limitada e
CN Z Z
lim f≤ f.
N→∞ CN A
Z
Reciprocamente, suponhamos que a sequência f seja limitada. Seja D ⊂ A um compacto retificável.
CN
Então D pode ser coberto pelos conjuntos abertos
IntC1 ⊂ IntC2 ⊂ . . . .
Consequentemente, será coberto por uma quantidade finita destes aberto pela compacidade, ou seja, por apenas
um deles, digamos IntCM . Assim, Z Z Z
f≤ f ≤ lim f.
D CM N→∞ CN
Sendo D arbitrário, tomando o sup sob todos os compactos retificáveis de A segue que f é integrável e que
Z Z
f ≤ lim f.
A N→∞ CN
O caso geral em que f não precisa ser não-negativa segue se nos lembrarmos que 0 ≤ f+ ≤ | f | e 0 ≤ f− ≤ | f |
e que | f | = f+ + f− .
A seguir listamos algumas propriedades análogas àquelas do caso ordinário. A demonstração pode ser en-
contrada em [10], Teorema 15.3.
Em particular, Z Z
f ≤ | f |.
A A
4.8. DEFICIÊNCIA DA INTEGRAL DE RIEMANN 79
Exemplo 4.8.1 A função característica χQ do conjunto dos números racionais não é Riemann integrável. Entre-
tanto, se definirmos χk como sendo a função característica do conjunto {q1 , q2 , . . . , qk } (os k primeiros racionais
em alguma ordem), então χk → χQ pontualmente e cada χk é Riemann integrável pois é não zero a menos de um
conjunto de medida nula.
Na verdade, mesmo que o limite pontual de uma sequência de funções seja integrável, pode ser que não
tenhamos a igualdade em (4.6).
Exemplo 4.8.2 Seja fk a função contínua que é zero se 1/k ≤ x ≤ 1 e cujo gráfico no intervalo (0, 1/k] forma um
triângulo isósceles de altura 2k. Então,
Z 1
fk (x)dx = 1, para qualquer k ∈ N.
0
Teorema 4.8.3 Seja I ⊂ R um intervalo fechado e { fk } uma sequência de funções definidas em I com valores em
R. Suponha ainda que fk → f uniformemente em I e que cada fk seja limitada e integrável em I. Então o limite f
é integrável em I e Z Z
lim fk = f.
k→∞ I I
Observemos que, como fk0 , é limitada, o mesmo vale para f . Seja agora P qualquer partição do intervalo I e R
qualquer subintervalo determinado por P. Então
Exercício 80 Se f , g : [0, 1] → R são duas funções crescentes (e portanto limitadas) e não-negativas, mostre que
h : [0, 1] × [0, 1] → R definida por h(x, y) = f (x)g(y) é integrável.
a) Mostre que, para qualquer partição P de Q e qualquer subretângulo R de Q determinado por P, temos
que
mR ( f ) + mR (g) ≤ mR ( f + g) e MR ( f + g) ≤ MR ( f ) + MR (g).
Conclua que
L( f , P) + L(g, P) ≤ L( f + g, P) e U( f + g, P) ≤ U( f , P) + U( f , P).
Exercício 83 Sejam Q ⊂ Rn um retângulo e f : Q → R uma função limitada. Mostre que f é integrável em Q se,
e somente se, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que U( f , P) − L( f , P) < ε sempre que a partição P possuir malha
menor que δ .
Sugestão: veja as sugestões no Exercício 6 da página 90 de [10].
Exercício 84 Suponha que f : [a, b] → R seja limitada e que f seja descontínua somente em uma quantidade finita
de pontos de [a, b]. Mostre que f é integrável em [a, b].
Sugestão: dado ε > 0 e sendo E o conjunto dos pontos de descontinuidade de f , cubra tal conjunto com uma
quantidade finita de intervalos [c j , d j ] ⊂ [a, b] tais que ∑ j (d j − c j ) < ε . Seja K o conjunto compacto obtido ao
removermos de [a, b] a união de todos os intervalos (c j , d j ). Segue que f é uniformemente contínua em K e tome
δ > 0 tal que | f (x) − f (y)| < ε sempre que x, y ∈ K e |x − y| < δ . Construa uma partição P que contém todos
os pontos c j e d j , nenhum ponto do interior de [c j , d j ], e tal que, se um subintervalo da partição não é da forma
[c j , d j ], então o comprimento desse subintervalo não excede δ . Mostre que esta partição satisfasz a condição do
critério de Riemann.
4.9. EXERCÍCIOS DO CAPÍTULO 81
Exercício 85 Seja C o conjunto de Cantor definido no Exercício 12. Considere uma função f : [0, 1] → R limitada
e contínua em todo ponto de [0, 1] \ C. Demonstre que f é integrável em [0, 1].
Sugestão: cubra C com uma quantidade finita de segmentos cuja soma dos comprimentos pode ser tão
pequena quanto queiramos e proceda como no Exercício 84
Exercício 86 Mostre que se A possui medida nula em Rn , os conjuntos A e ∂ A não necessariamente possuem
medida nula.
Exercício 87 Mostre que qualquer subconjunto de Rn−1 × {0} possui medida nula em Rn .
Exercício 88 Seja f : [a, b] → R uma função contínua. Mostre que o gráfico de f , definido por
Exercício 89 Sejam Q ⊂ Rn um retângulo e f : Q → R uma função limitada. Mostre que se f se anula exceto em
um conjunto fechado B de medida nula, então f é integrável e
Z
f = 0.
Q
Exercício 90 Seja A ⊂ R2 um aberto e f : A → R de classe C2 . Use o Teorema de Fubini para mostrar que
D2 D1 f (x) = D1 D2 f (x), para todo x ∈ A.
Sugestão: se D2 D1 f (x0 ) − D1D2 f (x0 ) > 0 para algum x0 ∈ A, então existe um retângulo contendo x tal que
D2 D1 f (x) − D1 D2 f (x) > 0 em todo este retângulo.
a) Mostre que S é denso em Q mas que qualquer reta paralela aos eixos coordenados contém, no máximo, um
subconjunto finito de S.
82 CAPÍTULO 4. INTEGRAÇÃO
b) Defina f : Q → R por
0 se (x, y) ∈ S,
f (x, y) =
1 se (x, y) ∈ Q \ S.
Mostre que
Z 1 Z 1 Z 1 Z 1
f (x, y)dy dx = f (x, y)dx dy = 1
0 0 0 0
mas que a integral Z
f
Q
não existe.
Exercício 95 Mostre que a união finita de conjuntos retificáveis é retificável. A união enumerável de conjuntos
retificáveis é retificável?
Exercício 97 Suponha que um subconjunto limitado S de Rn possua no máximo uma quantidade finita de pontos
de acumulação. Mostre que S é retificável e que v(S) = 0.
Exercício 98 Seja S ⊂ Rn limitado. Mostre que se S é retificável então S também será e v(S) = v(S). Dê um
exemplo de um conjunto não retificável S tal que S e IntS são retificáveis.
Exercício 99 Seja f : R → R dada por f (x) = x. Mostre que, dado λ ∈ R, existe uma sequência CN de compactos
retificáveis que cobre R, satisfazem CN ⊂ IntCN+1 para cada N e
Z
lim f = λ.
N→∞ CN
Exercício 100 Verifique que o Teorema 4.8.3 não é válido se o intervalo I é ilimitado.
d) Dê um exemplo de uma função não-decrescente em [0, 1] que seja discontínua em uma quantidade infinita
de pontos.
Exercício 103 (Desigualdade de Young) Seja f uma função contínua, crescente e tal que f (0) = 0. Demonstre
que, para quaisquer a, b > 0, temos que
Z a Z b
ab ≤ f+ f −1 .
0 0
Exercício 104 a) Demonstre que se f : [a, b] → R é integrável e se m ≤ f (x) ≤ M para todo x ∈ [a, b], então
existe µ ∈ [m, M] tal que
Z b
f = (b − a)µ .
a
b) Demonstre que se f : [a, b] → R for contínua, então existe ξ ∈ [a, b] tal que
Z b
f = (b − a) f (ξ ).
a
Para integrais de funções de uma variável sabemos que vale o resultado conhecido como mudança de variáveis:
Z g(b) Z b
f (x)dx = f (g(t))g′ (t)dt,
g(a) a
sempre que g′ (t) 6= 0 para t ∈ [a, b] (na verdade veremos que esta condição pode ser relaxada). Pretendemos
neste capítulo apresentar uma demonstração deste resultado para o caso geral de uma função f definida em um
subconjunto aberto de Rn .
A demonstração que daremos do Teorema de Mudança de Variáveis utiliza a noção de partições da unidade,
a qual será utilizada para reformular a definição da integral de uma função sobre um subconjunto aberto. Além
disso, necessitaremos de algumas informações fundamentais sobre difeomorfismos em Rn .
Lema 5.1.1 Seja Q ⊂ Rn um retângulo. Então existe uma função φ : Rn → R de classe C∞ tal que φ (x) > 0 para
x ∈ Int Q e φ (x) = 0 caso contrário.
85
86 CAPÍTULO 5. O TEOREMA DE MUDANÇA DE VARIÁVEIS
Lema 5.1.2 Seja A uma coleção de subconjuntos abertos em Rn e seja A a união desses subconjuntos. Então
existe uma sequência de retângulos Q1 , Q2 , . . ., todos eles contidos em A, tais que:
c) cada ponto de A possui uma vizinhança que intercepta somente uma quantidade finita de retângulos Qi ’s.
Observação 5.1.3 Se uma cobertura de um subconjunto A satisfaz a propriedade do item c), dizemos que ela é
localmente finita.
Demonstração do Lema 5.1.2 Seja D1 , D2 , . . . uma sequência de subconjuntos compactos que estão contidos em
A cuja a união é A (não é necessário que sejam retificáveis) e tais que Di ⊂ IntDi+1 para cada i. Para conveniência
na notação, definimos Di = 0/ se i ≤ 0.
Cx
x Di
Di−1
Di−2
Bi
Para cada i, seja Bi := Di \ IntDi−1 . Então cada Bi é um subconjunto fechado, pois é a intersecção de Di com
Rn \ IntDi−1 . Como obviamente eles são limitados, temos que Bi é compacto. Note ainda que Bi ∩ Di−2 = 0, / já
que Di−2 ⊂ IntDi−1 .
Para cada x ∈ Bi , escolhemos um cubo fechado Cx , centrado em x, contido em A e disjunto de Di−2 . Além
disso, escolha Cx pequeno de forma que esteja contido em algum elemento de A .
Como os interiores dos cubos Cx cobrem Bi , podemos escolher uma quantidade finita destes cubos cujos
interiores ainda cobrem Bi . Defina Ci a coleção finita destes cubos que cobrem Bi e
C := C1 ∪ C2 ∪ . . . .
Segue que C é uma coleção enumerável de retângulos (cubos), os quais mostraremos que satisfazem as proprieda-
des que necessitamos.
Por construção, cada elemento de C está contido em um elemento de A e segue o item b).
Dado x ∈ A, seja i o menor inteiro tal que x ∈ Int Di . Então x ∈ Di mas x 6∈ IntDi−i , e portanto x ∈ Bi . Como
os interiores dos cubos cobrem Bi , temos que x pertence a alguns desses interiores e segue o item a).
Seja x ∈ A. Então x ∈ IntDi , para algum i. Cada cubo de Ci+2 , C1+3 , . . . é disjunto de Di , por construção.
Segue que o conjunto IntDi pode interceptar somente os cubos de C1 , . . . , Ci+1 , ou seja, uma quantidade finita de
cubos.
5.1. PARTIÇÕES DA UNIDADE 87
Notemos ainda que supp φ pode ser caracterizado pela propriedade que se x 6∈ supp φ , então existe uma
vizinhança de x na qual φ é identicamente nula.
Teorema 5.1.5 Seja A uma coleção de conjuntos abertos em Rn e seja A a união desses abertos. Existe uma
sequência φ1 , φ2 , . . . de funções contínuas φi : Rn → R tais que:
e) cada φi é de classe C∞ ;
f) para cada i, o conjunto Si é compacto;
g) para cada i, o conjunto Si está inteiramente contido em um elemento de A .
Definição 5.1.6 Uma coleção de funções {φi } satisfazendo as condições a)–d) do Teorema 5.1.5 é chamada de
partição da unidade. Se satisfaz e), dizemos que a partição da unidade é de classe C∞ . Satisfazendo f), ela é dita
com suporte compacto e no caso de satisfazer g), ela é dita subordinada à coleção (ou dominada pela coleção)
A.
Demonstração do Teorema 5.1.5 Dada a coleção A , seja Q1 , Q2 , . . . a sequência de retângulos dada pelo Lema
5.1.2. Para cada i, seja ψi : Rn → R uma função de classe C∞ que é estritamente positiva em Int Qi e zero caso
contrário. Assim, ψi (x) ≥ 0 para todo x ∈ Rn . Além disso, observe que supp ψi = Qi , o qual é um subconjunto
compacto de A que está contido em um elemento de A . Finalmente, cada x ∈ A possui uma vizinhança que inter-
cepta somente uma quantidade finita de conjuntos Qi . Segue que a sequência {ψi } satisfaz todas as propriedades
listadas no teorema exceto d).
Pela condição c), para cada x ∈ A, a série
∞
λ (x) := ∑ ψi (x)
i=1
converge, já que somente uma quantidade finita de parcelas é não-nula. Por este mesmo motivo, para cada x, λ é
soma finita de funções de classe C∞ , e portanto é de classe C∞ . Finalmente, λ (x) > 0 para todo x ∈ A já que cada
x pertence ao interior de um retângulo Qi , onde ψi (x) > 0. Definamos então
ψi (x)
φi (x) := .
λ (x)
A sequência {φi } satisfaz todas as propriedades listadas no teorema.
Queremos explorar a conexão entre partições da unidade e integrais estendidas. Necessitamos ainda de outro
lema técnico.
Lema 5.1.7 Seja A ⊂ Rn um aberto e f : A → R uma função contínua. Se f se anula fora de um conjunto de
subconjunto compacto C ⊂ A, então f é integrável em A e em C e
Z Z
f= f.
A C
88 CAPÍTULO 5. O TEOREMA DE MUDANÇA DE VARIÁVEIS
Demonstração. A função contínua f se anulando fora de C e sendo contínua em A, temos que fC será contínua e
limitada em Rn , e portanto será integrável em qualqyer retângulo contendo C, ou seja, f é integrável em C.
Seja {Ci } uma sequência de compactos retificáveis cuja união é A e tais que Ci ⊂ IntCi+1 para cada i. Segue
que C pode ser coberto por uma quantidade finita de conjuntos IntCi , e portanto apenas por um destes conjuntos,
digamos IntCM . Como f se anula fora de C, temos que
Z Z Z
f= f= f,
C CM CN
Teorema 5.1.8 Seja A ⊂ Rn um aberto e f : A → R uma função contínua. Seja {φi } uma partição da unidade em
A possuindo suporte compacto. Então f é integrável em A se, e somente se, a série
∞ Z
∑ A
φi | f |
i=1
Como D é qualquer subconjunto compacto retificável de A, tomando o sup para termos a definição de integral
estendida obtemos que
Z ∞ Z
f ≤∑ φi f .
A i=1 A
5.2. PROPRIEDADES DE DIFEOMORFISMOS EM RN 89
Agora suponhamos que f seja integrável em A. Notemos que f (x) ≥ ∑∞ i=1 φi (x) f (x) para todo x ∈ A. Segue
que, dado um inteiro não-negativo N, por comparação e linearidade da integral,
N Z Z N Z
∑ A
φi f =
A
∑ φi f ≤
A
f.
i=1 i=1
Passo 2: No caso em que f não é necessariamente não-negativa, consideremos | f |. Pelo Passo 1, | f | é integrável
em A se, e somente se, a série
∞ Z
∑ φi | f | A
i=1
converge. Mas, pelo Teorema 4.7.4, f é integrável em A se, e somente se, | f | é integrável em A, o que demonstra
uma parte do resultado.
Por outro lado, se f é integrável em A, pela própria definição e pelo Passo 1 temos que
Z Z Z ∞ Z ∞ Z ∞ Z
f= f+ − f− = ∑ φi f+ − ∑ φi f− = ∑ φi f ,
A A A i=1 A i=1 A i=1 A
onde na última igualdade usamos que uma série convergente pode ser adicionada termo a termo. Isto finaliza a
demonstração do Teorema.
Q = [a1 , b1 ] × . . .[an , bn ]
em Rn , então Q pode ser coberto por uma quantidade finita de cubos, cada um tendo largura menor que δ , e com
soma total dos volumes menor que 2v(Q). Isto será suficiente pois, se S possui medida nula em Rn , então cobrimos
S com retângulos que possuem soma total dos volumes menor que ε /2.
Vamos supor ainda que, para cada i = 1, . . . , n, temos ai > 0. Caso contrário, basta transladarmos o retângulo
Q por Q + p, onde p ∈ Rn é um ponto escolhido idealmente.
Seja λ > 0 tal que o retângulo
Qλ := [a1 − λ , b1 + λ ] × . . . × [an − λ , bn + λ ]
90 CAPÍTULO 5. O TEOREMA DE MUDANÇA DE VARIÁVEIS
Segue que
Agora finalmente demonstraremos o lema. Suponha então que E ⊂ Rn S possua medida nula em Rn . Seja
{Ck } uma sequência de compactos de A com Ck ⊂ IntCk+1 para cada k e A = ∞ k=1 Ck . Definamos Ek := Ck ∩ E.
Lembremos que é suficiente demonstrar que cada g(Ek ) possui medida nula em Rn , já que estes conjuntos cobrem
g(E).
Como Ck ⊂ IntCk+1 e Ck é compacto, escolhemos δ > 0 tal que a δ -vizinhança de Ck (na métrica do sup),
está contida em IntCk+1 . Sejam M tal que
Podemos ainda cobrir Ek com uma quantidade enumerável de cubos fechados, cada uma deles com largura menor
ε
que δ e com soma total dos volumes menor que ε ′ = .
(nM)n
5.2. PROPRIEDADES DE DIFEOMORFISMOS EM RN 91
Seja {Di } a sequência de tais cubos. Como a largura da cada Di é menor que δ , temos que Di ⊂ Ck+1 . Segue
′
que |Dg(x)| ≤ M para todo x ∈ Di , de forma que g(Di ) está contido em um cubo Di com largura dada por (nm)L,
′
onde L é a largura de Di . Note ainda que o cubo Di possui volume dado por
′
v(Di ) = (nM)n (L)n = (nM)n v(Di ).
Assim,
∞
′
∑ v(Di ) = (nM)n ε ′ = ε .
i=1
′
Como a sequência {Di } cobre g(Ek ), o resultado segue.
Demonstração. Seja U ⊂ A um aberto. Como g é im difeomorfismo, temos que g(U) é aberto de B. Assim,
g(IntD) é aberto de B e está contido em g(D) = E, isto é,
e por simetria
g−1 (Int E) ⊂ IntD. (5.2)
Combinando (5.1) e (5.2) obtemos que g(IntD) = Int E.
Por outro lado, g((ExtD) ∩ A) é um subconjunto aberto de B. Pela injetividade de g, g((Ext D) ∩ A) ∩ g(D) =
0.
/ E como g(D) = E,
g((ExtD) ∩ A) ⊂ Ext E. (5.3)
Mostremos que (5.3) implica em
∂ E ⊂ g(∂ D). (5.4)
De fato, seja y ∈ ∂ E. Sendo E compacto, temos E fechado. Logo y ∈ ∂ E e, em particular, y ∈ B. Seja x ∈ A tal
que g(x) = y. Notemos que x 6∈ IntD por (5.1) e x 6∈ Ext D por (5.3). Segue que x ∈ ∂ D e assim y ∈ g(∂ D).
Por simetria,
∂ D ⊂ g−1 (∂ E). (5.5)
Por (5.4) e (5.5) temos g(∂ D) = ∂ E. Isto conclui a demonstração do item a).
Para verificarmos o item b) lembremos que, se D é retificável, então a medida de ∂ D é nula em Rn . Mas daí
o Lema 5.2.1 implica que g(∂ D) = ∂ E também possui medida nula em Rn , ou seja, E é retificável.
Nosso próximo resultado nos diz que um difeomorfismo pode, localmente, ser decomposto como produto de
difeomorfismos de certos tipos especiais. Este resultado técino de certa forma generaliza um resultado de Álgebra
Linear que afirma que toda matriz não-singular é produto de matrizes elementares.
Demonstração. O teorema será demonstrado para casos particulares inicialmente e assim dividiremos a prova em
4 passos.
Passo 1. Seja T : Rn → Rn uma transformação linear inversível, isto é, T (x) = Cx, onde C é uma matriz não-
singular. Mostremos que T se fatora como produto de transformações lineares inversíveis e primitivas.
Sabemos que cada matriz não-singular é decomposta como produto de matrizes elementares. Tais matrizes
são obtidas da matriz identidade através de 3 operações fundamentais:
2- trocar a i-ésima linha (coluna) pela i-ésima linha (coluna) somada com j-ésima linha (coluna) multiplicada
por um escalar;
Notemos que as matrizes elementares obtidas da matriz identidade pelas operações 2- e 3- dão origem a
transformações lineares primitivas. Vamos verificar que a operação 1- pode ser obtida como composição das
operações 2- e 3-. Assim, matrizes elementares obtidas da identidade pela operação 1- dão origem a tranformações
lineares que são escritas como produto de transformações lineares primitivas. Este resultado segue observando a
seguinte tabela:
linha i linha j
estado inicial A B
troque linha i por linha i – linha j A−B B
troque linha j por linha j + linha i A−B A
troque linha i por linha i – linha j −B A
multiplique linha i por −1 B A
Passo 2. Vamos supor agora que o difeomorfismo é uma translação. Assim, seja t : Rn → Rn dada por t(x) = x + c,
onde c ∈ Rn é um ponto fixado. Então t = t1 ◦ t2 , onde
Como as primeiras n − 1 linha de Dh(x) são iguais às primeiras n − 1 linhas de Dg(x), temos que Dh(0) = In . Segue
do Teorema da Função Inversa que h é um difeomorfismo de uma vizinhança V0 de 0 com um aberto V1 ⊂ Rn .
Seja k : V1 → Rn dada por
k(y) = (y1 , . . . , yn−1 , gn (h−1 (y))).
Notemos que k(0) = (0, . . . , 0, gn (0)) = 0. Além disso,
In−1 0
Dh(y) = .
D(gn ◦ h−1 )(y)
Notemos ainda que
D(gn ◦ h−1)(0) = Dgn (h−1 (0)) · Dh−1 (0)
= Dgn (0) · (Dh(0))−1
= (0 ... 0 1).
Segue que Dk(0) = In e k é um difeomorfismo de uma vizinhaça W1 de 0 em um aberto W2 de Rn .
Seja W0 = h−1 (W1 ). Temos então a seguinte sequência de difeomorfismos:
h k
W0 → W1 → W2 .
Obviamente h e k são difeomorfismos primitivos. Resta-nos mostrar que k ◦ h = gW : Se x ∈ W0 , então:
0
Passo 4. Consideremos agora o caso geral enunciado no teorema. Dado g : A → B e fixado x0 ∈ A, seja C = Dg(x0 ).
Definamos as translações t1 ,t2 , T : Rn → Rn por
t1 (x) = x + x0, t2 (x) = x − g(x0) e T (x) = C−1 x.
Seja g̃ := T ◦ t2 ◦ g ◦ t1 . Então g̃ é um difeomorsfimo do conjunto aberto t1−1 (A) ⊂ Rn no aberto T (t2 (B)) ⊂ Rn .
Além disso, pela regra da cadeia:
g̃(0) = 0 e Dg̃(0) = In .
O resultado segue escrevendo g = t2−1 ◦ T −1 ◦ g̃ ◦ t1−1 e aplicando os passos 1, 2 e 3 aos difeomorfismos do lado
direito.
Teorema 5.3.1 Sejam g : [c, d] → R uma função de classe C1 e f : g([c, d]) → R contínua. Definamos
Z x
F(x) := f (t)dt, x ∈ g([c, d]).
g(c)
Demonstração. Como g′ e f ◦ g são contínuas no compacto [c, d], temos que a integral em questão existe. Defina-
mos então Z x
G(x) := f (g(t))g′ (t)dt.
c
Queremos concluir que G(x) = F(g(x)). Notemos pelo Teorema Fundamental do Cálculo que
É interessante observar que a maioria dos livros demonstram o Teorema 5.3.1 no caso em que g′ (x) 6= 0 em
[c, d], o que não é necessário. Uma demonstração ainda mais geral pode ser encontrada em [?], a qual não requer
nem mesmo a continuidade de f e de g′ .
Consideremos por um momento o caso especial do Teorema 5.3.1 em que g′ não se anula em J = [c, d].
Com isso, g é estritamente crescente ou estritamente decrescente em J. Suponha que g′ (x) > 0 em J. Segue que
g(c) < g(d) e assim g(J) = [g(c), g(d)] pelo Teorema do Valor Intermediário. A fórmula de mudança de varáveis
pode então ser escrita como Z Z
f (x)dx = f (g(t))g′ (t)dt. (5.6)
g(J) J
Por outro lado, se g′ (x) < 0 em J, teremos g(c) > g(d) e assim g(J) = [g(d), g(c)]. Com isso podemos escrever
Z Z
f (x)dx = − f (g(t))g′ (t)dt. (5.7)
g(J) J
Esta última fórmula é interessantes pois ela está no estilo em que enunciaremos a foma geral do Teorema de
Mudança de Variáveis, o qual apresentamos loga a seguir.
Notemos que o Teorema 5.3.2, mesmo quando n = 1, é mais geral que o Teorema 5.3.1, já que agora estamos
incluindo o caso de integrais impróprias.
( f1 ◦ g)| detDg| e ( f2 ◦ h)| det Dh| são integráveis em U e em V respectivamente ainda vale a fórmula sugerida.
Com estas hipóteses, então o resultado vale para h ◦ g.
Passamos à demonstração do Passo 1. Dada f : W → R contínua e integrável, segue por hipótese que
Z Z Z
f= ( f ◦ h)| detDh| = ( f ◦ h) ◦ g| detDh| ◦ g| detDg|, (5.8)
W V U
onde usamos f2 = f e f1 = ( f ◦ h)| detDh|, que são contínuas e integráveis. Por outro lado, usando a Regra da
Cadeia obtemos que
D(h ◦ g)(x) = Dh(g(x)) · Dg(x), para qualquer x ∈ U,
e pelas propriedade da função determinante segue que
detD(h ◦ g)(x) = det(Dh(g(x))) det(Dg(x)). (5.9)
Substituindo (5.9) em (5.8) obtemos
Z Z
f= f ◦ (h ◦ g)| detD(h ◦ g)|,
W U
Passo 2. Suponhamos que cada x ∈ A possua uma vizinhança U ⊂ A tal que o resultado vale para o difeomorfismo
g : U → V , onde V = g(U), e para toda função contínua f : V → R que possui suporte compacto contido em V .
Então mostraremos que o resultadoo vale para g : A → B e toda função contínua f : B → R (estamos usando um
abuso de notação e denotando também por g a restrição gU ).
Nesta parte da demonstração usaremos partição da unidade. Inicialmente, cobrimos A com uma coleção de
abertos Uα ⊂ Rn tais que, se Vα = g(Uα ), então o resultado vale para o difeomorfismo g : Uα → Vα e toda função
contínua f : Vα → R tal que supp f ⊂⊂ Vα .1 Notemos que B é coberto pelos abertos Vα . Escolhemos uma partição
da unidade {φi } em B com suporte compacto dominada pela coleção {Vα }. Pelo Exercício 107 a coleção {φi ◦ g}
é uma partição da unidade em A com suporte compacto dominada por {Uα }.
Seja f : B → R contínua e integrável em B. Pelo Teorema 5.1.8 temos que
Z ∞ Z
f =∑ φi f .
B i=1 B
Dado i, escolhemos α tal que supp φi ⊂⊂ Vα . A função φi f é contínua em B e se anula fora do compacto supp φi .
Pelo Lema 5.1.7 Z Z Z
φi f = φi f = φi f .
B supp φi Vα
A hipótese neste passo implica que
Z Z
φi f = (φi ◦ g)( f ◦ g)| detDg|.
Vα Uα
Usando novamente o Lema 5.1.7 e o fato que φi ◦ g se anula fora do compacto supp φi ◦ g obtemos
Z Z
φi f = (φi ◦ g)( f ◦ g)| detDg|.
B A
Como | f | é integrável em B, a igualdade (5.10) vale com | f | no lugar de f . Como φi ◦ g é uma partição da unidade
em A, temos pelo Teorema 5.1.8 que ( f ◦ g)| det Dg| é integrável em A. Daí aplicamos (5.10) à f para conluirmos
que Z Z
f= ( f ◦ g)| detDg|.
B A
1
A notação supp f ⊂⊂ Vα siginifica que supp f é um compacto contido no aberto Vα .
96 CAPÍTULO 5. O TEOREMA DE MUDANÇA DE VARIÁVEIS
Passo 4. Para n > 1, mostremos que se o resultado vale para um difeomorfismo primitivo h : U → V , com U,V ⊂ Rn
abertos, então ele vale para um difeomorfismo qualquer g : A → B.
De fato, se g : A → B é um difeomorfismo qualquer, então fixamos x ∈ A e uma vizinhança U0 de x na qual
gU se escreve como composição de difemorfismos primitivos como no Teorema 5.2.4. Supondo que o resultado
0
vale para cada um desses difeomorfismos, então o Passo 1 implica que ele vale para gU . Mas aí o Passo 2 implica
0
que o resultado vale para g, já que x ∈ A é arbitrário.
Passo 5. Agora mostramos que se o resultado vale em dimensão n − 1, então ele vale para n. Mas pelo Passo 4,
basta demonstrarmos este fato para um difeomorfismo primitivo h : U → V , U,V ⊂ Rn abertos. Podemos assumir,
sem perda de generalidade, que h preserva a última coordenada.
Seja x0 ∈ U e y0 = h(x0 ). Tomemos um retângulo Q contido em V cujo interior contém y0 e definamos
S := h−1 (Q). Segue que h : IntS → Int Q é também um difeomorfismo. Como x0 é arbitrário, basta demonstrarmos
pelo Passo 2 que o resultado vale para h : Int S → IntQ e para qualquer função contínua f : IntQ → R cujo suporte
é um subconjunto compacto de IntQ.
Como a função ( f ◦ h)| detDh| se anula fora de um compacto de IntS, precisamos demonstrar que
Z Z
f= ( f ◦ h)| detDh|.
Int Q Int S
Estendemos f em todo Rn definindo-a como sendo 0 fora de IntQ. Defina ainda F : Rn → R como sendo a
extensão de ( f ◦ h)| detDh| como sendo 0 fora de IntS. Ambas, f e F são contínuas e desejamos demonstrar que
Z Z
f= F.
Q S
Mas usando o Teorema de Fubini (Teorema 4.4.1), esta última igualdade entre integrais é equivalente à seguinte:
Z Z Z Z
f (y,t) = F(y,t).
t∈I y∈D t∈I x∈E
Mas além disso, basta mostrarmos que as integrais internas são iguais.
Fixado t, a intersecção de U e de V com Rn−1 × {t} são conjuntos da forma Ut × {t} e Vt × {t}. Como F se
anula fora de S, segue que a igualdade que devemos provar é a seguinte:
Z Z
f (y,t) = F(y,t).
y∈Vt x∈Ut
V
U h
S Ut × {t} Vt × {t} Q
∂k
e pelas propriedades de determinates temos que det Dh = det . Assim, para t fixado, k(x,t) é não-singular. Além
∂x
1
disso, ela aplica Ut em Vt bijetivamente e é de classe C . O Teorema da Função Inversa implica que k(·,t) é um
difeomorfismo de abertos de Rn−1 .
Aplicando a hipótese de indução temos que, para t fixado:
Z Z
∂ k
f (y,t) = f (k(x,t),t) det
y∈Vt x∈Vt ∂x
Z
= f (h(x,t))| det Dh|
x∈Vt
Z
= F(x,t).
x∈Vt
Demonstração. Basta aplicarmos o Teorema 5.3.2 ao difeomorfismo g−1 : B → A e à aplicação F = ( f ◦g)| detDg|,
a qual é contínua em A. Os detalhes serão omitidos e deixados como exercício.
Para cada inteiro m ≥ 0, defina φ2m+1 (x) = f (x − mπ ) e, para cada inteiro m ≥ 1, defina φ2m (x) = f (x + mπ ).
Mostre que {φi } é uma partição da unidade em R.
está bem definida e é de classe Cr em Rn . Utilize isto para provar o seguinte resultado: se f : S → R é de classe
Cr em cada ponto x ∈ S, então f pode ser estendida à uma função de classe h : A → R de classe Cr , definida em
um subconjunto aberto A ⊂ Rn que contém S.
Sugestão: cubra S por vizinhanças apropriadas e seja A a união dessas vizinhanças. Tome uma partição da
unidade subordinada a esta cobertura.
Exercício 107 Sejam A, B ⊂ Rn abertos e g : A → B um difeomorfismo. Suponha que {Vα } é uma cobertura de
B e seja {φi } uma partição da unidade em B com suporte compacto e dominada por {Vα }. Mostre que {φi ◦ g} é
uma partição
Exercício 108 Mostre que se f : R2 → R é de classe C1 , então f não pode ser injetora.
Sugestão: se D f (x) = 0 para todo x, então f é constante; caso contrário aplique o Teorema da Função
Implícita.
Exercício 109 Mostre que se f : R → R2 é de classe C1 , então f não pode ser sobrejetora. De fato, mostre que
f (R) não contém subconjunto aberto de R2 .
Exercício 110 Demonstre uma generalização do Teorema 5.2.4 no qual a afirmação cada hi é primitivo é trocada
por cada hi preserva todas a menos de uma coordenada.
Sugestão: suponha x0 = 0, g(x0 ) = 0 e Dg(0) = In . Então g pode ser fatorada como g = k ◦ h, onde
e k preserva todas a menos da i-ésima coordenada e, além disso, h(0) = k(0) = 0 e Dh(0) = Dk(0) = In .
Exercício 111 Seja A ⊂ Rn um aberto e g : A → Rn uma função localmente Lipschitz. Mostre que se E ⊂ A possui
medida nula em Rn , então g(E) também possui medida nula em Rn .
a) Mostre que o item a) do Teorema 5.2.2 vale somente sob a hipótese de que g e g−1 são contínuas.
b) Mostre que o item b) do Teorema 5.2.2 vale somente sob a hipótese de que g é localmente Lipschitz e g−1 é
contínua.
Exercício 113 Refaça com detalhes os exemplos 1, 2, 3, 4 e 5 da Seção 17 e o exemplo 1 da Seção 19 da referência
[10].
Exercício 115 Seja πk : Rn → R a função projeção dada por πk (x) = xk . Seja S ⊂ Rn um conjunto retificável
com volume não-nulo. O centróide de S é definido como sendo o ponto c(S) ∈ Rn cuja k-ésima coordenada, para
cada k, é dada por Z
1
ck (S) := πk .
v(S) s
Dizemos que um conjuntos S ⊂ Rn , retificável é simétrico com relação ao subespaço xk = 0 de Rn se a
transformação
h(x) = (x1 , . . . , xk−1 , −xk , xk+1 , . . . , xn )
aplica S em si mesmo. Mostre neste caso que ck (S) = 0.
Exercício 116 Seja A ⊂ Rn−1 um aberto retificável. Dado um ponto P ∈ Rn com Pn > 0, seja S ⊂ Rn o subconjunto
definido por
S := {x | x = (1 − t)Q + tP onde Q ∈ A × {0} e 0 < t < 1}.
O conjunto S é chamado de cone com base A × {0} e vértice P.
a) Mostre que
v(Bnr ) = λn rn ,
onde λn = v(Bn1 ).
b) Encontre λ1 e λ2 .
c) Supondo n ≥ 3, obtenha a fórmula:
Z 2π Z 1
2π
λn = λn−2 (1 − r2)n/2−1 rdrd θ = λn−2
0 0 n
d) Deduzir que
π n/2
λn = ,
Γ(1 + n/2)
onde Z ∞
Γ(y) = e−x xy−1 dx.
0
Formas diferenciais
Neste capítulo introduziremos o conceito de formas diferenciais, as quais serão utilizadas para tratarmos de uma
versão generalizada do Teorema de Stokes em Rn . Este caso geral que trataremos necessita de conceitos mais po-
derosos que aqueles provindos da Álgebra Linear e do Cálculo de Várias Variáveis. De uma certa maneira, estamos
interessados em estudar aproximações multi-lineares de objetos suaves, generalizando o conceito de aproximação
linear desenvolvido em Cálculo. Necessitaremos assim desenvolver ferramentas provindas da Álgebra Multilinear.
Nas próximas primeiras seções deste capítulo desenvolveremos conceitos puramente algébricos.
As formas diferenciais desempenham um papel importante no estudo de variedades diferenciáveis. Primeira-
mente, objetos clássicos como gradiente, divergente, rotacional e os resultados envolvendo tais operadores podem
ser escritos de maneira concisa em termos de formas diferenciais. A consequência desse fato é que podemos de-
senvolver uma teoria de integração em variedades que, de certa forma, independe do sistema de coordenadas. Um
outro ponto importante é que as formas diferenciais nos permitem construir os grupos de de Rham, relacionando a
topologia da variedade com sua estrutura analítica.
é linear.
Dizemos que f : V k → R é multilinear (ou k-linear) se ela é linear na i-ésima coordenada para cada i =
1, . . . , k.
Podemos citar dois exemplos simples: para k = 1, L 1 (V ) = V ∗ , o dual de V ; para k = 2, temos que L 2 (V )
é o conjunto de todas as aplicações bilineares de V .
Sendo um k-tensor uma função multilinear que associa a cada k-upla de vetores em V um número real, dois
k-tensors podem ser somados e multiplicados por escalares (elementos de R). Com a definição natural de soma
pontual e multiplicação por escalares temos que L k (V ) é um espaço vetorial. Deixemos este fato documentado
em forma de teorema.
101
102 CAPÍTULO 6. FORMAS DIFERENCIAIS
Teorema 6.1.2 O conjunto de todos os k-tensores em V constitui um espaço vetorial sobre R se definirmos a soma
de k-tensores e produto por um escalar respectivamente por
( f + g)(v1 , . . . , vk ) = f (v1 , . . . , vk ) + g(v1, . . . , vk ) e (α f )(v1 , . . . , vk ) = α f (v1 , . . . , vk ).
Como no caso de transformações lineares, um tensor fica completamente determinado pelo seu valor nos
elementos da base do espaço vetorial em questão.
Dado um conjunto {1, 2, . . . , n}, uma k-lista de inteiros deste conjunto é uma k-upla I = (i1 , . . . , ik ), onde
i1 , . . . , ik são elementos de {1, 2, . . . , n}.
Lema 6.1.3 Seja {e1 , . . . , en } uma base do espaço vetorial (de dimensão finita) V . Se f , g : V k → R são dois
k-tensores em V que satisfazem
f (ei1 , . . . , eik ) = g(ei1 , . . . , eik )
para toda k-lista I = (i1 , . . . , ik ) de inteiros do conjunto {1, . . . , n}, então f = g.
Demonstração. Seja (v1 , . . . , vk ) ∈ V k . Expressamos cada vi como soma dos elementos da base de V da forma:
n
vi = ∑ αi j e j .
j=1
= g(v1 , . . . , vk ).
Teorema 6.1.4 Sejam V um espaço vetorial com base {e1 , . . . , en } e fixemos uma k-lista I = (i1 , . . . , ik ) de inteiros
do conjunto {1, . . . , n}. Dada uma outra k-lista J = ( j1 , . . . , jk ) de inteiros de {1, . . . , n}, existe um único k-tensor
φI em V que satisfaz:
0 se I 6= J,
φI (e j1 , . . . , e jk ) =
1 se I = J.
Os tensores da forma φI , quando I percorre todas as k-listas de inteiros de {1, . . . , n}, forma uma base de L k (V )
e são chamados de k-tensores elementares. Em particular, dim L k (V ) = nk .
Demonstração. Consideremos inicialmente o caso k = 1. Como sabemos da Álgebra Linear, podemos determinar
um funcional linear φi : V → R apenas especificando seu valor nos elementos de uma base de V . Definamos então
0 se i 6= j,
φi (e j ) =
1 se i = j.
Estes 1-tensores possuem todas as propriedades desejadas.
No caso k > 1, definimos φI por
φI (v1 , . . . , vk ) := φi1 (v1 )φ12 (v2 ) . . . φ1k (vk ).
É imediato verificar que φI é multilinear e satisfaz as propriedades desejadas. Verifiquemos que os k-tensores φI
formam uma base de L k (V ) quando I percorre todas as k-listas de inteiros {1, . . . , n}. Seja f ∈ L k (V ). Para cada
I = (i1 , . . . , ik ) defina o escalar dI por
dI := f (ei1 , . . . , eik ).
6.1. TENSORES E PRODUTOS TENSORIAIS 103
Vamos mostrar que f se escreve como combinação linear dos k-tensores φI e que os coeficientes escalares dessa
combinação são justamante dI . De fato, seja
g := ∑ dJ φJ ,
J
onde a soma se estende sob todas as k-listas de elementos de {1, . . . , n}. Então
Exemplo 6.1.5 Seja V = Rn e {e1 , . . . , en } sua base canônica. Então uma base de L 1 (V ) é dada por {φ1 , . . . , φn },
onde cada φi está definida em v = x1 e1 + . . . + xnen por
φi (v) = xi .
onde
v j = x1 j e1 + . . . + xn j en .
Logo, uma base de L k (V ) pode ser dada pelos monômios nas componentes do vetor v na base {e1 , . . . , en }.
Em particular, se f : V → R é um 1-tensor, então f é da forma
Vamos agora introduzir uma operação que podemos efetuar entre tensores em V de ordens diferentes.
Não é difícil verificar que f ⊗g é realmente multilinear. Será deixado também como exercício a demonstração
do próximo resultado, que lista algumas propriedades do produto tensorial.
1) f ⊗ (g ⊗ h) = ( f ⊗ g) ⊗ h;
2) (α f ) ⊗ g = α ( f ⊗ g) = f ⊗ (α g), para qualquer α ∈ R;
3) se f e g possuem a mesma ordem, então
( f + g) ⊗ h = f ⊗ h + g ⊗ h,
(6.1)
h ⊗ ( f + g) = h ⊗ f + h ⊗ g;
104 CAPÍTULO 6. FORMAS DIFERENCIAIS
φI = φi1 ⊗ . . . ⊗ φik ,
onde I = (i1 , . . . , ik ).
Definição 6.1.8 Seja T : V → W uma transformação linear entre os espaços vetoriais V e W . A transformação
dual de T é a aplicação
T ∗ : L k (W ) → L k (V )
definida como segue: se f ∈ L k (W ) e se v1 , . . . , vk são vetores de V , então
1) T ∗ é linear;
2) T ∗ ( f ⊗ g) = T ∗ f ⊗ T ∗ g;
Se denomina transposição uma permutação σ ∈ Sk para a qual existem dois inteiros distintos i e j tais que
σ (i) = j, σ ( j) = i e σ (l) = l se l 6= i, l 6= j.
Assim, uma trasposição permuta dois inteiros distintos e deixa os demais fixados. Note que neste caso σ 2 é a
identidade. Uma transposição elementar é uma transposição que permuta somente dois números consecutivos e
deixa os demais fixados. É possível provar o seguinte fato:
Fato 1: toda permutação σ ∈ Sk se escreve como produto de transposições elementares.
6.2. TENSORES ALTERNADOS 105
Uma outra informação importante é que, qualquer que seja a maneira que escrevemos uma permutação σ
como produto de transposições elementares, a quantidade destes fatores nunca muda. Assim, podemos definir
a função sinal de uma permutação sgn : Sk → {1, −1} por sgn(σ ) = 1 se σ se escreve como produto de um
número par de transposições elementares e sgn(σ ) = −1 se σ se escreve como produto de um número ímpar de
transposições elementares. Sendo assim, temos o seguinte:
Fato 2: a aplicação sgn : Sk → {1, −1} define um homomorfismo do grupo multiplicativo Sk no grupo multiplica-
tivo com dois elementos {1, −1}; além disso, se σ é uma transposição, então sgn(σ ) = −1.
Consideremos agora dois conjuntos quaisquer E e F e uma aplicação f : E k → F. Para σ ∈ Sk , definimos
σ f : E k → F pela equação
(σ f )(v1 , . . . , vk ) := f (vσ (1) , . . . , vσ (k) ).
Assim, σ f se deduz de f mediante uma permutação das variáveis. Observemos que se σ é a identidade, então
σ f = f . Ademais, se σ , τ ∈ Sk , então
(τσ ) f = τ (σ f ).
De fato, seja σ f = g. Temos por um lado que
O que acabamos de verificar nos diz, em outras palavras, que o grupo Sk opera à esquerda no conjunto das
funções de E k em F.
Vamos introduzir agora o importante subespaço A k (V ) de L k (V ).
Definição 6.2.1 Seja V um espaço vetorial (sobre R). Um k-tensor f ∈ L k (V ) é chamado alternado se tivermos
que f (v1 , . . . , vk ) = 0 sempre que vi = vi+1 para pelo menos um índice i, 1 ≤ i < k. Convencionaremos que, quando
k = 1, todo 1-tensor f ∈ L 1 (V ) é alternado. Denotaremos o conjunto dos k-tensores alternados em V por A k (V ).
Proposição 6.2.2 Seja f ∈ L k (V ). Então f é um k-tensor alternado se, e somente se, para qualquer permutação
σ ∈ Sk , tem-se que
f (vσ (1) , . . . , vσ (k) ) = sgn(σ ) f (v1 , . . . , vk ). (6.2)
Se f é um k-tensor alternado e se existirem dois índices distintos i e j tais que vi = v j , então f (v1 , . . . , vk ) = 0.
Agora notemos que, se σ , τ ∈ Sk , então (σ τ ) f = σ (τ f ) e que sgn(σ τ ) = sgn(σ ) sgn(τ ). Segue que se a
igualadade (6.2) vale para σ e para τ , então vale para α = σ τ . Como qualquer permutação é produto de um
número finito de transposições elementares, para as quais vale a relação (6.2), temos que esta igualdade vale para
qualquer σ ∈ Sk .
Reciprocamente, suponhamos que f ∈ L k (V ) satisfaça (6.2) para qualquer permutação σ ∈ Sk . Em particu-
lar, quando σ é uma transposição elementar que permuta dois índices consecutivos quaisquer i e i + 1, então
f (v1 , . . . , vk ) = − f (v1 , . . . , vk ),
ou seja, f (v1 , . . . , vk ) = 0.
Vamos agora encontrar uma base para este espaço vetorial. Observemos que, se k = 1, então nada temos a
fazer já que A 1 (V ) = L 1 (V ) = V ∗ . Além disso, no caso em que k > n = dimV , devemos ter A k (V ) o espaço
trivial. De fato, qualquer k-tensor f fica unicamente determinado pelo seus valore nas k-uplas de elementos da base
de V ; mas quando k > n, necessariamente um elemento da base deverá se repetir na k-upla; daí se f for alternado,
ele deve se anular em toda k-upla de elementos da base de V pela Proposição 6.2.2. Falta então analisar o caso em
que 1 < k ≤ n.
Dado um conjunto {1, 2, . . . , n}, uma k-lista ascendente I = (i1 , . . . , ik ) deste conjunto é uma k-lista que
satisfaz
i1 < i2 < . . . < ik .
Demonstração. Pelo Lema 6.1.3 é suficiente mostrar que f e g possuem o mesmo valor em uma k-upla arbitrária
(e j1 , . . . , e jk ) de elementos da base de V . Seja J = ( j1 , . . . , jk ). Caso um dos elementos jq e j p sejam iguais, então
tanto f quanto g serão zero nesta k-upla. Suponha então que a k-lista J seja formada por elementos distintos. Seja
σ ∈ Sk tal que a k-lista I = ( jσ (1) , . . . , jσ (k) ) seja ascendente. Então
g(e jσ (1) , . . . , e jσ (k) ) = f (e jσ (1) , . . . , e jσ (k) ).
Mas
f (e jσ (1) , . . . , e jσ (k) ) = σ f (e j1 , . . . , e jk ) = sgn(σ ) f (e j1 , . . . , e jk ).
Uma similar igualdade vale para g.
Teorema 6.2.4 Sejam V um espaço vetorial com base {e1 , . . . , en } e fixemos uma k-lista ascendente I = (i1 , . . . , ik )
de inteiros do conjunto {1, . . . , n}. Dada uma outra k-lista ascendente J = ( j1 , . . . , jk ) de inteiros de {1, . . ., n},
existe um único k-tensor alternado ψI em V que satisfaz:
0 se I 6= J,
ψI (e j1 , . . . , e jk ) =
1 se I = J.
6.2. TENSORES ALTERNADOS 107
Os tensores da forma ψI , quando I percorre todas as k-listas ascendentes de inteiros de {1, . . . , n}, formam uma
base de A k (V ) e são chamados de k-tensores alternados elementares. Tais tensores satisfazem a fórmula
ψI = ∑ sgn(σ )σ φI .
σ ∈Sk
Demonstração. Mostremos que ψI dado pela fórmula do teorema é um k-tensor alternado. Se τ ∈ Sk , temos
τψI = ∑ sgn(σ )τ (σ φI )
σ ∈Sk
= sgn(τ )ψI ,
Finalizaremos esta seção estabelecendo uma relação entre os tensores alternados em V = Rn e o determinante
de uma matriz.
Teorema 6.2.5 Seja ψI um k-tensor alternado elementar em Rn correspondente à base canônica de Rn , onde
I = (i1 , . . . , ik ) é uma k-upla ascendente de inteiros de {1, 2, . . . , n}. Dada uma k-upla de vetores v1 , . . . , vk em Rn ,
que podem ser escritos na forma
vi = (x1i , . . . , xni ), i = 1, . . . , k,
consideramos a matriz n × k
x11 ... x1k
.. .. ..
X = . . .
xn1 ... xnk
Então
ψI (v1 , . . . , vk ) = det XI ,
onde XI é a matriz cujas linhas são sucessivamente as linhas i1 , . . . , ik de X.
u = (x1 , x2 , x3 , x4 ),
v = (y1 , y2 , y3 , y4 ),
w = (z1 , z2 , z3 , z4 ).
108 CAPÍTULO 6. FORMAS DIFERENCIAIS
Então
xi yi zi
ψi jk (u, v, w) = det x j yj zj ,
xk yk zk
onde (i, j, k) = (1, 2, 3) ou (i, j, k) = (1, 2, 4) ou (i, j, k) = (1, 3, 4) ou (i, j, k) = (2, 3, 4).
h̃ = ∑ sgn(σ )σ h. (6.4)
σ ∈Sk,l
Aqui, Sk,l denota o subconjunto de Sk+l formado pelas permutações σ que são embaralhamentos simples, isto é,
tais que
σ (1) < . . . < σ (k) e σ (k + 1) < . . . < σ (k + l). (6.5)
Intuitivamente uma permutação σ ∈ Sk,l é obtida da seguinte forma: considere dois maços de cartas de um baralho,
o primeiro com k cartas e o segundo com l cartas; enumere as cartas do primeiro maço de 1 até k e do segundo
maço de k + 1 até k + l; se embaralharmos estes dois maços uma única vez deslizando o segundo maço sobre o
primeiro, as cartas se encontrarão em uma ordem tal que a relação de ordem induzida sobre cada um dos maços
iniciais continua a mesma. Assim a ação de embaralhar definiu uma permutação σ que satisfaz (6.5). Observe
ainda que o número das permutações σ ∈ Sk+l que satisfazem (6.5) é
(k + l)!
.
k!l!
Devemos efetivamente mostrar que h̃ definida em (6.4) é um k + l-tensor alternado. Suponhamos que
v1 , . . . , vk+l seja uma k + l-upla de vetores em V tais que dois vetores consecutivos sejam iguais, isto é, vi = vi+1
para algum 1 ≤ i < k + l. Queremos provar que
• considere as permutações σ ∈ Sk,l tais que σ −1 (i) e σ −1 (i + 1) são ambas menores ou iguais a k ou ambas
maiores ou iguais a k + 1. No primeiro caso, temos que vi e vi+1 figuram ambos entre os primeiros k lugares
na parcela sgn(σ )h(vσ (1) , . . . , vσ (k+l) ); logo, tal parcela se anula sendo h alternada nas k-primeiras variáveis.
No segundo caso a parcela também é nula por uma razão análoga.
6.3. PRODUTO EXTERIOR 109
• considere agora as permutações σ ∈ Sk,l tais que σ −1 (i) ≤ k e σ −1 (i + 1) ≥ k + 1 e as σ ∈ Sk,l tais que
σ −1 (i) ≥ k + 1 e σ −1 (i + 1) ≤ k. Seja τ a transposição elementar que permuta i e i + 1. Se σ está na
primeira subcategoria, então τσ está na segunda e reciprocamente. Assim, podmeos agrupar em dois a dois
os termos restantes da definição de h̃. Por exemplo, para cada σ tal que σ −1 (i) ≤ k e σ −1 (i + 1) ≥ k + 1,
tomaremos
sgn(σ )h(vσ (1) , . . . , vσ (k+l) ) − sgn(σ )h(vτσ (1) , . . . , vτσ (k+l) ),
e observamos que esta expressão é nula, pois a sequência τσ (1), . . . , τσ (k + l) é obtida de σ (1), . . . , σ (k + l)
trocando-se i e i + 1. Como vi = vi+1 , nada se altera ao calcularmos h nas respectivas k-uplas de vetores.
Segue que a aplicação ϕk,l : A k,l (V ) → A k+l (V ) está bem definida. Podemos então definir o produto que
nos interessa.
Definição 6.3.1 Dadas f ∈ A k (V ) e g ∈ A l (V ), o produto exterior de f com g é definido como sendo o elemento
ϕk,l (h) e denotado por f ∧ g. Em outras palavras,
f ∧ g(v1 , . . . , vk+l ) = ∑ sgn(σ ) f (vσ (1) , . . . , vσ (k) )g(vσ (k+1) , . . . , vσ (k+l) ).
σ ∈Sk,l
Nosso próximo passo será demonstrar que o produto exterior de tensores alternados é associativo. Entretanto,
necessitamos ainda de um lema preliminar.
Dados k, l, m três números inteiros, denotaremos por A k,l,m (V ) o subespaço de L k+l+m (V ) formado pelas
aplicações que são alternadas com relação às k primeiras varáveis, alternadas com relação às l seguintes variáveis
e alternadas com relação às m últimas variáveis.
Consideremos o seguinte diagrama:
ϕk,l
A k,l,m (V ) / A k+l,m (V ) (6.6)
ϕl,m ϕk+l,m
ϕk,l+m
A k,l+m (V ) / A k+l+m (V ).
A aplicação ϕk,l transforma um elemento u ∈ A k,l,m (V ) em um elemento ũ alternado com relação às k + l primeiras
variáveis (sem afetar as últimas), a saber:
onde o somatório percorre todas as permutações σ ∈ Sk+l+m que (com um abuso de notação) também pertencem à
Sk,l e deixam fixos os índices k + l + 1, . . . , k + l + m. Analogamante definimos a aplicação ϕl,m .
( f ∧ g) ∧ h = f ∧ (g ∧ h).
Sendo o produto exterior associativo, podemos considerar qualquer produto exterior finito de tensores alter-
nados f1 ∧ f2 ∧ . . . ∧ f p . No caso particular de funcionais lineares vemos que o produto exterior está intimanet
ligado com o cálculo de determinantes.
Demonstração. Basta usar a definição de produto exterior e indução em p. Além disso, note que a expressão que
surge no segundo termo da igualdade do enunciado é justamente a definição do determinante da matriz de entradas
fi (v j ).
Proposição 6.3.8 Dada uma base {e1 , . . . , en } do espaço vetorial V , seja {φ1 , . . . , φn } sua base dual. Se I =
(i1 , . . . , ik ) for uma k-lista ascendente de inteiros de {1, . . . , n} e ψI for o tensor alternado elementar correspon-
dente, então
ψI = φi1 ∧ . . . ∧ φik .
Uma forma diferencial de grau 0 nada mais é que uma função ω : U → R. Já uma forma diferencial de grau
1 é uma aplicação ω : U → L (Rn ).
Se ω : U → A k (Rn ) é uma k-forma diferencial, então podemos escrever
onde cada aI : U → R é uma função e I percorre o conjunto das k–uplas ascendentes de {1, . . . , n}. Diremos que
ω é de classe Cr se cada aI for de classe Cr em U. Como estamos mais interessados em k-formas diferenciais de
classe C∞ , para simplificar chamaremos as k-formas diferenciais de classe C∞ somente de k-forma diferenciais.
Utilizaremos a notação Ωk (U) para denotar o conjunto das k-formas diferenciais (de classe C∞ ) definidas no
aberto U ⊂ Rn . Dado um elemento ω ∈ Ω(U) e vetores ξ1 , . . . , ξk ∈ Rn , esceveremos
ω (x)(ξ1 , . . . , ξk ) =: ω (x; ξ1 , . . . , ξk ).
Notemos que se α ∈ Ωk (U) e β ∈ Ωl (U) são duas formas diferenciais, então para cada x ∈ U podemos
considerar o produto α (x) ∧ β (x), que é um elemento de Ωk+l (U). Em particular, o produto exterior de formas
diferenciais possui todas as propriedades do produto exterior de tensores alternados.
Seja f : U → R uma função suave e ω ∈ Ωk (U) uma k-forma diferencial. Então o produto f ∧ ω será
denotado simplesmente por f ω , e é a forma diferencial
que é a soma direta dos espaços Ωk (U) para todos os valores inteiros positivos de k. O produto exterior
uma Álgebra, chamada de Álgebra graduada. Notemos que esta Álgebra é anticomutativa e associativa.
112 CAPÍTULO 6. FORMAS DIFERENCIAIS
ω (x) = ∑ aI (x)φi1 ∧ . . . ∧ φik , I percorrendo o conjunto das k–uplas ascendentes de {1, . . . , n}.
I
Sendo ω suave, cada função aI é suave e sua derivada DaI (x) : Rn → R é um elemento de L 1 (Rn ). Assim, a
aplicação derivada DaI : U → L 1 (Rn ) é uma 1-forma diferencial. Definamos ω ′ : U → L 1 (Rn , A k (Rn )), x 7→
ω ′ (x), dada por
ω ′ (x)(ξ0 ) = ∑[DaI (x) · ξ0 ]φi1 ∧ . . . ∧ φik .
I
Notemos que ω ′ (x) pode ser vista como uma função de (Rn )k+1 em R. Além disso, ω ′ (x) é uma função mul-
tilinear de ξ0 , ξ1 , . . . , ξk e uma função alternada de ξ1 , . . . , ξk . Em outras palavras, ω ′ (x) ∈ A 1,k (Rn ). Utilizando a
aplicação ϕ1,k : A 1,k (Rn ) → A k+1 (Rn ) podemos definir o operador que associa ω a uma k + 1-forma.
ω′ ϕ1,k
U → A 1,k (Rn ) → A k+1 (Rn ),
onde usamos a notação (ξ0 , . . . , ξ̂i , . . . , ξk ) significando que o vetor ξi foi suprimido da k-upla (ξ0 , . . . , ξi , . . . , ξk ).
Proposição 6.5.4 Seja ω ∈ Ω1 (U), com U ⊂ Rn um aberto. Então d ω = 0 se, e somente se, a aplicação bilinear
(ξ1 , ξ2 ) 7→ (ω ′ (x)(ξ1 )) · ξ2
d( f ω ) = (d f ) ∧ ω + f d ω .
Lema 6.5.6 A diferencial dxi da função xi é a aplicação constante U → L 1 (Rn ) cujo valor é o elemento φi ∈
L 1 (Rn ).
Com esta notação podemos escrever uma k-forma diferencial de uma maneira canônica.
Proposição 6.5.7 Sejam U ⊂ Rn um aberto e ω ∈ Ωk (U). Então ω se escreve de uma maneira única
onde o somatório percorre todos as k-listas ascendentes I = (i1 , . . . , ik ) do conjunto {1, 2, . . ., n} e as funções
coeficientes aI são de classe C∞ em U.
Assim,
n n
∂f ∂f
d f (x; ξ ) = ∑ ξi = ∑ dxi (ξ ),
i=1 ∂ xi i=1 ∂ xi
Demonstração. Como ambos os lados de (6.7) são lineares em α e β , é suficiente demonstrar a igualdade quando
α = f dxi1 ∧ . . . ∧ dxik e β = gdx j1 ∧ . . . ∧ dx jl . Utilizando o Exercício 129 vemos o seguinte:
α ∧ β = f gdxi1 ∧ . . . ∧ dxik ∧ dx j1 ∧ . . . ∧ dx jl .
114 CAPÍTULO 6. FORMAS DIFERENCIAIS
O próximo resultado é fundamental no estudo das formas diferenciais e nos diz que o operador diferencial
satisfaz d 2 = 0.
d(d ω ) = 0.
Demonstração. Utilizando novamente a linearidade do operador d é suficiente demonstrar o fato para o caso em
que ω = f dxi1 ∧ . . . ∧ dxik . Calculando temos
n ∂f
d d( f dxi1 ∧ . . . ∧ dxik ) = d ∑ dxi ∧ dxi1 ∧ . . . ∧ dxik
i=1 ∂ xi
n n
∂2 f
=∑ ∑ ∂ x j ∂ xi dx j ∧ dxi ∧ dxi1 ∧ . . . ∧ dxik
i=1 j=1
∂2 f ∂2 f
=∑ dxi ∧ dx j + dx j ∧ dxi ∧ dxi1 ∧ . . . ∧ dxik .
i< j ∂ xi ∂ x j ∂ x j ∂ xi
Aqui usamos que dxi ∧ dxi = 0. Sendo f suave, podemos usar o Teorema de Clairaut-Schwarz e o fato que
dxi ∧ dx j = −dx j ∧ dxi para concluir a demonstração.
6.5. O OPERADOR DIFERENCIAL E SUAS PROPRIEDADES 115
Definição 6.5.11 Seja U ⊂ Rn um aberto. Uma k-forma diferencial ω é chamada fechada se d ω = 0 e é chamada
exata se existe uma (k − 1)-forma diferencial τ tal que ω = d τ .
d d d
Ω0 (U) → Ω1 (U) → Ω2 (U) → . . . .,
na qual as formas fechadas são precisamente os elementos do núcleo de d e as formas exatas são os elementos da
imagem de d. Esta sequência é chamada de complexo de de Rham de U.
d ω = dP ∧ dx + dQ ∧ dy + dR ∧ dz,
fórmula esta que ainda pode ser escrita, utilizando a Proposição 6.5.8 e o Corolário 6.3.4, como
∂R ∂Q ∂ P ∂ R ∂Q ∂P
dω = − dy ∧ dz + − dz ∧ dx + − dx ∧ dy.
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y
d ω = d f ∧ dx + dg ∧ dy
∂f ∂f ∂g ∂g
= dx + dy ∧ dx + dx + dy ∧ dy
∂x ∂y ∂x ∂y
∂f ∂g
= dy ∧ dx + dx ∧ dy
∂y ∂x
∂ f ∂g
= − dy ∧ dx.
∂y ∂x
d ω = (1 − 2xy)dy ∧ dx.
1
ω= (−ydx + xdy).
x2 + y2
Então ω é fechada.
∂P ∂Q ∂R
div F = div(P, Q, R) = + + .
∂x ∂y ∂z
Proposição 6.6.3 Se U = R3 , então um campo F ∈ X(U) é o gradiente de alguma função escalar f se, e somente
se, rotF = 0.
Como toda 1-forma em U ⊂ R3 é uma combinação linear como funções coeficientes de dx, dy e dz, podemos
identificar 1-formas com campos vetoriais em U via
Similarmente, as 2-formas diferenciais em U ⊂ R3 podem ser identificadas com campos de vetores em U da forma
∂f ∂f ∂f ∂ f ∂ f ∂ f
df = dx + dy + dz ←→ , , = ∇f.
∂x ∂y ∂z ∂x ∂y ∂z
Já a diferencial de uma 1-forma é
∂R ∂Q ∂P ∂R ∂ Q ∂ P
d(Pdx + Qdy + Rdz) = − dy ∧ dz + − dz ∧ dx + − dx ∧ dy,
∂y ∂z ∂z ∂x ∂x ∂y
6.6. CONEXÕES COM CÁLCULO EM R3 117
que corresponde a
rot(P, Q, R).
Um cálculo simples mostra ainda que a diferencial de uma 2-forma geral é
∂P ∂Q ∂R
d(Pdy ∧ dz + Qdz ∧ dx + Rdx ∧ dy) = + + dx ∧ dy ∧ dz,
∂x ∂y ∂z
que corresponde a
∂P ∂Q ∂R
div(P, Q, R) = + + .
∂x ∂y ∂z
Assim, após todas estas apropriadas identificações, o operador diferencial d de 0-formas, 1-formas e 2-formas
são simplesmente os três operadores gradiente, rotacional e divergente. Em resumo, em um subconjunto aberto
U ⊂ R3 temos as identificações
d d d
Ω0 (U) / Ω1 (U) / Ω2 (U) / Ω3 (U)
∼
= ∼
= ∼
= ∼
=
∇
rot
div
C∞ (U) / X(U) / X(U) / C∞ (U).
Então rotF = (0, 0, 0) mas F não é gradiente de nenhuma função escalar em U. A razão é que se F fosse o
gradiente de uma função de classe C∞ em U, então pelo Teorema Fundamental para integrais de linha teríamos que
a integral Z
−y x
2 2
dx + 2 dy
C x +y x + y2
sobre qualquer curva fechada C deveria ser zero. Entretanto, se C é o círculo unitário com x = cost e y = sent,
0 ≤ t ≤ 2π , temos que
Z Z 2π
−y x
2 + y2
dx + 2 dy = − sent cost + cost sentdt = 2π .
C x x + y2 0
O fato da Proposição 6.6.3 ser verdadeira ou não em um aberto U depende essencialmente de sua topologia.
Assim, se torna importante estudar o quociente
{k-formas fechadas em U}
H k (U) := ,
{k-formas exatas em U}
f ∗ g := g ◦ f .
O próximo lema nos fornece as regras computacionais para o pullback f ∗ de formas diferenciais.
a) f ∗ (ω + η ) = f ∗ ω + f ∗ η ;
b) f ∗ (gω ) = f ∗ g f ∗ ω ;
c) se ω1 , . . . , ωk ∈ Ω1 (U), então
f ∗ (ω1 ∧ . . . ∧ ωk ) = f ∗ ω1 ∧ . . . ∧ f ∗ ωk .
finalizando a demonstração.
Denotemos por (x1 , . . . , xm ) um ponto de Rm e por (y1 , . . . , yn ) um ponto de Rn . Então uma aplicação f : V ⊂
Rm → Rn pode ser escrita em coordenadas como
y1 = f1 (x1 , . . . , xm ), . . . , yn = fn (x1 , . . . , xm ).
Seja agora ω = ∑I aI dyi1 ∧ . . . ∧ dyik uma k-forma em Rn . Com as propriedades de f ∗ que demonstramos temos
que
f ∗ ω = ∑(aI ◦ f ) f ∗ dyi1 ∧ . . . ∧ f ∗ dyik .
I
Se v ∈ Rm , temos que
f ∗ dyi (x; v) = dyi (D f (x) · v) = D(yi ◦ f )(x) · v = D fi (x) · v.
6.8. EXERCÍCIOS DO CAPÍTULO 119
Assim,
f ∗ ω = ∑(aI ◦ f )d fi1 ∧ . . . ∧ d fik . (6.11)
I
Podemos utilizar as propriedades do pullback para encontrar a expressão de uma k-forma em um outro
sistema de coordenadas. Por isso alguns textos os definem como mudança de variáveis.
−r sen θ r cos θ
f ∗ω = (cos θ dr − r sen θ d θ ) + (sen θ dr + r cos θ d θ ) = d θ .
r2 r2
O Exercício 136 generaliza o exemplo anterior. O próximo resultado aiinda nos fornece mais propriedades
computacionais do pullback.
Demonstração. Os itens a) e b) ficarão para os exercícios. Para o item c) basta verificarmos o caso em que
ω = gdxi1 ∧ . . . ∧ dxik ,
e por outro,
d f ∗ (gdxi1 ∧ . . . ∧ dxik ) = d (g ◦ f )d(xi1 ◦ g) ∧ . . . ∧ d(xik ◦ g)
= d(g ◦ f ) ∧ d(xi1 ◦ f ) ∧ . . . ∧ d(xik ◦ f ),
f (v1 , v2 , v3 ) = 2x1 y2 z2 − x2 y3 z1 ,
g = φ2,1 − 5φ3,1.
Exercício 122 Sejam V e W dois espaços vetoriais com bases {e1 , . . . , en } e { f1 , . . . , fm } respectivamente e T : V →
W uma transformação linear. Dado f ∈ L k (W ), encontre T ∗ f em função dos coeficientes de f e de Tei na base
de W .
Exercício 123 Seja {e1 , e2 } a base canônica de R2 e {φ1 , φ2 } a base dual. Definamos f = −2φ1 ⊗ φ2 e conside-
remos T : R3 → R2 a transformação linear dada pela matriz
1 0 2
A= .
0 −1 1
Exercício 124 Sejam V e W espaços vetorias de dimensão finita sobre R e T : V → W uma transformação linear.
Mostre que se f ∈ A k (W ), então T ∗ f ∈ A k (V ).
Exercício 125 Sejam f1 , . . . , fn ∈ L 1 (V ), onde V é um espaço vetorial. Mostre que, para que estes vetores sejam
linearmente dependentes, é necessário e suficiente que f1 ∧ . . . ∧ fn = 0.
(S f )(v1 , . . . , vk ) := ∑ σ f (v1 , . . . , vk ).
σ ∈Sk
Exercício 127 Demonstre que qualquer 2–tensor pode ser escrito como soma de um tensor simétrico com um
tensor alternado. Este fato é verdadeiro para um k–tensor, k ≥ 3?
Sugestão: considere e1 ⊗ e2 ⊗ e3 , onde {e1 , e2 , e3 } é a base canônica de R3 .
(a f ) ∧ (bg) = (ab) f ∧ g.
Exercício 130 Se t : V → W for uma tranformação linear e se f e g forem tensores alternados em W , mostre que
T ∗ ( f ∧ g) = T ∗ f ∧ T ∗ g.
Exercício 131 Suponha que sejam dados dois subconjuntos {ω1 , . . . , ωk } e {α1 , . . . , αk } de L 1 (V ) onde V é um
espaço vetorial. Suponha ainda que os elementos deste conjunto estejam relacionados por
k
ωi = ∑ ai j α j , i = 1, . . . , k.
j=1
Exercício 132 Sejam α1 , . . . , αk , k ≤ n, elementos linearmente independentes de L 1 (Rn ). Mostre que um ele-
mento α ∈ L 1 (Rn ) satisfaz
α ∧ α1 ∧ . . . ∧ αk = 0
se, e somente se, α pertence ao subespaço gerado por α1 , . . . , αk . Neste caso mostre que, se α 6= 0, então existe
um k − 1-tensor alternado β tal que
α1 ∧ . . . ∧ αk = α ∧ β .
Exercício 133 Seja f : U ⊂ Rm → Rn uma aplicação de classe C∞ . Assuma que m < n e que ω seja uma k-forma
em Rn com k > m. Mostre que f ∗ ω = 0.
Exercício 135 Sejam U = Rn \ {0} e m um inteiro positivo fixado. Considere a seguinte n − 1-forma em U:
n
η = ∑ (−1)i−1 fi dx1 ∧ . . . ∧ dx
ci ∧ . . . dxn ,
i=1
a) Calcule d η .
b) Para quais valores de m temos que d η = 0?
a) Que condições devem satisfazer as funções u, v : R3 → R, ambas de classe C∞ , para que a forma diferencial
α − vdu seja fechada? Mostre que u e v são independentes de z.
b) É possível tomar v = V (x, y) arbitrária?
c) Demonstrar que se u e v satisfazem as condições do item a), então as três formas diferenciais du, dv e
α − vdu são linearmente independentes em cada ponto.
a) Mostre que ω se escreve em uma vizinhança de P0 na forma α ∧d f , sendo α uma 1-forma em uma vizinhança
de P0 , se , e somente se, d f não se anula em P0 e f satisfaz uma certa equação diferencial parcial que deverá
ser determinada.
∂f ∂f ∂f
b) Seja α = λ dx + µ dy + ν dz. Expresse λ , µ e ν em termos de a, b, c, ∂x , ∂y e ∂z de forma que α ∧ d f = ω .
Exercício 143 Seja f uma função de classe C∞ em uma vizinhança aberta de um ponto x0 ∈ Rn com valores em
R. Defina ui (x) := ∂∂ xfi (x) e seja ϕ (x) := (u1 (x), . . . , un (x)).
Sob quais condições existe uma vizinhana̧ aberta V de x0 tal que ϕ seja um difeomorfismo de V sobre ϕ (V )?
Suponhemos que esta condições seja satisfeita e escrevamos x = ϕ −1 (u), onde u ∈ ϕ (V ). Demonstre que a
forma diferencial
n
ω = ∑ xi dui
i=1
∂g
é fechada. Deduza que existe, em uma vizinhança V de u0 = ϕ (x0 ), uma função g de classe C∞ tal que xi = ∂ ui .
Demonstre ainda que se f é uma função homogênea de grau p 6= 1, então tem-se que, em ϕ −1 ,
g ◦ ϕ = (p − 1) f + k,
para alguma constante k, e demonstre que g pode ser tomada homogênea de grau p/(p − 1).
Exercício 144 (Lema de Cartan) Suponha que ω1 , . . . , ωk ∈ Ω1 (U) sejam linearmente independentes, onde U ⊂
Rn é um aberto. Se α1 , . . . , αk ∈ Ω1 (U) são tais que
k
∑ αi ∧ ωi = 0,
i=1
demonstre que cada αi , i = 1, . . . , k, pode ser escrito como combinação linear (com coeficientes suaves) de
ω1 , . . . , ωk .
Capítulo 7
Voltando às variedades
Neste capítulo apresentaremos mais resultados sobre variedades diferenciáveis. Nosso objetivo é generalizar para
variedades os resultados sobre as formas diferenciais e também estudar integrais de formas diferenciais em vari-
edades. Iniciamos com uma definição mais refinada de espaço tangente que será também útil em estudos mais
avançados. Após isso, daremos a definição de variedades com bordo e de variedades orientáveis.
Definição 7.1.1 Seja p ∈ Rn um ponto fixado. O espaço tangente a Rn em p, denotado por Tp Rn , é o conjunto
dos vetores v − p ∈ Rn , isto é, a translação da origem de Rn para p.
Identificamos o espaço tangente Tp Rn com Rn via a aplicação J : Tp Rn → Rn dada por J(p, v) = v. Dessa
forma, vemos que Tp Rn é um espaço vetorial.
Seja U ⊂ Rn um aberto e f : U → Rm de classe C1 . Fixemos p ∈ U e definamos q = f (p). Já definimos
a aplicação derivada D f (p) : Rn → Rm . Definimos a aplicação d f p : Tp Rn → Tq Rm de acordo com o seguinte
diagrama:
d fp
Tp Rn / Tq Rm
O
∼
= ∼
=
D f (p)
Rn / Rm ,
isto é,
d f p (p, v) = J −1 ◦ D f (p) ◦ J(p, v) = J −1 (D f (p)(v)) = (q, D f (p) · v).
Sejam {e1 , . . . , en } uma base de Rn e vi := (p, ei ) ∈ Tp Rn , i = 1, . . . , n. Então {v1 , . . . , vn } é uma base de Tp Rn .
Notemos que, se U ⊂ Rn é um aberto e f ∈ C1 (U), então
∂f
d f p (vi ) ∼
= D f (p) · ei = (p).
∂ xi
Em particular, sendo xi : U → R a i-ésima função coordenada, temos
∂ xi 0 se i 6= j,
(dxi ) p (v j ) = =
∂xj 1 se i = j.
123
124 CAPÍTULO 7. VOLTANDO ÀS VARIEDADES
Logo, {(dx1 ) p , . . . , (dxn ) p } é uma base de Tp∗ Rn := (Tp Rn )∗ . Observemos que, se f ∈ C1 (U), então,
∂f ∂f n ∂f
d f p (v j ) = (p) = (p)(dx j ) p (v j ) = ∑ (p)(dxi ) p (v j ).
∂xj ∂xj i=1 ∂ xi
Segue que
n
∂f
df = ∑ dxi .
i=1 xi
∂
Com isso, a aplicação d f nada mais é que a diferencial de f vista como uma 0-forma.
Observação 7.1.2 Dada ω ∈ A k (Rn ), temos que, via a identificação de Rn com Tp Rn , ω define um k-tensor
alternado ω ∈ A k (Tp Rn ), a qual é dada por
ω (p, v1 ), . . . , (p, vk ) := ω (v1 , . . . , vk ).
Doravante, identificaremos ω e ω .
Definição 7.2.1 Seja M uma variedade diferenciável de dimensão n e p ∈ M. Definimos o conjunto Tp M como
sendo o conjunto das classes de equivalência de curvas γ : I → M, com 0 ∈ I e γ (0) = p, segundo a seguinte relação
de equivalência: γ ∼ α se, e somente se, em um sistema de vizinhança coordenada (Ω, ϕ ) de p, (ϕ ◦ γ )′ (0) =
(ϕ ◦ α )′ (0).
Definição 7.2.2 Seja M uma variedade diferenciável de dimensão n e p ∈ M. Consideremos o espaço vetorial F p
das funções f : M → R que são diferenciáveis em p e seja N p o subconjunto de F p consistindo das funções f tais
que
D( f ◦ ϕ −1)(ϕ (p)) = 0
para toda vizinhança coordenada (Ω, ϕ ) de p. Dizemos que X é um vetor tangente a M em p se X é um funcional
linear X : F p → R que se anula em N p . O espaço tangente T̃p M é o conjunto dos vetores tangentes a M em p.
Elementos de T̃p M são o que chamamos de derivações, e este nome é justificado pela proposição abaixo.
7.2. ESPAÇO TANGENTE A UM PONTO EM UMA VARIEDADE 125
Proposição 7.2.3 (Regra de Leibniz) Sejam f , g : M → R com f , g ∈ F p e X ∈ T̃p M, com p ∈ M fixado. Então
X( f g) = f (p)X(g) + g(p)X( f ).
Demonstração. Temos
X( f g) = X ( f − f (p) + f (p))(g − g(p) + g(p))
= X ( f − f (p))(g − g(p)) + f (p)X(g) + g(p)X( f ),
pois uma função constante pertence a N p . Por outro lado, se a e b se anulam em p, então
Com a soma e produto de funcionais lineares o espaço T̃p M é naturalmente um espaço vetorial. Vamos exibir
uma base para este espaço. Dada uma vizinhança coordenada (Ω, ϕ ), denotemos por (x1 , . . . , xn ) as coordenadas
neste sistema. Definimos o vetor ∂∂xi (p) por
∂ ∂ ( f ◦ ϕ −1 )
(p)( f ) := (ϕ (p)).
∂ xi ∂ xi
Notemos que
∂ ∂ (x j ◦ ϕ −1)
(p)(x j ) = (ϕ (p)) = δi j (δ de Kronecker).
∂ xi ∂ xi
Segue que o conjunto { ∂∂xi (p)}, i = 1, . . . , n, é linearmente independente. Vamos verificar que, para qualquer
X ∈ T̃p M, existem escalares X i , i = 1, . . . , n, tais que
n
∂
X = ∑ Xi (p).
i=1 ∂ xi
com αi = ∂
∂ xi (p)( f ) ∈ Rn , vemos que
n
f − ∑ αi xi ∈ N p ,
i=1
o que nos dá
n n
∂
X( f ) = ∑ αi X(xi ) = ∑ (p)( f )X(xi ),
i=1 i=1 xi
∂
e escolhemos X i = X(xi ).
Dessa discussão concluímos também que a dimensão de T̃p M é n, ou seja, T̃p M e Tp M são isomorfos. Vamos
dar uma demonstração direta deste fato importante exibindo um isomorfismo entre estes espaços.
Proposição 7.2.4 Seja M uma variedade diferenciável e p ∈ M. Os espaços T̃p M e Tp M são isomorfos.
126 CAPÍTULO 7. VOLTANDO ÀS VARIEDADES
∂ ( f ◦ γ) ∂ ( f ◦ α)
(0) = (0),
∂t ∂t
já que neste caso temos
( f ◦ γ )′ = ( f ◦ ϕ −1 ◦ ϕ ◦ γ )′ = ( f ◦ ϕ −1 )′ ◦ (ϕ ◦ γ )′
e, por definição, (ϕ ◦ γ )′ (0) = (ϕ ◦ α )′ (0). Notemos que X ∈ T̃p M. De fato, X é obviamente linear e, se f ∈ N p ,
então ∂ (∂f ◦t γ ) (0) = 0, já que D( f ◦ ϕ −1)(ϕ (p)) = 0.
Para verificarmos que Ψ é bijetora fixamos X ∈ T̃p M com
n
∂
X = ∑ Xi (p).
i=1 ∂ xi
Seja γ : (−δ , δ ) → M dada por γ (t) = pt ∈ M, onde ϕ (pt ) = (tX 1 , . . . ,tX n ), onde estamos supondo ϕ (p) = 0.
Então:
n
∂ ( f ◦ γ) ∂ ( f ◦ ϕ −1) ∂ (tX i )
(0) = ∑ = X( f ).
∂t i=1 ∂ xi ∂t
Segue que Ψ é sobrejetora. Além disso, se γ não é equivalente a α , então (ϕ ◦ γ )′ (0) 6= (ϕ ◦ α )′ (0) e é possível
exibir uma função f tal que
( f ◦ γ )′ (0) 6= ( f ◦ α )′ (0),
A partir de agora não faremos distinção entre T̃p M e Tp M, usando sempre esta última notação para indicar
ambas as noções de espaços tangentes apresentadas.
Apesar de Tp M ser definido através de funções que podem estar definidas em toda a variedade M, é importante
observara que ele é essencialmente um objeto que depende de construções locais.
Definição 7.2.6 Seja M uma variedade de dimensão n. O fibrado tangente de M, denotado por T M, é a união
disjunta dos espaços tangentes Tp M a M em p, para todo p ∈ M, isto é,
[
TM = Tp M.
p∈M
Uma forma diferencial de grau k, ou uma k-forma diferencial em M é uma aplicação ω : M → A k (M) tal
que π ◦ ω = Id, onde π é a projeção de A k (M) em M. Como no caso de Rn , denotaremos por Ωk (M) o conjunto
das k-formas diferenciais em M.
A definição do produto exterior e do operador diferencial de formas diferenciais é definido de maneira aná-
loga ao caso de Rn , e mantém todas a propriedades. Além disso, podemos definir a ação de uma aplicação di-
ferenciável f entre variedades em Ωk (M), a qual também será denotada por f ∗ . Em particular, se (Ω, ϕ ) é um
sistema de vizinhanças coordenadas com ϕ = (x1 , . . . , xn ) sendo as coordenadas locais neste sistema, seja { ∂∂xi (p)}
(i = 1, . . . , n) uma base de Tp M e {dxi } sua base dual. Então qualquer forma ω ∈ A k (M) se escreve como
onde a soma percorre todos as k-uplas ascendentes de {1, . . . , n}. Dizemos que uma forma diferencial ω escrita
como em (7.1) é de classe C∞ se cada aI é de classe C∞ em M.
7.4 Pushforwards
Definição 7.4.1 Sejam M e N duas variedades diferenciáveis e F : M → N uma aplicação suave. Para cada p ∈ M,
definimos o pushforward de F como sendo a aplicação F∗ : Tp M → TF(p) N dada por
A verificação de que esta definição faz sentido, isto é, que F∗ X ∈ TF(p) N, é relativamente simples.
Veremos que o pushforward de uma aplicação entre variedades desempenha um papel importante no estudo
de formas diferenciais em variedades, especialmente na teoria de integração.
a) F∗ : TP M → TF(p) N é linear;
b) (G ◦ F)∗ = G∗ ◦ F∗;
c) se F é um difeomorfismo entre M e N, então F∗ é um isomorfismo entre Tp M e TF(p) N.
Demonstração. Suponhamos incialmente que B ⊂ U é uma vizinhança aberta de p com B ⊂ U. Então tomamos
X ∈ TpU com i∗ X = 0 ∈ Tp M. Se f ∈ C∞ (U) é qualquer, escolhemos f˜ ∈ C∞ (M) tal que f˜ = f sobre B, isto é,
consideramos uma extensão suave de f para fora de B. Então, pelo Lema 7.2.5 vemos que
Ter a mesma orientação define uma relação de equivalência no conjunto das bases de V e existem exatamente duas
classes de equivalência para esta relação. A escolha de uma dessas classes é chamada de uma orientação de V.
Este conceito está relacionado com a escolha de uma base g ∈ A n (V ) (lembremos que dim(A n (V )) = 1, de forma
que qualquer elemento não nulo forma uma base deste espaço).
Lema 7.5.1 Seja g ∈ A n (V ) e {e1 , . . . , en } uma base de V . Então, para qualquer conjunto de vetores v1 , . . . , vn
com
n
vi = ∑ ai j e j , i = 1, . . . , n,
j=1
temos que
g(v1 , . . . , vn ) = det(ai j )g(e1 , . . . , en ).
Corolário 7.5.2 Se g ∈ A n (V ) com g 6= 0, então g possui o mesmo sinal em duas bases se estas bases possuem
mesma orientação. Assim, uma escolha de g ∈ A n (V ), g 6= 0, determina uma orientação de V .
A grosso modo, para estender o conceito de orientação para uma variedade M deve-se tentar orientar cada
um dos espaços tangentes Tp M de forma que a orientação de espaços tangentes de pontos próximos coincidam.
Dessa forma, deveríamos entender de alguma maneira como passar de uma base para Tp M para uma base de Tq M
de maneira contínua se p e q estivessem próximo.
Definição 7.5.3 Uma variedade diferenciável M de dimensão n é dita orientável se ela possui uma estrutura dife-
renciável U = {Uα , ϕα } na qual todas as mudanças de coordenadas ϕα ◦ ϕβ−1 possuem determinante Jacobiano
positivo. Neste caso dizemos que U orienta M.
Daremos uma caracterização em termos de forma diferenciais para a orientabilidade de uma variedade. Uti-
lizaremos no decorrer da demonstração o Exercício 153.
Teorema 7.5.4 Uma variedade diferenciável M de dimensão n é orientável se, e somente se, ela possui uma n-
forma diferencial que nunca se anula.
7.5. VARIEDADES ORIENTÁVEIS 129
Demonstração. Suponhamos que M é orientável e seja {(Uα , ϕα )} uma estrutura diferenciável de M na qual todo
determinante Jacobiano das mudanças de coordendas é positivo. Consideremos {ρα } uma partição da unidade
(C∞ ) subordinada à {Uα } (veja o Exercício 149). Definamos
ω = ∑ ρα dxα1 ∧ . . . ∧ dxαn ,
onde x1α , . . . , xnα são as funções coordenadas de ϕα . Para todo p ∈ M, existe uma vizinhança aberta U p de p que
intercepta somente um número finito de conjuntos supp ρα . Segue que ω é uma soma finita em U p e portanto suave
em todo ponto p ∈ M.
Fixemos agora uma vizinhança coordenada (U, ϕ ) de um ponto p da estrutura diferenciável que orienta M,
onde ϕ = (x1 , . . . , xn ), e consideremos U ∩Uα . Pelo Exercício 153 temos que
∂ xi
dx1α ∧ . . . ∧ dxαn = det α
dx1 ∧ . . . ∧ dxn ,
∂xj
∂ xiα
onde det ∂xj
> 0, pois M é orientável. Segue que
h ∂ xi i
ω = ∑ ρα dx1α ∧ . . . ∧ dxnα = ∑ ρα det α
dx1 ∧ . . . ∧ dxn .
∂xj
Como ρα (p) > 0 para algum α , temos que
para alguma função k > 0. Sendo p arbitrário obtemos que ω nunca se anula em M.
Suponhamos agora que ω é uma n-forma diferencial em M que nunca se anula. Dada uma estrutura diferen-
ciável em M, vamos usar ω para modificar esta estrutura de forma que o determinante Jacobiano de cada mudança
coordenada seja positivo.
Seja (U, ϕ ) uma vizinhança coordenada com ϕ = (x1 , . . . , xn ). Então
ω = f dx1 ∧ . . . ∧ dxn
para alguma função f de classe C∞ . Como ω nunca se anula e f é contínua, temos que f > 0 ou f < 0 em U.
Se f > 0, deixe o sistema de coordenadas como ele está; se f < 0 trocamos o sistema de vizinhança coordenada
(U, ϕ ) por (U, ϕ̃ ), onde ϕ̃ = (−x1 , x2 . . . , xn ). Após todas estas mudanças (quando necessárias), podemos assumir
que, em qualquer vizinhança coordenada (V, ψ ), com ψ = (y1 , . . . , yn ), temos
ω = hdy1 ∧ . . . ∧ dyn ,
com h > 0. Esta é uma estrutura diferenciável na qual toda mudança de coordenadas possui determinante Jacobiano
positivo. De fato, se (U, ϕ ) e (V, ψ ) são tais que ϕ = (x1 , . . . , xn ) e ψ = (y1 , . . . , yn ), então
ou seja
f 1
dx ∧ . . . ∧ dxn = dy1 ∧ . . . ∧ dyn .
h
Pelo Exercício 153 temos que
∂ yi f
det = > 0 em U ∩V.
∂xj h
Isto finaliza a demonstração.
A escolha de uma orientação da variedade diferenciável M define uma orientação em cada espaço tangente
Tp M, p ∈ M. Neste caso, dizemos que o espaço tangente está orientado de acordo com a orientação da variedade e
a base canônica de Tp M é chamada de base orientada.
130 CAPÍTULO 7. VOLTANDO ÀS VARIEDADES
Proposição 7.6.2 Sejam U,V ⊂ Hn abertos e f : U → V um difeomorfismo. Então f aplica pontos interiores em
pontos interiores e pontos de bordo em pontos de bordo.
Demonstração. Seja p ∈ U com p ∈ Int(Hn ). Então existe um aberto B em Rn com p ∈ B ⊂ Hn . Segue que f (B)
é aberto em Rn . Assim, f (p) ∈ f (B) ⊂ V ⊂ Hn e f (p) é um ponto interior.
Se p ∈ ∂ Hn , então f −1 ( f (p)) = p ∈ ∂ Hn . Como f −1 : V → U ’e um difeomorfismo, f (p) não pode ser
interior, ou seja, f (p) ∈ ∂ Hn .
Definição 7.6.3 Uma variedade diferenciável com bordo de classe C∞ é um subconjunto M ⊂ Rn com uma estru-
tura diferenciável U no seguinte sentido generalizado: U = {(Uα , ϕα )} consiste de uma família de subconjuntos
abertos Uα de M, cada um com um homeomorfismo ϕα sobre um subconjunto aberto de Hn (com a topologia de
subespaço de Rn ) tais que
1) os conjuntos Uα cobrem M;
2) se (Uα , ϕα ) e (Uβ , ϕβ ) são elementos de U , então as mudanças de coordenadas ϕβ ◦ ϕα−1 e ϕα ◦ ϕβ−1 são
difeomorfimos de ϕα (Uα ∩Uβ ) e ϕβ (Uα ∩Uβ ), subconjuntos abertos de Hn ;
7.7. ESPAÇOS TANGENTES E ORIENTAÇÃO EM VARIEDADES COM BORDO 131
Seja p ∈ M e (U, ϕ ) uma vizinhança coordenada de p. Pela Proposição 7.6.2, se ϕ (p) ∈ ∂ Hn , então ψ (p) ∈
∂ Hn para qualquer vizinhança coordenada (V, ψ ) de p. O conjunto dos pontos p ∈ M para os quais ϕ (p) ∈ ∂ Hn
para algum (U, ϕ ) é chamado de bordo de M. Tal conjunto é denotado por ∂ M. Temos que M \ ∂ M é uma variedade
no sentido usual. Se ∂ M = 0,
/ dizemos que M é uma variedade sem bordo.
Teorema 7.6.4 Se M é uma variedade diferenciável de dimensão n com bordo, então a estrutura diferenciável de
M determina em ∂ M uma estrutura diferenciável com a qual este subconjunto é uma variedade diferenciável sem
bordo de dimensão n − 1. Além disso, a inclusão i : ∂ M → M é um mergulho.
Observação 7.6.5 Toda variedade diferenciável pode ser considerada como uma variedade com bordo. Para
verificar este fato, basta fixarmos uma vizinhança coordenada (U, ϕ ) da variedade M com ϕ = (x1 , . . . , xn ),
que possui como imagem um aberto ϕ (U) ⊂ Rn , e compor com um difeomorfismo de Rn em Int Hn dado por
(x1 , . . . , xn ) 7→ (x1 , . . . , xn−1 , exn ).
Mesmo que o termo variedade com bordo englobe também as variedades no sentido original, usa-se nor-
malmente o termo variedade sem bordo para denotar as variedades onde ∂ M = 0. / O termo variedade fechada
normalmente indica uma variedade compacta sem bordo. Já as variedades abertas são aquelas não-compactas sem
bordo.
Aplicações diferenciáveis entre variedades com bordo, posto, etc, podem agora serem definidos exatamente
como no caso de variedades sem bordo. Vamos estudar com um pouco mais de detalhes os espaços tangentes à
variedades com bordo.
Lema 7.7.1 Se M é uma variedade diferenciável de dimensão n com bordo e p ∈ ∂ M, então Tp M é um espaço
vetorial de simensão n com base dada pelos vetores
∂ ∂
(p), . . . , (p)
∂ x1 ∂ xn
Demonstração. Que Tp M é um espaço vetorial segue claramente da definição. Para qualquer vizinhança coor-
denada (U, ϕ ) de p ∈ ∂ M, temos que o pushforward ϕ∗ : Tp M → Tϕ (p) Hn é um isomorfismo como no caso de
variedades sem bordo. Assim, basta encontrarmos uma base para Tq Hn com q ∈ ∂ H n .
Seja i : Hn → Rn a aplicação inclusão. Vamos verificar que i∗ : Tq Hn → Tq Rn é um isomorfismo.
Suponhamos que i∗ X = 0 e seja f qualquer função suave de com valores em R definida em uma vizinhança
de q em Hn . Estendemos f para uma função f˜ em uma vizinhança de q em Rn . Segue que f˜ ◦ i = f , o que implica
X f = X( f˜ ◦ i) = i∗ X( f˜) = 0,
e i∗ é injetiva.
Por outro lado, dado Y ∈ Tq Rn , seja X ∈ Tq Hn definido por
X f = Y f˜,
onde f˜ é qualquer extensão de f . Escrevendo
n
∂
Y = ∑Yi (q)
i=1 ∂ xi
em termos da base canônica de Tq Rn , obtemos
n
∂ f˜
X f = ∑Yi (q).
i=1 ∂ xi
Então X ∈ Tq Hn e i∗ X = Y, ou seja, i∗ é sobrejetora.
Passamos agora a estudar com mais detalhes a relação entre a orientação de uma variedade e de seu bordo.
Iniciamos observando que a orientação de uma variedade diferenciável é definida como no caso sem bordo.
Se D é uma variedade suave e compacta de dimensão n, mergulhada em uma outra variedade M também de
dimensão n, então dizemos que D é um domínio regular de M. Uma orientação em M define uma orientação em
D. De fato, basta restringirmos à D uma n-forma diferencial que nunca se anula em M. O bordo de uma variedade
é uma subvariedade mergulhada, ou seja, ∂ M é orientável desde que M o seja. Deixaremos este fato mais explícito
no próximo resultado.
Teorema 7.7.2 Seja M uma variedade orientada com bordo. Então ∂ M é orientável e a orientação de M deter-
mina uma orientação de ∂ M. Em particular, se {(Uα , ϕα )} é uma estrutura diferenciável que orienta M, então a
estrutura induzida {(Uα ∩ ∂ M, ϕα |Uα ∩∂ M )} orienta ∂ M.
Demonstração. Como ∂ M é uma variedade diferenciável de dimensão n − 1, temos que Tp (∂ M) pode ser vsto
como um subespaço vetorial de Tp M de dimensão n − 1. Sejam (U, ϕ ) e (V, ψ ) vizinhanças coordenadas de p ∈ ∂ M
com ϕ = (x1 , . . . , xn ) e ψ = (y1 , . . . , yn ). Neste caso temos que xn = yn = 0 sobre U ∩ ∂ M e V ∩ ∂ M. Além disso,
como a composição
ψ ◦ ϕ −1 : ϕ (U ∩V ) → ψ (U ∩V )
aplica pontos interiores em pontos interiores e pontos de ∂ M e ∂ Hn , temos que
yn (x1 , . . . , xn ) = 0 se xn = 0 e yn (x1 , . . . , xn ) > 0 se xn > 0,
onde xi = x−1
i , i = 1, . . . , n. Segue que
∂ yn ∂ yn
(ϕ (q)) = · · · = n−1 (ϕ (q)) = 0
∂ x1 ∂x
para q ∈ U ∩V ∩ ∂ M. Assim, sobre U ∩V ∩ ∂ M temos
∂y ∂ y1 ∂ y1
1
∂ x1
... ∂ xn−1 ∂ xn
.. .. ..
. . .
D(ψ ◦ ϕ −1
)=
.
∂ yn−1 ∂ yn−1 ∂ yn−1
∂ x1
... ∂ xn−1 ∂ xn
∂ yn
0 ... 0 ∂ xn
7.8. EXERCÍCIOS DO CAPÍTULO 133
Pelo Teorema 7.7.2, a orientação natural do bordo de uma variedade diferenciável M parece inicialmente ser
aquela dada pela restrição à ∂ M da estrutura que orienta M. Entretanto, veremos que esta orientação causa alguns
problemas ao apresentarmos, por exemplo, o Teorema de Stokes.
Definição 7.7.3 Seja M uma variedade orientada com bordo e com dimensão n. Seja {(Uα , ϕα )} uma estrutura
diferenciável que orienta M. Se n for par, então a orientação do bordo ∂ M é aquela dada pela estrutura induzida
{(Uα ∩ ∂ M, ϕα |Uα ∩∂ M )}. Se n é ímpar, então a orientação do bordo ∂ M é dada pelo oposto da estrutura induzida
(trocando-se o sinal da primeira função coordenada de cada ϕα ). Esta orientação é chamada de orientação de
Stokes de ∂ M.
Exemplo 7.7.4 A orientação de Rn canônica é dada pela n-forma dx1 ∧ . . . ∧ dxn e a restrição dessa forma à
Hn orienta o espaço modelo para variedades com bordo. Segue que a orientação de Stokes de ∂ H n é dada pela
(n − 1)-forma (−1)n dx1 ∧ . . . ∧ dxn−1 .
Exercício 147 Demonstre que se uma variedade diferenciável de dimensão n é difeomorfa a uma variedade dife-
renciáel de dimensão m então m = n.
Exercício 148 Seja A ⊂ Rn um subconjunto qualquer. Uma cobertura U de A é chamada de localmente finita se
cada ponto de A possui uma vizinhança que intercepta no máximo uma quantidade finita de elementos de U. Uma
outra cobertura V de A é um refinamento de U se, para cada V ∈ V , existe U ∈ U tal que V ⊂ U. Dizemos que
A é paracompacto se toda cobertura aberta de A admite um refinamento localmente finito.
a) Demonstre que toda variedade diferenciável admite uma cobertura enumerável e localmente finita formada
por conjuntos relativamente compactos (o fecho é compacto).
b) Demonstre que toda variedade diferenciável M é paracompacta.
Sugestão: consulte seu livro favorito de variedades diferenciáveis ou use os resultados que conhece para subcon-
juntos de Rn .
134 CAPÍTULO 7. VOLTANDO ÀS VARIEDADES
Exercício 149 Seja M uma variedade diferenciável e A = {Aα }α ∈I uma cobertura de M por abertos (em M).
Demonstre que existe uma partição da unidade suave em M subordinada à A , isto é, existe uma coleção de
funções contínuas {φα : M → R | α ∈ I} com as seguintes propriedades:
Exercício 150 Seja M uma variedade diferenciável com bordo e A = {Aα } uma cobertura de M por abertos (em
M). Demonstre que existe uma partição da unidade suave em M subordinada à A .
Exercício 151 Sejam M uma variedade diferenciável, A ⊂ M um subconjunto fechado e U ⊂ M um aberto com
A ⊂ U. Demonstre que existe uma função contínua ϕ : M → R tal que 0 ≤ ϕ ≤ 1 sobre M, ϕ ≡ 1 sobre A e
supp ϕ ⊂ U. Uma função ϕ dessa forma é chamada de função bacia para A com suporte em U.
Sugestão: tome U0 = U e U1 = M \ A e uma partição da unidade subordinada à {U0 ,U1 }.
Exercício 152 (Lema de extensão) Sejam M uma variedade diferenciável, A ⊂ M um subconjunto fechado e
f : A → Rm uma função suave. Demonstre que, para qualquer subconjunto aberto U ⊂ M com A ⊂ U, existe
uma função suave f˜ : M → Rm tal que f˜|A = f e supp f˜ ⊂ U.
Sugestão: para cada p ∈ A escolha uma vizinhança Wp de p e uma função f˜p definida e suave em Wp que coincide
com f em A; diminuindo Wp podemos assumir que Wp ⊂ U; considere a cobertura {Wp | p ∈ A} ∪ {M \ A} de M e
uma partição da unidade subordinada a esta cobertura; considere o produto de cada membro dessa partição pela
função f˜(·) correspondente.
Exercício 153 Seja M uma variedade de dimensão n e consideremos uma vizinhança coordenada (U, ϕ ) de um
ponto p ∈ M. Sejam f1 , . . . , fn funções suaves em U e ϕ = (x1 , . . . , xn ) funções coordenadas em U. Prove que
∂ f
i
d f1 ∧ . . . ∧ d fn = det dx1 ∧ . . . ∧ dxn .
∂xj
Exercício 154 Seja f : R3 → R de classe C∞ e assuma que M = f −1 (0) seja uma subvariedade regular de R3 de
dimensão 2. Mostre que as igualdades
dx ∧ dy dy ∧ dz dz ∧ dx
= =
fz fx fy
valem em M sempre que fizerem sentido. Em particular, mostre que M possui uma 2-forma que nunca se anula em
M sendo assim orientável.
Exercício 155 Demonstre que qualquer subconjunto aberto de uma variedade diferenciável orientável é orientá-
vel.
Exercício 158 Suponha que a variedade diferenciável M seja união de duas variedades orientadas abertas e com
intersecção conexa. Demonstre que M é orientável. Em particular, isto demonstra que a esfera Sn é orientável.
7.8. EXERCÍCIOS DO CAPÍTULO 135
Exercício 159 Seja T : Sn → Sn a alicação antípoda dada por T x = −x. Demonstre que T preserva orientação
se, e somente se, n é ímpar.
Exercício 160 Seja M = S1 × [0, 1] o cilindro com a orientação no sentido anti-horário quando visto do exterior.
Descreva a orientação de Stokes de S1 × {0} e de S1 × {1}.
Exercício 161 Seja M uma variedade sem bordo e f : M → R uma função de classe C∞ . Suponha que d f 6= 0
sobre o conjunto f −1 (0). Demonstre que M + = {p ∈ M; f (p) ≥ 0} é um domínio regular e encontre seu bordo.
Exercício 162 Seja E um espaço vetorial com produto interno h·, ·i e de dimensão finita n = dim E. Suponhamos
que E esteja orientado e fixemos uma base ortonormal {e1 , . . . , en } que nos dá a orientação de E. Definimos
V : E n → R por
V (v1 , . . . , vn ) = det A,
onde A = (ai j )n×n com ai j = hei , v j i.
Integração em variedades
Neste capítulo definimos a integral de uma n-forma diferencial em uma variedade diferenciável de dimensão n com
ou sem bordo, que são os objetos integráveis em Geometria. Primeiramente definimos de uma forma diferencial
em subconjuntos de Rn e depois utilizamos o pullback de uma vizinhança coordenada e partições da unidade para
estendermos a definição para variedades. Demonstraremos um dos resultados fundamentais de Análise e Geome-
tria, que é o Teorema de Stokes. Este resultado engloba os importantes teorema de Cálculo Vetorial: Teorema de
Green, Teorema de Gauss e Teorema Fundamental para integrais de linha.
Para definirmos a integral de uma forma diferencial ω em um aberto U qualquer devemos tomar um certo
cuidado, uma vez que, mesmo supondo que ω possui suporte compacto, não sabemos se este suporte é retificável.
Lema 8.1.1 Sejam U um aberto e K um compacto, ambos subconjuntos de Rn com K ⊂ U. Então existe um
compacto retificável D tal que K ⊂ D ⊂ U.
Demonstração. Dado p ∈ K, existe uma bola aberta contendo p cujo fecho não intercepta o bordo de U. Cobrindo
K com bolas com estas propriedades e usando a compacidade, existe uma quantidade finita de tais bolas abertas
B1 , . . . , Bk cobrindo K. O bordo de cada uma dessas bolas possui medida nula e, dessa forma, D = B1 ∪ . . . Bk
satisfaz as propriedades requeridas.
n
Suponha que U ⊂ R seja um aberto e considere uma n-forma ω em U com suporte compacto. A integral de
ω em U é definida por Z Z
ω= ω,
U D
onde D é um compacto retificável tal que supp ω ⊂ D ⊂ U.
Se V ⊂ Hn é um subconjunto (relativamente) aberto e se ω é uma n-forma com suporte compacto em V,
definimos a integral de ω em V por Z Z
ω= ω,
V D∩Hn
sendo novamente D um compacto retificável satisfazendo supp ω ⊂ D ⊂ V. Assim, a definição de integração em
Hn generaliza a definição em Rn .
137
138 CAPÍTULO 8. INTEGRAÇÃO EM VARIEDADES
Proposição 8.1.2 Sejam A, B ⊂ Rn compactos retificáveis e ω ∈ Ωn (B). Supnha que F : A → B seja uma aplicação
suave cuja restrição à Int A é um difeomorfismo sobre IntB. Então, se F preserva a orientação,
Z Z
ω= F ∗ω .
B A
Demonstração. Esta é uma consequência do Teorema de Mudança de Variáveis. Denote por (y1 , . . . , yn ) e por
(x1 , . . . , xn ) as coordenadas B e A respectivamente. Então ω = f dy1 ∧. . . ∧dyn para alguma função suave f : B → R.
Se F preserva orientação:
Z Z
ω= f dy1 . . . dyn
B
ZA
= f ◦ F| det DF|dx1 . . . dxn
ZA
= f ◦ F detDFdx1 . . . dxn
ZA
= F ∗ω ,
A
onde na última igualdade utilizamos (6.11) e o Exercício 131. Para o caso em que F reverte orientação basta
observarmos | det DF| = − detDF.
Pela igualdade (6.11) vemos que (ϕ −1 )∗ ω possui suporte compacto contido em ϕ (U) ⊂ Rn , o que implica
que o lado direito de (8.1) está bem definido. Além disso, nada precisamos mudar nessa definição no caso em que
M é uma variedade diferenciável orientada com bordo, supondo que ω possua suporte contido em um aberto de
uma vizinhança coordenada generalizada que orienta M.
Proposição 8.2.1 Seja ω uma n-forma diferencial em uma variedade diferenciável orientada M de dimensão n,
com ou sem bordo. Suponha que ω possua suporte contido em um elemento U de uma vizinhança coordenada
(U, ϕ ). Então
Z
ω
M
Demonstração. Seja (V, ψ ) uma otra vizinhança coordenada que orienta M e tal que supp ω ⊂ V. Então ψ ◦ ϕ −1
8.2. INTEGRAÇÃO DE FORMAS EM VARIEDADES 139
Para integrarmos uma n-forma diferencial não necessariamente com suporte contido em uma vizinhança
coordenada, utilizamos a definição anterior e partição da unidade.
Seja M uma variedade diferenciável (com ou sem bordo) orientada com dim M = n. Fixada uma forma ω ∈
Ωn (M) com suporte compacto, seja {(Ui , ϕi )} uma cobertura finita de supp ω formada por vizinhanças coordenadas
orientadas de M e seja também {ρi } uma partição partição da unidade subordinada a esta cobertura. Definimos a
integral de ω sobre M por Z Z
ω =∑ ρi ω .
M i M
Notemos que ρi ω possui suporte compacto em Ui e, portanto, cada termos desta soma é uma integral de uma
n-forma em M como em (8.1).
Proposição 8.2.2 Seja ω uma n-forma diferencial em uma variedade diferenciável orientada M de dimensão n,
com ou sem bordo. Suponha que ω possua suporte compacto em M. Então
Z
ω
M
não depende da escolha da escolha da estrutura diferenciável fixada nem da partição da unidade subordinada.
Demonstração. Suponhamos que {(V j , ψ j )} e {(Ui , ϕi )} sejam duas coleções finitas de vizinhanaças coordenadas
orientadas que cobrem supp ω e fixemos duas respectivas partições da unidade {ρ j } e {ρi }. Para cada i temos
Z Z
! Z
M
ρi ω =
M
∑ρj ρi ω = ∑
M
ρi ρ j ω .
j j
Somando em i obtemos Z Z
∑ ρi ω = ∑ ρi ρ j ω . (8.2)
i M i, j M
Observe que cada termo na soma do lado direito de (8.2) é a integral de uma n forma com suporte compacto em Ui
(por exemplo). Trocando os papéis de i e j obtemos
Z Z
∑ M
ρ jω = ∑
M
ρi ρ j ω ,
j i, j
e concluímos a demonstração.
Supnnha que N ⊂ M seja uma subvariedade orientada de dimensão k (com ou sem bordo) imersa na variedade
diferenciável. Se ω ∈ Ωk (M) e ω |N possui suporte compacto em N, então podemos definir a integral de ω em N
usando a restirção: Z Z
ω= ω |N .
N
140 CAPÍTULO 8. INTEGRAÇÃO EM VARIEDADES
Proposição 8.2.3 Suponha que M e N sejam variedades diferenciáveis orientadas de dimensão n, com ou sem
bordo, e sejam ω , η ∈ Ωn (M). As seguintes propriedades são válidas:
a) se α , β ∈ R, então Z Z Z
αω + β η = α ω +β η;
M M M
Demonstração. O item a) é de simples verificação. Já o item d) segue da Proposição 8.1.2 se supormos incialmente
que a n-forma possui suporte compacto em uma vizinhança coordenada e, após isso, usarmos partição da unidade
e o item a). No caso do item c), observamos inicialmente que a restrição de ω a uma vizinhança coordenada
{(U, ϕ )} satisfaz (ϕ −1 )∗ ω |U = f dx1 ∧ . . . ∧ dxn , onde f > 0 em U. Assim, cada termo na definição da integral de
ω é positivo. Observando que M e −M são difeomorfas via um difeomosfismo que reverte orientação, o item b)
segue do item d).
O próximo resultado é uma ferramenta que auxilia no cálculo de integrais de formas diferenciais.
Lema 8.2.4 Seja M uma variedade diferenciável com ou sem bordo orientada com dimensão n. Suponha que
A1 , . . . , Ak ⊂ M e B1 , . . . , Bk ⊂ Rn sejam compactos retificáveis e que Fi : Ai → Bi , i = 1, . . . , k sejam aplicações
suaves satisfazendo as seguintes propriedades:
a) Fi (Ai ) = Bi e Fi |Int Ai é um difeomorfismo de Int Ai em IntBi que preserva orientação para cada i = 1, . . . , k;
Demonstração. Suponhamos que supp ω está contido em U, onde (U, ϕ ) é uma vizinhança coordenada orientada
de M. Diminuindo um pouco U, podemos assumir que U é retificável. Definimos
Ci = U ∩ Bi , i = 1, . . . , k.
Exemplo 8.2.5 Vamos agora verificar como o Lema 8.2.4 facilita o cálculo de integrais de formas com um exem-
plo. Fixemos a 2-forma em R3 \ {0} dada por
ω = xdy ∧ dz + ydz ∧ dx + zdx ∧ dy,
3 3
a qual queremos integrar na esfera S2 = ∂ B (B é a bola fechada de raio 1 em R3 ). Para tanto, consideramos
F : D → S2 , onde
D = [0, π ] × [0, 2π ], F(ϕ , θ ) = (sen ϕ cos θ , sen ϕ sen θ , cos ϕ ).
3
Notemos que F = F̃|{1}×D , sendo F̃ : (0, 1] × D → B dada por
As coordenadas de F são
F 1 (ϕ , θ ) = sen ϕ cos θ , F 2 (ϕ , θ ) = sen ϕ sen θ , F 3 (ϕ , θ ) = cos ϕ ,
e por linearidade,
F ∗ ω = F ∗ (xdy ∧ dz) + F ∗ (ydz ∧ dx) + F ∗ (zdx ∧ dy),
onde:
F ∗ (xdy ∧ dz) = (x ◦ F)dF 2 ∧ dF 3 = − sen3 ϕ cos2 θ d θ ∧ d ϕ ,
F ∗ (ydz ∧ dx) = (y ◦ F)dF 3 ∧ dF 1 = − sen3 ϕ sen2 θ d θ ∧ d ϕ ,
F ∗ (zdx ∧ dy) = (z ◦ F)dF 1 ∧ dF 2 = − sen ϕ cos2 θ d θ ∧ d ϕ .
Dessa forma,
Z Z
ω= F ∗ω
S2 D
Z
= − sen ϕ d θ ∧ d ϕ
D
Z 2π Z π
= sen ϕ d ϕ d θ = 4π .
0 0
142 CAPÍTULO 8. INTEGRAÇÃO EM VARIEDADES
Teorema 8.3.2 (Teorema de Stokes) Seja M uma variedade diferenciável orientada de dimensão n. Suponha que
ω seja uma (n − 1)-forma em M com suporte compacto. Então
Z Z
dω = ω, (8.3)
M ∂M
O Teorema de Stokes possui um enunciado conciso e engloba várias informação importantes. Em particular,
se ∂ M = 0/ ou se supp ω ∩ ∂ M = 0,/ devemos interpretar a integral sobre ∂ M em (8.3) como sendo nula. Além
disso, se dim M = 1, então o lado direito de (8.3) será uma soma finita.
onde o circnflexo sobre dxi siginifa que este elemento está omitido no produto exterior. Calculamos então d ω :
n
ci ∧ . . . ∧ dxn
d ω = ∑ d fi ∧ dx1 ∧ . . . ∧ dx
i=1
n
∂ fi ci ∧ . . . ∧ dxn
= ∑ dx j ∧ dx1 ∧ . . . ∧ dx
i, j=1 x j
∂
n
∂ fi
= ∑ (−1)i−1 dx1 ∧ . . . ∧ dxn .
i=1 ∂ xi
Para o cálculo dos termos i 6= n usamos o Teorema Fundamental do cálculo para para mostrarmos que eles são
nulos:
n−1 Z RZ R Z R n−1 Z RZ R Z R
∂ fi ∂ fi
∑ (−1)i−1 0 −R
...
−R ∂ xi
dx1 . . . dxn = ∑ (−1)i−1 0 −R
...
−R ∂ xi
ci . . . dxn
dxi dx1 . . . dx
i=1 i=1
n−1 Z RZ R Z R
= ∑ (−1)i−1 ... fi |xxii =−R
=R ci . . . dxn
dx1 . . . dx
i=1 0 −R −R
= 0,
uma vez que fn = 0 se xn = 0. Note ainda que, se supp ω não intercepta ∂ Hn , fn também será zero para xn = 0.
Agora calculamos o lado direito de (8.3) e comparamos com (8.4). Temos
Z n Z
ω =∑ ci ∧ . . . ∧ dxn .
fi (x1 , . . . , xn−1 , 0)dx1 ∧ . . . ∧ dx
∂ Hn i A∩Hn
A restrição de dxn à ∂ Hn é zero pois xn é constante neste conjunto (veja o Exercício 166). Segue que todas as
parcelas na soma que contém dxn se anulam, ou seja,
Z Z
ω= fn (x1 , . . . , xn−1 , 0)dx1 ∧ . . . ∧ dxn−1.
∂ Hn A∩Hn
Agora lembremos que, na orientação de Stokes, (x1 , . . . , xn−1 ) orienta positivamente ∂ Hn se n é par e negativamente
se n é ímpar. Portanto,
Z Z
ω = (−1)n fn (x1 , . . . , xn−1 , 0)dx1 . . . dxn−1
∂ Hn A∩Hn
Z R Z R (8.5)
= (−1)n ... fn (x1 , . . . , xn−1 , 0)dx1 . . . dxn−1 ,
−R −R
Isto conclui o Passo 2, uma vez que ϕ orienta ∂ M positivamente (orientação de Stokes).
Passo 3. Finalmente vamos supor que ω é uma (n − 1)-forma com suporte compacto na variedade orientada M
e escolhemos uma coleção finita {(Ui , ϕi )} de vizinhanças coordenadas que orientam M e que cobrem supp ω .
Fixamos (ρi ) uma partição da unidade subordinada a esta cobertura e aplicamos o Passo 2 ao produto ρi ω para
144 CAPÍTULO 8. INTEGRAÇÃO EM VARIEDADES
obtermos
Z Z Z
ω =∑ ρi ω = ∑ d(ρi ω )
∂M i ∂M i M
Z
=∑ d ρi ∧ ω + ρi d ω
i M
Z
! Z
!
=
M
d ∑ ρi ∧ω +
M
∑ ρi dω
i i
Z
= dω ,
M
pois !
d ∑ ρi = d1 = 0.
i
Como já mencioamos, o Teorema de Stokes apresenta, de uma maneira bastante concisa, vários resultados
importantes de Análise Vetorial. Em sua demonstração utilizamos o Teorema Fundamental do Cálculo. Seja agora
N uma variedade diferenciável e suponha que γ : [a, b] → N uma imersão suave de maneira que M = γ [a, b] seja
uma subvariedade mergulhada com bordo em N. Se orientarmos M de maneira que γ preserva orientação, então
para qualquer f ∈ C∞ (N) temos do Teorema de Stokes e da Observação 8.3.1 que
Z Z Z
df = df = f = f (γ (b)) − f (γ (a)),
γ M ∂M
que é o Teorema Fundamental para Integrais de Linha. Em particular, se γ : [a, b] → R é a inclusão, então temos o
Teorema Fundamental do Cálculo.
Corolário 8.3.3 Suponha que M seja uma variedade diferenciável compacta, orientável e com bordo. Se ω ∈
Ωn−1 (M) é fechada, então Z
ω = 0.
∂M
Corolário 8.3.4 Suponha que M seja uma variedade diferenciável compacta, orientável e sem bordo. Se ω ∈
Ωn−1 (M) é exata, então Z
d ω = 0.
M
Teorema 8.3.5 (Teorema de Green) Seja D ⊂ R2 um compacto retificável com ∂ D suave. Se P, Q : D → R são
funções suaves, então
Z Z
∂Q ∂P
− dxdy = Pdx + Qdy.
D ∂x ∂y ∂D
Demonstração. Basta aplicarmos o Teorema de Stokes à forma Pdx + Qdy observando que
∂P ∂Q
d(Pdx + Qdy) = dP ∧ dx + dQ ∧ dy = dy ∧ dx + dx ∧ dy
∂y ∂x
Exercício 168 Suponha que exista η ∈ Ωn−1 (Rn \ {0}) tal que d η = 0 e
Z
η 6= 0.
Sn−1
Demonstre que η não é exata.
Exercício 169 Seja M uma variedade diferenciável compacta, sem bordo e orientada de dimensão m + n + 1.
Suponha que ω ∈ Ωm (M) e que η ∈ Ωn (M). Demonstre que
Z Z
ω ∧ dη = α dω ∧ η ,
M M
para algum α ∈ R.
Exercício 170 Suponha que M seja uma variedade doferenciável e que S ⊂ M seja uma subvariedade orientada
de dimensão k sem bordo. Suponha ainda que exista uma k-forma fechada ω ∈ Ωk (M) com
Z
ω 6= 0.
S
Esta k-forma pode ser exata? Além disso, S pode ser o bordo de alguma subvariedade de M compacta, orientada
e com bordo?
146 CAPÍTULO 8. INTEGRAÇÃO EM VARIEDADES
Capítulo 9
9.3 Homotopia
Exercício 171 Utilize o Lema de Poincaré para demonstrar que, para qualquer função f : U → R, onde U ⊂ R é
um aberto, existe uma função suave g : U → R tal que g′ = f .
Exercício 172 Seja U ⊂ R2 um subconjunto aberto e estrelado. Utilize o Lema de Poincaré para demonstrar as
afirmações abaixo.
a) Se u, v : U → R são duas funções suaves tais que
∂u ∂v
− = 0,
∂x ∂y
então existe uma função suave f : U → R tal que
∂f ∂f
=v e = u.
∂x ∂y
b) Para toda função suave f : U → R, existe um par de funções suaves u, v : U → R tais que
∂u ∂v
− = f.
∂x ∂y
147
148 CAPÍTULO 9. POINCARÉ, DE RHAM E EXEMPLOS ADICIONAIS
Exercício 173 Seja U ⊂ R3 um subconjunto aberto e estrelado. Utilize o Lema de Poincaré para demonstrar as
afirmações abaixo.
rot v = 0,
∇ f = v.
div v = 0,
rot w = v.
c) Para toda função suave f : U → R, existe um campo de votres suave w : U → R3 tal que
div w = f .
onde P, Q e R são funções desconhecidas. Mostre que tal sistema possui solução se, e somente se,
∂ A ∂ B ∂C
+ + = 0.
∂x ∂y ∂z
[1] Brezis, Haim: Functional analysis, Sobolev spaces and partial differential equations. Universitext. Springer,
New York, 2011.
[2] Dieudonné, J. A. Foundations of modern analysis. Enlarged and corrected printing. Pure and Applied Mathe-
matics, Vol. 10-I. Academic Press, New York-London, 1969.
[3] Krantz, S. G. e Parks, H. R. The implicit function theorem. History, theory, and applications. Birkhäuser
Boston, Inc., Boston, MA, 2002.
[4] Lima, E. L. Curso de Análise. Vol. 2, Rio de Janeiro, IMPA, Projeto Euclides, 1989.
[5] Lima, E. L. Variedades diferenciáveis, Publicações Matemáticas, Rio de Janeiro, IMPA, 2007.
[6] Folland, Gerald B.: Real analysis. Modern techniques and their applications. Second edition. Pure and Ap-
plied Mathematics (New York). A Wiley-Interscience Publication. John Wiley & Sons, Inc., New York, 1999.
[7] Goursat, E. J. B. Sour la théorie des fonctions implicites, Bulletin de la Société Mathématique de France, 31
(1903), 184–192.
[8] Hilbert, D. e Cohn-Vossen, S. Geometry and the imagination. Translated by P. Neményi. Chelsea Publishing
Company, New York, N. Y., 1952.
[9] Abraham, R.; Marsden, J.E. e Ratiu, T.: Manifolds, tensor analysis, and applications. Second edition. Applied
Mathematical Sciences, 75. Springer, Verlag, New York, 1988.
[10] Munkres, J. R. Analysis on manifolds, Addison-Wesley Publishing Company, Advanced Book Program,
Redwood City, CA, 1991.
[11] Munkres, J. R. Topology: a first course, Prentice-Hall, NJ, 1975.
[12] Rudin, W. Priciples of mathematical analysis, 2 ed., McGraw-Hill, New York, 1964.
[13] Spivak, M. Calculus on manifolds: a modern approach to classical theorems of advanced calculus, W. A.
Benjamin, Inc., New York-Amsterdam, 1965.
149