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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO PENAL E DIREITO

PROCESSUAL PENAL
DISCIPLINA: LEIS PENAIS ESPECIAIS
SÉRIE: 4ª
PROFESSOR: Me. FILIPE AZEVEDO RODRIGUES
ALUNO: SAMUEL DE OLIVEIRA PAIVA

RESENHA

O fenômeno da criminalidade,
RODRIGUES, Filipe
intrínseco que é em menor ou maior grau a
Azevedo. Crime organizado
e a tutela penal do qualquer sociedade, acompanha as
branqueamento de capitais:
intersecções históricas entre o mercado e o
um estudo crítico a partir do
direito penal do bem Estado, naturalmente tendo experimentado o
jurídico in “Lavagem de
aperfeiçoamento de seus métodos com a
dinheiro e crime
organizado: diálogos entre internacionalização e globalização que
Brasil e Portugal”. Belo
produzem a integração desses mercados.
Horizonte: Del Rey, 2016.
Dentro de um contexto de

sociedade de risco, profundamente determinada pelo advento de novas

preocupações e instabilidades, o Estado, sobretudo no seu braço punitivo,

convive hodiernamente com determinado tumulto legiferante, o que claramente

decorre da dificuldade de fornecer respostas rápidas e eficazes para a cada vez

mais intricada fronteira entre o lícito e ilícito, dentro do que se insere a

maximização do enriquecimento ilícito através de mecanismos de

branqueamento de capitais.

A prática do branqueamento de capitais (mais conhecido entre nós

como “lavagem de dinheiro”), tem nascedouro na necessidade de conversão do


dinheiro ilícito oriundo do tráfico de drogas em valores lícitos, através da

inserção e posterior retirada dos dividendos dele gerados no mercado regular.

Por óbvio, o branqueamento de capitais não mais depende do tráfico, eis que

apresenta dinamização por outras condutas delituosas, como os próprios crimes

contra a administração pública, tráfico de pessoas, terrorismo etc. Como bem

apontado pelo autor, é possível separar três grandes grupos de países, cada qual

com uma função predominante - ainda que não exclusiva - dentro do contexto da

macrocriminalidade, havendo aqueles produtores das commodities ilícitas,

aqueles que funcionam como consumidores desses produtos e, por derradeiro,

aqueles que mantêm as offshores (“paraísos fiscais”) responsáveis pela fase de

rentabilização e ocultamento financeiro dos montantes.

Descritas as linhas gerais do desse fenômeno criminoso específico,

denota-se a existência, no âmbito teórico do Direito Penal, de certa indefinição

quanto ao bem jurídico protegido pelo delito de branqueamento de capitais,

especialmente sob a perspectiva do direito penal econômico.

A teoria do bem jurídico, verdadeiro marco liberal, assenta-se na

necessidade de estrita vinculação entre o que se busca proteger com a norma

penal e o respeito da autonomia individual dos cidadãos, seja essa autonomia

direta ou indireta (nos limites em que mediada pelo sistema), sempre orientada

pelos direitos fundamentais, que reclamam tipos penais necessários, adequados

e proporcionais.

Destarte, ao menos três teorias reclamam a definição do bem jurídico

protegido pelo delito de branqueamento de capitais. Uma primeira teoria afirma

que o delito de branqueamento de capitais não possui propriamente um bem

jurídico, mas vale-se daquele relativo ao crime que lhe precede, ao passo que uma

segunda teoria sustenta ser o bem jurídico tutelado a ordem econômica (essa

predominante), enquanto a terceira defende ser a própria administração da

justiça.
Aponta, o autor, que a teoria que afirma ser o bem jurídico tutelado a

ordem econômica, parece não observar que, ao menos sob a ótica estritamente

econômica, inúmeros mercados são exatamente robustecidos pelo

branqueamento de capitais, geradores de vultuosa rentabilidade. Doutro ângulo,

o Direito Penal Econômico, embasado que é no interesse coletivo, deve ser

visualizado sempre como ultima ratio, além de que, como é o caso brasileiro, o

objeto expressamente declarado pela legislação tipificadora do branqueamento

de capitais reside no combate ao crime organizado e não a proteção da ordem

econômica, o que evidencia a incongruência.

No caso da tese da administração da justiça como bem jurídico

protegido pelo crime de branqueamento de capitais, os problemas repousam na

inegável expansão do poder punitivo que induz, implicando em verdadeiro

Direito Penal do Inimigo (terceira velocidade), valendo-se mencionar o exemplo

brasileiro, que já possui, na espécie, legislação de terceira geração, no sentido de

que qualquer que seja o crime antecedente admite-se a figura do branqueamento.

Os dilemas descritos, reinantes no âmbito da dogmática penal,

sinalizam até mesmo para certa indefinição quanto a correção do branqueamento

de capitais enquanto delito autônomo, parecendo ao autor ser mais interessante

que fosse analisado enquanto mera circunstância especial qualificadora ou

majorante, sendo ainda mais interessante a última hipótese, posto que menos

restritiva.

Em apertada síntese, são essas as reflexões levantadas pelo autor,

sendo forçoso concluir que pela dinâmica do fenômeno criminoso moderno,

muitas perplexidades surgirão no âmbito da dogmática penal, desafiando assim

o permanente repensar por parte dos operadores do direito e da sociedade de um

modo geral.

Mossoró/RN, 24 de agosto de 2017.

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