Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Artigo Jaume-Fatima PDF
Artigo Jaume-Fatima PDF
Introdução
Metodologia
O paciente conhecido como “Homem dos Lobos”, Sergei Pankejeff, era um adulto
jovem de classe socioeconômica alta cujo pai tinha um caráter marcadamente depressivo.
O paciente, pouco antes dos 4 anos de idade, desenvolveu uma histeria de angústia que
se transformou em uma neurose obsessiva religiosa que durou até os 10 anos. Sergei levou
uma vida normal dos 10 aos 18 anos, momento em que sofreu um surto psicológico após
uma infecção de gonorréia. Ele foi analisado por Freud de 1910, com 24 anos de idade,
até 1914, ano em que o próprio analista a deu por finalizada. No momento em que ele
começou a terapia psicanalítica ele era completamente dependente, incapaz de levar uma
vida autônoma. O paciente foi tratado de sua neurose infantil cerca de 15 anos após ela
ter acabado. A parte inicial do tratamento foi caracterizada por um longo período de
apatia, no qual não houve avanços. A respeito disso, Freud considerou que o paciente
tinha tanto medo de ter que levar uma vida autônoma que desenvolveu uma resistência a
cura. Neste sentido, podemos considerar que esta resistência seria um exemplo do que
Freud descreve na 24ª das Conferências de Introdução à Psicanálise (1915-17) como
ganho secundário da doença. Esta resistência inicial só pôde ser vencida por causa do
efeito da transferência entre Freud e seu paciente e à decisão de Freud de marcar um prazo
máximo para a conclusão do tratamento. Finalmente foi possível analisar o material
psíquico necessário para atingir uma correta compreensão do caso e o cancelamento dos
sintomas. No entanto, o analista austríaco reconhece em Análise terminável e
interminável (1937) que essa cura não foi definitiva, acontecendo varias recaídas.
Como o próprio Freud afirma, a importância deste caso radica em que a gravidade
dos sintomas e a duração do tratamento permitem aprender muito sobre o
desenvolvimento anímico, particularmente sobre como as pulsões sexuais participam da
gênese das neuroses.
A fixação está vinculada com outro mecanismo psíquico, a regressão, que consiste
em voltar a alguma etapa anterior do desenvolvimento. Estas duas funções estão
estreitamente relacionadas: quanto mais forte seja a fixação em determinada fase do
desenvolvimento, mais provavelmente uma aspiração sexual vai regredir a esta mesma
fase, quando seja frustrada, ou seja, quando enfrente algum obstáculo para a sua
satisfação. Paralelamente, a aspiração libidinal oporá menor resistência aos impedimentos
externos quanto mais forte seja a fixação. A regressão pode ser de dois tipos: retrocesso
aos primeiros objetos nos quais foi investida a libido, que são de natureza incestuosa, e
retrocesso de toda a organização sexual a fases anteriores. Ambos os tipos são muito
importantes para a gênese das neuroses. Como relata Freud em História de uma Neurose
Infantil (1918), no caso de Sergei Pankejeff, aconteceram esses dois tipos de regressão.
Por um lado, o paciente regrediu da fase fálica à fase sádico-anal, por que começou a
praticar a masturbação na frente da sua babá, que reprovou duramente esta atitude e ele
relacionou essa reprovação com o perigo de castração; pelo outro, a rejeição da babá fez
Sergei voltar à sua escolha de objeto primária, seu pai, com quem ele tinha realizado o
processo psíquico de identificação.
Em relação aos conceitos de fixação e regressão, deve ser salientada uma idéia
que aparece recorrentemente na obra freudiana no sentido de que, apesar do
desenvolvimento por fases do psiquismo humano, as diferentes etapas nunca são
completamente superadas. Isso é afirmado, por exemplo, em referência aos diversos tipos
de angústia, na 32ª das Novas Conferências de Introdução à Psicanálise (1931-32) e
também, considerando o desenvolvimento psíquico em geral, em Análise terminável e
interminável (1937).
Em poucas palavras, o eu pode ter duas atitudes frente à regressão aos pontos de
fixação: ou admiti-la, e então a pessoa se torna perversa, ou rejeitá-la, o que provocará
uma repressão. Portanto, a inclinação ao conflito depende tanto do desenvolvimento do
eu quanto do desenvolvimento da libido.
Ainda no artigo sobre a repressão, Freud comenta que uma das suas características
é que exige um esforço constante. O reprimido continua querendo acessar a consciência
e é preciso um esforço permanente em sentido contrario; para manter-lo inconsciente.
Parece claro que a angústia foi gerada numa situação de perigo e é reproduzida
sempre que se apresenta uma situação semelhante. Para Freud, cada idade, cada etapa do
desenvolvimento tem associada uma determinada condição de angústia. Na primeira
etapa de imaturidade biológica teríamos o perigo do desvalimento psíquico (decorrente
de seu desvalimento físico). Na primeira infância, o perigo é a perda de objeto, ou seja, a
separação da mãe, que é um objeto que recebe um enorme investimento libidinal, pois é
a fonte de alimentação e cuidados. Na fase fálica, o perigo é a castração; nesta fase é o
penis o objeto que recebe um elevado investimento libidinal, também porque representa
a possibilidade de união com a mãe, de acordo com Ferenczi. Mais tarde, esta angústia
de castração se transforma em angústia frente à consciência moral. O que se teme é o
castigo do supereu. No entanto, estas situações de angústia podem conviver e levar o eu
a determinadas reações de angústia em períodos posteriores ao que seria adequado ou
podem acontecer varias ao mesmo tempo. Portanto, podemos entender que não existe o
perigo de considerar a angústia de castração como o único motor dos processos defensivos
que conduzem à neurose. Nesse sentido, no caso da mulher a situação de perigo mais
eficaz seria a perda de objeto. Na verdade, a perda do amor por parte do objeto, mais do
que a perda do objeto em si. Dada a maior prevalência da histeria entre a população
feminina, Freud postula que esta perda de amor do objeto teria a mesma função geradora
de angústia que a angústia de castração nas fobias e a angústia frente ao supereu na
neurose obsessiva.
A primeira gira em torno dos pólos: frustração exterior e fixação libidinal. Freud
considera a possibilidade de atribuir maior peso ao fator endógeno na ponderação da
importância destas duas variáveis para a contração das neuroses, mas acaba relacionando
esta opção com a extensão que se queira dar ao próprio conceito de neurose. Mais
especificamente, quanto maior a fixação, menor será a frustração necessária para produzir
a regressão libidinal, até que no limite seja possível se pensar em uma neurose com
etiologia quase que totalmente endógena e outras com etiologia quase que exclusivamente
exógena. Em relação à dinâmica entre esses dois pólos, Freud comenta em Análise
terminável e interminável (1937) que nas neuroses existe uma ação combinada do fator
constitucional e do acidental. Quanto mais importante seja o primeiro, mais facilmente
um trauma levará à fixação, deixando uma perturbação do desenvolvimento como
conseqüência. Quanto mais importante seja o fator traumático, mais vai manifestar o
sofrimento que este gerou, mesmo num paciente com um funcionamento pulsional
normal. Assim, é claro, do ponto de vista freudiano, que as neuroses com etiologia
traumática apresentam um prognóstico mais favorável. O autor austríaco considera que
somente nesses casos, em que mediante o fortalecimento do eu se consegue tramitar
corretamente o que não o foi em períodos anteriores, se pode falar de uma análise
definitivamente acabada. Os fatores desfavoráveis para a análise, e que podem atrapalhar
seu desenvolvimento, tornando-a interminável, seriam a intensidade constitucional das
pulsões e a alteração prejudicial do eu adquirida nos processos de defesa.
Em História de uma Neurose Infantil (1918), Freud discute o valor das vivências
da primeira infância na gênese da neurose. Para Freud, no caso do homem dos lobos e em
consonância com o sentido global da teoria psicanalítica, estas vivências são
indubitavelmente relevantes. Sendo que, de acordo com a teoria freudiana, a constituição
sexual como fator interno predisponente e a frustração formam uma série complementar
na gênese das neuroses, Freud explica que o fato de uma criança contrair uma neurose no
seu terceiro ou quarto ano evidencia que o fator constitucional pode ser tão eficaz que
nenhuma frustração é requerida para dar origem à neurose.
A segunda perspectiva sobre a etiologia das neuroses da que Freud trata nas
Conferências de Introdução à Psicanálise (1915/16) é o ponto de vista econômico, ou
quantitativo. A esse respeito, afirma que a quantidade, a magnitude das energias que
entram em jogo, tem que ser tida em conta em todo lugar. Um conflito psíquico não
irrompe sem chegar a acumular certa intensidade energética. A importância patogênica
dos fatores constitucionais depende de quão grande é o desequilíbrio entre a magnitude
de uma pulsão respeito de uma oposta. De fato, todo homem tem os mesmos tipos de
disposições no qualitativo; as diferenças estão nas proporções quantitativas. Da mesma
forma, para avaliar a resistência à contração das neuroses, é importante levar em conta a
quantidade de libido que a pessoa pode conservar sem aplicar e quanta fração desta pode
sublimar. O objetivo do aparelho anímico de evitar o desprazer pode-se descrever em
termos quantitativos como a tentativa de dominar os volumes de estímulo que operam no
seu interior, impedindo que cheguem a produzir desprazer.
Considerações finais
No relato que o autor realiza do caso clínico de seu paciente russo, Sergei
Pankejeff, em História de uma Neurose Infantil (1918), Freud ressalta a aparente
predisposição de Sergei à neurose, determinada tanto ao nível hereditário/familiar quanto
ao nível das vivências traumáticas da sua infância, entre as que podemos citar a impressão
que lhe causou a cena primordial, o episodio de sedução protagonizado pela sua irmã e a
reprovação que sua babá fez das suas práticas masturbatórias junto à intelecção da
possibilidade de castração. Assim, Freud parece focar sua atenção no fator constitucional.
Neste sentido, o analista austríaco discute o papel da filogenia e da experiência
ontogenética, assim como das vivências realmente vivenciadas e das fantasias; no
entanto, não chega a atribuir um peso específico no esquema etiológico das neuroses a
nenhum desses pólos que configuram duas das series complementares que ele descreve
nas Conferências.
Referências