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Esporte Na Escola e Esporte Da Escola PDF
Esporte Na Escola e Esporte Da Escola PDF
O "esporte na escola"
e o "esporte da escola":
da negação radical para uma relação de tensão permanente
Um diálogo com Valter Bracht
A idéia central
Este artigo discute as relações da es-
que apresento cola com as práticas culturais de es-
para este diálo- porte, estabelecendo um diálogo com o
go é a de que a livro de Valter Bracht (1992) e trazendo
escola, como para essa discussão as contribuições de
instituição alguns estudiosos da história das
disciplinas escolares (Nóvoa, Forquin e
social, pode Chervel). A idéia central defendida é a
produzir uma de que a escola pode produzir uma
cultura escolar cultura escolar de esporte que, ao invés
de esporte que, de reproduzir as práticas de esporte
ao invés de hegemônicas na sociedade, como
reproduzir as
escreveu Bracht, estabeleça com elas
uma relação de tensão permanente,
práticas de intervindo na história cultural da
esporte sociedade.
hegemônicas na
sociedade, como
escreveu Bracht,
estabeleça com As práticas culturais de esporte vêm
elas uma relação sendo escolarizadas ao longo deste século, dos muitos pontos trazidos à reflexão pelo
de tensão per- como um dos temas de ensino da Educação autor, justamente aquele que trata do ensino
Física. Então, quais as relações possíveis da do esporte na escola, por intermédio da
manente, num
escola (e do seu ensino de Educação Física) Educação Física.
movimento
com as práticas culturais de esporte?
propositivo de
A idéia central que apresento para
intervenção na
Tentando refletir acerca das possíveis este diálogo é a de que a escola, como
história cultural instituição social, pode produzir uma cultura
respostas a essa pergunta, tomei como
da sociedade. referência o livro de Valter Bracht (1992)', escolar de esporte que, ao invés de
Educação Física e aprendizagem social, o reproduzir as práticas de esporte hege-
que se justifica por ser esse autor um dos mônicas na sociedade, como escreveu
mais lidos pelos professores de Educação Bracht, estabeleça com elas uma relação de
Física, no Brasil (Oliveira, 1994). A intenção tensão permanente, num movimento
é a de estabelecer com esse estudioso um propositivo de intervenção na história cul-
diálogo2 para discutir um tural da sociedade.
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Bracht não sustenta seus argumentos como um "sistema" sem poder, posicionada
apenas na teoria dos sistemas. Ele procura na hierarquia social como reprodutora de a-
complementá-la com base no materialismo ções determinadas por outros sistemas e, por-
histórico para dizer que tanto, submissa a eles. Seus "códigos e fun-
ções" ou seus "critérios seletivos" perdem for-
os sistemas sociais não podem ser simplesmente ça. Ora, esse é somente um dos muitos olha-
colocados lado a lado, e sim, para superar o
res que se pode lançar sobre a escola e um dos
caráter meramente descritivo da análise, preci-
samos, através da análise histórica, identificar a pontos centrais deste diálogo com o texto de
gênese dos sistemas, as suas determinações, ou Bracht.
seja, através da categoria antropológica do
trabalho, introduzir a questão do poder nas re-
lações intersistemas. Isto significa perguntar, por
exemplo, em que medida um sistema não tem
sua identidade ou o sentido norteador das ações, Um outro olhar para a escola: um lugar de
determinados por outros sistemas (que produção de cultura
constituem o seu meio ambiente) mais 'pode-
rosos'? É preciso analisar o desenvolvimento em Torna-se fundamental, aqui, trazer a
primeira idéia é a função de sua posição na hierarquia global
(p.19). crítica de Antônio Nóvoa àquele olhar sobre
de que Bracht a escola como lugar de transmissão de
defende que a Bracht entende que um dos critérios que conhecimento:
escola tem seus identificam a diferenciação de um sistema diz
próprios Historicamente a escola foi vista como um 'lugar
respeito à diferenciação dos papéis. Isto é, em de cultura': primeiro numa acepção idealizada de
"códigos e que medida os diferentes papéis que preci- aquisição de conhecimentos e das normas
funções", admi- sam ser cumpridos no interior de um sistema, 'universais', mais tarde numa perspectiva crítica
tindo então que não se confundem com outros de outros siste- de inculcação ideológica e de reprodução social.
ela possua uma mas. Ou seja, um "sistema" — como a escola Num e noutro caso, ignorou-se o trabalho
— poderia estar cumprindo papéis determina- interno de produção de uma cultura escolar, em
certa autonomia relação com o conjunto das culturas em conflito
como instituição
dos por outros sistemas "mais poderosos".
numa dada sociedade, mas com especificidades
Percebe-se, aqui, que Bracht abandona aquela próprias que não podem ser olhadas apenas pelo
social. A segunda
primeira idéia, registrada anteriormente, de prisma das sobredeter-minações do mundo
idéia decorre uma possível autonomia da Escola para esta- exterior. (Nóvoa, 1994. p.15)
imediatamente belecer seus próprios "códigos e funções", seus
desta: a Educa- "critérios seletivos" para se relacionar com o E também a crítica de André Chervel
ção Física (e os meio ambiente e regular esta relação. (1990):
temas que ela vai
A concepção de escola como puro e simples
ensinar, entre os Ao abandoná-la, Bracht expressa um agente de transmissão de saberes elaborados
quais o esporte), outro entendimento sobre a escola: fora dela está na origem da idéia, muito ampla-
sendo constituin- mente partilhada no mundo das ciências huma-
A instituição educacional é produto de um nas e entre o grande público, segundo a qual ela
te da escola, processo de complexificação da sociedade — é, por excelência, o lugar do conservadorismo,
assume e incor- produzido fundamentalmente pelo desenvolvi- da inércia, da rotina (p.182).
pora em seu mento das forças produtivas — que determinou
ensino esses uma diferenciação de sistemas, os quais Especialmente no Capítulo 1 (mas
"códigos e cumprem, no conjunto das relações sociais, também nos outros três), Bracht parece pró-
determinadas funções: a transmissão do saber ximo das visões históricas sobre a escola
funções" da social acumulado exigiu o surgimento de uma criticadas por Nóvoa e por Chervel. Bracht
escola. instituição para cumprir tal tarefa — o sistema
parece ainda não reconhecer o trabalho in-
educacional (p.19).
terno de produção de uma cultura escolar. E
Percebe-se, então, que Bracht agora se isso terá repercussões em sua discussão sobre
refere à escola como um lugar unicamente da o esporte na escola, como se verá adiante.
"transmissão do saber social acumulado", sen-
do essa a tarefa que o sistema educacional O entendimento de Bracht não é im-
deve cumprir. Ou seja, a escola é entendida procedente: a escola pode, sim, de um lado,
como um lugar de transmissão de um conhe- estar cumprindo também aquela tarefa por
cimento produzido sempre fora dela, por um ele exposta. Mas, de outro lado, a escola
outro sistema "mais poderoso", para usar a sua pode não se reduzir a ela, como
expressão. Por aí, Bracht apresenta a escola
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se fosse uma "correia de transmissão" de de fornecer "a base" para o esporte de rendi-
uma cultura produzida por outros "sistemas", mento. A escola é a base da pirâmide esporti-
sem intervir nela. Um outro olhar então se va. É o local onde o talento vai ser descoberto.
Esta relação, portanto, não é simétrica (p. 22).
pode lançar à escola, reconhe-cendo-a como
uma instituição que possui a capacidade de Parece haver uma certa ambigüidade
produção de uma cultura escolar. Isto é, uma nessa afirmação. Bracht inicialmente escreve
escola que possua certa autonomia para que o esporte e a Educação Física "condi-
produzir a sua cultura, com seus próprios cionam-se mutuamente". Isso dá a entender
códigos e critérios — como o próprio Bracht que o esporte estaria influenciando (ou con-
havia presumido existir — e, assim, dicionando, ou determinando) o ensino da
estabelecer relação com o conjunto das Educação Física, na escola, na exata medida
culturas em conflito numa dada sociedade, do seu contrário, isto é, que a Educação
como escreve Nóvoa. A diferença Física também estaria influenciando o es-
fundamental, aqui, é que se defende que a porte. Contudo, ao final, depois de dizer que
escola tem um movimento propositivo de a Educação Física é a "base da pirâmide es-
intervenção cultural na sociedade. Esse outro portiva", Bracht afirma que a relação entre
olhar para a escola é fundamental para a ambos "não é simétrica". Ou seja, se há um
discussão que segue e, por isso, estará pólo subordinado nesta relação, este é o da
sempre presente.
Educação Física, na escola.
O entendimento
de Bracht não é
Nesse quadro, Bracht apresenta uma
improcedente: a
idéia que se tornou muito conhecida e aceita
O "esporte na escola" e a negação radical quando de sua publicação (e aqui me in- escola pode, sim,
do "esporte da escola" cluo): de um lado, estar
cumprindo
É aqui, então, que irei privilegiar as re- ... a Educação Física assume os códigos de uma também aquela
lações da escola com o esporte, dialogando outra instituição[a instituição esporte], e de tal
forma que temos então não o esporte da escola tarefa por ele
com Bracht. e sim o esporte na escola, o que indica a sua exposta. Mas, de
subordinação aos códigos/sentidos da insti- outro lado, a
Sempre aproveitando o próprio texto de tuição esportiva. O esporte na escola é um escola pode não
Bracht, nele se encontra uma breve síntese do prolongamento da própria instituição esportiva. se reduzir a ela,
desenvolvimento do esporte no mundo e que aqui Os códigos da instituição esportiva podem ser
resumidos em: princípio do rendimento como se fosse
será citada para contextualizar a discussão:
atlético-desportivo, competição, comparação de uma "correia de
O esporte sofre no período do pós-guerra um rendimentos e recordes, regulamentação rígida, transmissão" de
grande desenvolvimento quantitativo. Afirma- sucesso esportivo e sinônimo de vitória, uma cultura
se paulatinamente em todos os países sob a racionalização de meios e técnicas. O que pode
ser observado é a transplantação reflexa destes produzida por
influência da cultura européia, como o elemento
hegemônico da cultura de movimento. No códigos do esporte para a Educação Física. outros "siste-
Brasil as condições para o desenvolvimento do Utilizando uma linguagem sistêmica, poder-se- mas", sem
esporte, quais sejam, o desenvolvimento indus- ia dizer que a influência do meio ambiente intervir nela.
trial, com a conseqüente urbanização da (esporte) não foi/é selecionada (filtrada) por um
população e dos meios de comunicação de código próprio da Educação Física, o que
massa, estavam agora, mais do que antes, demonstra sua falta de autonomia na deter-
presentes (p.22). minação do sentido das ações em seu interior.
(Bracht, 1992, p.22; grifo meu)
É exatamente a partir do grande de-
senvolvimento do esporte pelo mundo que, para Note-se que é aqui que Bracht vai
Bracht, irá dar-se o fato mais marcante na abandonar aquela segunda idéia registrada
história da Educação Física, na escola, a partir da anteriormente — a de que a Educação Físi-
Segunda Guerra Mundial — a sua subordinação ca, realizando-se no interior do sistema edu-
ao esporte de rendimento: cacional, poderia assumir o estatuto de ati-
vidade pedagógica, incorporando-se aos
É importante citar que o desenvolvimento da códigos e às funções da própria escola. Ago-
instituição esportiva não se dá indepen-
ra, o autor afirma taxativamente que a Edu-
dentemente do da Educação Física: condicio-
nam-se mutuamente. A esta é colocada a tarefa cação Física "assume os códigos de uma
outra instituição", mais poderosa: a institui-
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os códigos
O esporte é legitimado pela sociedade As questões que coloco para este diá-
citados.
e é exatamente isso que garantiria legitimida- logo são estas: a Educação Física, na escola,
de para o ensino de Educação Física na esco- tem sido mesmo apenas e tão somente um
la: ensinar esporte. Mas, paradoxalmente, pa- veículo de transmissão/reprodução do
rece que a Educação Física somente seria le- esporte, com os códigos do esporte de ren-
gitimada na escola na medida em que trans- dimento citados por Bracht? Ela apenas está
mitisse (ensinasse) esse elemento da cultura "servindo à indústria do esporte"? Ou, de
tal como ele se realiza nas sociedades moder- outra forma: a escola não possui e nem se-
nas, com os códigos citados. Nessas socieda- quer desenvolveu nenhum "grau de autono-
des, o esporte alcança, segundo Bracht, uma mia" para, por intermédio da Educação Fí-
"unanimidade", assim resumida por ele: sica (mas também de outros tempos e espa-
ços educativos), ensinar o esporte por seus
Ser esportivo, aparentar boa forma física, já
quase não é uma opção, mas sim uma imposição
próprios códigos, normas ou critérios? Ela se
social. Ligada a este boom do corpo ou das resume a realizar uma "transplantação
práticas corporais, temos oboom da indústria do reflexa" do esporte produzido "totalmente
lazer e dos materiais esportivos, (p.46) fora dela"? Ela não tem ou nem pode cons-
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truir uma forma própria de cultivar e ensinar sim é que a história do esporte, no Brasil, evi-
o esporte? dencia a sua origem aristocrática, mas tam-
bém um movimento de popularização crescen-
Como prática cultural, o esporte incor- te de algumas de suas manifestações (o maior
pora valores sociais, culturais, econômicos e exemplo é o futebol). O uso do esporte para
estéticos de uma dada sociedade historicamen- fins políticos e ideológicos também é um fato
te organizada, sendo realizado em diferentes (a era Vargas e a era da ditadura militar são
espaços sociais e culturalmente apropriado de ilustrativas; Linhales, 1996).
múltiplas formas — inclusive as não-autori-
zadas. A escola é um desses espaços de reali- Por um lado, numa sociedade estru-
zação e de apropriação da prática cultural de turada em moldes capitalistas de produção,
esporte, e é o tratamento que ela dá a ele, na como é a brasileira, o esporte não ficou imu-
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Educação Física, que interessa aqui. ne a um processo de mercantilização que pa-
rece sem fronteiras. O esporte incorpora (ou
Assim, de um lado, pergunta-se: é impos- já é mesmo criado com) os valores estimula-
sível a escolarização do esporte, isto é, a produ- dos por este modelo: a competição, a classifi-
ção de um "esporte da escola", que seja uma prá- cação, a seleção, a comparação, a performan-
tica da cultura escolar, com seus códigos própri- ce, a vitória... enfim, aqueles mesmos códigos
os? E, de outro lado, também pergunta-se: como indicados por Bracht. A paulatina constituição
seria isso sem o "esporte na escola"? do esporte com a propriedade de ser "de ren-
dimento" indica uma das suas possíveis for-
Creio que o problema central está aqui: mas de manifestação numa sociedade de mol-
ao afirmar que "temos não o esporte da escola des capitalistas. O processo de mercantilização
e sim o esporte na escola", Bracht estabelece referido pode ser exemplificado na venda de
uma negação radical da possibilidade de se espaços para publicidade nos lugares da práti-
ter o "esporte da escola", negação que se dá ca esportiva (estádios e ginásios, por exem-
com a presença do "esporte na escola". Ou plo) e nos uniformes dos atletas; na compra,
seja, a existência deste impõe-se de tal forma na venda ou na troca dos próprios atletas (tal-
na escola (e à escola), que inibe, inviabiliza, vez ainda a maior e mais rentável das merca-
opõe-se, enfim, nega a existência daquele. dorias esportivas, com sua expressão legal na
Então, é a instituição esportiva, como um lei do passe), no gerenciamento empresarial
"sistema mais poderoso", que determina as ações dos clubes, num imenso mercado gerado em
que uma outra instituição mais fraca, a escola (e, torno do esporte (produtos de beleza, cigar-
nela, a Educação Física) deve realizar. Em decor- ros, bebidas, roupas, calçados, uma infinidade
rência, a ação da Educação Física na escola se de material esportivo, carros, bicicletas, mo-
limitaria a ser a "base da pirâmide esportiva", a tocicletas... tudo pode ser melhor vendido
fonte dos talentos para o esporte de rendimento. quando associado ao esporte, à idéia de que
É a configuração da relação assimétrica a que se ele é um bem acima de qualquer suspeita). Os
referiu o autor. No limite, isso elimina a possibili- exemplos poderiam continuar, garimpados de
dade de o esporte ser escolarizado, de a cultura praticamente todos os campos da atividade
escolar ter o seu esporte. É a perda da autonomia humana. (Castellani F°, 1989; Ghiraldelli,
pedagógica, ainda que com a conquista da legiti- 1989; Kunz 1991; Bracht, 1992; Linhales,
midade pedagógica. 1996). Mas essa forma de existência não ficou
restrita às fronteiras capitalistas: paradoxalmen-
te, os países ditos socialistas também desenvol-
Sim, pode-se admitir que essa é uma das veram e usaram o esporte com esses mesmos
possíveis manifestações do esporte na escola. códigos, para fins políticos e ideológicos.
Mas seria essa negação radical a única possi-
bilidade de relação entre o esporte e a escola?
Por outro lado, no entanto, o percurso
histórico do esporte, no Brasil, também pode
ser investigado a partir das tentativas de apro-
priação de suas várias manifestações, das for-
O esporte entra em "campo" na escola mas de resistência ao seu controle político,
econômico e cultural e, ainda, da produção
Como prática cultural, o esporte ocupa de outras formas de praticá-lo, por parte dos
um importante lugar nas relações sociais. As- setores populares da sociedade — esse é um
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tema de investigação ainda pouco explorado (o espaço e o tempo oficiais para o seu ensi-
por pesquisadores da Educação Física. no). É eleito (ou imposto?) como algo digno
de ser ensinado. Em suma, é por esse proces-
Não aceitando ser meros coadjuvantes so histórico que se tem o "esporte na esco-
da história, os setores populares também bus- la": o esporte entrou no "campo" da escola.
caram (e buscam) apropriar-se das práticas
culturais de esporte. O futebol, como citado, No entanto, há que se investigar tam-
talvez seja o melhor exemplo disso: de espor- bém se a escola não foi (ou é) um "campo"
te aristocrático transformou-se num dos maio- apropriado pelos alunos oriundos dos setores
res fenômenos de massa, sendo praticado em populares para o acesso à prática de esportes.
condições diversas. Fundamental é que ele tam- E não me refiro aqui somente às aulas curri-
bém foi apropriado pelos setores populares.4 culares de Educação Física. Refiro-me tam-
Assim, diferente- bém, e principalmente, às estratégias usadas
mente de uma para ocupação dos espaços e dos tempos es-
Há então muitas imbricações a serem
negação radical colares, ainda que contra a (ou apesar da) pró-
consideradas pelos estudiosos da Educação pria escola, para a prática das modalidades
do "esporte da Física no percurso histórico do esporte no Bra- esportivas, e com códigos que não necessaria-
escola" pelo sil, para que se possa ampliar a compreensão mente reproduzem os do esporte de rendimen-
"esporte na das múltiplas formas de apropriação desta prá- to, mas com a construção de regras, de tem-
escola", conside- tica cultural — principalmente das apropria- pos e de espaços próprios. Como assinalei, as
ro ser frutífero ções não-autorizadas das práticas culturais de apropriações e as práticas não autorizadas de
para a Educação esporte, por parte dos setores populares. esporte por alunos e professores se constitu-
Física avançar no em num interessante tema para pesquisas em
sentido de Pois bem, essas breves considerações Educação Física.
construir uma históricas, aliadas àquelas citadas de Bracht,
relação de
têm a intenção de perguntar: poderia a escola Assim, diferentemente de uma nega-
ficar indiferente ou alheia a essa história? ção radical do "esporte da escola" pelo "es-
tensão perma-
nente entre eles. porte na escola", considero ser frutífero para
Os estudos sobre a história da Educa- a Educação Física avançar no sentido de
Uma relação de
ção Física e do esporte já demonstraram que construir uma relação de tensão permanente
tensão perma- não. Especificamente sobre as relações entre entre eles. Uma relação de tensão perma-
nente que se o esporte e a Educação Física na escola, tais nente que se estabeleça entre uma prática de
estabeleça entre estudos — e os de Bracht são muito importan- esporte produzida e acumulada historicamen-
uma prática de tes para isso — apontam a predominância de te e uma prática escolar de esporte (a cultura
esporte produzi- uma relação histórica onde a submissão e a escolar de esporte).
da e acumulada dependência da Educação Física ao esporte de
historicamente e rendimento aparecem com muita força
uma prática (Castellani P, 1988; Ghiraldelli, 1989; Kunz,
escolar de 1991; Bracht, 1992; Linhales, 1996). Da negação radical à tensão permanente:
esporte (a os/as professores/as de Educação Física
cultura escolar Nos anos 1980, essa relação de submis- como produtores/as de cultura na escola
de esporte). são começa a ser problematizada por estudio-
sos/as da Educação Física. Entre eles, os es- É certo que se pode questionar os limi-
critos de Bracht parecem indicar a existência tes políticos e culturais que possui a escola para
da referida negação radical, ao afirmar que se criar uma cultura escolar de esporte, com es-
tem "o esporte na escola, mas não o esporte da pecificidades e organização próprias para, com
escola". ela, confrontar-se com o chamado esporte de
rendimento, produzido no interior de uma so-
Realmente, por suas relações com a to- ciedade predominantemente capitalista e por-
talidade social, da qual é uma manifestação, a tadora dos valores desta. Consciente desses
escola não poderia ficar alheia a todo esse pro- limites, creio também que é aí que se localiza
cesso histórico de consolidação do esporte a principal tarefa do/da professor/a: ser um/
como prática cultural da sociedade moderna.
uma produtor/a de cultura. Aliás, uma tarefa
Ele penetra por seus portões, é praticado em
ao mesmo tempo desafiadora e, por isso mes-
seus espaços e em seus tempos, consolida-se
mo, estimulante.
como conteúdo de ensino da Educação Física
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Então, a partir dessa relação de tensão reflexa" dos códigos do esporte para a escola
permanente, pode-se discutir as possibilidades (e de outras práticas), que ele menciona (p.22).
que se abrem para o ensino de Educação Físi- Com esta mesma preocupação, Kunz (1994)
ca ao tratar da prática cultural de esporte como se refere a uma "transformação didática do
um de seus temas, e aí, provocando a constru- esporte" a ser realizada pela escola. A
ção de sua cultura escolar do tema esporte. "filtragem crítica" proposta por Bracht e a
"transformação didática do esporte", de Kunz,
O esporte que penetra o espaço escolar aproximam-se da idéia de Forquin (1992) so-
é o esporte criado e praticado culturalmente bre a tarefa de "transposição didática" que a
na sociedade, com interesses diversos e escola pode realizar:
conflituosos, certamente. Esse esporte é
A educação escolar não se limita a fazer uma
escolarizado e incorporado à cultura escolar. seleção entre os saberes e os materiais culturais
disponíveis num momento dado da sociedade.
Como uma prática sociocultural da so- Ela deve também, a fim de os tornar
ciedade moderna, o esporte está "na escola", efetivamente transmissíveis, efetivamente
sim, e tudo indica a sua permanência nela. E assimiláveis para as jovens gerações, se entregar
a um imenso trabalho de reorganização, de
por que o esporte não estaria na escola? A pro- reestruturação, de "transposição didática". (p.32)
pósito, Forquin (1992), por intermédio de
Denis Lawton, chama a atenção para o fato Forquin se apóia em Michel Verret para
de que escrever que toda prática de ensino de um
objeto pressupõe a transformação prévia deste
certos aspectos de nosso modo de vida, certos
tipos de conhecimento, certas atitudes e certos objeto em objeto de ensino.
valores são considerados, na verdade, como
tendo suficiente importância para que sua trans- Aplicando tal idéia ao esporte, têm-se
missão à geração seguinte não seja deixada ao que a transposição didática do esporte, isto é,
acaso em nossa sociedade, mas seja confiada a a passagem de sua condição de saber erudito
profissionais especialmente formados (os do-
centes) no contexto de instituições complexas e
para a condição de saber ensinado na escola,
custosas (as escolas), (p.31) pressupõe, então, a sua transformação em um
objeto de ensino.
Creio que isso se aplica às práticas cul-
turais de esporte. E, por isso, estranho mesmo Se isso é fundamental, no entanto, não
seria ele não estar lá "na escola". A questão é suficiente, pois, ainda assim, continua-se no
central passa a ser, então, o tratamento, a rela- entendimento de que cabe à escola apenas o
ção da escola com essas práticas culturais no papel de transmitir saberes produzidos fora
seu processo de ensino, tanto na Educação Fí- dela, ainda que ela possa transformar esse sa-
sica quanto em outros espaços e tempos ber. Até aqui, não se atingiu, ainda, o entendi-
educativos. Veja-se que Forquin, como Bracht, mento de que a escola pode produzir a sua
também se refere somente à "transmissão" de cultura escolar.
certos tipos de conhecimento. Mas ambos não
avançam para a idéia de que haja a produção É em André Chervel (1990) que se pode
de uma cultura escolar, no caso, cultura esco- encontrar um avanço necessário a esse enten-
lar de esporte. Ambos não consideram um dimento:
movimento propositivo da escola na produção
dessa sua cultura própria de esporte. A história das disciplinas escolares expõe à
plena luz a liberdade de manobra que tem a
A esse respeito, há uma importante dis- escola na escolha de sua pedagogia. Ela depõe
contra a longa tradição que, não querendo ver
cussão a ser aprofundada (e que se deve esten- nas disciplinas ensinadas senão as finalidades
der muito além deste artigo, obviamente). que são efetivamente a regra imposta, faz da
escola o santuário não somente da rotina mas da
Bracht defende em seu texto que a Edu- sujeição, e do mestre, o agente impotente de
cação Física deve realizar uma "filtragem crí- uma didática que lhe é imposta do exterior. (P-
193)
tica" das atividades corporais, ao ensiná-las,
na escola, o que seria fundamental para o de- Com isso, prossegue Chervel, permane-
senvolvimento de sua identidade pedagógica cendo totalmente no interior desse quadro ri-
(p.24). Isso se oporia àquela "transplantação
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gido (...) se fechou toda possibilidade de ver o a idéia de rendimento e performance que pre-
movimento surgir do interior [da escola]. dominantemente orientam o seu ensino na es-
Note-se que Chervel se aproxima aqui daque- cola). E essa tensão é possível porque o ensi-
la crítica de Antônio Nóvoa a uma visão no produzido e realizado na escola não se en-
reducionista de escola. cerra nele mesmo:
As disciplinas escolares intervém igualmente na
Ora, se, como afirmou Nóvoa, não se história cultural da sociedade. Seu aspecto
pode ignorar "o trabalho interno de produção funcional é o de preparar a aculturação dos alu-
de uma cultura escolar", e agora, como regis- nos em conformidade com certas finalidades: é
tra Chervel, é preciso perceber "o movimento isso que explica sua gênese e constitui sua razão
surgir do interior da escola", pode-se, então, social. Mas se se as consideram em si mesmas,
tornam-se entidades culturais como outras, que
admitir que a escola — com a sua cultura e o transpõem os muros da escola, penetram na
seu movimento interior — tem condições de sociedade, e se inscrevem então na dinâmica de
estabelecer uma relação de tensão entre o sa- uma outra natureza. (Chervel, 1990, p.220)
ber erudito e o saber escolar, não se limitan-
do apenas a realizar uma "transposição didáti- Daí se avança para a compreensão de
ca", ou uma "filtragem crítica". que o "esporte da escola" pode "intervir na
história cultural da sociedade". Ora, com essa
compreensão, recusa-se aquela idéia de que o
Concordo, então, com a idéia de Chervel
"esporte na escola", com os códigos produzi-
de que a escola possui sim autonomia didática
dos por "sistemas mais poderosos", vai ser a
e organizacional (portanto, autonomia pedagó- negação radical do "esporte da escola", ini-
gica, como quer Bracht) para transmitir a cul- bindo e inviabilizando a sua existência. E su-
tura escolar gerada em seu próprio interior, da- pera-se também a idéia de que a escola não
das as suas especificidades como instituição. pode produzir uma prática de esporte com seus
códigos próprios, ou que isso seria algo ina-
Afirma-se e defende-se aqui, portanto, tingível e mesmo derrotado de uma vez por
a escola como um lugar de produção de cul- todas. Aceita-se, então, a idéia de que não só é
tura. Cabe-lhe, então, ao tratar do esporte, pro- possível à escola produzir a sua própria cultu-
duzir outras possibilidades de se apropriar dele ra escolar de esporte, como também a idéia de
— é o processo de escolarização do esporte que é com essa cultura que a escola vai inter-
— e, com isso, influenciar a sociedade para vir na história cultural da sociedade. E exata-
conhecer e usufruir de outras possibilidades mente aí que está o lugar da tensão permanente
de se apropriar do esporte. Buscar uma tensão a que me referi. Implícito está que, nesse
permanente entre o espaço social da escola e caso, o professor e a professora de Educação
o espaço social mais amplo. E isso que carac- Física, e a escola como instituição, são enten-
teriza um movimento propositivo da escola em didos como produtores de uma dada cultura.
suas relações com outras práticas culturais da
sociedade. A propósito, é preciso que se afirme ra-
dicalmente essa capacidade de intervenção da
A escola pode, por exemplo, problema- escola na sociedade, pois o que de pior pode-
tizar o esporte como fenômeno sociocultural, ria acontecer à idéia de se construir um espor-
construindo um ensino que se confronte com te como prática cultural portadora de valores
aqueles valores e códigos que o tornaram que privilegiam, por exemplo, o coletivo e o
excludente e seletivo, para dotá-lo de valores lúdico, é o enclausuramento dessa idéia na
e códigos que privilegiam a participação, o escola, como se ela fosse possível e desejada
respeito à corporeidade, o coletivo e o lúdico, somente em seu interior. Aprisionar essa idéia
por exemplo. Agindo assim, ela produz uma na escola é antecipar a sua morte. É o que
outra forma de apropriação do esporte, pro- pode ocorrer, paradoxalmente, se aceitarmos
duz um outro conhecimento acerca do espor- que o esporte "da escola", só possa ser prati-
te. Enfim, produz uma outra prática cultural cado no interior de seus muros. Aceitar isso
de esporte. Com ela, a escola vai tensionar seria negar a gênese social da escola e a sua
com os códigos dominantes da sociedade agre- permanente inserção na totalidade social, ne-
gados ao esporte (principalmente com a ex- gar que ela possa oferecer à sociedade outras
clusão da prática cultural de esporte a que a possibilidades de fruição do esporte. Ora, em
ampla maioria dos alunos é submetida e com
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... realmente o esporte educa. Mas, educação Mas ele defende que a tarefa dos pro-
aqui significa levar o indivíduo a internalizar fessores de Educação Física
valores, normas de comportamento, que lhe
possibilitarão adaptar-se à sociedade capitalista. é a de desenvolver uma pedagogia desportiva
Em suma, é uma educação que leva ao que possibilite aos indivíduos pertencentes à
acomodamento e não ao questionamento. Uma classe dominada, aos oprimidos, o acesso a uma
educação que ofusca, ou lança uma cortina de cultura esportiva desmistificada. Permitir ou
fumaça sobre as contradições da sociedade ca- possibilitar através desta pedagogia que estes
pitalista. Uma educação que não leva à forma- indivíduos possam analisar criticamente o fe-
ção "do indivíduo consciente, crítico, sensível à nômeno esportivo, situá-lo e relacioná-lo com
realidade que o envolve" [citando Oliveira, todo o contexto sócio-econômico-político e cul-
1993]. (p.63) tural. (p.65)
Bracht aqui ainda está preso àquele Aqui o seu olhar para a escola já parece
olhar um tanto funcionalista da escola, da Edu- mais aberto e atento às múltiplas possibilida-
cação Física e mesmo do esporte, como práti- des de apropriação deste lugar social. Não
ca cultural. Mas, Bracht também se pergunta: seria essa "pedagogia desportiva" uma possi-
em que medida ou até que ponto poderemos bilidade de se construir uma relação de tensão
chegar a um quadro diferente? Ou seja, o es- permanente entre uma prática escolar de es-
porte escolar pode ser diferente? Pode cum- porte (o esporte da cultura escolar) e a prática
prir um papel diferente do de inculcar a ideo- cultural de esporte hegemônica na sociedade?
logia burguesa?
No Capítulo 4, Bracht apresenta inúme-
E ele se posiciona sobre tais perguntas: ras considerações sobre o esporte e seu pro-
cesso de socialização, com base em diversos
Embora reconhecendo as ferrenhas determin- autores. Ele relata uma pesquisa que realizou
ações sociais que sobre a Educação Física Es-
colar recaem, acreditamos que no seu interior a
com alunos de 6a série numa escola pública da
contradição não foi suprimida, ela persiste. cidade de Santa Maria (RS). Nesta pesquisa, o
Embora os espaços a serem ocupados no sentido autor se propôs a verificar os resultados da
de uma ação transformadora sejam restritos, aplicação prática de uma metodologia de en-
admitimos a sua existência. Neste sentido, o da sino de esporte (modalidade basquete), a qual
identificação destes espaços, cumpre ini- foi denominada Metodologia Funcional Inte-
cialmente incluir a Educação Física/Esporte
escolar no contexto mais amplo da Educação e,
grativa (MFI).
enquanto parte desta, analisar as possibilidades
de contribuição/colaboração para o processo de O que quero dela trazer ao diálogo são
transformação social, condição para a os animadores resultados que uma prática pe-
concretização de uma sociedade mais justa e dagógica em Educação Física pode alcançar
livre.
quando se propõe a problematizar a prática
Em seguida, Bracht escreve que a esco- cultural de esporte realizada socialmente e a
la não é um instrumento homogêneo da classe construir outras possibilidades de usufrui-la (é
dominante e que, por isso mesmo, admite que a isso que chamo produzir uma cultura esco-
nela existe um espaço, embora pequeno, para lar de esporte), confrontando-se com aquela
o que Gadotti chama de " 'guerrilha ideológi- perspectiva de se colocar a Educação Física "a
ca travada na escola". (p.65) serviço da indústria do esporte", ou como "base
da pirâmide esportiva", como ele escreveu.
Bracht se refere à categoria da con-
tradição e diz que os espaços para a "ação Na conclusão de sua pesquisa, o autor
transformadora" na escola "são restritos", ainda demonstrava uma posição bastante de-
parecendo resignar-se a admitir que na es- terminista e mesmo reducionista sobre a es-
cola só há algumas pequenas brechas, uns cola e sobre a presença do esporte em seu in-
poucos momentos e espaços, "embora pe- terior, afirmando, por exemplo, que a escola
quenos", a serem ocupados pelos professo- reproduz a ideologia da classe dominante,
res. Ao contrário, pelo exposto, creio que há concluindo com isso que o esporte na escola
a possibilidade concreta de um movimento não deixa de veicular e reproduzir esta ideo-
propositivo da escola na produção de sua logia. Talvez seja essa posição que o acaba
cultura escolar para tensionar com a história induzindo a uma negação radical da possibili-
cultural da sociedade. dade de a escola produzir a sua cultura de es-
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porte, conforme tentei demonstrar. De todo ...na MFI prevê-se o envolvimento dos alunos
modo, os próprios resultados que ele obteve no processo de regulamentação dos jogos, o que
na pesquisa indicam que essa sua posição de- implica a criação pelos alunos de seus própri-
os papéis representativos, (p.105)
terminista pode ser bastante relativizada.
A partir disso, foi possível ao autor ve-
Então, resgato os seus procedimentos na rificar uma melhoria significativa nas catego-
conduta de uma prática escolar de Educação rias por ele construídas e analisadas, compa-
Física com o tema esporte, propostos em sua radas com uma metodologia tradicional de
pesquisa: ensino de esporte. Por exemplo, houve na ca-
tegoria chamada "nível de participação" uma
- incentivar os alunos e possibilitar-lhes a par- freqüência dos alunos às aulas muito superior,
ticipação no planejamento das aulas; - incenti-
var os alunos a expressarem idéias para a com uma participação com "maior entusias-
realização dos jogos; - conduzir reflexões e mo e maior alegria" e "um envolvimento
discussões com os alunos sobre as atividades consciente nas decisões de aula" (p.99). Tam-
desenvolvidas, levando-os a refletir quanto a: bém na categoria "contatos sociais", houve me-
1. importância da participação de todos os in- lhoria significativa na comunicação entre os
tegrantes do grupo; 2. possibilidade e necessi- alunos, e conseqüentemente na participação
dade de mudança de regras; necessidade de deles na organização das atividades da aula
conseguir ambiente agradável, cooperativo e de
companheirismo nos jogos; - considerar as idéi- e na superação dos conflitos, quando se pre-
as expressas pelos alunos e submetê-las à apre- tende exercitar a cooperação (p.100). E um
ciação do grupo; - engajar os alunos na último exemplo retirado da categoria "mudan-
organização e validação das atividades realiza- ça de regras/expressão de idéias" onde houve,
das nas aulas; - levar em consideração a impor- por parte dos alunos, uma "maior freqüência
tância de uma disciplina funcional, espontânea, de expressão de idéias e sugestões de mudan-
em contraposição à disciplina imposta; - ex- ças de regras ocorridas nas aulas desenvolvi-
plorar e utilizar a colocação de problemas aos
alunos, com o objetivo de levá-los à atividade
das com a MFI". Com isso, os alunos trans-
reflexiva; formaram regras internacionais do esporte e
puderam construir outras.
-limitar ao mínimo indispensável a direção pes-
soal das atividades, (p.90) Ora, esses exemplos retirados da pes-
quisa e da prática pedagógica de Bracht não
E também alguns aspectos da metodo- são outra coisa senão a construção por pro-
logia empregada: fessores e alunos, na escola, de outras possi-
bilidades de praticar o esporte: é a isso que
... na metodologia que propomos, a MFI, além
de buscar a eliminação da dominação pela
chamo produção de uma cultura escolar de es-
autoridade, sem no entanto renunciar o direito porte.
e o dever do professor de indicar uma direção,
indicadora do compromisso político assumido, E então retomo aquelas questões que
procura-se mostrar o esporte numa perspectiva apresentei para este diálogo: será que não
crítica, onde os alunos possam realmente houve autonomia pedagógica na realização
"fazer" o seu esporte levando em consideração
as características de sua realidade infantil e
desta prática escolar? Creio que houve sim,
existencial (social, econômica, política, pois o mais significativo da pesquisa de
cultural), e não apenas praticar o esporte. Para Bracht, a meu ver, é que ela realiza concre-
isso, entre outras coisas, o aluno tem de tamente o esporte da escola, sem "servir à
participar ativa e conscientemente do processo indústria do esporte" e sem fazer uma
de normatização que determina as condições "transplantação reflexa" do esporte de ren-
das interações no esporte. ( p.109, grifo meu) dimento para a escola.
A MFI substitui também a prioridade dada pela Houve, além disso, tanto uma "trans-
metodologia tradicional ao ensino dos gestos e formação do esporte em objeto de ensino"
ao aprendizado das regras esportivas interna- com aquele "imenso trabalho de reorgani-
cionais, pela vivência do jogo, procurando
transformar as aulas num campo de ação e vi- zação, de reestruturação" de um saber acu-
vência social, (p.109) mulado historicamene, como escreveu
Forquin, mas principalmente houve uma
produção de novas formas de praticar o es-
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Teoria e Educação, Porto Alegre: Pannonica, constitui-se de uma coletânea de quatro artigos,
n.2, p. 177-229, 1990. sendo três anteriormente publicados pelo autor, em
momentos diferentes. Neste texto, as referências
FORQUIN, Jean-Claude. Saberes Escolares, impe- serão sempre ao livro.
rativos didáticos e dinâmicas sociais. Teoria e 2
Educação, Porto Alegre: Pannonica, n.5, p.28- Segundo o Novo dicionário Aurélio, diálogo quer
54, 1992. dizer: " 1. Fala entre duas ou mais pessoas; conver
sação, colóquio; 2. Obra literária ou científica em
GHIRALDELLI JÚNIOR, Paulo. Educação forma dialogada. 3. Troca ou discussão de idéias,
Física progressista; a pedagogia crítico- de opiniões e de conceitos, com vista à solução de
social dos conteúdos e a Educação Física problemas, ao entendimento ou à harmonia; comu
brasileira . São Paulo: Loyola, 1988. nicação; 4. (...)."
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KUNZ, Elenor. Educação Física: ensino e mudan- O tratamento que a escola, como instituição, e os/
ças. Ijuí:UNIJUÍ, 1991. as alunos/alunas, como sujeitos, dão ao esporte tam
bém poderia ser discutido em outros tempos e
____. Transformação didático-pedagógica do espaços escolares (o recreio e o pátio, por exem
esporte. Ijuí: Unijuí, 1994 plo), e não só no ensino de Educação Física. Essa
discussão não será, entretanto, objeto deste ensaio.
LINHALES, Meily Assbú. Trajetória política do 4
esporte no Brasil: interesses envolvidos, seto- Para aprofundamento remeto o leitor à disserta-
res excluídos. Belo Horizonte: UFMG, 1996. ção de mestrado de Meily A. Linhales (1996), citada
(Dissertação, Mestrado em Ciência Política.) na bibliografia deste texto.
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