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Dialnet EntrePinturasCorporaisENotasMusicais 4807382 PDF
Dialnet EntrePinturasCorporaisENotasMusicais 4807382 PDF
2 – Jul/Dez 2010
Programa de Pós-Graduação – Mestrado em História do ICHS/UFMT
Resumo: Este estudo tem como objetivo Abstract: This study aims to analyze
analisar as contribuições de Darcy Ribeiro the contributions of Darcy Ribeiro and
e Desidério Aytai, tendo como ponto de Desidério Aytai, taking as its starting
partida a seguinte problemática: qual a point the following issues: the
contribuição de ambos à etnografia contribution of both the Brazilian
brasileira? Dividimos este artigo em duas ethnography? We split this article into
partes – Darcy Ribeiro e a “vontade de two parts – Darcy Ribeiro and “desire for
beleza” Kadiwéu e Desidério Aytai e a beauty” Kadiwéu and Desidério Aytai
musicalidade Nambiquara – que discorrem Nambiquara and musicality – that
uma breve biografia dos antropólogos e discourse a brief biography of
discutem a produção de ambos no que diz anthropologists and discuss the
respeito aos Kadiwéu e Nambiquara. production of both with respect to
Nossa experiência junto a esses índios Kadiwéu and Nambiquara. Our
responsabilizou-se pela decisão da escolha experience with these Indians was
das referidas etnias, já que Ribeiro e Aytai responsible for determining the choice of
estudaram também outras sociedades those ethnic groups, as Ribeiro and Aytai
indígenas. also studied other indigenous societies.
Palavras-chave: Darcy Ribeiro, Keywords: Darcy Ribeiro – Desidério
Desidério Aytai, etnografia indígena Aytai – Indian ethnography
Doutor em História pela UFG (Universidade Federal de Goiás). Docente da UFMS (Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul)/ Campus de Nova Andradina, e pesquisador colaborador da UnB (Universidade de
Brasília). Atualmente é diretor da Regional Centro-Oeste da ABHO (Associação Brasileira de História Oral) e
vice-presidente da Anpuh-MS (Associação Nacional de História – Seção Mato Grosso do Sul). Endereço
eletrônico: giovanijsilva@hotmail.com
Doutora em História pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Docente do Univag – Centro
Universitário de Várzea Grande e pesquisadora da Funai (Fundação Nacional do Índio). Atualmente é
presidente do IHGMT (Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso). Endereço eletrônico: anna-
edu@hotmail.com
159
Introdução
160
descrevê-las, legariam ao futuro vestígios de sociedades condenadas a se tornarem apenas
lembranças na consciência nacional, em futuro bem próximo.
Passado meio século das primeiras publicações destes dois pesquisadores, sabe-se
hoje que a ideia do desaparecimento das populações indígenas no Brasil está longe de se
concretizar. O valor dos resultados das pesquisas de Darcy Ribeiro e de Desidério Aytai,
entretanto, permanece inegável para a compreensão das trajetórias históricas dos Kadiwéu,
Nambiquara e de outros grupos com os quais estes antropólogos conviveram e sobre os
quais escreveram (Urubu-Kaapor e Ofayé, no caso de Ribeiro e Xavante, Bororo, Karajá e
Paresi, no caso de Aytai). O objetivo do presente artigo é desvendar aspectos da vida e da
obra desses dois pesquisadores, ao mostrar como entre pinturas corporais e notas musicais,
ambos, cada qual a seu modo e tempo, contribuíram para a compreensão da história
indígena no Brasil e, particularmente, sobre a presença de populações indígenas em
fronteiras étnicas e nacionais.
161
verdade, a publicação dos trabalhos de campo realizados por Ribeiro entre 1947 e 1948 e
embora tivessem se passado cinquenta anos desde que aquelas anotações etnográficas
haviam sido feitas, era possível estabelecer ali um “diálogo” com os Kadiwéu, por meio das
palavras e impressões registradas por Darcy Ribeiro.
Ribeiro nasceu em 26 de outubro de 1922 em Montes Claros, Estado de Minas
Gerais, no Vale do Rio São Francisco. Em 1946, formou-se em Antropologia pela Escola
de Sociologia e Política de São Paulo, dedicando seus primeiros anos de vida profissional
ao estudo dos índios do Pantanal, do Brasil Central e da Amazônia (1946-1956). Neste
período, criou o Museu do Índio e formulou o projeto de criação do Parque Indígena do
Xingu. Também elaborou para a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação,
a Ciência e a Cultura) um estudo sobre o impacto do contato de não indígenas e indígenas
brasileiros no século XX, publicando-o, pela primeira vez, em 1970 sob o título Os índios e
a civilização: a integração das populações indígenas no Brasil moderno (RIBEIRO, 1970).
Em 1954, colaborou com a OIT (Organização Internacional do Trabalho) na preparação de
um manual sobre populações indígenas de todo o mundo.
O primeiro livro publicado por Darcy Ribeiro foi Religião e mitologia Kadiwéu, em
1950. Com ele, recebeu naquele mesmo ano o Prêmio Fábio Prado de Ensaios. Mais tarde,
reuniu este e outros textos que publicara separadamente sobre os Kadiwéu, em belíssima
edição, com várias pranchas que retratam as artes gráficas e plásticas daqueles índios
(1980a).
Embora tenha sido “[...] econômico em mencionar passagens autobiográficas”
(PECHINCHA, 2000, p. 155), em seus escritos a respeito dos Kadiwéu, Darcy Ribeiro
revelou em Confissões que:
162
guerreiro, saqueador. Um herenvolk, que levou tão a fundo seu papel e sua
aristocracia que as suas mulheres deixaram quase totalmente de parir para
substituir os filhos próprios por crianças tomadas de outras tribos que eles
dominavam (RIBEIRO, 2002, p. 162-163).
163
Janeiro antigo. A propagação de suas ideias rompeu fronteiras, pois Darcy Ribeiro viveu
em vários países da América Latina, onde conduziu programas de reforma universitária.
Foi assessor do presidente Salvador Allende, no Chile, e de Velasco Alvarado, no
Peru. Neste período, escreveu cinco volumes de seus Estudos de Antropologia da
Civilização (O Processo Civilizatório; As Américas e a Civilização; O Dilema da América
Latina; Os Brasileiros: Teoria do Brasil e Os Índios e a Civilização), livros que atingiram,
em conjunto, mais de noventa edições, em diversas traduções. Neles, propôs uma teoria
explicativa das causas do desenvolvimento desigual entre os povos americanos. Como
reconhecimento de sua importância intelectual, Ribeiro foi agraciado com o título de
Doutor Honoris Causa por diversas universidades mundo afora.
Elegeu-se senador da República pelo Estado do Rio de Janeiro, em 1991, tendo
elaborado a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), sancionada pelo
presidente Fernando Henrique Cardoso, em 20 de dezembro de 1996, como Lei Darcy
Ribeiro. Entre 1991 e 1992, licenciado do Senado, assumiu a Secretaria Extraordinária de
Programas Especiais do Rio de Janeiro, completando a rede de Cieps e criando um novo
padrão de Ensino Médio. Planejou e criou, em 1994, a Uenf (Universidade Estadual do
Norte Fluminense), sediada em Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro, na qual
assumiu o cargo de chanceler. Durante a Conferência Mundial do Meio Ambiente –
ECO’92, realizada no Rio de Janeiro, em 1992 – implantou o Arboretum do Viveiro, dentro
do Parque da Floresta Branca.
Publicou, ainda, Aos Trancos e Barrancos, um balanço crítico da história brasileira
de 1900 a 1980; Sobre o Óbvio, uma coletânea de ensaios e Testemunho, um balanço de sua
vida intelectual. Editou, juntamente com Berta Ribeiro, a Suma Etnológica Brasileira, em
três volumes. Em 1992, publicou A Fundação do Brasil, um compêndio de textos históricos
dos séculos XVI e XVII, comentados por Carlos de Araújo Moreira Neto e precedidos de
um longo ensaio analítico sobre os primórdios do Brasil. Em 1995, publicou O Povo
Brasileiro, livro que encerrou a coleção de seus Estudos de Antropologia da Civilização,
além de uma compilação de seus discursos e ensaios, intitulada O Brasil como Problema.
Lançou, ainda, um livro para adolescentes, Noções de Coisas, com ilustrações de Ziraldo,
obra premiada pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, em 1996.
164
Naquele mesmo ano, publicou Diários Índios: os Urubu-Kaapor, que reproduz
integralmente os diários de campo escritos em forma de cartas à Berta Ribeiro, no período
de 1949 a 1951, quando era etnólogo do SPI (Serviço de Proteção aos Índios). Ainda em
1996, recebeu o Prêmio Interamericano de Educação Andrés Bello, concedido pela OEA
(Organização dos Estados Americanos) a eminentes educadores das Américas. Organizou,
também, a Fundação Darcy Ribeiro, com sede própria, localizada em sua antiga residência
em Copacabana, com o objetivo de manter viva sua obra e elaborar projetos nas áreas
educacional e cultural. Um de seus últimos projetos, lançado publicamente, foi o Projeto
Caboclo. 1
2
Darcy Ribeiro faleceu em 17 de fevereiro de 1997. No seu último ano de vida,
dedicou-se especialmente a organizar a Universidade Aberta do Brasil, com cursos de
educação à distância, e a Escola Normal Superior, para a formação de professores de
Ensino Fundamental. Desde as viagens de 1947-1948, Ribeiro jamais voltou aos Kadiwéu,
mas sempre se referiu a eles, em palestras, entrevistas e conferências, com carinho e
reverência, chamando-os de “meus índios”.
Os Kadiwéu, por sua vez, ao que parece, jamais o esqueceram:
As pinturas corporais dos Kadiwéu que tanto encantaram Darcy Ribeiro já haviam
fascinado outros tantos pesquisadores antes dele, como se pode verificar nas obras de
Guido Boggiani (1975), Claude Lévi-Strauss (2001) e Erich Freundt (1946). O conjunto de
manifestações artísticas, expressas por aquele grupo, recebeu do antropólogo a poética
alcunha de “vontade de beleza”.
1
O Projeto Caboclo, de autoria de Darcy Ribeiro, era destinado a criar um plano alternativo de ocupação da
Amazônia, baseado na experiência de adaptação dos índios à floresta, experiência esta herdada pelos caboclos
que a habitavam, segundo o autor, únicos capazes de fazê-la produzir e prosperar.
2
Para outras informações sobre a biobibliografia de Darcy Ribeiro, consultar o sítio eletrônico da Fundação
que leva seu nome, do qual algumas informações aqui apresentadas foram extraídas.
165
A antropóloga Berta G. Ribeiro, companheira de Darcy Ribeiro por muitos anos,
assim se refere às pinturas corporais dos Kadiwéu, relacionando-as aos antigos e ancestrais
Mbayá-Guaikuru:
Para Darcy Ribeiro (1980a, p. 269), a “vontade de beleza” Kadiwéu, observada por
ele, se expressava de maneiras distintas entre homens e mulheres. Sobre a pintura Kadiwéu,
de forma geral, observou que:
Nas pinturas das mulheres a arte Kadiwéu alcança sua mais alta
expressão, aquela que melhor espelha seu caráter nacional e, na fase de
destribalização que vivem hoje, eles próprios vêem nela o maior motivo
de orgulho tribal. Com estas pinturas embelezam os corpos dos jovens, os
objetos de uso, desde as esteiras e couros em que dormem e com que
166
arreiam seus cavalos e bois, até os pequenos abanos de palha,
emprestando-lhes uma característica tribal inconfundível.
Darcy Ribeiro, ou Bet’rra, como lhe chamaram os índios, legou um vasto painel
etnográfico sobre os Kadiwéu, ainda não superado por nenhum outro pesquisador até o
momento, em que retratou como viviam estes indígenas no final dos anos 1940, quando
formavam um contingente de pouco mais de duzentas pessoas. Embora não tenha sido um
estudioso da música Kadiwéu, recolheu por meio de gravações os sons produzidos por
aqueles índios em festas e rituais (CAMÊU, 1977). Nada comparado, contudo, com as
preocupações de Desidério Aytai e os estudos que desenvolveu sobre a musicalidade dos
Nambiquara e de outros grupos indígenas.
Contratada pela Funai no ano de 1982, Anna Maria R. F. Moreira da Costa chegou à
Terra Indígena Nambiquara, a noroeste de Mato Grosso com a atribuição de implantar um
programa de Educação Escolar indígena direcionado às necessidades emergentes dos
Nambiquara, principalmente àquelas decorrentes do asfaltamento da rodovia Marechal
Rondon, a BR-364, antiga 029. Esperava-se que essa estrada atraísse um enorme
contingente de trabalhadores de diferentes partes do país, e sua abertura atingiria vários
167
territórios indígenas, dentre eles, o dos Nambiquara. Como um dos condicionantes do
Banco Mundial, instituição financiadora, as populações que viviam às suas margens,
indígenas e não indígenas, deveriam receber atenção especial para que não sofressem tanto
com o impacto que a movimentação da estrada traria às suas vidas. Na análise do
antropólogo Paul D. Price (1989, p. 2),
Foi esse cenário que recebeu a pesquisadora, uma das autoras do presente artigo, e
que certamente era mais assustador do que aquele descrito por Claude Lévi-Strauss em
Tristes Trópicos, quando foi invadido pela bucólica vastidão da Chapada dos Parecis,
percorrida apenas “[...] por pequenos bandos de índios nômades, que estão entre os mais
primitivos que se possam encontrar no mundo; e cruzado, de um lado a outro por uma linha
telegráfica” (Lévi-Strauss, 2001, p. 256). A necessidade de conhecer a vida Nambiquara
direcionou-a a uma multiplicidade de campos ainda por explorar, a substituir e/ou traduzir
códigos daquele novo universo. A inexatidão das coisas, das ideias e até mesmo de
comportamentos a fez pensar que “[...] compreender menos, ser ingênuos, espantar-se, são
reações que podem nos levar a enxergar mais, a apreender algo mais profundo, mais
próximo da natureza” (GINZBURG, 2001, p. 29).
Tal preocupação também se circunscreve nos escritos de Deleuze, para quem:
3
Paul David Price foi um estudioso dos índios Nambiquara e que, também, de 1974 a 1976 assumiu, na
Funai, o cargo de coordenador do “Projeto Nambikwara” e, em 1980, a consultoria do Banco Mundial, órgão
financiador do Polonoroeste (Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil), implantado
nas áreas da Amazônia Legal.
168
Aprender diz respeito essencialmente aos signos. Os signos são objetos de
um aprendizado temporal, não de um saber abstrato. Aprender é, de
início, considerar uma matéria, um objeto, um ser, como se emitissem
signos a serem decifrados, interpretados. Não existe aprendiz que não
seja “egiptólogo” de alguma coisa. Alguém só se torna marceneiro
tornando-se sensível aos signos da madeira, e médico tornando-se sensível
aos signos da doença. A vocação é sempre uma predestinação com relação
a signos. Tudo que nos ensina alguma coisa emite signos, todo ato de
aprender é uma interpretação de signos ou de hieróglifos (DELEUZE,
2003, p. 4).
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e aos Nambiquara, de Mato Grosso. Em dez anos, ofícios, cartas, cartões postais,
aerogramas e telegramas caracterizaram-se por ser da maior relevância à Antropologia, em
especial, à etnografia indígena. Mais do que ler e orientar escritos e desenhos, a presença de
Aytai significou, na aldeia, a segurança do percurso acadêmico que Costa necessitava para
adentrar em um terreno tão árido – o da cultura material. E, assim, teve-se acesso ao
resultado das pesquisas de campo realizadas nos anos 1960, em especial aquelas
desenvolvidas entre os vários grupos Nambiquara das três áreas culturais: Cerrado, Serra do
Norte e Vale do Guaporé.
A seguir, pretende-se apresentar uma breve biografia, bem como a contribuição de
Desidério Aytai para a etnomusicologia indígena Nambiquara, tendo por base metodológica
uma análise do levantamento bibliográfico, sonoro e iconográfico realizado ao longo desses
anos, inclusas as cartas trocadas durante os anos de 1987 a 1998. Dentre os estudiosos que
desenvolveram pesquisas com os Nambiquara, Aytai foi o que mais contribuiu para o
enriquecimento do acervo que se pretendeu criar em Vilhena. Foi nesse período que se teve
acesso às Publicações do Museu Histórico de Paulínia e aos estudos que Aytai escreveu
sobre a etnologia Nambiquara, Xavante, Karajá, dentre outras. Na década de 1960
iniciaram-se os trabalhos de campo do engenheiro etnógrafo4 junto aos grupos Nambiquara,
bem como a publicação de uma série de artigos. Entre 1963 e 1966, esteve entre os
Mamaindê e os Sararé, ambos os grupos localizados no Vale do Guaporé. Com os grupos
da Chapada dos Parecis realizou estudos em 1967, mais precisamente com o grupo
Halotesu, e, nesse mesmo ano, retornou ao Vale do Guaporé para pesquisar os Wasusu.
A história de Aytai no Brasil teve início após a Segunda Guerra Mundial, quando a
Hungria tornou-se um Estado comunista. Avesso ao ideário comunista, Desidério Aytai
deixou a Hungria com sua família e trabalhou no Museu da Smithsonian Institution, em
Washington, no Musée de l´Homme, em Paris, e no Museu do Vaticano, em Roma. Em
1948, o engenheiro mecânico formado pela Real Universidade Húngara imigrou para o
Brasil, encontrando o espaço propício para construir sua carreira como antropólogo, depois
de uma longa trajetória como engenheiro mecânico.
4
Para conhecer mais sobre a atuação acadêmica de Aytai, ler a tradução de Thekla Hartmann para o texto de
Price (1988), intitulado Desidério Aytai: o engenheiro como etnógrafo. Nessa mesma revista, Hartmann,
então etnóloga do Museu Paulista, apresenta uma breve bibliografia de Desidério Aytai, às páginas 165-168.
170
No campo da Arqueologia, iniciou suas pesquisas nos sambaquis do litoral sul de
São Paulo. Os resultados das escavações realizadas por Desidério Aytai e os alunos do
curso de Ciências Sociais da PUCC (Pontifícia Universidade Católica de Campinas), no
final da década de 1950 e no decorrer dos anos 1960, encontram-se no acervo da
instituição, que também reúne peças coletadas em expedições a comunidades indígenas do
Centro-Oeste e Norte brasileiros. No ano de 1963, recebeu convite da PUCC para ocupar a
cadeira de Antropologia do curso de Ciências Sociais. Também foi professor e pesquisador
na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e em várias faculdades. Após aposentar-
se, fundou na PUCC a Faculdade de Engenharia, momento em que ocupou o cargo de
primeiro diretor.
Como professor, Aytai passou grande parte de sua vida na região de Campinas.
Entretanto, em outras cidades próximas sua presença marcou uma trajetória no campo da
Antropologia e da Arqueologia. Fundou o Museu Histórico Municipal de Paulínia 5, em
Paulínia, o Museu Municipal Elisabeth Aytai, em Monte Mor, nome atribuído em
homenagem a sua esposa, pesquisadora que encontrou, no ano de 1971, uma urna funerária
de tradição Tupi, datada de 800 a 1.000 anos. O desejo pelo campo antropológico, todavia,
permaneceu acima de quaisquer outros interesses acadêmicos. Organizou diversas
expedições às terras Xavante, Bororo, Paresi, Guarani, Karajá, Nambiquara (grupos
Halotesu, Katithaulu, Wasusu, Mamaindê), vinculado ao antigo sonho de estudar culturas
ágrafas da África e da América do Sul. Seus estudos preocuparam-se, em especial, pela
música indígena.
Desidério Aytai, conforme Deise Lucy Oliveira Montardo (2000, p. 6),
[...] foi um dos primeiros autores a realizar uma análise aprofundada da
música indígena. Ao transcrever mais de uma centena de canções xavante,
o autor apontou, por exemplo, a existência de uma estrutura polifônica
nesta música, desmistificando um dos preconceitos vigentes até o
momento de que a música indígena não apresentaria tais “sofisticações”.
5
Rene Sarli informa que o Museu Histórico Municipal de Paulínia “funciona em prédio construído em 1913.
Em 1977 graças ao empenho do professor Desidério Aytai, é feito um acordo entre a Prefeitura Municipal e a
Pontifícia Universidade Católica de Campinas para criação do museu que é inaugurado no ano seguinte.
Criado para reunir e preservar a documentação, memória e objetos de imigrantes que vieram para o Brasil em
busca de esperança, aventuras, fortuna ou simplesmente fugindo de uma situação difícil nas suas pátrias de
origem. Conta com um acervo histórico de 1.300 peças [...]”. Disponível em
http://www.conhecapaulinia.com.br/a-cidade/pontos-turisticos/637-museu-historico-municipal-de-paulinia.
Acesso em 11/11/2010.
171
Assim como José da Silva, em relação a Darcy Ribeiro, Costa não teve a
oportunidade de conhecer pessoalmente Desidério Aytai. Contudo, a etnologia “aytaiana”
sobre os grupos Nambiquara deram a ela a oportunidade de conhecê-lo e colocaram-na
mais próxima do grande legado deixado por ele. Na época da troca de correspondências,
Costa exercia a função de professora de diversas aldeias da Terra Indígena Nambiquara,
localizada na Chapada dos Parecis. Logo após a aquisição da cópia de seu acervo
fotográfico, a correspondência entre Aytai e Costa passou a ter um caráter mais acadêmico,
na medida em que o pesquisador se incumbiu de orientá-la em pesquisas direcionadas à
cultura material e imaterial dos índios Potiguara, na Paraíba. Por outro lado, depois de certo
tempo, as cartas também passam a ter um teor mais pessoal, quando foram trocadas
informações sobre preocupações cotidianas, família e ambiente de trabalho.
Todos os textos da pesquisa desenvolvida entre os Potiguara foram lidos por
Desidério Aytai. Após o levantamento dos artefatos confeccionados por esses índios,
iniciou-se a descrição de cada um deles, a partir da proposta de Berta G. Ribeiro, elaborada
na obra Dicionário do Artesanato Indígena (1988). Assim, os artefatos foram distribuídos
em nove categorias e receberam uma denominação em consonância ao estudo, com o
6
intuito de uniformização da taxonomia. As descrições passaram pelo olhar criterioso do
professor Aytai, quando também se pode entrar em contato com obras teórico-
metodológicas fundamentais à abordagem, a partir de suas indicações.
Em meados de 1989, prosseguiram-se os estudos direcionados à cultura material dos
Nambiquara do Cerrado, quando também se contou com a orientação de Aytai. Novamente,
as cartas foram uma fonte preciosa de informações. Ao contrário da documentação
fotográfica apresentada no estudo da cultura material e das plantas utilitárias e medicinais
dos índios Potiguara, no estudo Nambiquara optou-se pelos desenhos a nanquim sobre
papel vegetal. Dessa maneira, a produção iconográfica também foi enviada à Aytai, para
obter seu parecer, em que textos e desenhos passaram por sua criteriosa análise. Algumas
imagens, a fim de se obter maior clareza nos detalhes das peças, foram redesenhadas, a
pedido dele. O resultado desta pesquisa, inicialmente depositada na Biblioteca Nacional, no
Rio de Janeiro, possibilitou a edição de dois livros: Hatisu Nambiquara: lembranças que
6
O resultado da pesquisa sobre os artefatos Potiguara foi publicado pela Secretaria de Cultura do Estado da
Paraíba, no livro intitulado Potiguara: cultura material (COSTA; MOREIRA DA COSTA, 1989).
172
viraram histórias (COSTA, 2005) e Além do artefato: cultura material e imaterial
Nambiquara (COSTA, 2009), publicações estas que infelizmente o professor Desidério
Aytai não conheceu.
A última participação de Desidério Aytai nos trabalhos acadêmicos de Costa
ocorreu entre os anos de 1997 e 1998, durante a elaboração de Irmãos do chão: os
Nambiquara na etno-história contemporânea (COSTA, 1998), monografia apresentada à
UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), no Curso de Especialização em História.
Nesse estudo, Aytai contribuiu de forma ímpar na análise dos textos e no enriquecimento
da bibliografia referente aos Nambiquara, especialmente os estudos escritos em língua
estrangeira. Junto às cartas do professor, foram recebidos os números das Publicações do
Museu Histórico de Paulínia, com artigos direcionados aos interesses de estudo da
pesquisadora. Ao final de poucos anos, pode-se colecionar todos os números do periódico,
cuja edição foi interrompida após a sua morte.
Poucos estudiosos dedicaram-se especialmente às pesquisas sobre a música
Nambiquara. A esse respeito, Aytai informa que:
[...] vários autores que visitaram os Nambikuara falam das flautas, sem,
porém, dar muitos detalhes. C. Lévi-Strauss, por exemplo, no seu
excelente trabalho sobre vários grupos destes índios, diz que as flautas são
usadas nas festas do fim da época das chuvas, mas não menciona a
existência de uma choupana específica para guardá-las – pelo contrário,
conta que os índios esconderam as flautas recém-fabricadas entre os
galhos de uma árvore perto da aldeia, e fizeram, a pedido dele, uma
demonstração da música a certa distância da aldeia, para evitar qualquer
indiscrição feminina (AYTAI, 1967-68, p. 69-70).
173
uma bebida à base de mandioca e despejam-na também no interior das flautas,
alimentando-as, pois creem que ali se encontra a alma do menino que, no tempo mítico,
transformou-se em plantas utilitárias e comestíveis para seu povo.
Outros pesquisadores dedicaram-se ao estudo da música Nambiquara tais como
Halmos que escreveu La flûte nasale chez les indiens Nambicuara (BOGÁR; HALMOS,
1962), Melody and form in the music of the Nambicuara Indians (Mato Grosso, Brazil)
(1964) e The music of the Nambiquara indians (1979). Avery destaca-se entre os autores
por ter maior produção voltada à música dos Mamaindê, um dos grupos Nambiquara do
Vale do Guaporé. Publicou, na década de 1970, vários artigos de suma importância para o
conhecimento da música vocal Mamaindê (AVERY, 1977). Aspectos musicais da música
Nambiquara também foram apresentados por Lesslauer (1999).
Contudo, num cenário geograficamente mais amplo, o antropólogo Rafael José de
M. Bastos aponta que:
174
mitologia, música, cultura material, arqueologia e outros temas como manuais para
etnomusicólogos e recomendações para um antropólogo principiante. Destes, Aytai
reservou 29 artigos exclusivamente para estudos sobre a etnomusicologia Nambiquara,
Xetá, Xavante, Bororo, Karajá, inclusas as canções e assovios. Os estudos intitulados Da
caderneta de campo do antropólogo (1986 a 1987) caracterizam-se por apresentar um
conjunto de informações contidas em seus apontamentos de pesquisas realizadas no período
em que esteve em expedição junto aos índios Xetá, Bororo, Karajá, Nambiquara e Xavante.
Os minimanuais para etnomusicólogos, em três artigos, preocuparam-se em apresentar ao
pesquisador iniciante condutas para os estudos de campo, atentando-se principalmente para
a coleta de dados.
Os escritos específicos sobre música indígena abarcam desde a gravação em campo
dos rituais até a descrição do instrumento musical propriamente dito, como fez com os
Xavante, em sua tese de livre-docência (AYTAI, 1985). Sua trajetória etnográfica percorre
as fontes e a estrutura da música, os sons que formam os cantos, as melodias, a polifonia, a
letra, o ritmo. Os ornamentos e a maneira de cantar não passaram despercebidos por Aytai
e, muitas vezes, foram comparados a outros ritmos musicais. Há, em todos os artigos, um
rico registro iconográfico, elaborado por suas próprias mãos, que extrapola o intento de
apenas ilustrar, mas que integra o próprio corpo do texto, enriquecendo-o e facilitando sua
compreensão.
A música vocal também mereceu a atenção do pesquisador. Cuidou de realizar uma
compilação de relatórios completos e detalhados dos fatos etnomusicológicos coletados e
registrados em pesquisas de campo durante a década de 1960, oportunizando o
conhecimento dos segredos e encantos da música Nambiquara, até hoje não superada por
nenhum outro estudo. Desidério Aytai reuniu um vasto acerto sonoro, gravado em fitas-
cassetes e que, após sua morte, chegou às mãos de Costa como herança de uma amizade de
dez anos, calcada nas sensações que a escrita forneceu a ambos. A coleção das gravações
foi repassada ao Museu do Índio, da Funai, no Rio de Janeiro, a fim de receber
armazenamento adequado e gravação em CD, resguardando-se tão precioso registro sonoro.
Mas, não somente as Publicações do Museu Histórico de Paulínia apresentam
estudos de etnomusicologia Nambiquara, de autoria de Desidério Aytai. A Revista da
Universidade Católica de Campinas publicou, entre os anos de 1965 a 1972, os artigos Os
175
cantores da floresta (Partes I, II, III e IV) (AYTAI, 1964; 1965; 1966; 1972), contendo
importantes notas etnográficas sobre os índios Mamaindê, do Vale do Guaporé, nelas, com
exceção da parte IV, inclusas referências musicais. Periódicos estrangeiros também
contemplaram os escritos de Aytai: os Cahiers de musiques traditionnelles (1989),
publicados em Genebra, reservaram algumas páginas para La Flûte Nasale des Indiens
Nambikuara, um volume dedicado especialmente à música instrumental. Nesse estudo, a
flauta nasal tem um destaque merecido por ser um instrumento raro entre populações
indígenas. Dois fragmentos de cabaça, de formato arredondado, são unidos por cera de
abelha. Em uma das partes possui três orifícios: um destinado ao sopro nasal e dois à
digitação dos dedos indicadores. Tanto a flauta reta de bambu como a flauta nasal são
instrumentos musicais que estabelecem uma relação dos Nambiquara com o mundo
espiritual. A música instrumental como a vocal são uma das possibilidades que os
Nambiquara têm para estabelecer vínculos com os espíritos ancestrais e da natureza.
Desidério Aytai, em suas pesquisas de campo, não se ateve somente a descrever e estudar
os sons produzidos por essas flautas. Estendeu sua aguçada observação aos patamares mais
recônditos da religiosidade, como comprova seus escritos sobre a etnomusicologia
Nambiquara.
As mais de cem cartas recebidas de “Desi”8 oportunizaram a Costa conhecê-lo, além
do inestimável legado etnográfico deixado para a Antropologia. Sem dúvida, os tantos selos
postais colados nos envelopes de cores e tamanhos diversos selaram, também, uma amizade
que rompeu distâncias e minimizou a impossibilidade de não conhecê-lo pessoalmente.
Entretanto, as cartas de trabalho, aos poucos, foram se tornando também cartas de amizade.
E na cadência de conversas tão variadas, de experiências compartilhadas, desenhou-se seu
perfil. Pouco antes de sua morte, ainda trabalhando do Museu Elizabeth Aytai, em Monte
Mor, aos 93 anos, suas últimas cartas eram assim assinadas como “Desidério fóssil”!
Conclusão
8
“Desi”, segundo informações pessoais repassadas aos autores por Zilda Rangel, era a maneira carinhosa com
que as pessoas mais próximas se dirigiam a Desidério Aytai. Rangel é, atualmente, coordenadora do Museu
Elizabeth Aytai e teve o privilégio de trabalhar um longo período ao lado de Aytai.
176
É fato que os prognósticos de Darcy Ribeiro a respeito do desaparecimento de
populações indígenas no Brasil, felizmente, não se fizeram cumprir. Passados quarenta anos
da publicação de Os índios e a civilização verifica-se não apenas que muitas das
populações dadas como “extintas” pelo autor, de fato, não apenas não desapareceram, como
estão crescendo demograficamente de forma expressiva. Por outro lado, o registro de
atividades artísticas Kadiwéu, especialmente as ligadas às pinturas corporais, teve o mérito
de preservar informações a respeito de uma manifestação de arte estritamente relacionada
ao universo feminino e que se não está em completo desuso nos dias de hoje, já não
apresenta o vigor de outrora.
O próprio Darcy Ribeiro foi um crítico contumaz da tradição antropológica de
colecionar objetos de “arte indígena”, com fins museológicos, prática que segundo Lúcia
Hussak Van Velthem (1994) teve início com a descoberta do Novo Mundo e se estendeu
até princípios do século XX.
Para Ribeiro:
Darcy Ribeiro voltou inúmeras vezes, em seus escritos, ao tema das pinturas
corporais Kadiwéu, desde que publicou, em 1951, Arte dos índios Kadiuéu. Certa vez,
afirmou que “A mais elaborada arte de desenho dos índios americanos é a dos padrões de
pintura de rosto e de corpo dos meus Kadiwéu. Esta velha arte feminina assombrou até os
colonizadores europeus, habitualmente cegos para as expressões de beleza dos povos
indígenas” (RIBEIRO, 1987, p. 46; grifo dos autores). Não somente os Kadiwéu se
destacaram no cenário artístico indígena com suas pinturas corporais, mas também os
Asurini, os Xavante e os Wayana, dentre inúmeros outros. Trata-se de uma atividade não
177
apenas de cunho artístico, mas de importância social relevante para muitos grupos
indígenas.
De acordo com Lux Vidal (1985, p. 16),
Dessa forma, Aytai, por meio de seus estudos, revelou um dos aspectos mais
relevantes na vida dos grupos indígenas – a música –, geralmente negligenciada como
objeto de estudo por pesquisadores de distintas áreas do conhecimento. A exiguidade de
material sobre a música indígena deve-se, por um lado, à dificuldade em registrar fenômeno
tão efêmero como o som e, por outro, à dificuldade em se compreender a música indígena
178
nos contextos em que ela é produzida. Desidério Aytai conseguiu superar tais dificuldades,
legando um riquíssimo acervo ainda a ser explorado. 9
Ribeiro, por sua vez, legou uma vasta etnografia a respeito dos Kadiwéu e foi
considerado por estes indígenas, um “(quase) Kadiwéu”, uma vez que “História e mito
definiram uma aliança e fizeram de Darcy Ribeiro alguém capaz de reconfirmar os
símbolos Kadiwéu” (PECHINCHA, 2000, p. 161).
Assim, entre pinturas corporais Kadiwéu e notas musicais Nambiquara, Darcy
Ribeiro e Desidério Aytai legaram um vasto conhecimento sobre expressões artísticas e
culturais que, de outra forma, poderiam estar irremediavelmente perdidas, posto que as
pinturas corporais entre os Kadiwéu hoje em dia encontram-se em progressivo desuso,
enquanto entre os Nambiquara os interesses musicais começam a se aproximar dos ritmos
não indígenas. A contribuição de ambos para a etnografia indígena no Brasil, portanto, é
ímpar e revela a trajetória histórica de modos de ser e viver únicos de populações indígenas
cujo passado, graças aos trabalhos de dois incansáveis pesquisadores, é mais belo e sonoro.
Referências
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n. 2, Gèneve, p. 132-149, 1989.
9
Desse acervo, mesmo que a questão central da discussão não discorra totalmente sobre a etnomusicologia
Nambiquara, destaca-se o primoroso artigo intitulado Os cantores da floresta. Parte IV: a origem dos índios
Mamaindê (AYTAI, 1972). Isso porque se desconhece hipóteses consistentes que expliquem a existência dos
mais de trinta grupos que compõem a sociedade Nambiquara atual. Os Nambiquara, “embora partilhando de
uma mesma filiação linguística e de elementos culturais comuns, distinguem-se claramente entre si por
determinados aspectos de sua organização social, de sua cultura material e de seu sistema de crenças”
(COSTA, 2010, p. 91). Nesse estudo de Aytai sobre os Mamaindê, ao partir de uma análise glotocronológica
das línguas classificadas como Nambiquara, acredita-se que um grupo ancestral comum (proto-Nambiquara)
ocupava uma área localizada no divisor das águas do alto curso dos rios Guaporé e Juruena. Em decorrência
de uma grave crise há aproximadamente 4.000 anos, esse grupo se dividiu em cinco: os Mamaindê, Sararé
(Katithaulu), Tauitê, Tagnani (Tawentê), Kôkôzú (Wakalitesu). Aytai calculou que o epicentro da separação
ocorreu no território ocupado atualmente pelos Mamaindê, forçando a dispersão do que viria a se constituir no
Tawentê, ao Norte; no Tauitê e o Katithaulu, ao Sul; e no Wakalitesu, ao Leste. Este último grupo deu
origem, durante a migração, há 1.400 anos, ao Anunzê (Kithãulhu). Pouco depois, há 1.100 anos, se cindiu
novamente, formando o Halotesu e, finalmente, há cerca de 400 anos, o Wasusu se separou.
179
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182