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HILIA
Φιλια INS 1519-6917
jornal informativo de história antiga www.philia.uerj.br edições trimestrais desde 1998
SUMÁRIO
Editorial
CULTURA & SOCIEDADE
2 Félix Jácomo Neto
TALES DE MILETO E SUA A MORTE DE CÉSAR CONFORME
Tales de Mileto e CÍCERO EM DE OFFICIIS III
COSMOGONIA FILOSÓFICA
3 sua cosmogonia filosófica
Acríssio Luiz Gonçalves
O presente texto visa apresentar Cícero em De Officiis revisita temas
Cidades, suprimentos e algumas das doutrinas científico- jurídicos e sociais importantes e
4 rumores nas Guerras Civis
(49 - 45 a.C)
filosóficas atribuídas a Tales de Mileto, reconhecidos por uma audiência
destacando a relação entre seu presumida. E alguns outros ele renova
Ygor Klain Belchior pensamento e o nascimento da sentido a fatos, mudando-os retoricamente,
A morte de César conforme filosofia. como faz no caso do assassinato do César.
5 Cícero em De Officiis III
Lucas Amaya
“Que a terra lhe seja leve...”:
6 reflexões acerca da atividade
gladiatorial
Rafael Santos
conselho consultivo
Julian Gallego - Universidad Buenos Aires
Ivan Esperança – UNESP
Gilberto da Silva Francisco - UNIFESP
revisão
Alessandra Serra Viegas - UFRJ
Carla Cristina da S. Lavinas - UERJ
Renan M. Birro - UFF
edição e diagramação
Andréa Magalhães da S. Leal - UERJ
Vinícus Moretti Zavalis - UERJ
INDEXAÇÕES NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
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JORNAL INFORMATIVO DE HISTÓRIA ANTIGA
ESTUDAR O GREGO PARA SENTIR A RESPIRAÇÃO DOS TEXTOS ANTIGOS Félix Jácomo Neto
Resumo: Este texto apresenta quatro etapas no estudo inicial do grego antigo que contribuem com o desafio de não apenas ler os textos antigos
em traduções, mas adquirir o hábito de (re)visitar o texto em seu idioma original.
Palavras chaves: Grego antigo; texto original; tradução.
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JORNAL INFORMATIVO DE HISTÓRIA ANTIGA
Resumo: O presente texto visa apresentar algumas das doutrinas científico-filosóficas atribuídas a Tales de Mileto, destacando a
relação entre seu pensamento e o nascimento da filosofia.
Palavras-chave: Tales de Mileto; filosofia; cosmogonia. .
CIDADES, SUPRIMENTOS E RUMORES NAS GUERRAS CIVIS (49 - 45 A.C) Ygor Klain Belchior *
Resumo: Este artigo pretende estabelecer uma relação entre rumores e a logística de obtenção de suprimentos necessários às
guerras civis entre César e Pompeu.
Palavras chave: César, guerras civis, cidades.
Sobre uma guerra civil e seus ricos e também nas dificuldades enfrentadas por comunidade escolhe um lado, você
sangrentos eventos, até mesmo o César em suas campanhas na Espanha automaticamente se torna inimigo do
historiador latino Publio Cornélio Tácito (Caes. BC. 1, 69, 81 e 84), na França outro. E esse ato, tal marcante para o fio
afirma que não é preciso muita (Caes. BC. 2, 22) e, finalmente, na Grécia central deste texto era marcado por dois
originalidade e nem habilidade de um com Pompeu (Caes. BC. 3), quando os atos distintos feitos pelas cidades: elas
orador para que o conteúdo narrado recursos locais passam a ser escassos fechavam as portas - praeclusas esse
agrade a audiência (Tac. Ann. 1, 2). devido ao cerco, ao clima, a aridez do solo portas (Caes. BC. 2, 20) - ou abriam elas -
Afinal, guerra é guerra e o fratricídio e a tomada dos alimentos para dentro da portas aperuit (Caes. BC. 3, 81) - para os
constante, tema tão comum na literatura cidade sitiada. Guerra civil, portanto, é exércitos em campanha. Só cabe destacar
sobre esses períodos, a exemplo da obra sinônimo de fome (GARNSEY, 1988). que em toda a narrativa esse ato somente
Farsália de Lucano, para ilustrar outro Os viveres neste caso são a prioridade e acontece após uma longa deliberação dos
período deferente do de Tácito, são provas defender seu exército da escassez se torna próprios cidadãos que poderiam, e assim o
presentes de uma boa leitura e da o exercício diário de um bom general. fizeram, depor até mesmo a guarnição
completa “visualização” do temor que era Cavar poços (Caes. B. Alex. 5), navegar a
viver durante esses períodos da História costa (Caes. B. Alex. 7), cavalgar para o
Romana. O que se observa nos estudos é a interior em busca de trigo para o saque,
tentativa constante de estudar esses procurar gado, comer raízes, folhas e
períodos tendo como objeto das análises cascas são a prioridade (Caes. BC. 3, 58).
históricas o mesmo atrativo que a As grandes linhas de abastecimentos,
imaginação anseia quando falamos em neste caso, não funcionam da maneira
guerra: as táticas de batalha, as biografias que deveriam e falta dinheiro na capital Imagem 2: Mosaico Romano:
dos generais, a topografia, as armas e até para comprar produtos distantes e até Peixes e Vegetais (II d.C).
mesmo o tipo de vestimenta militar. mesmo para sustentar a posse da terra Fonte: Vatican Museums
Mas a guerra não é só isso! Ao (Caes. BC. 3, 20). Afinal, César não se
observarmos a obra Bellum Civile de omite em dizer que em muitos casos interna contrária aos exércitos que
César, por exemplo, podemos perceber tempestades atrapalhavam a navegação decidiram apoiar (Caes. BC. 3, 11). A
(Caes. BC. 1, 40; III, 22, 26, 27, 80, 102). comunidade, por sua vez, decidia e
Dessa forma, garantir que as também deixava para decidir até o último
comunidades vizinhas possam oferecer o minuto (Caes. BC. 1, 22, 23, 74). Visto
auxílio necessário para tal e também isso aproveito o final deste texto para
como abrigo aos feridos se firma nesse apresentar nosso estudo de doutoramento
cenário como a única opção que os em História Social: os rumores. O que se
generais possuem para continuar a percebe nas guerras civis, para além do
guerra. quadro descrito acima, são emissários,
As comunidades das províncias comerciantes, viajantes, correios e
possuíam comunicação prévia umas com desertores que propagam notícias e
Imagem 1: Busto de Júlio César as outras e até mesmo praticavam rumores, do ouvir falar (audiebat), do
Fonte: Museu Arqueológico rumor enquanto tal (rumor) e do perigo
Nacional de Nápoles comércio com aquelas que hoje estavam
sitiadas. Os produtos iam e vinham, assim que será enfrentar um general com tanta
que em quase sua totalidade a Guerra, como as notícias. César mesmo diz que fama. A guerra civil caminha ao lado!
para César, não se resume à batalhas. determinadas localidades áridas e Deste modo, saber de antemão quem
Estas, inclusive, compõem parcos montanhosas como o norte da Grécia apoiar era fundamental.
momentos de descrições que a meu ver somente viviam de importações de REFERÊNCIAS
são muito mais importantes para o produtos (Caes. BC. 3, 42). Ou seja, neste Cesar, Julio (1988). Alexandrian, African and
andamento de uma campanha civil: a cenário, é possível perceber que os Spanish wars. With an English Translation by A. G
obtenção de água, pastagem, madeira e exércitos poderiam recorrer a produtos Way. Cambridge, Massachusetts: Harvard
University Press.
de comida. Aliás, isso fica tão evidente locais enviados por cidades, assim como Cesar, Julio. (1990), The civil wars. With an
em sua narrativa que a presença de linhas comunicar a sua necessidade para elas e English Translation by A. G Peskett. Edited by G. P
de abastecimentos locais advindas das seus habitantes a tal ponto que eles Gool. Edinburgh: St Edmundusbury Press Ltd.
cidades (oppida/ civitates) próximas ao passem a fornecer os alimentos que GARNSEY, Peter. (1988). Famine and food
suplyin the Graeco-Roman world: responses to risk
conflito travado é o objetivo principal precisamos de maneira voluntária (Caes. and crises. Cambridge: Cambridge University
para aqueles que estão batalhando. E isso BC. 1, 40). Press.
perpassa pela análise dos recursos locais, Percebe-se, assim, outro problema para
como o Nilo para Água, em Alexandria, um conflito dessa natureza: quem apoiar * Doutorando em História Social pela USP
observado no Bellum Alexandrinum, 5, e em uma Guerra Civil? Se a sua Membro do Laboratório de Estudos
4 sobre o Império Romano - LEIR.
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Resumo: Cícero em De Officiis revisita temas jurídicos e sociais importantes e reconhecidos por uma audiência presumida. E alguns
outros ele renova sentido a fatos, mudando-os retoricamente, como faz no caso do assassinato do César.
Palavras chave: Cícero, história, retórica.
Resumo: Através da análise de uma estela funerária objetivamos refletir acerca da prática da gladiatura, focando na profissionalização
e na possibilidade de enriquecimento decorrente desta atividade.
Palavras-chave: Gladiadores, Epigrafia, Economia.
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Resumo: O presente trabalho busca apresentar, de maneira introdutória, o processo de colonização grega em Siracusa e os motivos que
levaram os oikistes de Corinto a escolher esta região para a formação desta apoikia sicilliana.
Palavras-chave: Siracusa, Sicília, Apoikia.
despertaram interesse por serem duas foi ligada ao continente por uma ponte, o
A Sicília ocupa a privilegiada posição regiões ricas em minérios. Além disso, o que possibilitou, mais tarde, expandir-se
na região central do mediterrâneo e servia crescimento demográfico na Grécia para além dos limites do território.
de ligação, por meio das rotas marítimas, extinguiu a busca de novas áreas de Talvez a escolha por Siracusa deveu-se a
entre o continente europeu e o africano. abastecimento de cereais, além do sua localização em uma área muito
Os habitantes mais antigos da região Peloponeso. Musti (1994: 66-141) favorável, exatamente na rota marítima
dividiam-se em três grupos étnicos concorda com esta opinião afirmando que comercial já estabelecida no período
distintos: os Sícanos, de origem ibérica, a colonização foi certamente uma resposta arcaico, possuindo além disso, dois portos
que ocupavam a área oriental; os Sículos, ao desequilíbrio determinado pela relação naturais de dimensões diferentes, fato que
povos da Itália meridional que se entre os escassos recursos e as grandes facilitava a troca comercial e o
estabeleceram na parte central da Sicília e necessidades durante os chamados escoamento de produtos cultivados em
os Êlimos, de origem desconhecidas que
habitavam a parte ocidental da ilha. É
provável, apesar de faltarem achados
arqueológicos, que a partir do século XI
a.C este lugar tenha sido visitado por
Fenícios, que implantaram algumas
feitorias, e gregos comerciantes
(CALCIATI, 1987:P.15).
A migração de gregos para o ocidente
começou no século VII e havia sido
pensada e preparada anteriormente por
meio das aberturas, esporádicas, de
emporias para o escambo de artefatos em
troca dos preciosos metais e matérias Imagem: Mapa do mediterrâneo com destaque na região de Siracusa (Fonte: Dummett, Jeremy.
primas da Península Itálica. Essas Syracuse, city of legends: a glory of Sicily. London ; New York : I. B. Tauris, 2010, p. xiii)
atividades prepararam o conhecimento
Grego a nível geográfico e etnográfico, “séculos obscuros” e representaria uma suas férteis terras e enviadas para Corinto.
para o início das migrações no séc. VIII resposta, que somente em parte exprime A região estava instalada em uma planície
a.C. uma rebelião espontânea, e também em e protegida a oeste por uma cadeira
Assim, conforme Greco (1995:03-59) os parte é favorecida ou mesmo suscitada e montanhosa, com isso, a defesa natural
elementos não helênicos que já incentivada pelas próprias aristocracias desta apoikia estaria garantida.
comercializavam com emporias de citadinas. Greco (1995:03-59) acrescenta O poder de Siracusa cresceu muito em
fenícios de modo pacífico não puseram que estas migrações também fteriam o apenas alguns séculos após a sua fundação.
resistência aos primeiros assentamentos atrativo da riqueza característica do solo No período clássico, a apoikia já era
coloniais em lugares estratégicos da Costa fértil e a riqueza agrária espontânea, considerada uma das mais importantes
Tirrênica para uma mútua interação devido ao terreno vulcânico. regiões do mediterrâneo. Neste período,
comercial e cultural. Siracusa foi a segunda apoikia da sua história política mesclou curtos
O motivo e a forma em que a colonização Sicília, fundada em 734 a.C., como narra instantes de democracia com governos de
dos gregos na Sicília foi realizada é Tucídides (6.3), o coríntio Árquias tiranos, que incluía a conhecida família dos
discutida por inúmeros autores. A hipótese conduziu um grupo de oikistes para Deinomenides – Gélon, Hiéron e trasíbulo
principal para o motivo da criação de novas Siracusa, estabelecendo-se na ilha de – além de Dionísio I, famoso por enfrentar
apoikias no período dos séculos VIII-VII Ortígia, expulsando de lá os sículos. Cartago.
a.C., seria a crise em que o território grego Estrabão (6,2- 4) relata que o fundador REFERÊNCIAS:
passava naquele momento. Claude Mossé Árquias foi a Delfos consultar o oráculo CALCIATI, Romulo. Corpus Nummorum
(1970) aborda a questão da motivação para saber qual região escolher. Tendo o Siculorum: La monetazione di bronzo, 1983-
comercial, pois houve o desenvolvimento deus questionado sobre escolher a riqueza 1987, 3 voll. MORTARA: Calicò, 1987
da metalurgia do ferro, que gerou a ou saúde e Árquias escolhido a riqueza, o GRECO, Emmanuelle. Archeologia della
necessidade do endurecimento do metal deus concedeu ao coríntio fundar Magna Grecia. Bari: Laterza 1995
com a utilização de uma liga de estanho e Siracusa. A ocupação de Siracusa se deu, MOSSÉ, CLAUDE. La Colonisation dans
cobre e, com isso, tornou-se fundamental primeiramente, na pequena ilha de l'Antiquité. Paris: Nathan, 1970.
o estabelecimento e controle de regiões quarenta hectares, chamada Ortígia, onde *Museóloga formada pela Unirio.
ricas nesses minerais; assim como as rotas encontra-se até hoje a principal área Mestranda em História na UERJ
marítimas. Magna Grécia e Sicília monumentalizada da cidade. A ilha logo Responsável pelo setor de Numismática do
Museu Histórico Nacional
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CURSO DE EXTENSÃO
Trimestral.
ISSN 1519-6917