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Disciplina: TBAT 1

Professor: Dr. Leandro Lima


AULA 01

A ALIANÇA E A CRIAÇÃO
Gn 1.26-31

A primeira coisa que precisa acontecer, para que possamos experimentar a


vida plena, o viver abençoado, é entender a própria origem de nós mesmos. É preciso
começar pelo começo. Então, vamos pensar um pouco: O que torna o homem tão
especial? Num certo sentido nós somos exatamente iguais a tantas espécies de seres
vivos. Os pássaros voam em bandos, as bestas viajam em manadas e nós vivemos em
tribos. Como eles, nós também lutamos para sobreviver e, em algum momento,
definhamos e morremos. Mas há algo que nos torna diferentes de todas as demais
criaturas: nós sabemos disso e sentimos isso. Alguém poderia dizer: ‘é porque somos
seres racionais, porque temos consciência das coisas que fazemos e porque podemos
realizar coisas grandiosas que os animais não podem’. De fato, podemos fazer muitas
coisas que os animais não conseguem. Podemos construir máquinas, escrever livros,
amar de uma forma intensa, contemplar a beleza das cores do jardim e as perfeições
das galáxias distantes. Mas há algo mais. Sabemos que somos especiais, porque há
algo dentro de cada ser humano que não se contenta com as coisas que nos cercam.
Em cada um de nós há um anseio por uma vida cheia de grandes realizações.
O livro do Gênesis tem a resposta para os nossos anseios e também a
explicação para a existência deles. Ele explica porque nos sentimos especiais e
também porque temos desejos tão sofisticados.
No Gênesis, o ser humano foi criado de modo distinto das demais criaturas. Ao
meditar sobre o modo especial como Deus criou o ser humano podemos entender a
razão da nossa existência e também como construir uma existência significativa. Ao
ler essas descrições descobrimos que fomos feitos para a glória e também como é
possível alcançar essa meta.

I. IMPRESSÕES DIGITAIS

O texto do Gênesis diz que, ao criar o ser humano, Deus não seguiu a rotina
com que criou os demais seres vivos. O relato da criação diz: “Façamos o homem à
nossa imagem, conforme a nossa semelhança” (Gn 1.26). Imagem e semelhança são
duas expressões que o antigo texto sagrado usa para explicar a diferença do homem
em relação às demais criaturas. Ele é diferente de tudo o mais porque se parece com
Deus. Nenhum privilégio poderia ter sido maior do que ter sido criado parecido com
Deus. O Criador deixou uma marca de si mesmo em sua criatura, como o oleiro deixa
suas impressões digitais sobre o vaso. Mas essa marca é muito mais do que um mero
detalhe acidental, ela aponta para a essência da nossa existência e abre as
possibilidades para uma vida gloriosa.
A primeira coisa que precisa ser notada é que quando Deus fez o homem à sua
imagem, estava colocando nele um senso insuperável dEle mesmo. Eram Suas
impressões digitais, ou seja, uma lembrança de Deus que não poderia ser apagada
dentro da alma do ser humano. Por isso há esse anseio dentro de cada pessoa, um
anseio que as coisas dessa vida não conseguem preencher. O ser humano suspira pela
eternidade. Ele não se conforma com a morte. Não consegue aceitar o fim. A razão é
simples: não foi feito para a morte, nem para esse fim.
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Ao mesmo tempo, o ser humano deseja algo mais nessa vida também. Todos
têm dentro de si um desejo, uma busca por algo que transcende a sua condição e a
sua própria vida finita. É por isso que nos foram dados os prazeres terrestres e, ao
mesmo tempo, é por isso também que eles não nos satisfazem completamente. Nos
foram dados a fim de elevar o sentido para a verdadeira alegria em Deus. Isso significa
que a nossa busca por prazeres foi calculada para ser, no fim das contas, algo como
uma inspiração para uma busca de Deus.
Imagine a implicação deste tipo de pensamento! Por que será que Israel tinha
tantas festas em seu calendário litúrgico? Pense na história do Deus-homem, que, não
somente viu uma bênção na união de um homem e de uma mulher, mas até mesmo
providenciou um milagre, a fim de que houvesse vinho para celebrar aquela ocasião.
Talvez você diga: “mas nós não somos ensinados a abandonar o mundo e os seus
prazeres”? Só no sentido em que isso nos conduz ao pecado. Há prazeres lícitos e
coisas maravilhosas no mundo. Nem tudo é feio e triste. As impressões digitais que
Deus deixou sobre o ser humano são um indicador de que o ser humano só pode
encontrar sua felicidade completa e o sentido para sua existência naquele que o criou.
Essa é uma marca indelével.
Deus deixou uma marca de si mesmo dentro do ser humano, por isso ele não
consegue se livrar da ideia de Deus. É aquilo que Paulo fala aos atenienses “pois nele
vivemos, nos movemos e existimos” (At 17.28). Por isso, no fundo, não há ser humano
que não seja religioso. Todos aspiram pelo divino. Ninguém consegue negar isso de
forma completa. É por isso que não existe um ateu no sentido completo. Mesmo
quando as pessoas negam a existência de Deus, no fundo estão brigando com essa
ideia, que está arraigada em seus corações. Por isso o ser humano é tremendamente
responsável diante de Deus. Deus deixou tão gravado no coração do homem o senso
de sua existência, e, além disso, de tal forma ele demonstra isso através de todas as
coisas criadas, que ninguém poderá argumentar diante de Deus: “eu não sabia”. Paulo
lembra que “os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder como também
a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo,
sendo percebidos por meio das cousas que foram criadas. Tais homens (os que negam
a existência divina) são por isso indesculpáveis” (Rm 1.20).

II. A RAZÃO DA EXISTÊNCIA

Nos dias atuais, quando as pessoas pensam em explicar a origem da vida ou a


origem de tudo o que existe, acreditam que é papel da ciência nos dar estas
explicações, mas, frequentemente a ciência moderna tem prometido mais do que
pode dar. É verdade que a ciência está mais bem preparada para dar certas respostas
do que outros campos. Por exemplo, quando pensamos na idade da terra, será que a
teologia tem a obrigação de dar uma resposta melhor do que a geologia? Dificilmente,
pois a teologia não existe para explicar a idade das coisas, uma vez que a Bíblia não é
um livro científico, nem foi escrita para nos prover deste tipo de informação. E, isso,
por sua vez, não significa que as datas geológicas estejam necessariamente corretas.
E há questões que nem a ciência, nem coisa alguma neste mundo pode nos dar a
resposta. Se, por um lado, a Bíblia não está preocupada em nos responder desde
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quando estamos aqui, é somente ela que pode nos dizer como, e principalmente,
porque estamos aqui.
Uma teoria popular diz que Deus nos criou porque ele se sentia sozinho. Mas,
certamente seria algo inacreditável imaginar que Deus precisasse dos seres humanos
para preencher um vazio em seu ser. Somos nós que possuímos este vazio. Nós
precisamos dele e não ele que precisa de nós. Como poderia a divina trindade se sentir
só em meio a milhões e milhões de anjos? Não é Deus que está sozinho no universo
sem o ser humano, é o ser humano que está sozinho sem Deus. Mesmo assim, não é
necessário negar que Deus desejou a companhia do ser humano. Ele desejou e por
isso o fez. Ele poderia ter feito apenas animais, mas desejou fazer alguém mais
parecido com Ele próprio. Deus queria relacionamento. Ele estabeleceu que nesse
relacionamento o ser humano satisfaria de forma única a sua vida. Deus nos criou por
amor.
Outra teoria diz que Deus criou os seres humanos, porque queria ter alguém
que O amasse de livre-vontade. Essa teoria diz que os anjos amavam a Deus não por
livre-vontade, mas por compulsão. Entretanto, essa teoria tende a dar demasiado
crédito ao ser humano e não explica como boa parte dos anjos se rebelou contra Deus
(Cf. 2Pe 2.4; Jd 6; Ap 12.7). Você pode até pensar que essa discussão não tem muita
importância, mas dela depende a nossa visão da criação e do próprio homem. Afinal,
a criação está centrada no homem, ou está centrada em Deus? Deus existe para nosso
propósito ou nós existimos para propósito dEle? A resposta bíblica é que nós existimos
por causa dele, para louvor da sua glória (Ef 1.6). A Escritura nos diz que Deus tem
prazer em suas obras. O Salmo 104 diz “A glória do Senhor seja para sempre! Exulte o
Senhor por suas obras!” (v. 31). Como o artista se alegra em sua obra prima, assim
Deus se alegra nas coisas que criou. Ou seja, todas as coisas existem por causa dele e
não por nossa causa. “Qual é o fim principal do homem?” é a pergunta número um do
nosso catecismo (Breve Catecismo de Westminster), e a resposta é: “Glorificar a Deus
e goza-lo para sempre”. Tendo considerado isso, não é preciso negar que Deus
desejava pessoas que o amassem de todo o coração, alma e forças, conforme Jesus
explicou que era a vontade de Deus.
Deus criou o mundo porque queria se alegrar no mundo criado e, ao mesmo
tempo, desejava que o mundo o glorificasse. Ao mesmo tempo em que Deus se alegra
em sua criação, nós também somos chamados para nos alegrar nEle. Deus nos criou
para ter prazer em nós e nós, da mesma forma, devemos ter prazer nele. Precisamos
considerar o propósito de nossa criação como centrado em Deus. Somente quando
entendemos isso é que podemos compreender o significado por trás do trabalho e do
lazer, do prazer e da restrição, da vida e da morte, do riso e do temor. Existimos para
a glória de Deus. Por isso, glorificar a Deus é a razão da nossa existência e fazer isso é
o que mais satisfaz a alma de um regenerado. Ao longo desse livro, tentaremos
demonstrar como fazer isso.

III. LIBERDADE CRIADORA

Um dos aspectos que a “imagem e semelhança” divina significava era uma


total possibilidade de agir como Deus agia. Nada havia na raça humana da forma como
Deus a criou que pudesse predispor o homem ao pecado. Havia justiça, santidade e
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piedade em todas as atitudes. Dessa forma tudo o que o ser humano fizesse deveria
ser parte da adoração. Planejar o futuro, nomear os animais, dar à luz filhos, construir
cidades, escrever músicas, praticar esportes, refletir sobre o significado de cada coisa,
etc., tudo deveria estar centrado em Deus.
Mas Deus não queria máquinas de xerox. O que Deus desejava era que Adão e
Eva desfrutassem de uma ligação criativa com seu Criador. Deus imaginou um mundo
perfeito e o trouxe à existência. Ele criou o mundo do nada (ex nihil), e com tantas
variedades de tons, cores e formatos quantas se poderiam imaginar. Ele criou tanto o
mundo macro, como o micro em todos os seus detalhes de forma, tamanho, cor e
função. O plano de Deus era que a humanidade também se tornasse imitadora dele
nesse sentido. É claro que o homem não poderia criar coisa alguma “do nada”, mas
como foi feito à imagem de Deus poderia refletir a criativa imaginação do Criador em
singular e impressionante imitação. Aprendemos isso do texto de Gênesis. Deus disse
“façamos o homem a nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele
domínio...” (Gn 1.26). Note a expressão “domínio”. Dominar é algo próprio de Deus,
mas o homem, que foi criado à sua imagem, também tinha a função de dominar, numa
clara imitação a Deus.
Assim que terminou de criar o ser humano, Deus o chamou para realizar uma
tarefa especial e específica: dar nomes aos animais. O texto diz: “Havendo, pois, o
SENHOR Deus formado da terra todos os animais do campo e todas as aves dos céus,
trouxe-os ao homem, para ver como este lhes chamaria; e o nome que o homem desse
a todos os seres viventes, esse seria o nome deles. Deu nome o homem a todos os
animais domésticos, às aves dos céus e a todos os animais selváticos” (Gn 2.19-20).
Essa tarefa aparentemente simples que Deus confiou ao homem era, na verdade,
muito significativa. Era um estímulo do Criador para que sua obra prima não fosse
apenas uma “reprodução”, uma mera cópia, mas um criador também. É
impressionante perceber que, de certo modo, Deus está chamando o homem para se
envolver com a criação e exercer sua criatividade também.
Assim, a imagem de Deus não precisa ser vista apenas num sentido de reflexo,
como num espelho, mas também de um modo dinâmico, como quando a luz atinge
um prisma e lança suas tonalidades variadas. Deus criou o homem à sua imagem e o
dotou de capacidade e liberdade para fazer coisas extraordinárias. Deveria fazer tudo
isso, não centrado em si mesmo, mas em Deus, pois tudo o que o homem fazia refletia
Deus.
De certo modo, o ser humano continua fazendo isso. Ao explorar as
potencialidades desse mundo, ao fazer descobertas científicas ou desenvolver novas
tecnologias, o ser humano está apenas seguindo a ordem divina “dominai sobre os
peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra” (Gn
1.38). O problema é que o ser humano tem feito isso de modo exacerbado, egoísta e
destrutivo. A razão dessa atitude é o que será estudado no próximo capítulo: o
pecado. Entretanto, quando o problema do pecado é resolvido, então podemos nos
voltar para os aspectos criativos da vida. Deus espera isso. Espera que utilizemos a
mesma criatividade dele.
A maior implicação da imagem e semelhança de Deus é a possibilidade de
relacionamento. Ao fazer isso, Deus pôde estabelecer com o ser humano um rela-
cionamento que não era possível com os outros animais: uma Aliança. Assim, a
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imagem e semelhança divina concederam ao homem um imenso privilégio, mas


também uma grande responsabilidade. Deus queria um relacionamento sério, não
irresponsável, por isso estabeleceu um teste. Certo dia, Deus disse para Adão: “De
toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem
e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás”
(Gn 2.16-17). Aqui está a primeira aliança que Deus estabeleceu com o ser humano,
era uma aliança baseada em obras, ou seja, na obediência do ser humano ao
mandamento divino. Deus só fez isso porque o homem tinha capacidade de entender
e obedecer àquela ordem, sendo que obedecer a Deus significaria desfrutar de uma
comunhão sem limites que faria com que “comer aquele fruto” se tornasse algo
insignificante. Mas nós já conhecemos a história. O homem optou pelo caminho ruim
e sobre isso teremos mais a dizer na próxima aula. Neste momento é importante
lembrar que a Aliança foi o meio especial que Deus estabeleceu para trazer sentido à
vida do homem. Na Aliança, o homem poderia desenvolver seu relacionamento com
Deus de modo a desenvolver seus potenciais e conhecer a Deus cada vez mais.

IV. HOUVE UMA ALIANÇA COM ADÃO?

Embora muitos estudiosos discordem, há ampla evidência bíblica para se


afirmar que a primeira Aliança estabelecida por Deus foi com o próprio Adão ainda no
Éden. O fato de o termo Aliança não aparecer não implica que não havia aliança, pois,
no caso de Davi, em lugar algum aparece o termo aliança, mas ninguém nega que Deus
estabeleceu uma aliança com Davi.
Há duas passagens bíblicas que ensinam que havia uma aliança estabelecida
nos tempos de Adão. A primeira é Jeremias 33.20- 21,25-26 “Assim diz o SENHOR: Se
puderdes invalidar a minha aliança com o dia e a minha aliança com a noite, de tal
modo que não haja nem dia nem noite a seu tempo, poder-se-á também invalidar a
minha aliança com Davi, meu servo, para que não tenha filho que reine no seu trono;
como também com os levitas sacerdotes, meus ministros. Assim diz o SENHOR: Se a
minha aliança com o dia e com a noite não permanecer, e eu não mantiver as leis fixas
dos céus e da terra, também rejeitarei a descendência de Jacó e de Davi, meu servo,
de modo que não tome da sua descendência quem domine sobre a descendência de
Abraão, Isaque e Jacó; porque lhes restaurarei a sorte e deles me apiedarei”. A
referência à Aliança divina com o dia e com a noite é entendida como uma referência
à criação, em que Deus estabeleceu os dias e as noites. Essa é uma referência concreta
a uma Aliança feita nos tempos de Adão.
Em Os 6.7, há uma referência direta à Aliança com Adão: “Mas eles
transgrediram a aliança, como Adão; eles se portaram aleivosamente contra mim”.
Alguns insistem que a referência a Adão é, na verdade, referência a uma cidade do
mundo antigo. Porém, essa explicação carece de base, sendo muito mais claro o
significado de que Adão, o primeiro homem, quebrou a Aliança com Deus. Se ele
quebrou a Aliança é porque havia uma Aliança.
A evidência conclusiva está no fato de que todos os elementos constitutivos
de uma aliança se encontram antes da aliança com Noé. Assim, a extensão da Aliança
Divina alcança o princípio do mundo e se estende até ao fim do tempo.
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Podemos ver essa Aliança com Adão antes e depois da Queda. É a mesma
Aliança, mas a situação é diferente. Após a Queda Deus vai renová-la, sob o prisma da
Redenção, primeiramente com o próprio Adão, depois com Noé, Abraão, Davi e, por
fim, consumá-la na Pessoa de Jesus Cristo. É correto dizer que, antes da Queda, a
Aliança era das Obras e após a Queda passa a ser da Graça, mas o que não podemos
pensar é que Deus tenha mudado seu propósito. A Aliança continua visando o bem do
homem, porém, antes da queda, o homem era sem pecado e, portanto, havia base
para um compromisso de obras, porém, após a queda, a graça tem o papel primordial.
Antes da Queda, vemos os aspectos da Aliança na instituição do Sábado
(aspecto espiritual), do casamento (aspecto social), do trabalho (aspecto cultural). O
mandamento explícito de não comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e
do mal também faz parte do aspecto espiritual. O Sábado desempenha papel
preponderante, afetando a própria estrutura da história, ele consuma tanto a obra da
criação, quanto a obra da redenção. O casamento é vital porque, através dele, Deus
providenciou a “ajuda” necessária para o homem, possibilitando ainda a propagação
da raça através de um meio natural. E o trabalho não é apenas um aspecto legal da
velha aliança, ele pertence integralmente ao homem que foi feito à imagem de Deus,
que é um Deus que trabalha. Através do trabalho (mandado cultural), juntamente com
o Sábado (mandado espiritual) e o casamento (mandado social), o homem encontra
significado para sua vida. Deus estabeleceu esse tríplice relacionamento para tornar a
vida do homem agradável, significativa e prazerosa.
Da ordem de se abster do fruto segue-se a necessidade de obediência estrita
à Palavra de Deus. O aspecto do sangue como elemento vital na aliança prova-se
através disso, pois o pacto de vida e morte foi assumido, e uma vez que o homem
pecou, somente o sangue substituto poderá livrá-lo da maldição da aliança. Aqui,
muitos entendem a morte do primeiro animal para fazer as vestes de Adão e Eva,
como elemento constitucional da Aliança (Gn 3.21).
Após a Queda, a Aliança se baseia principalmente nas declarações de Deus a
Satanás, à mulher e ao homem (Gn 3.14-19). Satanás recebe maldição pura, pois a
serpente, como tipo de Satanás, terá que rastejar, comendo o pó da derrota todos os
dias. Deus ainda garante a destruição de Satanás com a vinda de um descendente que
esmagará a cabeça dele, além de uma guerra sem fim entre as duas sementes (a santa
e a maligna). Porém a mulher e o homem recebem uma maldição mitigada (reduzida),
na qual Deus mescla juízo e graça. Juízo, porque de fato a vida do homem e da mulher
seria difícil, e a morte por fim os consumiria, porém a graça pode ser vista no simples
fato de que até lá continuariam vivendo, se multiplicando e dominando a terra,
tirando dela o seu sustento.

V. APTIDÃO PARA COISAS SANTAS

Quando interpretamos a existência através daquilo que o Gênesis descreve


ficamos com implicações impressionantes para a vida. A primeira implicação é que
não importa se nosso próximo é um cristão ou não, ele merece respeito, pois a
imagem divina ainda está nele. Além disso, implica em que tenhamos
relacionamentos comuns com não-cristãos em praticamente todas as esferas de nossa
vida. Nós podemos construir carros juntos, participar de assembleias ou de concílios
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escolares sem ser adversários, pois, de fato, a vida cívica encontra sua origem na
Criação mais que na Redenção. É uma vergonha para nós cristãos que sejam os não-
cristãos que lideram as campanhas contra o aborto, contra as drogas ou contra a Aids.
Por que tem que ser os não-cristãos que se levantam em favor dos direitos civis? Será
que estas funções não deveriam ser nossas também? Quanto mais nós nos apegarmos
à doutrina da criação, mais seriamente tomaremos nossa responsabilidade social. O
mesmo deve ser dito em relação à natureza e à ecologia.
Uma impressionante implicação também diz respeito ao conceito de trabalho.
A filosofia popular diz que nós devemos trabalhar para o fim de semana. Mas Deus
estabeleceu o trabalho antes da queda para ser santo, algo como um culto a Deus,
certamente uma nobre atividade. A doutrina da criação nos fala de termos alegria em
nosso trabalho, considerando-o algo positivo, louvável, de grande importância. E isso
não importa se alguém é um engenheiro, um físico nuclear, uma doméstica ou um
gari. O trabalho deve ser considerado como um chamado de Deus, e todos devem
buscar se alegrar nele e glorificar a Deus através dele.
Dentro dos domínios da Redenção nós somos diferentes dos não-cristãos, mas
quanto à Criação temos uma comum humanidade. Ou seja, comemos, bebemos,
enxergamos, trabalhamos, criamos, e discutimos da mesma forma. Nossas convicções
religiosas não devem denegrir nossa humanidade, o que devemos fazer é centralizar
nossa humanidade e a expressão dela em Deus. Ou seja, Deus está interessado em
todos os aspectos de nossa humanidade, pois todos esses aspectos devem refleti-lo.
Concluímos que na criação, Deus estabeleceu uma Aliança para abençoar e dar
sentido ao homem que ele havia criado. Por esse motivo, o ser humano só entende
quem é, e desfruta de uma vida plena quando volta-se para a Aliança divina.

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