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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão
DJe 17/12/2012
Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 8

27/11/2012 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 115.182 SÃO PAULO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


PACTE.(S) : CARLOS ALBERTO FERREIRA GUIMARÃES
IMPTE.(S) : LEONARDO AFONSO PONTES
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Habeas corpus. 2. Falsidade ideológica e quadrilha. Condenação. 3.


Apelação. Turma julgadora composta majoritariamente por juízes
federais convocados. 4. Alegação de ofensa ao princípio do juiz natural.
Não ocorrência. Precedente do Plenário. 5. Ordem denegada.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do


Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência do
Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata de
julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, denegar
a ordem, nos termos do voto do Relator.
Brasília, 27 de novembro de 2012.

Ministro GILMAR MENDES


Relator
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27/11/2012 SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 115.182 SÃO PAULO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


PACTE.(S) : CARLOS ALBERTO FERREIRA GUIMARÃES
IMPTE.(S) : LEONARDO AFONSO PONTES
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Trata-se de


habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado por Leonardo
Afonso Pontes, em favor de Carlos Alberto Ferreira Guimarães, contra
acórdão proferido pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), que denegou a ordem, nos autos do HC 212.629/SP. Eis a ementa
desse julgado:

“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ÓRGÃO


COLEGIADO COMPOSTO, MAJORITARIAMENTE, POR
JUÍZES CONVOCADOS, POR NORMA CONSTITUCIONAL
OU LEGAL. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. OFENSA AO
PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. INOCORRÊNCIA.
PRECEDENTES.
1. Através do julgamento do RE 597.133/RS (17.11.2010),
em regime de repercussão geral, o STF fixou a orientação de
que não há violação ao princípio do juiz natural quando a
Turma julgadora é composta, na sua maioria, por juízes
convocados de primeiro grau, entendimento que homenageia a
duração razoável do processo, ‘materializando o ideal de uma
prestação jurisdicional célere e efetiva’.
2. O referido entendimento adotado pela Quinta Turma do
Superior Tribunal de Justiça, aferiu estarem dentro da
legalidade os julgamentos proferidos pelos órgãos fracionários
com quantitativo majoritário de juízes convocados. Desta
forma, resta superada a jurisprudência em sentido contrário
emanada, anteriormente, por esta Corte.

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HC 115.182 / SP

3. Ordem denegada”.

Na espécie, o paciente foi condenado às penas de 5 anos e 4 meses de


reclusão, em regime inicial fechado, e de 66 dias-multa, pela prática dos
crimes previstos nos arts. 299, parágrafo único, e 288, caput, todos do CP,
na forma do art. 69 (concurso material).
Contra essa decisão, a defesa e o Ministério Público Federal
interpuseram apelação.
A Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF da
3ª Região) deu parcial provimento aos recursos: o apelo defensivo foi
acolhido para absolver o réu da prática do delito de falsidade ideológica;
já o recurso ministerial foi provido para decretar a perda do cargo de
Agente da Polícia Federal, com fundamento no art. 92, I, a, do CP. Daí, a
impetração de habeas corpus no STJ, alegando nulidade do acórdão do TRF
da 3ª Região ante a violação do princípio do juiz natural, tendo em vista
que a Turma julgadora fora composta, em sua maioria, por juízes federais
convocados.
A Quinta Turma do STJ denegou a ordem.
Opostos embargos de declaração, estes restaram rejeitados.
No presente writ, a defesa reitera a alegação de nulidade do acórdão
do TRF da 3ª Região porque, para o referido julgamento, a Turma
Criminal foi composta majoritariamente por juízes de primeiro grau.
Liminar indeferida.
A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pela denegação da
ordem.
É o relatório.

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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HABEAS CORPUS 115.182 SÃO PAULO

VOTO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): No presente


habeas corpus, a defesa insiste na alegação de nulidade do acórdão
proferido pelo TRF da 3ª Região, sustentando que a Turma julgadora da
apelação foi composta majoritariamente por juízes federais convocados,
em violação ao princípio do juiz natural.
De início, destaco que um dos princípios essenciais do direito
constitucional diz respeito ao postulado do juiz natural, que traz ínsita a
proibição das Cortes ad hoc ou dos tribunais de exceção.
A propósito, o voto condutor do HC 81.963/RS, rel. Min. Celso de
Mello, 2ª Turma, unânime, DJ 28.10.2004, observou que:

“O princípio da naturalidade do juízo representa uma das


mais importantes matrizes político-ideológicas que conformam
a própria atividade legislativa do Estado e condicionam o
desempenho, pelo Poder Público, das funções de caráter penal-
persecutório, notadamente quando exercidas em sede judicial.
O postulado do juiz natural, em sua projeção político-
jurídica, reveste-se de dupla função instrumental, pois,
enquanto garantia indisponível, tem, por titular, qualquer
pessoa exposta, em juízo criminal, à ação persecutória do
Estado, e, enquanto limitação insuperável, representa fator de
restrição que incide sobre os órgãos do poder estatal
incumbidos de promover, judicialmente, a repressão criminal. -
É irrecusável, em nosso sistema de direito constitucional
positivo - considerado o princípio do juiz natural - que
ninguém poderá ser privado de sua liberdade senão mediante
julgamento pela autoridade judiciária competente. Nenhuma
pessoa, em conseqüência, poderá ser subtraída ao seu juiz
natural. A nova Constituição do Brasil, ao proclamar as
liberdades públicas - que representam limitações expressivas

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aos poderes do Estado - consagrou, de modo explícito, o


postulado fundamental do juiz natural. O art. 5º, LIII, da Carta
Política prescreve que ‘ninguém será processado nem
sentenciado senão pela autoridade competente’". (HC
81.963/RS, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, unânime, DJ
28.10.2004).

Entende-se que juiz natural é o órgão judicial regular e


legitimamente investido de poderes da jurisdição, dotado de todas as
garantias inerentes ao exercício da magistratura (vitaliciedade,
inamovibilidade, irredutibilidade de vencimentos – CF, art. 95, I, II, III),
que deve decidir segundo regras de competência fixadas com base em
critérios gerais vigentes ao tempo do fato.
Na lição de Jorge Figueiredo Dias, a ideia de juiz natural assenta-se
em três postulados básicos:

“(a) somente são órgãos jurisdicionais os instituídos pela


Constituição;
(b) ninguém pode ser julgado por órgão constituído após a
ocorrência do fato;
(c) entre os juízes pré-constituídos vigora uma ordem
taxativa de competências que exclui qualquer alternativa
deferida à discricionariedade de quem quer que seja.” (DIAS,
Jorge de Figueiredo. Direito Processual Penal. Coimbra: Coimbra
Editora, 1974, v. 1, p. 322/323).

É certo, no entanto, que tal garantia não impede substituições


previstas em lei, desaforamentos e prorrogação de competência, casos
excepcionais contemplados na legislação processual penal.
Integra também o conceito de juiz natural, para os fins
constitucionais, a ideia de imparcialidade, isto é, a concepção de
“neutralidade e distância em relação às partes” (Neutralität und Distanz

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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HC 115.182 / SP

des Richters gegenüber den Verfahrensbeteiligter) Cf. BVerfGE 21, 139 (146);
PIEROTH & SCHLINK. Grundrechte - Staatsrecht II. Heidelberg: 2005. p.
277.
O âmbito de proteção de caráter estritamente normativo faz com que
o legislador deva tomar as providências necessárias à realização do
princípio consagrado na Constituição.
Evidentemente, a garantia do juiz natural pressupõe adequada
disciplina legislativa a propósito: i) da competência dos órgãos judiciais;
ii) das regras de solução de conflito de competência ou de jurisdição; iii)
das normas sobre prorrogação de competência e substituição de juízes; e
iv) da definição precisa das regras de impedimento e suspeição de juízes.
Não pode, porém, o legislador, a pretexto de tornar operacional o
princípio, impor-lhe limitação que acabe por desfigurar-lhe a
operacionalidade constitucional.
Quanto ao tema, no julgamento do HC 96.821/SP, o Plenário do STF
fixou a orientação de que não há violação ao princípio do juiz natural
quando a turma julgadora é composta, na sua maioria, por juízes
convocados de primeiro grau. Eis o teor da ementa deste julgado:

“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL.


JULGAMENTO DE APELAÇÃO NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DE SÃO PAULO. CÂMARA COMPOSTA
MAJORITARIAMENTE POR JUÍZES CONVOCADOS.
NULIDADE. INEXISTÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO
JUIZ NATURAL. INOCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA.
I - Esta Corte já firmou entendimento no sentido da
constitucionalidade da Lei Complementar 646/1990, do Estado
de São Paulo, que disciplinou a convocação de juízes de
primeiro grau para substituição de desembargadores do TJ/SP.
II - Da mesma forma, não viola o postulado constitucional
do juiz natural o julgamento de apelação por órgão composto
majoritariamente por juízes convocados na forma de edital
publicado na imprensa oficial.
III - Colegiados constituídos por magistrados togados, que

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os integram mediante inscrição voluntária e a quem a


distribuição de processos é feita aleatoriamente.
IV - Julgamentos realizados com estrita observância do
princípio da publicidade, bem como do direito ao devido
processo legal, à ampla defesa e ao contraditório.
V – Ordem denegada” - (HC 96.821/SP, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, Pleno, maioria, DJe 25.6.2010).

É dizer, o Plenário declarou que a convocação excepcional é


compatível com o princípio do juiz natural. No mesmo sentido, cito
vários precedentes: HC 69.601/SP, rel. Min. Celso de Mello, 1ª Turma,
unânime, DJ 18.12.1992; HC 70.103/SP, rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma,
unânime, DJ 18.6.1993; HC 71.963/SP, rel. Min. Carlos Velloso, Pleno,
maioria, DJ 17.3.1995; HC 74.765/SP, rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma,
maioria, DJ 9.5.1997; HC 73.796/SP, rel. Min. Néri da Silveira, 2ª Turma,
unânime, DJ 2.6.2000; e HC 83.459/SP, red. p/o acórdão Min. Sepúlveda
Pertence, 1ª Turma, maioria, DJ 28.5.2004.
Por fim, ressalto que a convocação de juízes federais ou substitutos
para auxiliar em segundo grau de jurisdição foi instituída, no âmbito da
Justiça Federal, pela Lei 9.788, de 19 de fevereiro de 1999.
Diante do exposto, meu voto é no sentido de denegar a ordem.
É como voto.

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Decisão de Julgamento

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SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA

HABEAS CORPUS 115.182


PROCED. : SÃO PAULO
RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
PACTE.(S) : CARLOS ALBERTO FERREIRA GUIMARÃES
IMPTE.(S) : LEONARDO AFONSO PONTES
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: A Turma, por unanimidade, denegou a ordem, nos termos


do voto do Relator. 2ª Turma, 27.11.2012.

Presidência do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski. Presentes


à sessão os Senhores Ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes e
Cármen Lúcia.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Mário José Gisi.

p/ Fabiane Duarte
Secretária

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