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O término da Guerra Fria foi um marco com significado histórico e geográfico, isso porque
foi depois dele passou-se a vivenciar um outro momento com transformações ideológicas e
politicas. No século XXI, mesmo com toda a evolução e desenvolvimento, sucedeu um aumento
das desigualdades sociais em todo o mundo, isso porque um número pequeno de pessoas, de
famílias, que tem o poder sobre a maior parte da renda mundial, só está preocupada com a
exploração, e com tudo que o sistema capitalista os oferecem, desconhecendo assim todo e qualquer
direito humano. Toda essa desorganização social, financeira influencia totalmente no romance
contemporâneo, que tanto explora essa dura realidade, retratada muitas vezes pela tendência da
“literatura marginal”.
Fisher (2006) relata que o romance brasileiro das últimas décadas traz um vínculo entre o
individual e o global, por meio da proximidade trazida pela tecnologia, mostrando vários elementos
que configuram esse feito. Ocorrendo depois desse período de redemocratização uma explosão da
literatura, lembrando de destacar Clarice Lispector, Guimarães Rosa, entre outros que nos anos 70
usaram o gênero como um meio de protestar e se engajar politicamente. Recentemente, o diálogo
entre o literário e o tecnológico, também possibilitou sua propagação. Para que se possa explorar o
romance brasileiro das últimas décadas precisa-se ter consciência que este vivenciou dois
momentos, onde o primeiro ele se posta frente a repressão e no segundo ele se aproxima da
democratização e da globalização, o livro Feliz ano novo de Rubem Fonseca marca bem esses
momentos.
A cidade tornou-se espaço para os grandes romances brasileiros, visto que essa era sinônimo
de modernidade, as pessoas saem de somente o físico para conjunto também de linguístico e virtual;
mas apesar dessa modernização aparecem também os efeitos, muitas vezes não tão positivos, de tal
feito. Em diversas obras brasileiras é possível notar uma associação entre o linguístico e o corporal,
que apesar de mostrar todos os avanços da vida moderna também questiona uma serie de
divergências existentes na época. Ruffato em sua obra Eles eram muito cavalos traz a sociedade
urbana como fonte do seu fazer literário, explicitando as inúmeras mudanças ocorridas nela através
do tempo, mostrando também a desordenada vida contemporânea.
São Paulo, que é visto como um importante núcleo econômico, move a economia devido a
sua força perante a indústria e comércio. Segundo Saskia Sassen (2006), a cidade passou de
metrópole para megacidade, que corresponde a áreas urbanas com uma maior quantidade de
habitantes do planeta, estas são as responsáveis por estabelecer a conjuntura econômica do planeta,
mas em contrapartida possui muita pobreza e marginalização, em meio ao desenvolvimento típico
de uma megacidade vem como consequência falta de assistência básica para toda a população; com
todo esse crescimento, a cidade é palco do multiculturalismo.
Em seu romance, o autor procura mostrar toda a desigualdade existente na megacidade, sua
narrativa tem características intensa e desordenada, explicitando a interpretação dos traços dessa
cidade. Para ele a modernidade leva ao consumismo, onde o foco está voltado para a mercadoria;
nessa sociedade consumista está inserido o narrador flânuer que está voltado para o fetiche, o blasé
faz o papel contrário, este não se deixa levar por todos esses “encantamentos” e por fim, o zappuer,
que varia em diversas imagens da cidade com um olhar instável; esse último serve de objeto para o
romance de Ruffato, possibilitando através desse tipo de narração mostrar diferente modos de ver a
obra em seus fragmentos.
Na obra, tem-se a cidade como algo vivo e variante, o foco está voltado para a própria
cidade, existe uma vinculação entre fotografia, literatura e cinema. Nela São Paulo é retratada como
uma cidade com diferentes níveis sociais, que muda a cada emoldura da narração, que muito está
voltada para a individualidade, típica do sistema capitalista, se perdendo de uma coletividade, ela
está entre mover-se e paralisar-se, que se exibe por diversas faces. Diferente dos espaços, nem todos
os personagens são nomeados, mostrando mais uma vez que o foco da narrativa está voltado para a
cidade.
No que refere à linguagem do romance, uma serie de características é posta, começando com
o título que traz algo enigmático que retratam diversos acontecimentos. Na obra, também
encontramos em alguns momentos textos que não são literários sobre inúmeros assuntos; religião e
política também são manifestadas no romance. Sua pontuação influencia para um entendimento do
tempo de um pensamento para outro, dando uma ideia de movimento. Percebe-se uma variedade
linguística, onde a linguagem também retrata o consumismo, uma crise de valores que essa
contemporaneidade trouxe, a literatura nessa obra se constrói e reconstrói a cada instante. Vale
lembrar também que esse é considerado um romance urbano, visto que procura nas irregularidades
da cidade sua própria constituição.