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Quem são os rohingyas, povo muçulmano que a ONU

diz ser alvo de limpeza étnica

http://www.bbc.com/portuguese/internacional-
41257869

A migração de cerca de 370 mil muçulmanos rohingyas


de Mianmar para Bangladesh nas últimas semanas é mais um
capítulo de uma história marcada por décadas de
perseguições.

Cerca de um milhão de pessoas dessa minoria, a maior


comunidade no mundo, vivem em Mianmar, país
predominantemente budista. A maioria mora de forma
precária no Estado de Rakhine, palco dos episódios recentes
de violência que o alto comissário das Nações Unidas para os
direitos humanos, Zeid Ra'ad al-Hussein, classificou de
"limpeza étnica".

O estopim foi em 25 de agosto, quando militantes


rohingya atacaram dezenas de postos policiais. Em resposta, o
exército birmanês deu início a uma operação militar que,
segundo relatos citados pelo alto comissário da ONU,
incendiou vilarejos, matou civis e espalhou minas terrestres na
fronteira com Bangladesh.

O êxodo em massa dos rohyngias nos últimos dias não


tem precedentes, diz a Organização Internacional para as
Migrações (OIM) da ONU, que estima que outras 100 mil
pessoas possam se juntar nos próximos dias aos que cruzaram
a fronteira.

Cerca de 60% dos novos refugiados são crianças, de


acordo com o chefe de proteção a crianças da Unicef em
Bangladesh, Jean Lieby.

Pobreza e repressão

A crise do povo rohingya é uma das mais longas do


mundo e também uma das mais negligenciadas. O diagnóstico,
feito pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Refugiados (Acnur), levou a ONU a aprovar uma resolução em
dezembro de 2014 que exortava Mianmar a permitir o acesso
à cidadania para a minoria, classificada de forma geral como
apátrida.

No país, eles são proibidos de se casar ou de viajar sem a


permissão das autoridades e não têm o direito de possuir terra
ou propriedade.

O povo representa cerca de 5% entre 60 milhões de


habitantes de Mianmar, e sua origem ainda é amplamente
debatida.

Por sua parte, eles afirmam serem indígenas do Estado


de Rakhine, anteriormente conhecido como Arakan, no oeste
do país, mas outros apontam que são, na verdade,
muçulmanos de origem bengali que migraram para Mianmar
durante a ocupação britânica.
Desde 1948, quando o país se tornou independente, eles
têm sido vítimas de tortura, negligência e repressão.

Com as dramáticas mudanças políticas e sociais locais


nos últimos anos, os ânimos das várias comunidades que
habitam o país entraram em ebulição e uma onda de violência
e discriminação voltou a emergir contra os rohingyas.

Após ter sido governado por uma junta militar por mais
de meio século, Mianmar vinha passando por uma transição
para a democracia e por melhorias no campo social.

Mas a situação não melhorou para os rohingyas.

Em 2012, duas ondas de violência, uma em junho e a


outra em outubro, orquestradas por grupos extremistas de
maioria budista em Rakhine, deixaram cerca de 140 mortos,
centenas de casas e edificações muçulmanas destruídas e 100
mil desabrigados.

Autoridades e a polícia foram acusadas de não agir para


defendê-los.

Como explicou o correspondente da BBC no sudeste da


Ásia, Jonathan Head, em um relato feito em 2015, "Rakhine é
o segundo Estado mais pobre em Mianmar, e este é um dos
países menos desenvolvidos do mundo".
"A pobreza, negligência e repressão têm desempenhado
um grande papel na violência étnica", diz o repórter.

"Adicione a isso as memórias históricas amargas e os


medos sentidos por comunidades rivais do que poderiam
perder ou ganhar no ambiente político novo e incerto de
Mianmar", acrescenta.

Em 2012, 100 mil muçulmanos rohingyas ficaram


desabrigados.

Direitos civis

Tanto as Nações Unidas quanto as organizações de defesa


dos direitos humanos pedem que as autoridades de Mianmar
revejam a Lei de Cidadania de 1982, de forma a garantir que
os rohingyas não continuem sem pátria.

Essa é a única maneira, dizem, para combater as raízes


da longa discriminação contra essa etnia.

Contudo, muitos budistas de Mianmar nem sequer


reconhecem o termo rohingya. Chamam-nos de "bengalis
muçulmanos" - uma alusão à visão oficial de que os rohingyas
são imigrantes de Bangladesh.

Como diz Jonathan Head, cerca de 800 mil rohingyas de


Mianmar não possuem cidadania. E isso de certa forma
incentivou budistas a acreditar que sua campanha de
segregação e expulsão forçada é justificada.

Mas a segregação, explica o correspondente da BBC, não


só é social.

"As longas décadas de isolamento e de injustiça crônica


impostas pela junta militar de Mianmar criou um preconceito
e ressentimento no Estado de Rakhine. E isso tem fermentado
um clima venenoso da desconfiança e falta de informação."

"É claro que, além de a separação física dos muçulmanos


e budistas, também há uma extrema segregação mental."

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