Você está na página 1de 14

Vocês lembram, é claro, essa bela história dos dois discípulos do último capítulo

do Evangelho de Lucas —como no primeiro dia da semana—, nesse mesmo Yom


Rishon, domingo, que começou com o relato espantoso das mulheres sobre como
elas não encontraram o corpo de Jesus, no mesmo dia mas, uma hora mais
tarde, dois deles estavam viajando … para uma aldeia chamada Emaus (em
Hebraico é Ammaus — ‫ )עמאוס‬que ficava a 60 estadios (cerca de sete milhas) de
Jerusalém. Podemos imaginar o que estava acontecendo em seus corações e
mentes. Eles ficaram muito perplexos com tudo o que tinha acontecido com seu
Mestre, e estavam falando entre eles sobre esses eventos. Agora, no caminho o
próprio Jesus … foi com eles, mas eles não O reconheceram. Eles continuavam
falando; eles responderam a Jesus quando perguntou sobre as últimas notícias de
Jerusalém; eles ficaram intrigados com o fato de que somente Ele não sabia o que
havia acontecido —mas eles não O reconheceram—. Então ele disse algo muito
notável: ó néscios e tardos de coração para crer em tudo o que os profetas
disseram![1] Temos que admitir que é realmente difícil imaginar um peregrino
eventual dizendo algo tão rude —é preciso ter uma autoridade real para dizer tais
palavras—mas mesmo depois dessas palavras, eles não O reconheceram. Então
Ele começou a ensiná-los sobre as Escrituras. Alguém poderia pensar que
deveriam ter lembrado dEle ensinando-lhes tantas vezes quando Ele estava com
eles, mas mesmo assim não conseguiram reconhecê-lo. Seus olhos estavam
impedidos, de modo que não o reconheceram.[2]
Já vimos que referir-se à vinda do Messias como oculto e revelado poderia ser
tomado como representativo do Judaísmo do primeiro século. A idéia do
Messias não sendo reconhecido pelo povo de Israel era uma idéia muito comum
no pensamento Judaico. Nesse sentido, a história de Emaús apenas produz prova
adicional para essa idéia. No entanto, através desta história Lucas mostra muito
claramente como e por que eles não o reconheceram —e é isso que vamos
discutir agora—.
Seus olhos estavam impedidos
Procuremos compreender o que aconteceu aos olhos dos discípulos na estrada
para Emaús. Nós lemos que seus olhos estavam impedidos. Em Inglês, como em
Grego, o verbo impedido é a forma passiva do verbo impedir. Essencialmente, isso
significa que, o que quer que tenha acontecido aos discípulos, sua incapacidade
de reconhecer Jesus não dependia de si mesmos. Alguém estava impedindo seus
olhos até que chegasse o momento marcado.[3] Então, quando chegou o
momento marcado, o mesmo alguém abriu seus olhos: Então seus olhos foram
abertos e eles O reconheceram.[4] Aqui novamente, como no versículo 16, o texto
usa a forma passiva: seus olhos foram abertos. O verbo Grego[5] usado aqui
significa “ser aberto completamente, totalmente ” e ocorre várias vezes na
Septuaginta. O uso da forma ativa deste verbo é notável. Em quase todos os
lugares da Septuaginta onde este verbo é encontrado na forma ativa, o sujeito da
sentença é o próprio Deus, o que nos leva a uma conclusão muito importante:
Deus é o único que pode abrir nossos olhos espirituais! Por exemplo, em 2 Reis
6:17, Eliseu ora para que o Senhor abra os olhos de seu servo: SENHOR,
peço, abra seus olhos para que ele veja. E o SENHOR abriu os olhos do moço, e
ele viu. É por isso que as palavras de Lucas no final do mesmo capítulo: E Ele
abriu seu entendimento, para que eles compreendessem as Escrituras[6], em
certo sentido, é uma declaração de fé: Lucas certamente acredita que Jesus é
Deus e é por isso que Ele tem a autoridade de Deus para abrir. De acordo com
Lucas, o Senhor, e somente Ele, tem autoridade para impedir o entendimento e
os olhos —e Ele é o único que pode abrir, destrancar o entendimento e os olhos—
. Os olhos dos discípulos na estrada para Emaús foram impedidos de uma
maneira soberana somente por Sua mão e de modo algum poderiam ter
reconhecido Jesus até que Ele mesmo abriu seus olhos.
A este respeito, gostaria de recordar a cena bem conhecida na sinagoga de
Nazaré do capítulo 4 do Evangelho de Lucas: Indo para Nazaré, onde fora criado,
entrou num sábado, na sinagoga, segundo seu costume, e levantou-se para
ler…[7] Ao ler esses versículos, Lucas 4: 16-30, fica-se invariavelmente admirado
com a atmosfera incrivelmente tensa que enche a sinagoga quando Jesus lê o
profeta Isaías. Qual é a fonte dessa tensão e o que ela demonstra? E todos na
sinagoga tinham os olhos fitos nele… Todos lhe davam testemunho e se
maravilhavam das palavras de graça que lhe saiam dos lábios.[8] Em outras
palavras, Lucas mostra uma imagem muito semelhante à que testemunhamos no
caminho de Emaús: os corações daqueles que ouviram Jesus estavam
queimando; eles estavam claramente sentindo que aquele que estava diante deles
tinha uma autoridade especial, extra-humana. E todos na sinagoga tinham os
olhos fitos nele em um intenso desejo e expectativa de ver nEle aquele que eles
sentiram em seus corações, que Ele era. Acredito que desejavam
desesperadamente obedecer a voz de seus corações e reconhecer o Messias —e
no entanto?— eles não puderam. Por quê? Qual foi a diferença entre os discípulos
na estrada para Emaús e os habitantes da cidade de Jesus de Nazaré? Lucas
deixa claro que, em ambos os casos, os corações queimaram e, em ambos os
casos, os olhos fitos em Jesus foram impedidos por ninguém menos que o próprio
Senhor (já sabemos que na Bíblia, ninguém mais pode impedir ou abrir os olhos de
alguém) . No entanto, os olhos dos discípulos na estrada para Emaús foram
finalmente abertos, enquanto os olhos das pessoas em Nazaré permaneceram
impedidos…
Esta é uma mensagem que Lucas transmite aos seus leitores neste capítulo de
transição: ninguém além do próprio Deus pode impedir ou abrir os olhos
espirituais. Para Lucas, é claramente Sua decisão e somente Sua, tanto no
caso dos discípulos na estrada de Emaús, cujos olhos foram abertos no final e que
finalmente O reconheceram, e no caso da sinagoga, onde os olhos das pessoas
permaneceram impedidos e não O reconheceram.
Continua…
(Se vocês estão interessados em ler meu livro sobre o Hidden Messiah, ou outros
livros, vocês podem obtê-los através da minha página neste
blog, https://blog.israelbiblicalstudies.com/julia-blum/.)
[1] Lucas 24.25
[2] Lucas 24:16
[3] Em Grego, exatamente como em Inglês, temos a forma
passiva (εκρατουντο) do verbo impedir (Κρατεω).
[4] Lucas 24:31
[5] Διανοιγω
[6] Lucas 24:45
[7] Lucas 4:16
[8] Lucas 4:20, 22

Home > Blog > Jewish Studies > O Capítulo Transitório (2): Recontando a História

O Capítulo Transitório (2):


Recontando A História
By Julia Blumfevereiro 8, 2018No comments
Continuamos nossa jornada através do capítulo de transição do Evangelho de
Lucas —a jornada na estrada de Emaús, juntamente com dois discípulos tristes e
o misterioso estranho que se juntou a eles no caminho—. Lembramo-nos de que
seus olhos foram impedidos e eles não reconheceram Jesus neste Estranho. A
história continua a dizer-nos que “começando por Moisés, discorrendo por todos
os profetas, expunha-lhes o que a Seu respeito constava em todas
as Escrituras“.[1] Temos que perceber, no entanto, que Sua explicação não era
apenas concernente a Si mesmo —não era apenas a Sua história—: Ele os levou
através das Escrituras, através do Tanach, através da história de Israel, e nesse
sentido, Ele os levou através de sua própria história. Antes de reconhecê-lo —e
para capacitá-los a reconhecê-lo— Ele recontou a eles sua própria história. Nós
lemos depois que seus corações começaram a queimar enquanto O estavam
ouvindo. O que estava acontecendo lá?
Talvez ainda hoje, na era das câmeras digitais, alguns de vocês ainda se lembrem
como as fotos comuns não digitais eram reveladas. O filme era colocado em uma
solução especial —o revelador— e algum tempo depois, uma imagem começaria a
surgir. No início, os contornos apareceriam, depois os detalhes mais finos da
imagem, e após um tempo toda a imagem estaria claramente visível. Na verdade,
esse era o objetivo do revelador —tornar a imagem latente visível—.
Para mim, todo esse processo sempre pareceu uma espécie de processo
misterioso e quase místico. Parece completamente incrível que, por um lado, a
imagem já esteja lá —ela já existe em sua totalidade, impressa perfeitamente no
filme— o processo químico complexo não altera nada sobre esta imagem e não
lhe acrescenta nada, ele simplesmente revela, coloca em exibição, revela o que já
existe. No entanto, por outro lado, embora apenas um passo nos separe de ver o
que está impresso na fotografia, sem este passo, sem revelar o filme, nunca
descobriríamos o que está incorporado nele —até que o revelador faça seu
trabalho, a imagem latente permanece invisível—.

Pensem no Apóstolo Paulo, por exemplo. Sabemos que ele estudou a Torá e as
Escrituras durante toda sua vida, mas até que essas escrituras fossem “reveladas”,
ele não tinha visto Jesus nelas. O que aconteceu com Saulo (Paulo) depois de sua
experiência na Estrada de Damasco? Vocês já consideraram o que aconteceu
dentro dele durante esses três dias que ele passou, abalado e cego, em jejum e
oração em Damasco, na Rua Direita, antes de Ananias ter sido enviado a ele? O
que ele pensou durante sua paralisação imposta, ao mesmo tempo em que
repensava —endireitando— sua vida e suas convicções, privado da capacidade de
ler fisicamente e, portanto, folheando mentalmente através das Escrituras onde ele
havia sido alimentado? Ele não recebeu novos textos, nenhum pergaminho caiu do
céu sobre ele, estas eram as mesmas Escrituras que ele havia lido toda a sua vida
—elas simplesmente estavam começando a ser “reveladas”, vistas, entendidas e
lidas sob uma luz completamente nova—. Elas sempre tinham sido sua vida, o
significado e o fundamento de sua existência, mas para sua incrível perplexidade,
o mesmo Jesus, em quem ele era completamente confiante três dias atrás, não
estava lá, simplesmente não poderia estar lá, estava agora aparecendo nessas
páginas —reveladas diante de seu olhar interior—.

O processo de “revelação” semelhante está acontecendo com nossos discípulos


na estrada para Emaús. O mesmo Tanach, as mesmas Escrituras que leram a vida
inteira estão sendo “reveladas”, vistas e compreendidas sob uma luz
completamente nova. E, de acordo com Lucas, uma vez que Ele os tinha levado
através das Escrituras, uma vez que as Escrituras tinham sido “reveladas”, tudo
tinha sido alterado em seus corações: seus corações agora estavam queimando e
enquanto seus olhos físicos ainda estavam impedidos, seus olhos internos, os
olhos da fé estavam sendo abertos. Era apenas uma questão de tempo (e
momento) antes que seus olhos físicos também fossem abertos. E é por isso que,
quando chegaram ao lugar e Jesus fez como “se fosse para mais longe, eles o
constrangeram, dizendo: Fica conosco porque já é tarde e o dia já declina”.[2]
Eles o constrangeram —e, por favor, entendam—: esta é a única coisa em toda
esta história que eles realmente escolheram por sua própria vontade. Seus olhos
ainda estavam impedidos, eles ainda não sabiam quem Ele era, e à primeira vista,
era apenas uma preocupação humana natural: “já é tarde e o dia já declina”. No
entanto, sabemos que, neste ponto, seus corações tinham estado queimando, eles
tinham a sensação de que seu encontro com esse “estranho” ainda não havia
terminado, e eles agiram de acordo com seus corações, não de acordo com seus
olhos. É crucial para nós entendermos isso primeiro, eles O
constrangeram, pediram-lhe que permanecesse com eles, e só então, e só por
essa razão, Ele entrou para ficar com eles.
Essa dinâmica, entre a disposição do coração e a abertura dos olhos, é muito
importante na Bíblia. Quando o Senhor Se revelou a Moisés na sarça ardente,
Moisés ao ver este arbusto disse: “irei para lá e verei essa grande
maravilha”.[3] Rashi comenta: “Deixe-me afastar-me daqui para me aproximar de
lá”. Notavelmente, está escrito que “o SENHOR viu que ele se voltava para ver, e
só então Deus o chamou do meio do mato”.[4] Somente quando Moisés “se
afastou daqui para se aproximar de lá”, apenas quando começou a caminhar na
direção de Deus —e somente quando Deus viu isso— só então Ele falou com
ele. O próprio Senhor soberano escolhe quando Se revelar a um homem; Ele
mesmo intervém e faz os corações queimarem; Ele mesmo chama um homem
para ouvir e responder. Mas se Ele continua a revelar o propósito de Sua
intervenção depende da resposta desse homem: se ele O constrange a
permanecer —se ele está disposto a “se afastar daqui para se aproximar de lá”—
. É sempre nossa decisão se agimos de acordo com nossos olhos ou nossos
corações.
Se você gostou de meu livro, talvez possa desfrutar também meu livro As Though
Hiding His Face, que discute em profundidade a questão do Messias Oculto. Para
obter este e meus outros livros, clique aqui: all Books by Julia
[1] Lucas 24:27
[2] Lucas 24:29
[3] Êxodo 3:3
[4] Êxodo 3:4

O Capítulo Transitório (3): A


Mensagem Do Partir Do Pão
By Julia Blumfevereiro 15, 2018No comments
UM CONVIDADO INCOMUM

Depois que os dois discípulos constrangeram Jesus, “Ele entrou para ficar com
eles”. Então lemos:
“Ora aconteceu que, quando Ele se sentou à mesa com eles, Ele tomou o pão,
deu graças a Deus e o partiu e deu a eles. Então seus olhos foram abertos e
eles O reconheceram”.[1]
Em primeiro lugar, vamos entender como esta refeição parecia do ponto de vista
Judaico tradicional. Compartilhar refeições sempre foi uma parte muito importante
da vida comunitária Judaica. No início da refeição, a benção tradicional é sempre
dita quando o pão é partido; como era a semana da Páscoa, teria sido matzah, não
um pão comum, então a Bênção sobre o Matzah teria sido adicionada: “Bendito és
Tu, Senhor nosso Deus, Rei do Universo que nos torna santos através de Seus
mandamentos e nos ordena comer Matzah”. Aquele que recita a bênção, faz isso
enquanto literalmente parte o pão, exatamente como sabemos que Jesus
fez. Nesse sentido, era uma refeição Judaica tradicional de Chol Ha-
Moed (Semana da Páscoa). Foi?
No Talmud Babilônico lemos: “O anfitrião deve partir o pão” (Berakoth 46 ). Na
tradição Judaica, o hospedeiro —o chefe da família— é aquele que sempre diz a
benção e parte o pão. Os hóspedes esperam as instruções de seu hospedeiro e
calmamente recebem o que é colocado diante deles. No entanto, não é isso que
vemos aqui. É evidente este não era um convidado habitual! Em vez de aguardar a
direção do hospedeiro, vemos esse “estranho” tomando o lugar do hospedeiro: Ele
é quem diz a benção e parte o pão! Podemos imaginar que esse comportamento
deve ter chamado a atenção de todos na casa. De onde veio essa autoridade?
NINGUÉM DEVE ESTENDER SUA MÃO

Aqui eu gostaria de citar uma passagem dos Pergaminhos do Mar Morto. Os


Sectários de Qumran acreditavam no Salvador eterno (eles provavelmente
acreditavam que era Melquisedeque), que veio como homem e era conhecido por
eles como o Mestre da Justiça. O Mestre da Justiça era um sacerdote. Deixe-nos
olhar um documento fragmentário, 1QSa (às vezes chamado A Regra Messiânica)
e vejamos o que este texto diz sobre o Sacerdote; [o Mess]ias de Israel deve
[entrar] … e [ninguém deve estender] sua mão para o primeiro fruto… diante do
Sacerdote, pois [ele é aquele que] abençoa as primícias do pão e do vinho
novo…[2]
Ninguém deve estender a mão para abençoar o pão: isso significa que, nos dias
de Jesus, havia um entendimento (pelo menos entre os Essênios), que, quando o
Messias viesse, ninguém deveria estender sua mão para abençoar o pão diante
dele. A autoridade para abençoar o pão claramente pertencia ao hospedeiro —a
menos que o Messias estivesse presente—. E quando, em nossa história, esse
estranho agiu na casa como “alguém que tinha autoridade”[3] ,embora os olhos
dos discípulos ainda estivessem impedidos, seus corações que tinham estado
queimando ao longo do caminho agora estavam cheios de emoção e
ansiedade. Para eles, Seu comportamento era um sinal definitivo de Sua dignidade
messiânica.
UM HOMEM COM UM JARRO

Mas por que e como eles mesmos saberiam sobre esse entendimento dos
Essênios do privilégio do Messias para partir o pão? Voltemos uma semana atrás
e observemos Jesus e seus discípulos se aproximando da Cidade
Santa. Jerusalém estava repleta de pessoas que vieram para a Páscoa. Cada
casa tinha convidados adicionais, cada quarto estava lotado, mas Jesus parecia
estranhamente despreocupado sobre um lugar para comer a refeição da
Páscoa. Confiantemente Ele disse a seus discípulos: “Ao entrardes na cidade
encontrareis um homem carregando um jarro de água. Segui-o até a casa em que
ele entrar“.[4] Como Jesus sabia que encontrariam um homem com um jarro de
água? Um homem com um jarro de água era uma visão muito incomum, pois este
era normalmente trabalho das mulheres. Por que um homem estaria levando um
jarro de água em Jerusalém?
O único grupo de homens Judeus que tradicionalmente carregava jarros de água
era o dos Essênios. Uma vez que os Essênios eram geralmente celibatários, seus
homens faziam o trabalho das mulheres. Portanto, um homem carregando um jarro
de água só poderia ter sido um Essênio. Os Essênios tinham suas comunidades,
não só em Qumran, mas em várias cidades. Eles também tinham uma comunidade
em Jerusalém. Josefo nos diz que um dos portões de Jerusalém era chamado “a
Porta dos Essênios”. Aparentemente, foi através desta porta que eles entraram em
sua comunidade. Pelas palavras de Jesus, seus discípulos entenderam que tinham
que entrar em Jerusalém pela porta dos Essênios. Além disso, uma vez que os
Essênios utilizavam um calendário diferente, seus quartos de hóspedes ainda
estavam disponíveis. É por isso que o Mestre sabia que um quarto estaria
disponível para a Última Ceia. E é por isso que uma semana mais tarde, os
discípulos reconheceriam Sua autoridade messiânica no partir do pão.

RECONHECIDO PELO SOFRIMENTO


Mas há algo ainda mais importante acontecendo aquí —algo que os Essênios não
sabiam e os discípulos ainda não tinham entendido, mas eles estão começando a
entender agora—. Sabemos que durante a Última Ceia, Jesus foi quem abençoou
o pão e o vinho e, como eles tiveram essa refeição na sala dos Essênios e dentro
da comunidade Essênia, enquanto partia o pão, Jesus poderia ter sido visto como
um Messias Essênio. É por isso que Ele está se certificando de dizer-lhes que Ele
não é um Messias no conceito Essênio: Ele está associando este partir do pão
com o que estava por vir, ao Seu sofrimento iminente. “O que estou fazendo vocês
não entendem agora, mas depois vocês vão compreender”.[5]
Agora, de volta à história de Emaús: quando este estranho começou a agir na casa
como “quem tinha autoridade”,[6] assumindo o papel do hospedeiro e partindo o
pão, o coração dos discípulos —que tinha estado queimando ao longo do
caminho— agora estavam totalmente cheios de emoção. Eles se lembraram de
Sua benção Messiânica durante a Última Ceia (ou eles a viram ou foram
informados sobre isso), portanto, para eles, foi um sinal claro de sua dignidade
Messiânica. Eles também se lembraram de Suas palavras sobre o sofrimento: “O
que estou fazendo vocês não entendem agora, mas depois vocês vão
compreender”.[7] Essas palavras: “depois vocês vão compreender“, estavam
sendo cumpridas naquele momento e ali: “Então seus olhos foram abertos e
eles o reconheceram”. De acordo com o relato de Lucas, isto é o que os dois
discípulos perceberam enquanto Ele estava partindo o pão: Ele era o Messias —
mas Ele não era o Messias que eles esperavam—; Ele não era o Messias que
Israel esperava; Ele não era o Messias que os Essênios esperavam. Ele era o
Messias Sofredor.

Se vocês gostaram deste artigo, vocês podem gostar também do meu livro As
Though Hiding His Face, que discute em profundidade a história de Emaús. Para
obter este e meus outros livros, clique aqui: all Books by Julia
[1] Lucas 24:30-31
[2] 1Qsa, column 2, lines 18-21.
[3] Marcos 1:22
[4] Lucas 22:10
[5] João 13:7
[6] Marcos 1:22
[7] João 13:

A Reversão Total (o Capítulo


Transitório – 4)
By Julia Blumfevereiro 22, 2018No comments
Nós já sabemos que o último capítulo do Evangelho de Lucas serve não só como
uma maravilhosa transição literária para seu segundo volume, Atos, mas também
como a chave espiritual de toda a história da messianidade oculta de Jesus —
entendendo os olhos impedidos e abertos no seu Evangelho—.

Vocês, naturalmente, se lembram que, finalmente quando chegou o momento


marcado, os olhos dos discípulos foram abertos: “E aconteceu que, quando estava
sentado à mesa com eles, tomou o pão, abençoou-o e o partiu, e o deu para
eles. Então seus olhos foram abertos e eles o reconheceram; e Ele desapareceu
de sua visão”. O momento aqui é de extrema importância: aconteceu no momento
específico do partir o pão, deixando os discípulos segurando o pão em suas mãos,
sem dúvida impressionados e tremendo com a grandiosidade do que acabara de
acontecer. E o que exatamente aconteceu? Procuremos contemplar a essência
desse momento crucial —como Lucas o vê e o descreve—.
Precisamos examinar aqui um pouco de Grego. Já vimos que ambos os verbos —
impedido e aberto— são utilizados nas formas passivas tanto em Inglês como em
Grego: em primeiro lugar, “seus olhos foram impedidos”: Οφθαλμοι αυτων
εκρατουντο,[1] em seguida, veio o momento crucial, e “seus olhos foram
abertos”: δε διηνοιχθησαν οι οφθαλμοι.[2] A palavra Δι-ανοιγω significa
completamente, totalmente aberto. Esta palavra é encontrada várias vezes na
Septuaginta, mas a única vez em toda a Septuaginta quando esta linha completa
ocorre da mesma maneira, com a mesma redação como é encontrada em
Lucas, δε διηνοιχθησαν οι οφθαλμοι, está no terceiro capítulo do Livro de Gênesis,
em uma das cenas mais dramáticas das Escrituras. Quando Adão e Eva (Hava)
pecaram —quando violaram o mandamento que Deus lhes deu e comeram o fruto
da Árvore do Conhecimento, quando o primeiro pecado entrou no mundo, quando
tudo mudou e tudo foi virado de cabeça para baixo, neste momento fatídico da
criação— diz: “E seus olhos foram abertos…”[3]
O que significa isso, que foram abertos os olhos de Adão e Eva? Esta passagem
do livro de Gênesis nos ajuda a compreender melhor a enorme mudança que
Lucas descreve. A Queda não foi apenas um dos principais eventos da história da
criação, foi um cataclismo global —uma mudança total no status e na estrutura do
universo—. O que a Bíblia descreve como os olhos (de Adão
e Eva) sendo abertos é uma das manifestações e consequências mais
substanciais e fundamentais dessa mudança global. Adão e Eva, que até então
tinham visto Deus em Sua realidade, e viram tudo apenas em Sua luz e a luz de
Sua realidade, começaram a ver o mundo com uma visão nublada e pecaminosa,
que desde então se tornou e permaneceu a visão humana da realidade. A
capacidade de ver Deus que lhes foi dada originalmente ficou fraca e foi perdida, e
mesmo Adão e Eva, para não mencionar seus descendentes, começaram a ver
este mundo da maneira como a humanidade continuaria a vê-lo ao longo dos
tempos: pesado, material e físico. Eles deixaram Sua presença —e “seus olhos
foram abertos” para essa visão do mundo—. De agora em diante, para ver o
invisível, o homem precisaria de fé. Por isso o Senhor estava tão preocupado com
o fato de que eles não “estenderiam a mão e tomassem também da Árvore da
Vida, e comessem, e vivessem para sempre”;[4] que eles não permaneceriam
para sempre assim —incapazes de ver a realidade espiritual, capazes de ver
apenas o material e o físico—. E a partir desse momento no terceiro capítulo de
Gênesis, quando Adão e Eva pecaram, quando “seus olhos foram abertos” para
este mundo e eles precisavam se esconder do Senhor, Deus tem lidado
com Tikkun Olam (reparação do mundo); e desse momento em diante, Ele tem
estado ansioso pelo momento em que os olhos das pessoas seriam abertos
novamente, mas desta vez, abertos na direção inversa —ver o que é invisível
para essa visão humana pecaminosa e sobrecarregada—.
De acordo com a opinião acadêmica, o Grego de Lucas é o melhor de todos os
quatro Evangelhos. É provável que o Grego fosse o idioma nativo do
evangelista. Não há dúvida de que Lucas conhecia muito bem a LXX (a
Septuaginta) e provavelmente foi influenciado por ela. Portanto, podemos sugerir
que esta simetria marcante entre διηνοιχθησαν οι οφθαλμοι em Lucas
24 e διηνοιχθησαν οι οφθαλμοι em Gênesis 3: 7 é intencional e que Lucas mostra
propositalmente aqui a principal reversão de Gênesis 3 e ele quer que seus
leitores entendam, não somente a profundidade e a grandiosidade do que
aconteceu na estrada para Emaús, mas a mudança fundamental no status do
universo quando a Messianidade de Jesus é revelada e reconhecida.
É importante lembrar, entretanto, que não só os olhos dos discípulos se abriram,
mas naquele momento, Jesus se tornou invisível para eles. Assim, Lucas
apresenta sua história de Emaus como um tipo e símbolo da reversão principal de
Gênesis 3. Esta reversão total é completada e confirmada por Lucas 24:31: os
olhos dos discípulos foram abertos —para ver o invisível—.
Lucas é o único Evangelho que tem a história de Emaús, e ele quer que seus
leitores vejam que os discípulos não reconhecem Jesus enquanto ele está com
eles e visível aos seus olhos, mas que seus olhos são abertos e eles o
reconhecem somente quando Ele desaparece de seu olhar visível. A transição que
testemunhamos aqui é do Messias visível, mas não reconhecido —para o
Messias reconhecido, mas invisível—. Nesse sentido, o último capítulo do
Evangelho de Lucas simboliza a mensagem inteira e fornece uma excelente
transição do primeiro volume para o segundo volume de seus escritos: do
Messias visível, mas oculto, para o Messias revelado, mas invisível.
Se vocês gostaram deste artigo, vocês podem gostar também do meu livro As
Though Hiding His Face, que discute em profundidade a história do Capítulo
Transitório e os olhos impedidos e abertos. Para obter este e meus outros livros,
cliquem aqui: all Books by Julia

[1] Lucas 24:16


[2] Lucas 24:29
[3] Gênesis 3:7
[4] Gênesis 3:22

Você também pode gostar