2 SAÚDE DIÁRIO POPULAR

SEGUNDA-FEIRA, 23 DE MARÇO DE 2015 DIÁRIO POPULAR 3

Infocenter DP - Carlos Queiroz Divulgação - DP

Para identificar os problemas com a conioses no Sistema de Informação de

Relatório do Cerest identifica falta notificação, o Cerest ouviu uma série de
de informações sobre doenças profissionais da rede de saúde. Um dos
entrevistados pelo Diário Popular, foi
respiratórias em Candiota, o médico coordenador do Hospital de
pelo menos um trabalhador foi Candiota, Alexandre D’avila. Segundo
diagnosticado com pneumoconiose, ele, não há dados estatísticos confiá-
mas número pode ser maior veis porque muitos casos não seriam
cadastrados pela Secretaria de Saúde.
“Se existe algum registro, é mínimo e
não chega a 20% do total que deveria ter.”
Com experiência de trabalho em
outros municípios da região, como
Pedras Altas, Herval e Pinheiro Ma-
chado, o médico diz que em Candiota
a incidência de doenças respiratórias e
reações alérgicas é bem mais elevada.
“Principalmente fora das estações frias,
quando é mais comum.”
Os problemas com as notificações
também foram confirmados pela res-
ponsável pelo Setor de Vigilância Epide-
miológica da 7ª Coordenadoria Regional
de Saúde, Cândida Britto.
Para a coordenadora do Cerest
Regional, Maristela Irazoqui, um dos
principais objetivos do órgão agora é
a implantação de dados de pneumo-
Agravos de Notificação (Sinan). “Vamos
tentar criar uma unidade sentinela de
referência de análises clínicas, espiro-
metria e biópsia pulmonar para auxiliar
nos diagnósticos.” Porém, ainda não há
previsão para que a ideia saia do papel.
De acordo com o procurador do
MPT, Alexandre Ragagnin, o órgão
aguarda um relatório solicitado à CRM
após inspeção realizada em setembro
sobre medidas adotadas para proteção
de doenças respiratórias nos traba-
lhadores. O Jornal também entrou em
contato com o secretário de Saúde do
município, Dinossane Pech, mas ele
afirmou não ter conhecimento de casos
de subnotificação.
A investigação do Cerest contou
com apoio da prefeitura de Candiota.
De acordo com o prefeito Luiz Carlos
Folador (PT), a exploração do carvão e
a produção de energia na cidade são um
interesse político e econômico. Portan-
to, o momento é de cautela. “É preciso Usina é responsável por 80% da receita de Candiota e emprega diretamente 880 profissionais
fazer novos estudos, e caso se identifi-
que algum problema, vamos atrás das Augusto Barros - DP
formas de prevenção.”

O Diário Popular enviou uma série complementares e avaliação com espe-

Diego Queijo
Candiota. A usina termelétrica Presidente
Médici é um símbolo do desenvolvimento
no horizonte da campanha. Tanto ela
quanto a mina de carvão formam um nú-
cleo. Ao redor dele gira a economia - cerca
de 80% da receita do município sai da
mina. Nos próximos anos os investimentos
previstos no setor ultrapassam os R$ 2,1
bilhões para a exploração.
O trabalho não cessa. Faça noite ou
faça dia, faça sol ou faça chuva, a usina pro-
duz energia impulsionada pelo trabalho
direto de 880 funcionários. Porém, entre a
Companhia Rio-grandense de Mineração
(CRM) e a Companhia de Geração Térmica
de Energia Elétrica (CGTEE), mais da me-
tade deles (611) não reside em Candiota, e
sim, em cidades vizinhas.
Neste segundo e último capítulo da
reportagem especial sobre o impacto da
atividade carbonífera na saúde, o Diário
Popular revela um cenário de falta de da-
dos. Principalmente sobre a incidência de
problemas respiratórios e no diagnóstico
de muitos trabalhadores não residirem em
Candiota, torna as informações dispersas
e de difícil averiguação por parte de órgãos
de prevenção e vigilância.
Com base no estudo da UFRGS mos-
trado na edição de ontem do Jornal, o
Ministério Público do Trabalho (MPT)
iniciou investigações sobre a atividade
na mineradora e na usina. O órgão solici-
tou ao Centro de Referência em Saúde do
Trabalhador (Cerest) um relatório mais
abrangente sobre a situação da saúde dos
trabalhadores da CRM. O documento foi
entregue no fim de fevereiro à procurado-
ria do MPT.
De acordo com o técnico do Cerest,
Giovani Plá, há má gestão de informa-
ções sobre a saúde dos trabalhadores. Ao
consultar o banco de dados do Sistema
de Informação de Saúde do Trabalhador
(Sist) verificou-se apenas a notificação de
acidentes de trabalho, e apenas um caso
de doença (Hepatite C). Porém, esta falta
de informações seria um problema, pois
a atividade de Candiota expõe a popula-
ção à inalação de poeiras causadoras de
Alexandre Trindade tem 50 anos. Mora
em Bagé, mas trabalha na mineradora.
Ele é o único trabalhador identificado
com a doença provocada pelo carvão. As
manchas no pulmão foram vistas pela
primeira vez nos exames anuais feitos pela
CRM. A partir daí, Alexandre passou por
uma bateria de exames em Bagé, Pelotas e
Porto Alegre, até ser diagnosticado. Após
a descoberta, Alexandre continua traba-
lhando na empresa, mas deixou o setor de
manuseio do carvão.
De acordo com o Cerest, um dos
principais motivos para não haver novos
casos oficiais de pneumoconiose seria
justamente a dificuldade para se obter a
identificação da doença. E - também de
acordo com o Sindicato dos Mineiros - a
falta de exames rotineiros específicos na
empresa.
A falta de informações dos efeitos do
carvão na saúde em Candiota também
poderia contribuir com o baixo número
de benef iciados com aposentadoria
especial. Eles têm direito à inatividade
após 25 anos de trabalho. Mas de acordo
Alexandre Trindade já
enfrentou uma bateria
de exames desde que
foi diagnosticado com
a doença provocada
pelo carvão
de perguntas para a CRM e a CGTEE.
De acordo com a mineradora, após a
identificação do caso de pneumoconiose
os preceitos recomendados pelas normas
regulamentadoras de segurança e saúde
do trabalhador foram mantidos. “O em-
pregado foi acompanhado por profissio-
nais especialistas de renome estadual e
ainda vem sendo monitorado pela CRM.”
Ainda de acordo com a assessoria da
empresa, há mais de 20 anos existe mo-
nitoramento de trabalhadores da CRM
expostos ao carvão mineral e não há
registro de outros casos de empregados
com problemas respiratórios de origem
ocupacional. Os exames são periódicos,
porém os resultados são arquivados e
somente profissionais da saúde ligados
à empresa podem ter acesso aos docu-
mentos.
Já a CGTEE disse ter firmado contrato
com o Sesi para realização das avalia-
ções ambientais em todo o complexo
de Candiota, que conta com equipe es-
pecializada e equipamentos modernos
para avaliação dos riscos. A partir dos
resultados novas medidas serão implan-
tadas. Quanto à diminuição dos impac-
tos da poeira ou fumaça em Candiota a
CGTEE disse utilizar dessulfurizadores
para redução de enxofre, e precipitado-
res, que reduzem o material particulado
resultantes da emissão gasosa.
Sobre os exames nos funcionários,
a CGTEE realiza estudos anuais e con-
segue visualizar a porcentagem de em-
pregados que apresentaram resultados
anormais em algum exame realizado.
Desta forma, formula propostas que mi-
nimizam (ou anulam) os problemas de
cialista. Além disso, cada colaborador
recebe cópia de seus exames. Porém, a
empresa não revelou os números de in-
cidência de problemas respiratórios nos
trabalhadores.
A empresa diz ter promovido em 2012
um estudo, em parceria com a Universi-
dade Federal de Rio Grande (Furg), de
acompanhamento de saúde da popula-
ção na região. Com relação a problemas
respiratórios, o trabalho indicou que ao
comparar os números obtidos com as
outras cidades gaúchas - exceto Aceguá e
Pedras Altas - eles são semelhantes. “Este
mesmo Programa deverá ser aplicado
nos empregados das nossas unidades em
Candiota, estamos em fase de negociação
com a Furg.”
No estudo com crianças menores de
cinco anos, as maiores prevalências de
alterações da função respiratória foram
identificadas em Herval e Candiota.
Também foram investigados 1.950 nas-
cimentos ocorridos em sete municípios.
O maior número de nascimentos prema-
turos foi registrado em Candiota (14,8%).
No Brasil, este índice é de 11,7%, de acordo
com o Fundo das Nações Unidas para a
Infância (Unicef).
Para o diretor administrativo da
CGTEE, Sandro Oliveira, os resultados
reforçam a necessidade de um acom-
panhamento a longo prazo das condi-
ções sociais e de saúde da população.
“Os resultados deste estudo mostram
que embora os indicadores de saúde e
ambientais avaliados não evidenciem
uma situação crítica da relação saúde/
ambiente, chama-se atenção para a difícil
situação socioeconômica desta popula-

Fonte: CRM
de doenças como a pneumoconiose do car- enfermidades como pneumoconioses. E com o diretor do Sindicato, Edson Budó, saúde relatados. Os resultados passam ção que a coloca em uma condição de
vão, também chamada de “pulmão negro”. hoje somente uma pessoa foi diagnosti- dificilmente eles conseguem obter o por avaliação médica e, se necessário, o vulnerabilidade mesmo sob condições
A carência de notificações, aliada ao fato cada com ela. benefício. trabalhador é encaminhado para exames ambientais não tão desfavoráveis.”