O artigo refere-se a um relato realizado por Leland Emerson McCleary no
Encontro Paulista entre intérpretes e Surdos, realizado em São Paulo. A explanação de McCleary tinha como objetivo esclarecer o seguinte tema: "a crença que surdos norte- americanos têm na sua língua e na sua cultura" ou mais precisamente “por que os surdos norte-americanos creem na sua língua e na sua cultura, e os brasileiros não? ” A resposta dessa pergunta não está ligada a questões de superioridade de língua ou cultura dos surdos norte-americanos frente aos brasileiros, mas sim relacionado ao orgulho dos mesmos perante a sua condição, isto é, sentem orgulho de ser surdo. Na comunidade surda não existe diferença entre “ter orgulho da sua língua” e “ter orgulho de ser surdo”, ou seja, as duas expressões andam juntas. Para alguns ouvintes, o fato de alguém “ter orgulho de usar a língua de sinais dos surdos” não significa “ter orgulho de ser surdo”, por acreditarem que ninguém pode ser feliz por viver com essa “deficiência”. É por esse motivo que alguém demostrar seu orgulho de ser surdo é um ato político, pois consegue balançar o mundo do ouvinte e abrir espaços para a mudança. O orgulho por ser surdo deve ser um ato de afirmação pessoal, um ato de autoestima para ser capaz de lidar com todo tipo de preconceito proveniente do ouvinte. Além disso, o orgulho saudável não é aquele vindo de apenas uma única pessoa, pois é um valor social que deve ser compartilhado com uma comunidade. É um ato realizado por um grupo de pessoas para mudar suas relações com o mundo em sua volta, redefinindo o significado de ser surdo. Em relação ao motivo de alguns surdos brasileiros ainda não apresentarem esse “orgulho” e os norte-americanos sim, pode-se afirmar que os norte-americanos aprenderam com outros grupos minoritários e marginalizados que já tinham feito sua luta política pelo reconhecimento e a autoestima anteriormente. A partir da Segunda Guerra Mundial ocorreram várias mudanças nos Estados Unidos e permaneceram até a década de 90. Antes dos surdos, vários outros grupos marginalizados fizeram suas lutas pela dignidade humana e pela garantia dos seus diretos como cidadãos. Primeiro foram os negros norte-americanos, depois as mulheres, depois os hispânicos e os gays, e depois os surdos. Ou seja, os surdos puderam aprender com a história. Tanto para negros e gays foi necessário alguém tomar um ato de autoestima para que fossem reconhecidos e que os movimentos “Orgulho Negro” e “Orgulho Gay” começarem a ser respeitados. Com os surdos norte-americanos o evento que desencadeou o movimento político foi a luta por um presidente surdo, na Universidade Gallaudet, que fechou a universidade durante uma semana em 1988. A luta pelos direitos civis dos surdos, usuários de língua de sinais, ainda está no começo, mas o importante é que a comunidade surda tem agora uma nova arma: a autoestima, incentivada pelo conceito do “orgulho de ser surdo”. Ter orgulho de ser negro” (ou gay ou surdo) não significa excluir quem não é negro ou gay ou surdo, é um conjunto de estratégias para que mudanças possam acontecer. O objetivo é redefinir o que significa ser negro, ou gay, ou surdo, para que todos possam ter orgulho de viver numa sociedade em que todos possam ser o que são e aprender uns com os outros.