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09 - 17, 2009
A LIBERDADE DA CIDADE
David Harvey
Tradução de:
Anselmo Alfredo *
Tatiana Schor **
Cássio Arruda Boechat ***
O notável sociólogo urbano Robert Park poderosas forças sociais. O ritmo e a escala
certa vez escreveu que a cidade é: assustadores do processo de urbanização nos
últimos cem anos significam, por exemplo, que
“a tentativa mais consistente do homem e a fomos refeitos muitas vezes sem saber por quê,
mais bem sucedida como um todo para refazer como ou para quê. Isso tem contribuído para o
o mundo em que vive o mais próximo de seu bem-estar humano? Tem isso nos feito pessoas
desejo íntimo. Mas, se a cidade é o mundo que melhores ou nos deixado pender em um mundo
o homem criou, é o mundo no qual ele está de anomia e a lienação, ódio e frustra ção?
d or av ante cond enad o a v iv e r. Assim , Tra nsform am o- nos e m me ra s môna da s
indiretamente, e sem qualquer clareza da arremessadas de lá para cá num mar urbano? E
natureza de sua tarefa, fazendo a cidade o o que podemos agora fazer com as imensas
homem refez a si mesmo1”. concentrações de riqueza e privilégios em nossas
Se Park estiver certo, então a questão cidad es naquilo que até a s Nações U nidas
sobre qual tipo de cidade queremos não pode retratam como um “planeta de favelas” em
estar divorciada da questão sobre qual tipo de explosão3.
pessoas desejamos ser, quais tipos de relações A grande questão, certamente, é para
sociais buscamos, qual relação nutrimos com a onde ir a partir daqui. Existe alguma via para
natureza, qual modo de vida desejamos. Isto se exercitar esse precioso direito à cidade que Park
assemelha com a concepção de Lefebvre sobre o insinua e Lefebvre advoga? Remendar com
direito à cidade não “como um simples direito de resultados é inútil. O que tudo isto faz, como
visita ou como um retorno às cidades tradicionais”, Engels certa vez notou, é girar em falso: uma
mas “como um direito à vida urbana transformado favela é varrida daqui apenas para reaparecer
e renovado” 2. O direito à cidade está, por isso, noutro lugar qualquer. Se nos opomos ao nosso
além de um direito ao acesso àquilo que já existe: estado corrente, então o único caminho radical
é um direito de mudar a cidade mais de acordo adiante é confrontar os processos básicos que
com o nosso desejo íntimo. A liberdade para nos geram esse estado4. Isto reivindica uma densa
fazermos e nos refazermos, assim como nossas análise.
cidades, é um dos mais preciosos, ainda que dos
m ai s ne g li ge ncia d os, dos nossos d ir ei tos Quero aqui me concentrar em um macro
humanos. Mas, sendo que, como Park adverte, processo particular que tem sido esquecido muito
até agora faltamos com qualquer sentido de frequentemente, justamente por ser tão macro.
cla reza sobre a natur eza d e nossa tare fa, Isto é o que chamo “o problema do capital
devemos primeiramente refletir sobre como excedente”. Ele atua assim: os capitalistas
fomos feitos e refeitos, através da história, por começam o dia com um certo montante de
um processo urbano impulsionado para frente por dinheiro e terminam o dia com um maior. No dia
seguinte eles levantam e têm de decidir o que uma república socialista como antídoto à ganância
fazer com o dinheiro extra que eles ganharam no e à desigualdade capitalistas. Mas a burguesia,
dia anterior. Eles encaram um dilema faustiano: r ev id ando v iole nt a me nt e cont ra os
reinvestir para ter ainda mais dinheiro ou revolucionários, não poderia resolver a crise e o
consumir o excedente. As leis coercitivas da resultado foi a ascensão ao poder de Napoleão
competição os forçam a reinvestir porque, se Bonaparte, que se autoproclamou imperador em
alguém não reinveste, então, outro seguramente 1852. Para sobreviver politicamente, o imperador
o fará. Para permanecer um capitalista, algum sabia que deveria lidar com o problema do capital
excedente deve ser reinvestido para fazer ainda excedente e fez isso anunciando um vasto
mais excedente. programa de investimento infraestrutural tanto
interno quanto no exterior. No exterior, isto
A política do capitalismo é dirigida pela
significou a construção de estradas de ferro
necessidade de encontrar terrenos lucrativos para
através da Europa e descendo ao Oriente, bem
a absorção de capital excedente. Se há uma
como apoio para obras grandiosas como o Canal
escassez de trabalho e os salários são muito altos,
de Suez. Internamente, significou consolidar a
então ou o traba lho existente t em de ser
rede ferroviária, construir portos e ancoradouros.
disciplinado (desemprego tecnologicamente
Mas, acima de tudo, significou reconfigurar a
induzido ou uma dura crítica contra o poder da
inf raestrutura urbana de Paris. Ele trouxe
classe trabalhadora organizada são dois dos
Haussmann a Paris para assumir as obras públicas
principais métodos) ou força de trabalho fresca
em 1853.
t em d e se r encontrad a (p e la i mi gração,
exportação de capital ou proletarização). Se não Haussmann compreendeu claramente que
há poder de compra suficiente no mercado, então sua missão era ajudar a resolver o problema do
novos mercados devem ser encontrados pela capital excedente e do desemprego pela via da
expansão do comércio exterior, promovendo urbanização. A reconstrução de Paris absorveu
novos produtos e modos de vida, criando novos enormes quantidades de trabalho e de capital para
instrumentos de crédito e gastos estatais com os padrões da época e, junto com uma supressão
dívida financiada. Se a taxa de lucro é muito baixa, autoritária das aspirações da força de trabalho
e nt ão a re gula çã o e st at a l da s “r uínas d a par isiense, foi um ve ículo funda mental de
com pe ti çã o”, a m onop ol iza çã o (f usõe s e estabilização social. Haussmann valeu-se dos
aquisições) e as exportações de capital às frescas p la nos utópi cos ( dos fouri ea nos e sai nt-
pastagens proporcionam a saída. E, se nada disso simonianos) de remodelar Paris que haviam sido
for possível, então os capitalistas se defrontam debatidos na década de 1840, mas com uma
com uma condição de crise na qual muito de seu grande diferença. Ele transformou a escala à qual
capital será desvalorizado. A crise toma forma de o processo urbano foi imaginado. Quando o
um excedente de capital que não pode ser arquiteto Hittorf mostrou a Haussmann seus
disponibilizado. E quando o capital fica ocioso, planos para um novo boulevard, Haussmann
normalmente o trabalho faz o mesmo5. jogou-os de volta dizendo, “não é amplo o
suficiente... você o tem em 40 metros de largura
A urbanização proporciona um caminho
e eu o quero em 120”. Haussmann pensou na
para resolver o problema do capital excedente.
cid ad e como um t od o numa esca la m ai s
Considere o caso da Paris do Segundo Império. A grandiosa, anexou os subúrbios, redesenhou
crise de 1848 foi uma das primeiras crises bairros inteiros (tal como Les Halles), mais do
explícitas de capital excedente e foi extensiva à que apenas fragmentos e pedaços do tecido
Eur op a. Ela at ingi u Pa ri s d e ma ne ira urbano. Ele mudou a cidade por atacado mais do
p ar ti cul ar me nt e f or te e , com cap i ta l nã o que a varejo. Para fazer isto, precisou de novas
empregado, o resultado foi uma revolução instituições financeiras e de instrumentos de
a bort iva por p ar te d os t rab al ha dore s crédito. O que ele fez de fato foi ajudar a resolver
desempregados e daqueles utópicos que viam o problema do capital excedente estabelecendo
A liberdade da cidade, pp. 09 - 17 11
para o nível de 10 milhões e vastos projetos infra- A cidade de Nova Iorque perdeu postos de
estruturais estão transformando a paisagem 9– emprego para os subúrbios e para o Sul e Oeste
novamente, tudo financiado por dívidas. É a (a indústria de vestuário mudou-se para as
urbanização da China o principal estabilizador do Carolinas antes, posteriormente indo para o
capitalismo global? A resposta tem de ser um sim Méx ico e agora para a China). As cida des
parcial. Mas a China é apenas o epicentro de um ce ntra i s m a is a nt i g as t or na ra m - se t er ra s
processo de urbanização que se tornou agora desgastadas, centros de desemprego e pobreza
genuina ment e gl obal em p arte através da cr e sce nt e s e d e m i no r i a s ra d i ca l m e n t e
impressionante integração global dos mercados i mp act ad a s. A economi a f oi be m , m as a s
financeiros que usam sua flexibilidade para os ci d a d e s c e nt r a i s nã o . O r e sul t a d o f oi o
projetos urbanos financiados por dívidas, desde desenrolar de uma distinta “crise urbana” nos
Dubai até São Paulo e de Mumbai até Hong Kong anos de 1960 em meio ao boom da “idade de
e Londres. O banco central chinês, por exemplo, ouro” do pós-guerra. Inquietude social, irromper
tem sido ativo no mercado de hipoteca secundário de v i o l ê n ci a s , m o v i m e nt o s u r b a n os
derivado do boom de refinanciamento nos EUA revolucionários, tudo culminando no levante
enquanto Goldman Sachs foi fortemente envolvido intracidades em escala nacional de 1968, no
no surgimento do mercado imobiliário em Mumbai despertar * do assassinato de Martin Luther King.
e o capital de Hong Kong foi investido em Foram os sinais chave desta aflição urbana 10.
Baltimore. Novamente, estamos olhando aqui
para uma outra transformação em escala, uma O governo federal financiou um esforço
que torna difícil de compreender que o que pode maciço para resolver a crise urbana. Fundos
estar ocorrendo globalmente é em princípio f luíram p ara as cid a de s im pa ct ad as e um
similar aos processos que Haussmann conduziu programa público de emprego, amplamente,
com tanta destreza na Paris do Segundo Império. mas não somente, nas mãos dos governos
A urbanização, concluo, é um veículo primordial municipais, foi destinado para aliviar a pobreza
p ara ab sor çã o do e x ce de nt e e m esca la s e a injustiça racial e trazer as cidades centrais
geográficas sempre crescentes. de volta à vida. Na cidade de Nova Iorque, o
empoderamento das minorias raciais e dos
Mas que tipo de urbanização é esta e quais sindicatos municipais veio de mãos dadas com
suas consequências para o caráter humano? E o aumento dos gastos nos serviços municipais
por quais meios e por quem esta transformação (educação e saúde). A isto a cidade adicionou
de escala tem sido realizada? No caso de Paris, sua própria caridade, tendo descoberto, com a
podemos claramente ver as figuras de Napoleão a j uda d os i nv e st i d ore s b a ncár i os, m ui t os
III e seus muitos assessores, bem como de caminhos para aumentar o endividamento. A
Haussmann e dos novos gênios do do crédito (os cidade fez o que Haussmann de fato fez: usou
irmãos Pereire) na vanguarda. Mas para onde notas de antecipação de impostos (empréstimos
olhamos hoje? contra receitas futuras estimadas) para financiar
Voltemos por um momento para olhar o orçamento corrente. Ao mesmo tempo, a
para o final da revolução urbana de Moses nos administração da cidade teve um complicado
Estados Unidos. Ele ajudou, a um preço, a relacionamento com os construtores urbanos,
estabilizar com sucesso o capitalismo global por os g ra nd e s f i na n ci a d or e s e e m p r e i t e i r a s
duas décadas. A inundação de investimentos especulativas. Por um lado, ela ajudou-os com
nos subúrbios e a integração da economia t o d o t i p o d e sub s í d i os ( p r ov a v e l m e n t e
nacional pelo sistema interestadual de vias lubrificado com subornos para os políticos e
e x p r e ssa s t r a nsf or m a ra m ra d i ca l m e n t e a sindicatos de construção), mas, por outro, a
ge og ra fi a d o si st ema urb ano dos EUA. As organização dos bairros e os fortes sindicatos
ci da de s ce nt ra is, o núcl eo t ra di ci onal d as municipais colocaram barreiras políticas aos
atividades produtivas, foram deixadas para trás. projetos da indústria da construção. Um boom
*
No texto in the wake que, ao mesmo tempo, significa velório, dando um duplo sentido ao texto N.T.
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espe cul at ivo d a constr ução (q ue incluiu o principal questão é por que os investidores
d e sa st re f ina nce i r o cha ma d o Wor ld Tra d e bancários se recusaram a emprestar e assim
Center) no fim dos anos 1960 precarizou ainda arriscaram levar à bancarrota aquilo que até
mais o mercado imobiliário de Nova Iorque. então era um dos maiores orçamentos do setor
público no mundo com potenciais consequências
O desastre bateu em 1973. A recessão
catastróficas para o sistema financeiro global
global começou globalmente no setor imobiliário
(o chanceler da Alemanha Ocidental apelou para
causando sérias dificuldades nas instituições
que Washington não deixasse a cidade ir à
financeiras com amplos interesses nos REITS
bancarrota por receio de um colapso total no
( Tr uste s d e Inve st im e nt o na Pr op ri ed ad e
sistema financeiro).
Imobiliária), muitos dos quais entraram em
colapso. O mercado imobiliário não poderia mais As r e s p os t a s a e ssa q u e st ã o s ã o
absorver o capital excedente. O governo federal, complicadas. Para começar, havia mais do que
em dificuldades financeiras devido à década das uma insinuação de racismo na decisão, uma vez
“armas e manteiga”, estratégia para enfrentar que o establishment financeiro branco (como
uma guerra contra a pobreza interna e uma guerra oposto a Leonard Ber nstein, que deu uma
militar no Vietnã, perdeu o controle internacional e l e g a nt e f e s t a p a ra os Pa nt e ra s N e g ra s)
assim como o interno sobre suas finanças. O claramente tinha receio da ascensão do poder
siste ma d e Bre tt on Wood s que ha vi a negro na cidade. A recessão e a crise fiscal
fundamentado a ordem financeira internacional proporcionaram uma oportunidade para pôr isso
entrou em colapso e uma crise fiscal foi gerada em xeque, enfatizando quem é que realmente
internamente com o surgimento de inflação e segurava as alças da bolsa e do poder. Em
desemprego. A resposta de Washington foi se g un d o l ug a r, os f i na nc i a d or e s e s t a va m
imediata. No Discurso do Estado da União (State receosos do poder dos sindicatos municipais e
of the Union Address), de 1973, o presidente d e sua ha b i li d ad e p a ra for ça r pa g am e nt o
Nixon assegurou à nação que a crise urbana havia f a vor á v el e pa cot es d e b e nef í ci os a se us
acabado, com o que simplesmente quis dizer que membros. Em terceiro, eles se opuseram aos
a ajuda às cidades centrais seria cortada. A g a st os m uni ci p ai s e m se rv i ços t a i s com o
recessão e a quebra do mercado imobiliário educação gratuita (incluindo à Universidade
atingiram as receitas de impostos arrecadados M u ni ci p a l de N ov a I or q ue c om
na cidade de Nova Iorque. Um governo municipal aproximadamente 330.000 estudantes) assim
já fortemente endividado teve de emprestar ainda como à expansão de emprego nas áreas de
mais para cobrir suas contas. Mas, em março de saúde, transporte e saneamento. Em quarto
1975, os banqueiros investidores de Nova Iorque lugar, o poder das organizações de comunidade
recusaram-se a financiar e comercializar a dívida em deter amplos projetos de construção (o lugar
da cidade forçando-a a enfrentar a bancarrota11. que mais tarde se tornou o Battery Park City
esteve em luta desde a metade dos anos 1960)
A m á a d m i ni st ra çã o f i na nce i ra e a
foi considerado uma séria barreira às suas
a v a r e z a d o s si nd i c a t o s m u ni ci p a i s f or a m
ambições. Finalmente, o setor financeiro estava
amplamente culpadas pela imprensa capitalista.
ele mesmo em dificuldade com o colapso do
Enquant o houve m ais d o que um g rã o de
mercado imobiliário e com o do REITS.
v e r d a d e e m a m b a s a s r e c l a m a çõ e s, os
investidores bancários [investment bankers] O poder de classe das elites financeiras
encorajavam havia tempos a cidade a tomar estava ameaçado e elas necessitavam encontrar
empréstimos, desde que isto fosse um grande um caminho para restabelecer sua posição. Os
negócio para eles e que as dificuldades no setor grandes financiadores e políticos, tais como os
imobiliário e a drenagem de decentes empregos irmãos Rockfeller, indubitavelmente amavam
do setor privado da área central da cidade não sua cidade. Eles apenas queriam refazê-la mais
fossem feitas pela administração da cidade. A se g und o se us p r óp r ios d e se j os í nt i m os e
14 - GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 26, 2009 HARVEY, D.
assegurar a riqueza e o poder deles mesmos do grupo Ford), disse “não” (“De Ford para a
ao fazer tal mudança. A crise fiscal de 1975 foi cidade: Morra” disse a manchete do jornal). A
vista e ca pturada por eles com o a grande cidade foi condenada como não sendo capaz de
oportunidade de fazer exatamente isso. pagar sua força de trabalho e as suas contas de
manutenção. A solução a que se chegou através
O que se pôs em movimento em 1975 foi
d e te nsa s ne goci a ções e ntr e inve sti dore s
um processo de refazer a cidade de Nova Iorque
bancários e o governador do estado de Nova
que teve sua plena fluidez na administração
I or que (com o pr ef e it o como cr esce nt e
Bloomberg após 2001. Toda a ilha de Manhattan
participantes nominal) foi de primeiro estabelecer
se tornou virtualmente um condomínio fechado
o que foi denominado Corporação de Assistência
para os ultrarricos, para os maiorais dos serviços
Municipal (MAC), depois suplantada pelo Conselho
financeiros (como o diretor do Goldman Sachs
de Controle de Emergência Financeira (EFCB).
que neste ano recebeu um bônus de US$ 52
milhõe s), para os diretore s dos fund os de O governo da cidade perdeu o controle de
investimentos de alto risco (o mais importante seu orçamento. A estrutura que emergiu foi
recebeu compensação pessoal de mais de US$ simples. Os rendimentos de impostos fluíram para
250 milhões em 2005), para os capitalistas o “Big MAC” ou para o EFCB e qualquer sobra do
financeiros e comerciantes transnacionais, para pagamento integral às instituições financeiras era
os magnatas da mídia, estrelas dos esportes e então dado à cidade para custear seus serviços.
do cinema, para instituições culturais (como o Cortes catastróficos no emprego municipal
MoMA, cultivado tão assiduamente por Nelson seguiram (assim como cortes no pagamento e
Rockfeller durante os anos 1970 como parte de nos benefícios) e a entrega de serviços da cidade
sua cruzada pessoal para civilizar a cidade pela em educação, saúde, saneamento e transporte
cultura). A cidade de Nova Iorque se transformou f oi sev e ra me nt e r ed uzid a . Os Rock fe ll er s
num destino turístico que foi sistematicamente conseguiram um de seus objetivos-chave: a
vendido ao resto do mundo como um lugar que imposição da tutoria sobre a Universidade
deve ser visto (incluindo agora, certamente, o Municipal de Nova Iorque (por que, diziam eles,
mórbido local onde o fracasso financeiro World deveriam os nova-iorquinos pagar por tal sistema
Trade Center de David Rockfeller uma vez esteve). de universidade de massa e gratuito enquanto
Os bairros, antes tristes e pobres em relação à Chicago não tinha nenhum, convenientemente
Manhattan, estão também agora sentindo o calor esquecendo quantos futuros vencedores de
dos empreendimentos à medida que grandes Prêmios Nobel foram nutridos através do sistema
projetos são estendidos sobre o Brooklin, o da cidade). Os sindicatos municipais perderam
Queens e, até mesmo, o Bronx. m ui to d e seu p od er. As associa ções d e
comunidade foram disciplinadas (o local do
Mas tudo isto pareceria um sonho nos
Bat te ry Pa rk C it y ra p id am ente tornou-se
negros dias de 1975. A cidade, sem nenhum outro
disponível). A democrática cidade de Nova Iorque
lugar para ir, apelou para o governo federal
foi de fato deposta e a ascensão do poder negro
financeiramente sem grana, mas o presidente
foi reprimida pelo golpe financeiro que em seus
Gerald Ford, ansioso por exibir suas credenciais
pormenores foi tão efetivo em termos econômicos
conservadoras face a uma reunião de movimentos
como o foi o golpe militar de 1973 no Chile12.
q ue l og o pa ssou a se r conhe ci da com o
Reaganismo e rodeado por assessores financeiros Mas os investidores bancários também
(como o ultraconservador Secretário do Tesouro precisavam refazer a cidade numa imagem
Willian Simon, que, quando era uma liderança na diferente e a maior questão era como e com o
área financeira nos anos 1960, encabeçara o quê. Eles tinham uma vantagem externa. A subida
encorajamento da cidade de Nova Iorque ao do preço do petróleo após a guerra árabe-
endividamento) e assessores políticos (como o israelense de 1973 pôs vasta quantidade de
grande urbanista Donald Rumsfeld, como chefe petrodólares à disposição dos Estados do Golfo.
A liberdade da cidade, pp. 09 - 17 15
para o sucesso de tais movimentos é confrontar o destinos e fortunas, ditar quem e o que somos e o
problema do capital excedente em sua raiz. E isto que nossas cidades devem ser. Vale a pena lutar
significa, muito simplesmente, que a acumulação pelo direito à cidade. Ele deveria ser considerado
de capital não pode continuar sua trajetória inalienável. A liberdade da cidade ainda está para
corrente, ab stratament e de ter minar nossos ser encontrada.
Notas
1. Park, R. On Social Control and Collective 11.Ferretti, F. The Year The Big Apple Went Bust.
Behavior. Chicago, Chicago University Press, p. Nova Iorque, Putnam, 1976; Tabb, W. The Long
3. Default: Nova Iorque City and the Urban Fiscal
Crisis. Nova Iorque, Monthly Review Press, 1982.
2 Lefebvre, H. Writing on Cities. Oxford, Blackwell,
1996, p.158. 12.Desenvolvi esta ideia mais amplamente em
HARVEY, D. A Brief History of Neoliberalism, op.
3. Davis, M. Planet of Slums. Londres, Verso, 2006.
cit, capítulo 2.
4. Engels, F. The Condition of the Working Class in
13.Alvarez, L. “Britain Says US Planned to Seize Oil
England. Nova Iorque, Oxford University Press, in ’73 Crisis”. In: New York Times, 4 de janeiro de
1999 edition.; Harvey, D. Social Justice and the
2004, A6: G owan, P. The G lobal Ga mble:
City. Londres, Edward Arnold, 1973. Washington’s Faustian Bid for World Dominance.
5. A teoria geral de tudo isso pode ser encontrada Londres, Verso, 1999.
em Harvey, D. The Limits to Capital. Londres,
14.Smith, N. The New Urban Frontier: Gentrification
Verso, edição de 2006. and the Revanchist City. Nova Iorque, Routledge,
6. A explicação precedente é baseada em Harvey, 1996.
D. Paris, Capital of Modernity. Nova Iorque,
15.Wade R. and Veneroso, F. “The Asian Crisis: the
Routledge, 2003. High Debt Model Versus the Wall Street-Treasury-
7. Moses, R. “What Happened to Haussmann”. In: IMF Complex”. In: New Left Review, 228, 1998,
Architectural Forum, 77, 1942, p. 1-10; Caro, 3-23: Petras, J. and Veltmeyer, H. System in
R. The Power Broker: Robert Moses and the Crisis: The Dynamics of Free Market Capitalism.
Fall of New York. Nova Iorque, Vintage, 1975. Londres, Zed Books, 2003.
8. Brenner, R. The Boom and the Bubble: The US 16.Esta é a principal tese de Harvey D. A Brief History
in the World Economy. Londres, Verso, 2003. of Neoliberalism, op.cit.
9. Cf. Harvey, D. A Brief History of Neoliberalism. 17.Balbo, M. citado em National Research Council,
Oxford, Oxford University Press, 2005, capítulo Cities Transformed: Demographic Change and Its
5. Implications in the Developing World. Washington,
D.C., The National Academies Press, 2003, p.379.
10.Kerner Commission. Report of the National
A dv i so r y C o mm i ss i on on Ci v il D is o rd e rs . 18.Polanyi, K. The Great Transformation. Boston,
Washington, Government Printing Office, 1968. Beacon Press, 1954, p. 257.