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Resumo
O objetivo deste texto é analisar como a reforma do aparelho de Estado tem influencia na
determinação das políticas para a educação infantil no Brasil na década de 1990. E nesta
mesma perspectiva a influência dos acordos internacionais na consolidação das políticas
para a educação infantil. A partir da compreensão das múltiplas determinações, abordado
pelo pressuposto metodológico materialista-histórico, considerou-se a reforma como um
processo neoliberal de alinhamento do Estado brasileiro aos preceitos financeiros
defendidos internacionalmente pelas organizações internacionais. O contexto de crise da
década de 1970 e democratização do Estado no final da década de 1980 permitiram uma
abertura da política brasileira ao neoliberalismo, principalmente pelos processos de
focalização, descentralização e privatização das ações do Estado. Nesta mesma perspectiva
a educação a partir desse período passa a representar algumas das características assumidas
pelo Estado brasileiro, como os processos descentralizatórios, focalizatórios e com a
efetivação das políticas enquanto programas de ação que tem tempo de finalização que são
desenvolvidas e financiadas pela sociedade civil, o que antes era assumido pelo Estado.
Verifica-se, pois, um alinhamento da educação infantil aos preceitos defendidos na reforma
do Estado brasileiro e assumidos pelas organizações internacionais e, que se vincula mais
às medidas compensatórias de alivio à pobreza do que às ações pedagógicas, se consolidam
enquanto programas de atendimento às famílias para o cuidado das necessidades primárias
das crianças, por exemplo. Para a discussão será apresentado a formulação do papel do
Estado brasileiro e, a constituição da educação infantil a partir da reforma de Estado da
década de 1990.
Introdução
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[...] Tudo se passa nas suas instituições, como se a <<luta>> de classe não
existisse. Esse Estado apresenta-se organizado como unidade política duma
sociedade com interesses económicos divergentes – não interesses de classes,
mas interesses de <<indivíduos privados>>, sujeitos económicos. Isto se reporta
à relação do Estado com o isolamento das relações sociais económicas, o qual é,
em parte o seu próprio efeito. A partir desse isolamento, a função política do
Estado apresenta uma ambivalência característica, constante diga respeito às
classes dominantes ou às classes dominadas (POULANTZAS, 1971, p. 8).
[...] o Estado apresenta uma ossatura material própria que não pode de maneira
alguma ser reduzida a simples dominação política. O aparelho de Estado, essa
coisa de especial e por conseqüência temível, não se esgota no poder do Estado.
Mas a dominação política está ela própria inscrita na materialidade institucional
do Estado. Se o Estado não é integralmente produzido pelas classes dominantes,
não o é também por elas monopolizado: o poder do Estado (o da burguesia no
caso do Estado capitalista) está inscrito nesta materialidade. Nem todas as ações
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Conforme Saes (1998) este Estado, chamado por ele de burguês, pode ser
identificado ao passo em que cria condições de reproduzir a ideologia que mantém o
sistema capitalista ao desenvolver dois aspectos a ele intrínsecos; o de individualizar os
sujeitos que produzem, os tornando indivíduos de vontades subjetivas e direitos que não se
relacionam com os dos demais, alcançado pela “[...] troca desigual entre o uso da força de
trabalho e o salário a forma de um ato de vontade realizado por iguais[...]” (SAES, 1998, p.
30). E o de neutralizar a ação coletiva dos indivíduos que são considerados individuais
com vontades antagônicas e, distante do coletivo de classe social.
A organização do estado capitalista passou por transformações na conjuntura das
relações econômicas mundiais. O momento de pós-guerra no final da década de 1930 foi
propício para as políticas keynesianas de John M. Keynes (1883-1946) que visavam o
governo das ações do Estado e do mercado de maneira a permitir um domínio sobre a
oscilação dos investimentos e empregos, moderando as crises e controlando as flutuações
do mercado, Moraes (2001). Paulani (2006) destaca que, naquele estado de Bem-Estar
Social, a forte intervenção estatal conduziu a economia e o estado capitalista ao que hoje se
considera ‘as décadas de ouro do capitalismo’ com alta taxa de emprego, baixa inflação e
crescimento acelerado da economia.
A partir da década de 1970 foi configurado o âmbito para que se desenvolvesse a
regulamentação do Estado e da economia por meio da ideologia neoliberal, conforme
Paulani (2006), a partir das crises do petróleo de 1973 e 1979, o aumento de juros, as crises
fiscais. E, o retorno da inflação, o fim da paridade entre as moedas e a globalização
financeira, de acordo com Peroni (2003). A formulação do pensamento neoliberal tem três
escolas como representantes: a escola austríaca que tem Friedrich August Von Hayek
(1899-1992) como principal teórico e que se tornou a base do neoliberalismo difundido nas
sociedades ocidentais; a escola de Chicago representada por Theodore Willian Schultz
(1902-1998), Milton Friedman (1912-2006) e Gari Becker(1930-); e a escola da Virgínia
representada por James M. Buchanan (1919-) e também conhecida como public choice – é
a teoria da escolha pública e consiste na intervenção do Estado na economia e as análises
dos aspectos ligados à ciência política, como os partido políticos, o processo eleitoral, a
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financiamento, o mesmo pode ser interrompido caso alguma medida seja tomada sem que
esteja designada pela instituição financiadora. Dessa forma as ações relacionadas aos
ajustes estruturais devem seguir as determinações dos acordos estabelecidos
internacionalmente, sejam eles vinculados à educação, à saúde ou às medidas de
saneamento básico.
Ao articular a nova realidade das relações econômicas, políticas e sociais que a
sociedade brasileira passava pós-ditadura militar, com as crises fiscais não se fazia mais
necessário um Estado burocrático, como destacado por Peroni (2003), se tornava
fundamental uma reforma que tinha suas bases no modelo gerencial neoliberal.
O papel assumido pelo Estado destina a execução dos direitos sociais garantidos
constitucionalmente para o terceiro setor – para a sociedade civil organizada – e para as
esferas estaduais e municipais, o Estado passa a ser o determinador e avaliador de políticas.
O documento da reforma apresenta enquanto processo de publicização aspectos
considerados importantes da reforma, como as privatizações generalizadas das empresas
públicas e a transferência dos serviços como a cultura, a educação a saúde e a pesquisa
científica Brasil, Mare (1995, p. 12 e 13). O vínculo aos pressupostos neoliberais é
caracterizado ao promover o processo de minimização das ações que oneram o Estado, a
partir da reforma caberá ao Estado: a definição de políticas públicas por meio do ajuste
fiscal; descarta seu papel protecionista com a liberalização comercial; se conscientiza que é
necessário a privatização das empresas estatais ao passo que estas acirram a crise fiscal e
dificultam a capacidade de o Estado promover a poupança; destina os serviços ao setor
privado em nome da maior eficiência; estabelecimento de uma parceria entre Estado e
sociedade para que provessem os serviços não-exclusivos do Estado, como a educação, a
saúde, a habitação.
A proposta de um Estado mínimo deve ser compreendida, como exposto por Peroni
(2003), apenas enquanto mínimo para as políticas sociais e máximo para o capital. É
verificado pela autora que a ênfase no documento da reforma consiste no processo de
descentralização e centralização das definições de políticas:
A partir das análises da conjuntura mundial em que se abriu espaço para as políticas
neoliberais e o contexto nacional de alinhamento a essas políticas, verifica-se que as
políticas educacionais sofreram influência direta da reforma do aparelho de Estado e, dessa
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forma, passou a ser alinhada aos preceitos neoliberais. Assim, cabe considerar, em que
medida é verificada nas ações propostas pelas legislações nacionais desenvolvidas pelo
Ministério da Educação em educação infantil, a interferência da reforma do estado
brasileiro de cunho neoliberal.
concomitantemente nas instituições que ofertam educação infantil, que o profissional desse
nível deve ser respeitado, ter formação adequada e plano de carreira, no entanto, não diz
respeito como essas metas devem ser atingidas. A característica que a definiu como
descentralizadora, foi observada, num período posterior quando da proposta da Política
Nacional de Educação Infantil: pelo direito de crianças de 0 a 6 anos à educação em 2006.
Processo semelhante ocorre na LDB n° 9.394/96 que institui o direito e o dever de
cada esfera da União no que tange à educação, mas não esclarece procedimentos ou
mesmo o plano de carreira, o que deixa a cargo de cada esfera responsável. Esse processo
de consolidação desta LDB se finalizou com a oposição ao projeto aprovado,
considerando-o por algumas das instituições que participaram da tramitação – como o
Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública –, como ilegítimo, acresceu-se a este fator, a
aprovação do projeto educacional do governo FHC, por meio das medidas provisórias –
MPs. É destacado por Peroni (2003), no bojo desse processo, a efetivação do
financiamento da educação, não pela legislação, mas pela Emenda Constitucional n° 14
que instituiu do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do
Magistério – Fundef.
Fator relevante a se considerar na década de 1990 são os documentos produzidos
internacionalmente que chegaram ao Brasil e influenciaram as decisões em educação,
afinal, conforme Peroni (2003), já existiam avaliações desenvolvidas pelas agências
internacionais da educação brasileira. Dentre os documentos que mais influencia tiverem
deve-se destacar três: o Prioridades y estrategias para la educación: Exame del Banco
Mundial (1996) – Banco Mundial; Educação um tesouro a descobrir: Relatório para a
UNESCO da Comissão Internacional sobre educação para o Século XXI (1996) –
UNESCO; e Educação e conhecimento: eixo da transformação produtiva com equidade
(1995) – CEPAL.
Estes documentos fazem uma análise da conjuntura educacional, bem como
concebem as bases para se pensar a educação nos países em desenvolvimento. Isto é,
utilizam de casos específicos e localizados como exemplos e a partir destes tentam uma
generalização. Neste sentido, cabe retomar a idéia de que não se podem retirar
particularidades de determinado contexto e inseri-los em outro sem que haja uma
resignificação pelos sujeitos envolvidos.
Conforme Soares (1998), o interesse pelo financiamento social, das instituições
financiadoras apenas cresce após o aumento do número de pessoas pobres, devido às crises
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Considerações finais
REFERÊNCIAS
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