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DIREITOS HUMANOS
DAS MULHERES
“O avanço das mulheres e a conquista da igualdade entre mulheres e homens são uma
questão de direitos humanos e uma condição para a justiça social; não devem, portanto,
ser encarados isoladamente, como um problema feminino.”
Declaração de Pequim e Plataforma de Ação. 1995.
192 II. MÓDULOS SOBRE QUESTÕES SELECIONADAS DE DIREITOS HUMANOS
HISTÓRIA ILUSTRATIVA
Um caso da vida real: A história de Selvi T. taram nele. Disseram-lhe então: “Vai para
casa para o teu marido e fica lá”.
Selvi tem 22 anos e está grávida do seu quin- Selvi foi, secretamente, ao tribunal de fa-
to filho. O seu marido iniciou os ataques en- mília, mas disse ao procurador que tinha
quanto ela estava grávida do seu primeiro muito medo de apresentar uma queixa
filho. “Naquela primeira vez ele bateu-me, formal. Sendo o caso muito grave o pro-
pontapeou o bebé na minha barriga e atirou- curador iniciou, independentemente, um
me do telhado”, disse ela. “O bebé sobreviveu, processo para assegurar uma ordem de
mas penso que [a criança] tem uma doença proteção para a Selvi. O tribunal ordenou
mental.” Desde então, a violência tem au- ao marido da Selvi que se afastasse dela e
mentado, quanto à frequência e gravidade, e lhe pagasse uma prestação de alimentos.
agora afeta mesmo as crianças. O marido da Mas a ordem nunca foi executada. Ele não
Selvi controla todos os aspetos da sua vida e pagou quaisquer prestações de alimentos,
é extremamente ciumento. Ela relatou: “Ele nunca se mudou de casa e continuou a
viola-me a toda a hora e verifica os meus flui- bater-lhe. A polícia nunca a foi ver depois
dos ‘lá em baixo’ para confirmar que eu não da ordem ter sido emitida.
tive sexo [com um outro homem].” Numa dada altura Selvi mudou-se para
Em 2008, Selvi foi finalmente à polícia um abrigo. Porém, nem mesmo o abrigo
depois do seu marido ter “partido o seu oferecia segurança do seu marido que apa-
crânio e braço”. A polícia trouxe o seu ma- receu um dia depois da polícia ter revela-
rido à esquadra, deram ao casal alguma do a localização do abrigo. Uma mulher,
comida e mandaram-nos para casa, dizen- a trabalhar no abrigo disse à Selvi: “Fala
do-lhe: “Não há problema, falámos com com o teu marido, ele está aqui, a chorar.”
ele, estão novamente juntos.” A segunda Quando ela falou com ele, ele espetou um
vez que Selvi foi à esquadra, eles levaram- garfo no seu braço, resultando numa ci-
na ao hospital já que ela estava a sangrar catriz que ela mostrou na entrevista. Ele
da sua cabeça, pois ele tinha-a atingido levou-a para casa.
com uma pedra. No entanto, disseram-lhe Em junho de 2010, na altura em que a Hu-
que se devia reconciliar com o seu esposo. man Rights Watch falou com a Selvi, os
Nesta altura, em 2009, o marido da Selvi abusos continuavam. O seu esposo vive
trancou-a num quarto, batendo-lhe todos com ela, raramente trabalha, joga, não
os dias. Quando, numa terceira vez ela es- paga as contas e agride Selvi e as crianças
capou e foi à esquadra, eles chamaram o frequentemente. Ela tem muito medo de
marido e ele pediu desculpa. A polícia en- mandar as crianças para um dormitório do
viou-a para casa novamente. Em 2010, Sel- Estado e tem terror de fugir. Não consegue
vi foi, pela quarta vez, à esquadra quan- cuidados pré-natais que são urgentes, já
do o seu marido trouxe, à noite, amigos a que os abusos incluem pontapés no seu
casa tendo-lhes “oferecido” a Selvi. Para abdómen, pois o seu cartão do Estado do
fugir, ela saltou do telhado e fugiu para a seguro de saúde está entre os documen-
esquadra da polícia. O seu marido disse à tos civis que o seu marido queimou, numa
polícia que ela estava a mentir. Eles acredi- dada ocasião.
E. DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES 193
A SABER
1. DIREITOS HUMANOS DAS MULHE- o Artº 1º da Declaração Universal dos Di-
RES reitos Humanos (DUDH) estava a ser redi-
gido em 1948. Esta mudança na formula-
As mulheres tiveram de lutar pelo seu re- ção tornou claro que os direitos humanos
conhecimento como seres humanos ple- pertencem a todos os seres humanos, não
nos e pelos seus direitos humanos básicos importa se mulher ou homem, e introdu-
por um longo período de tempo e, infe- ziu a igualdade como um dos princípios
lizmente, a luta ainda não terminou. Em- fundamentais no discurso e regime de pro-
bora a sua situação tenha melhorado de teção dos direitos humanos internacional.
muitas formas, quase globalmente, fatores O princípio da igualdade como é formal-
sociais ainda impedem a total e imediata mente expresso na lei, sem diferenciação
implementação dos direitos humanos para entre mulheres e homens, envolve fre-
as mulheres em todo o mundo. O séc. XX quentemente uma discriminação oculta
trouxe muitos avanços, mas também mui- contra as mulheres. Devido às diferentes
tos retrocessos, e nem mesmo em tempo posições e papéis que as mulheres e os ho-
de paz e progresso as mulheres e os seus mens têm tradicionalmente na sociedade,
direitos humanos foram alvo de atenção a igualdade de iure resulta, muitas vezes,
especial e nem ninguém, nessa altura, se na discriminação de facto. Esta situação
opôs a tal política. No entanto, em todos obrigou os ativistas dos direitos humanos
os períodos da história se podem encontrar das mulheres a promover a diferenciação
heroínas que lutaram pelos seus direitos entre igualdade formal e substantiva.
e pelos direitos de outras mulheres, com Em muitos contextos, as noções formais
armas ou palavras. Eleanor Roosevelt, por de igualdade não ajudaram as pessoas em
exemplo, insistiu que devia ser usado “to- situações de desvantagem. A noção tem de
dos os seres humanos são iguais” em vez evoluir na direção de uma definição subs-
de “todos os homens são irmãos” quando tantiva de igualdade tendo em conta plu-
194 II. MÓDULOS SOBRE QUESTÕES SELECIONADAS DE DIREITOS HUMANOS
lhes seja assegurada proteção especial. A prol da libertação e igualdade. Uma das
violência doméstica e outras formas de mais famosas proponentes do movimen-
violência ameaçam a segurança humana to foi Olympe de Gouges que escreveu a
das mulheres. Declaração dos Direitos da Mulher e da
Cidadã. Ela, assim como muitas das suas
A segurança humana trata, também, de companheiras, pagou na guilhotina o com-
assegurar o acesso igual à educação, promisso assumido com os direitos das
aos serviços sociais e ao emprego para mulheres.
todos, mesmo em tempo de paz. Às
mulheres é muitas vezes negado o ple- “A mulher nasce livre e goza de direitos
no acesso a estas áreas e o pleno gozo iguais aos dos homens em todos os as-
destes direitos. Assim, as mulheres e as petos”.
crianças, em particular, podem benefi- Artº 1º Declaração dos Direitos da Mulher e da
ciar de uma abordagem com base nos Cidadã.1789.
direitos humanos à segurança humana,
o que prova que esta não se atinge se os Também a Grã-Bretanha se revê numa
direitos humanos não forem totalmente longa e forte tradição de luta das mulhe-
respeitados. Desta forma, a erradica- res por direitos iguais. É até muitas vezes
ção de qualquer forma de discrimina- referida como “a terra natal do feminis-
ção, particularmente contra mulheres mo”. Logo por volta de 1830, as mulheres
e crianças, deve constituir uma priori- britânicas começaram a exigir o direito ao
dade na agenda da segurança humana. voto. Lutaram durante mais de 80 anos
Tem também particular relevância para com métodos distintos e, finalmente, em
a segurança humana, a situação das 1918, alcançaram os seus objetivos quan-
mulheres nos conflitos armados e a sua do lhes foi concedido o direito ao voto, a
proteção. partir dos 30 anos de idade. Outras áreas
de ação prioritárias destas primeiras fe-
Direitos Humanos em Conflito
ministas incluíram o acesso à educação,
Armado
o direito das mulheres casadas à proprie-
dade e o direito a desempenhar cargos
2. DEFINIÇÃO públicos.
E DESENVOLVIMENTO
DA QUESTÃO O Conselho Internacional das Mulheres
foi fundado logo em 1888 e, ainda hoje,
Uma Retrospetiva Histórica existe. Tem a sua sede em Paris e participa
Um importante acontecimento histórico, ativamente no processo de garantia dos di-
a Revolução Francesa, marca o começo reitos das mulheres, através de encontros
da luta das mulheres no sentido de serem internacionais, de seminários e workshops
reconhecidas como seres humanos iguais, nacionais, regionais e sub-regionais, com
num mundo masculino. Esta época consti- um programa de desenvolvimento intensi-
tui não só o começo do movimento a favor vo de projetos, em cooperação com agên-
dos direitos civis e políticos das mulheres cias internacionais, pelas Resoluções redi-
como também preparou o caminho para gidas e adotadas pela Assembleia-Geral,
o primeiro movimento de mulheres em pela cooperação, a todos os níveis, com
196 II. MÓDULOS SOBRE QUESTÕES SELECIONADAS DE DIREITOS HUMANOS
outras organizações não governamentais as pessoas cegas perante este facto. Os di-
e através de planos trienais de ação, em reitos fundamentais de mais de metade da
cada um dos seus cinco Comités Perma- humanidade foram esquecidos, o que, ine-
nentes. vitavelmente, conduziu à conclusão de que
não pode haver neutralidade de género nas
O primeiro órgão intergovernamental a leis internacionais ou nacionais, enquan-
tratar dos direitos humanos das mulheres to as sociedades, em todo o mundo, não
foi a Comissão Interamericana sobre as forem neutrais relativamente ao género, e
Mulheres (CIM), criada em 1928, para a continuem a discriminar as mulheres.
região da América Latina. Este órgão foi
o responsável pela elaboração do proje- Foi apenas nos anos 70 que a desigualdade
to da Convenção Interamericana sobre em muitas áreas da vida diária, a pobreza
a Nacionalidade das Mulheres, adotado entre mulheres e a discriminação contra me-
pela Organização dos Estados Americanos ninas levou as Nações Unidas a decidir ini-
(OEA), em 1933. Este tratado provocou ciar a Década para as Mulheres das Nações
um debate sobre o modo como a região Unidas: Igualdade, Desenvolvimento e
estava a desenvolver legislação que tratas- Paz, de 1976 a 1985. Em 1979, a Década cul-
se dos direitos humanos. minou com a adoção da Convenção sobre
a Eliminação de Todas as Formas de Dis-
Desde o início das Nações Unidas, em 1945, criminação contra as Mulheres (CEDM).
as mulheres procuraram participar na estru- Este documento é o mais importante instru-
tura e fazer sentir a sua presença no conteú- mento de direitos humanos para a proteção
do e na implementação dos instrumentos e e promoção dos direitos das mulheres e o
mecanismos dos direitos humanos. primeiro documento a reconhecer expres-
samente as mulheres como seres humanos
A Comissão para a Estatuto da Mulher plenos. A CEDM contém direitos civis e po-
(CEM) foi criada em 1946, com o mandato líticos, assim como direitos económicos, so-
de promover os direitos das mulheres em ciais e culturais, unindo os direitos humanos
todo o mundo. A sua primeira presidente que, por exemplo, nos Pactos Internacionais,
foi Bodil Boegstrup, da Bélgica. A CEM pro- estão divididos em duas categorias.
moveu a inclusão explícita dos direitos das
mulheres na DUDH e apresenta recomen- A Convenção regula questões relaciona-
dações ao Conselho Económico e Social das com a vida pública e privada das mu-
(ECOSOC), no respeitante a problemas ur- lheres. Vários artigos lidam com o papel
gentes a necessitarem de uma resposta ime- da mulher na família e na sociedade, a
diata, na área dos direitos das mulheres. necessidade de partilhar responsabili-
dades dentro da família e a urgência na
Embora as mulheres contribuíssem de igual implementação de mudanças nos sis-
forma, e desde o início, para a evolução do temas sociais e culturais que atribuem
sistema internacional político, económico e uma posição subordinada às mulheres.
social, a atenção dada aos problemas das Só através de tais mudanças elementa-
mulheres era mínima. Décadas de cegueira res é que o reconhecimento dos direitos
relativamente ao género, nos documentos humanos das mulheres pode ser trazido
dos direitos humanos, tornava, também, ao nível global. Até maio de 2012, 187
E. DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES 197
ONG internacionais (como a Amnistia In- trou que o Egito ainda está entre os países
ternacional) e locais (como a Coligação do com a mais elevada (90%) prevalência de
Cairo do Egito contra a MGF), também as MGF no mundo. Para além das atitudes
Nações Unidas abordam frequentemen- pró-MGF de uma maioria de mulheres
te este assunto: em 2005, através de uma em ambos os cenários urbanos e rurais
abordagem estatística da UNICEF sobre a e das discussões políticas cada vez mais
MGF, em 2008, com a publicação de uma acesas com a Irmandade Muçulmana e fa-
declaração de interagências sobre a eli- ções Salafi, a impunidade é um dos prin-
minação da mutilação genital feminina cipais obstáculos para a redução da MGF
e, em 2010, através da promoção de uma no Egito. “Se denunciarmos a um polícia
estratégia global dirigida aos profissionais na esquadra local, estaremos a apresentar
da saúde para não realizarem a MGF. As uma denúncia junto a alguém que acre-
conclusões da UNICEF permanecem váli- dita nela”, explica um ativista anti MGF
das: as taxas de prevalência da MGF es- local.
tão lentamente a diminuir nalguns países,
as atitudes perante a MGF estão a mudar Uma pandemia que coloca seriamente em
lentamente com mais mulheres a oporem- risco as mulheres é o VIH/SIDA. Apesar
se à sua continuação. Considerando que, das novas infeções em todo o mundo terem
nalguns países, a Primavera Árabe trouxe atingido o pico em 1997 e de o número de
parlamentos e/ou governos com participa- novas infeções ter diminuído desde então,
ção islâmica, que tendem a adotar atitudes a percentagem de mulheres a viverem com
benevolentes em relação à MGF. Os luta- o VIH tem aumentado continuamente nas
dores contra a MGF devem considerar as últimas décadas. Em termos globais, as
seguintes recomendações: as estratégias mulheres representam metade de todas as
para acabar com a MGF enquanto um pessoas que vivem com VIH: nas Caraíbas,
comportamento social devem ser acom- no Norte de África e no Médio Oriente, a
panhadas de educação integral, com base percentagem é de cerca de 50%, na África
na comunidade e sensibilização; os pro- Subsaariana é de 59%, enquanto que as ta-
gramas devem ser específicos para cada xas de infeção na Europa são cerca de 27%
país e adaptados de forma a refletirem as e a América do Norte apresenta a menor
variações regionais, étnicas e socioeconó- taxa de todo o mundo de 21%.
micas, e a separação pormenorizada dos No entanto, o Relatório do Dia Mundial
dados por variáveis socioeconómicas pode da SIDA do UNAIDS para 2011 mostrou
otimizar significativamente e fortalecer os algumas tendências encorajadoras na luta
esforços de promoção ao nível nacional. contra a SIDA: a proporção de mulheres
a viverem com o VIH permaneceu está-
O caso do Egito mostra a necessidade vel e as novas infeções, em geral, dimi-
destas estratégias na linha de ação: em- nuíram em 33 países, 22 deles na África
bora a mutilação genital feminina tenha Subsaariana (a região mais afetada pela
sido proibida e seja punível com multa ou epidemia de SIDA), devido a mudanças
prisão, logo em 1959 (uma proibição con- no comportamento sexual, aumento da
firmada por vários decretos e decisões de idade do primeiro contacto sexual e au-
tribunais superiores, o mais recente em mento do tratamento antirretroviral nas
2008), o estudo de 2005 da UNICEF mos- mulheres grávidas.
202 II. MÓDULOS SOBRE QUESTÕES SELECIONADAS DE DIREITOS HUMANOS
O relatório apresenta uma visão positiva vivem ou que sejam afetadas pelo VIH em
cautelosa de que o objetivo de erradica- situações de conflito e pós-conflito.
ção das novas infeções em crianças pode
ser alcançado até 2015, se os esforços se Direito à Saúde
intensificarem em quatro áreas de ação:
prevenção da infeção do VIH nas mulhe- “Os Estados devem estabelecer um me-
res em idade reprodutiva, parando-se a lhor equilíbrio entre o controlo das fron-
transmissão sexual e relacionada com as teiras e a sua obrigação de proteger as
drogas; integrando-se os esforços de pre- pessoas que são titulares de direitos,
venção no cuidado pré-natal, possibilitan- nomeadamente, requerentes de asi-
do-se o acesso das mulheres aos serviços lo e vítimas presumidas de tráfico. [...]
de planeamento familiar; garantindo-se As obrigações de proteção para com as víti-
testes regulares de VIH e aconselhamen- mas de violações de direitos humanos devem
to às mulheres grávidas, assim como o ser vistas como parte integrante de uma po-
acesso a medicamentos antirretrovirais às lítica de migração ‘saudável’.”
mulheres grávidas com o VIH e aos seus Maria Grazia Giammarinaro. 2012.
recém-nascidos. A este respeito a África
do Sul pode servir como um exemplo de
boas práticas: em 2010, o país forneceu Mulheres e Violência
medicamentos antirretrovirais a cerca de Em muitas sociedades, mulheres e meni-
95% das mulheres elegíveis, para preve- nas são sujeitas a violência física, sexual
nir novas infeções do VIH entre as crian- e psicológica que é transversal a diferen-
ças, o que significa que a taxa de provisão tes rendimentos, classes e culturas, tanto
quase duplicou em apenas três anos. Esta na vida pública, como na privada. Muitas
conquista reflete o compromisso político, vezes, as mulheres são vítimas de viola-
o forte envolvimento da sociedade civil, ções, abusos sexuais, assédio sexual ou
uma prestação de serviços descentralizada intimidação. Escravidão sexual, crimes
e o empoderamento dos enfermeiros. relacionados com o dote, crimes de hon-
Também em 2011, o Conselho de Seguran- ra, gravidez forçada, prostituição forçada,
ça das Nações Unidas, na sua Resolução esterilização e abortos forçados, seleção
1983, afirmou que as mulheres e meninas pré-natal do sexo, infanticídio feminino e
são particularmente afetadas pelo VIH e a mutilação genital feminina são também
que o fardo desproporcional de VIH e SIDA atos de violência cometidos contra as mu-
nas mulheres é um dos obstáculos persis- lheres.
tentes e desafios para a igualdade de gé-
nero e empoderamento das mulheres. No Factos e números
âmbito do seu mandato de manutenção de
paz, o Conselho de Segurança apelou aos x No mínimo, uma em cada três mulhe-
Estados-membros e a outras partes inte- res no mundo já foi abusada, de algu-
ressadas para apoiarem o desenvolvimen- ma forma, durante a sua vida. Assim,
to e fortalecimento das capacidades dos a violência sexual contra as mulheres
sistemas nacionais de saúde e redes da so- e meninas é um problema de propor-
ciedade civil, a fim de prestarem uma as- ções pandémicas. Para além do mais,
sistência sustentável para as mulheres que as mulheres e as meninas normalmen-
E. DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES 203
da pela Comissão Interamericana das Mu- lho sem discriminação em razão do género,
lheres ao longo de um processo de cinco encontra-se previsto no Protocolo Adicional
anos e constitui um quadro importante a de 1988.
nível político e jurídico. Lança as bases
para uma estratégia coerente de aborda- Mulheres e Conflitos Armados
gem ao problema da violência, tornando As mulheres muitas vezes tornam-se as
obrigatória a implementação, por parte primeiras vítimas de violência durante a
dos Estados, de estratégias públicas para a guerra e o conflito armado. No seu ensaio
prevenção da violência e apoio às vítimas. “A Segunda Frente: a Lógica da Violência
Sexual”, Ruth Seifert afirma que, em mui-
No quadro da Comissão Africana dos Di- tos casos, é uma estratégia militar atingir
reitos Humanos e dos Povos, o Protocolo à as mulheres, de modo a destruir o inimigo.
Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Tal como demonstrado acima, a violência
Povos sobre os Direitos das Mulheres em sexual contra a mulher é um crime que as-
África (Protocolo de Maputo), foi elaborado sume proporções pandémicas. Se, na vio-
e adotado pelos Estados-membros da União lência com a origem num parceiro íntimo
Africana (UA) em 2003, e subsequentemen- esta constitui uma forma dos homens do-
te entrou em vigor em 2005. Até maio de minarem as mulheres, a violência sexual
2012, 30 dos 53 Estados-membros da União em tempos de guerra consiste numa forma
Africana ratificaram este Protocolo. de comunicação entre homens, através do
atropelamento dos corpos das mulheres.
Entre as principais convenções do Conselho As mulheres e as meninas são considera-
da Europa (CdE), há duas convenções no das como táticas de guerra para humilhar,
âmbito dos direitos das mulheres: a Con- dominar, introduzir o medo, punir, disper-
venção Europeia dos Direitos Humanos sar e/ou deslocar à força os membros de
(CEDH) e a Carta Social Europeia, e os seus uma comunidade ou grupo étnico. A vio-
respetivos Protocolos. Embora os direitos lação e outras formas de violência sexu-
das mulheres não sejam explicitamente dis- al podem mesmo ser consideradas como
cutidos na CEDH, o artº 14º proíbe qualquer genocídio quando cometida com o intuito
distinção em razão do género (ou outras de destruir um grupo no seu todo ou em
razões). O Protocolo Adicional nº7 à Con- parte, como foi considerado pelo Tribunal
venção adicionou aos direitos protegidos, a Penal Internacional para o Ruanda (TPIR)
igualdade entre cônjuges no respeitante aos na sua decisão relativa a Jean-Paul Akaye-
seus direitos e responsabilidades no casa- su. Conclui-se, também da guerra na Bós-
mento, e no Protocolo nº12, é estabeleci- nia do início dos anos 90, que a “limpeza
da a proibição geral da discriminação por étnica” é uma estratégia de guerra e a vio-
qualquer autoridade pública, por qualquer lação não é um efeito lateral mas um dos
razão, incluindo o género. Os direitos espe- seus métodos. Tendo começado com os tri-
cíficos das mulheres são definidos na Carta bunais do Ruanda e da antiga Jugoslávia,
Social Europeia, tais como a remuneração estes crimes são agora perseguidos e não
igual, proteção materna, proteção de traba- mais permanecem na sombra da impuni-
lhadoras e a proteção social e económica de dade. O Estatuto de 1998 do Tribunal Penal
mulheres e crianças. O direito a oportunida- Internacional, pela primeira vez na histó-
des e tratamento iguais, em relação ao traba- ria, designa expressamente a violação, a
E. DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES 205
gravidez e prostituição forçadas como cri- mente violência sexual, durante o confli-
mes contra a humanidade e estabelece um to. Todos estes fatores devem ser tidos em
sistema de responsabilização individual consideração, especialmente em futuras
que tem como objetivo tanto trazer justi- missões de manutenção de paz, de modo a
ça para as vítimas como a pena adequada que seja fornecida às mulheres a máxima
para os perpetradores de tais crimes. assistência possível para lidar com as suas
necessidades especiais.
“Agora é mais perigoso ser-se uma mu-
lher do que um soldado num conflito mo- Uma mudança de paradigma na recons-
derno.” trução pós-conflito foi trazida pela Res.
Maj. Gen. Patrick Cammaert. 2008.
1325 (2000) do Conselho de Segurança da
ONU que foi o primeiro documento legal
do Conselho a exigir às partes em conflito
Factos e números o respeito pelos direitos das mulheres e o
apoio à sua participação nas negociações
x Foram proferidas, no Tribunal Penal para a paz e na reconstrução pós-conflito,
Internacional para a antiga Jugoslá- e que foi seguida pelas Resoluções 1888,
via, 18 condenações relacionadas com 1889 e 1894 (2009). As Resoluções enfati-
a violência sexual, enquanto funcio- zaram a necessidade de adotar uma pers-
nários das Nações Unidas estimam petiva de género em conflitos armados,
que as vítimas de violações ascendam assim como na gestão institucional dos
a 60.000. O número de condenações conflitos, na manutenção da paz e recons-
de outros tribunais é mais baixa: oito trução pós-conflito, para dar formação aos
pelo Tribunal Penal Internacional para funcionários sobre os direitos das mulheres
o Ruanda e seis pelo Tribunal Especial e, da mesma forma, incluir as mulheres em
para a Serra Leoa. processos de manutenção da paz e segu-
rança, especialmente ao nível da tomada
As mulheres raramente têm um papel ati- de decisões. Vários Estados estabeleceram,
vo nas decisões que levam ao conflito ar- entretanto, planos nacionais de ação para a
mado. Pelo contrário, elas trabalham para implementação das Resoluções e iniciativas
preservar ordem social no meio dos confli- da sociedade civil trabalham com o mes-
tos e dão o seu melhor para garantir uma mo objetivo. Contudo, na prática, a ONU
vida o mais normal possível. Além disso, dificilmente consegue atingir os seus pró-
as mulheres, “muitas vezes suportam uma prios objetivos: Nenhuma mulher foi, até
parte desproporcional das consequências agora, nomeada chefe ou mediadora prin-
da guerra”, como o Centro Internacional cipal para a paz em processos de negocia-
para a Investigação sobre as Mulheres afir- ção para a paz promovidos pela ONU, mas
mou no seu boletim informativo sobre re- em alguns processos desenvolvidos pela
construção pós-conflito. Muitas mulheres UA ou outras instituições, mulheres faziam
são esquecidas como viúvas que enfren- parte de equipas de mediadores. Um caso
tam o fardo pesado de apoiarem as suas recente positivo é o papel de Graça Machel
famílias, enquanto muitas vezes elas pró- como um dos três mediadores para a cri-
prias têm de lidar com o trauma causado se no Quénia em 2008. A participação das
por estarem expostas à violência, especial- mulheres nos processos de negociação para
206 II. MÓDULOS SOBRE QUESTÕES SELECIONADAS DE DIREITOS HUMANOS
a paz é ainda feita de forma ad hoc, não epidémicas. Esta bio-pirataria está a ser
sistematizada - em média, é menor do que agora justificada como uma nova “parce-
8% nos 11 processos de paz relativamente ria” entre agronegócios e as mulheres do
aos quais tal informação se encontra dis- Terceiro Mundo. Para nós, o furto não pode
ponível. Menos de 3% dos signatários dos ser a base de uma parceria.”
acordos de paz são mulheres. Fazendo face Vandana Shiva. 1998.
a estas insuficiências, entre outras, a As-
sembleia-Geral das Nações Unidas apoiou A deterioração dos recursos naturais tem
adicionalmente as Resoluções do Conselho efeitos negativos na saúde, bem-estar
de Segurança com a sua Resolução 66/132 e qualidade de vida da população como
em 2011. um todo, mas afeta especialmente as mu-
lheres. Além disso, o seu conhecimento,
Direitos Humanos em Conflito competências e experiências são raramen-
Armado te tomados em consideração pelos deci-
sores, que são maioritariamente homens.
Mulheres e Recursos Naturais A Conferência das Nações Unidas sobre
De acordo com o excerto de “Monocultu- Desenvolvimento Sustentável Rio+20,
ras, Monopólios e Mitos e a Masculiniza- centrou-se, por isso, na igualdade de gé-
ção da Agricultura”, de Vandana Shiva, nero como sendo fundamental para um
as mulheres na Índia têm um papel im- futuro sustentável, na discussão de estra-
portante no que respeita à preservação de tégias e programas para a igualdade de
conhecimentos sobre recursos naturais e género e o desenvolvimento sustentável e
ambiente: “as mulheres que se dedicam destacou o empoderamento das mulheres
à agricultura têm sido as guardiãs das se- nas chamadas economias verdes. A Dire-
mentes e as que as fazem crescer, através tora Executiva da ONU Mulheres, Michel-
dos tempos”. Isto não é apenas verdade na le Bachelet apelou a políticas robustas e
Índia, mas em todo o mundo. Através da compromissos fortes que refletissem com
sua gestão e uso dos recursos naturais, as clareza o papel central das mulheres no
mulheres providenciam sustento às suas desenvolvimento sustentável e condu-
famílias e comunidades. Assim, a tendên- zissem a uma mudança real na vida das
cia recente para a “apropriação das terras” pessoas, através da participação plena das
– aquisições de terras em larga escala por mulheres na agenda do desenvolvimento
empresas domésticas e transnacionais, sustentável.
governos e indivíduos, no seguimento
da crise mundial do preço dos alimentos A Menina
de 2007-2008 – fez das mulheres e das Em muitos países, a menina enfrenta dis-
suas crianças, as primeiras vítimas em criminação desde os seus primeiros anos
muitas regiões do hemisfério sul. de vida, ao longo da infância e na idade
adulta. Devido às atitudes e práticas no-
“O fenómeno da bio-pirataria através da civas, como a seleção pré-natal do sexo,
qual as empresas ocidentais estão a furtar o infanticídio feminino, a mutilação ge-
séculos de conhecimento coletivo e inova- nital feminina, a preferência pelos filhos
ção levada a cabo pelas mulheres do Tercei- rapazes, o casamento precoce, a explora-
ro Mundo está agora a atingir proporções ção sexual, as práticas relacionadas com
E. DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES 207
tes recentes, tais como o caso de Sakineh sa do dote na Índia e nos países vizinhos,
Ashtiani no Irão, cuja execução foi adia- desde há décadas, as estatísticas da Índia
da diversas vezes e, no fim, transformada sobre criminalidade relatam milhares de
numa sentença de dez anos, depois de uma casos anuais e números crescentes desde
vaga de protestos internacionais em 2010 e a década de 90.
2011, ou o caso de 2012 de um casal do Mali,
condenados a 100 vergastadas pelo crime Hoje, a participação política das mulhe-
de terem tido um filho fora do casamento, res é considerada mais importante do que
demonstram que se alcançaram poucos re- nunca, uma vez que as mulheres podem
sultados na reconciliação da religião ou da abordar melhor as suas preocupações.
tradição com os direitos das mulheres. Nos últimos 50 anos, mais e mais mu-
lheres alcançaram o direito de voto e de
Proibição da Tortura se candidatar e ocupar cargos públicos.
Liberdades Religiosas De acordo com o anterior Fundo de De-
senvolvimento das Nações Unidas para a
Outra prática religiosa que afeta o quoti- Mulher (UNIFEM), cada vez mais mulhe-
diano das mulheres pode ser encontrada res procuram transformar a política, e os
na Índia onde a Sati, a tradição Hindu de grupos de mulheres estão-se a centrar em
autoimolação na pira funerária com o seu esforços para aumentarem a representação
marido falecido, foi proibida pelo gover- das mulheres nas eleições, para revigorar
no britânico em 1829, mas ainda ocorre a responsabilização política. Hoje, existem
como é provado pelos últimos casos docu- mais mulheres no governo do que nunca.
mentados em 2006 e 2008. Enquanto que A proporção de mulheres deputadas a ní-
a Sati, vista tradicionalmente como o ato vel nacional aumentou 8% na década de
altamente respeitado de uma total devo- 1998 a 2008, em relação à média global
ção da mulher ao seu marido, ainda existe atual de 18,4%, em comparação com o
embora mais raramente, na Índia moder- aumento de apenas 1%, nas duas décadas
na, há um aumento chocante do número após 1975. No entanto, em todo o mundo,
de mortes entre mulheres (na maioria, jo- a igualdade de género no âmbito da gover-
vens) cujos maridos estão bem e vivos. As nação democrática continua a ser bastante
chamadas “mortes por causa do dote”, às limitada. As mulheres encontram-se em
vezes também referidas como “homicídios menor número, de 4 para 1, nas legisla-
de noivas”, ocorrem muitas vezes após turas em todo o mundo. Em meados de
um longo período de perseguição e tortura 2009, apenas 17 chefes de Estado ou de
pelos parentes do noivo, de forma a pres- governo eram mulheres. Mesmo continu-
sionar a família da noiva a pagar um dote ando a aceleração da taxa atual relativa à
mais elevado do que o anteriormente acor- participação das mulheres, em compara-
dado. Estes incluem casos de mulheres ção com as décadas anteriores, estaremos
que são assassinadas, mas também que ainda muito longe de alcançar a “zona de
são, presumivelmente, forçadas a cometer paridade” de 40-60%. De acordo com esti-
suicídio por autoimolação, envenenamen- mativas da ONU Mulheres, os países com
to ou enforcamento. Apesar das ONG e do sistemas eleitorais representativos por
governo, bem como de iniciativas interna- maioria simples dos votos, sem qualquer
cionais de luta contra as mortes por cau- tipo de regime de quotas, não vão atingir
E. DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES 209
CONVÉM SABER
da Declaração de Pequim e da Plataforma de
1. BOAS PRÁTICAS Ação relaciona as obrigações jurídicas com
a realidade, em muitos países, baseado em
Os Direitos Humanos numa Perspetiva relatórios de peritos, bem como em testemu-
de Género nhos de mulheres afetadas. Um outro manu-
O processo de interpretação dos instru- al “Between their Stories and our Realities”
mentos internacionais de direitos humanos foi produzido com o apoio do Instituto de
numa perspetiva sensível ao género já co- Viena para o Desenvolvimento e Coopera-
meçou. Um dos melhores exemplos é a ado- ção e pelo Departamento para a Cooperação
ção, pelo Comité dos Direitos Humanos das no Desenvolvimento do Ministério dos Ne-
Nações Unidas, do Comentário Geral nº gócios Estrangeiros Austríaco, em 1999, para
28, em março de 2000. Ao interpretar o artº comemorar o 20º aniversário da CEDM e é
3º do Pacto Internacional sobre os Direitos uma parte integrante da série de vídeo aci-
Civis e Políticos (PIDCP) no que respeita ma mencionada “Women Hold Up The Sky”.
aos direitos iguais de homens e mulheres no Com esta contribuição o People’s Movement
gozo de todos os direitos civis e políticos, o for Human Rights Education forneceu mate-
Comité reviu todos os artigos do Pacto atra- rial valioso para a formação das gerações fu-
vés de uma perspetiva sensível ao género. turas de ativistas dos direitos das mulheres.
Em 1992, o Comité Latino-Americano e
do Caribe para a Defesa dos Direitos da “Neste momento, gostaria de prestar home-
Mulher (CLADEM) lançou uma campanha nagem às mulheres da Women’s Caucus
que incluiu organizações de todo o mun- for Gender Justice, que tiveram em consi-
do que resultou na redação da Declaração deração as experiências das mulheres na
Universal dos Direitos Humanos (DUDH) guerra, identificaram estratégias para lidar
sob a perspetiva do género. Agora, esta com violações e ultrapassar a oposição in-
Declaração é usada como uma declara- tensa de muitos representantes nas nego-
ção “sombra”, para efeitos pedagógicos. ciações do Tribunal Penal Internacional
O objetivo é encorajar as mulheres não só (TPI), procurando garantir que a violação,
a aprender sobre direitos humanos, mas escravidão sexual, gravidez forçada e ou-
também a incluir neste quadro as suas tras formas de violência baseada no género
próprias experiências, necessidades e de- e sexual são incluídas no estatuto do TPI.”
sejos, expressos na sua própria língua. Mary Robinson, Alta Comissária das Nações Unidas
para os Direitos Humanos. 2000.
Formação para os Direitos das Mulheres
O People’s Movement for Human Rights O Apoio dos Meios de Informação Digi-
Education (PDHRE) fez uma importante tais aos Direitos das Mulheres e das Me-
contribuição para o avanço dos direitos das ninas
mulheres com o seu pioneiro “Passapor- Apesar do hiato digital mundial, mais mu-
te para a Dignidade” e as séries de vídeo lheres do que nunca, especialmente jo-
“Women Hold up the Sky”. O Passaporte vens e mulheres instruídas, têm acesso aos
para a Dignidade com a sua pesquisa global meios de informação eletrónicos e à World
sobre as 12 principais áreas de preocupação Wide Web. Um número crescente destas
212 II. MÓDULOS SOBRE QUESTÕES SELECIONADAS DE DIREITOS HUMANOS
esforço de vários anos a prevenir e elimi- ma das Nações Unidas, que se centravam
nar a violência contra as mulheres e me- exclusivamente na igualdade de género e
ninas em todas as partes do mundo. A empoderamento das mulheres: a Divisão
UNiTE apela aos governos, sociedade civil, para o Progresso das Mulheres, o Institu-
organizações de mulheres, jovens, ao setor to Internacional de Pesquisa e Formação
privado, aos meios de informação e a todo para a Promoção da Mulher, o Gabinete
o sistema da ONU para unirem forças para do Assessor Especial para Questões de
se enfrentar a pandemia global da violên- Género e Promoção da Mulher e o Fundo
cia contra as mulheres e meninas. de Desenvolvimento das Nações Unidas
A UNiTE pretende atingir até 2015 os se- para a Mulher (UNIFEM). As principais
guintes cinco objetivos, em todos os países: funções da ONU Mulheres são:
• a adoção e execução das leis internas • apoiar organismos intergovernamentais,
para enfrentar e punir todas as formas como a Comissão sobre o Estatuto das
de violência contra mulheres e meni- Mulheres, na sua formulação de políti-
nas; cas, padrões internacionais e normas;
• a adoção e implementação de planos de • ajudar os Estados-membros a imple-
ação nacionais multissetoriais; mentarem estas normas, disponibili-
• o reforço da recolha de dados sobre a zando-se para prestar apoio técnico e
prevalência da violência contra as mu- financeiro adequado aos países que o
lheres e meninas; solicitem, e estabelecerem parcerias efi-
• o aumento da consciência pública e mo- cazes com a sociedade civil; e
bilização social; e • manter o sistema das Nações Unidas
• a abordagem da violência sexual nos responsável pelos seus próprios com-
conflitos. promissos sobre a igualdade de género,
incluindo a monitorização regular do
Em 2010, as Nações Unidas agruparam as progresso de todo o sistema.
suas competências e esforços respeitantes
às mulheres e questões de género através da “No âmbito da ordem patriarcal existente,
criação da ONU Mulheres e a Entidade das a CEDM é um documento revolucionário
Nações Unidas para a Igualdade de Género extraordinário, único na sua perceção das
e o Empoderamento das Mulheres. mulheres enquanto seres humanos plenos.”
Shulamith Koenig. 2009.
Os Estados-membros da ONU deram,
desta forma, um passo histórico na ace- Um dos documentos mais recentes para a
leração do processo para se atingirem os aplicação e integração de questões de géne-
objetivos da organização respeitantes à ro na legislação e administração, bem como
igualdade de género e ao empoderamen- no âmbito das próprias Nações Unidas é a
to das mulheres. A constituição da ONU Resolução da Assembleia-Geral das Nações
Mulheres surgiu como parte da agenda Unidas 66/132, para o acompanhamento
de reforma das Nações Unidas, reunindo da Quarta Conferência Mundial sobre as
recursos e mandatos para obtenção de Mulheres, a implementação integral da De-
um impacto maior. Funde-se e constrói- claração e Plataforma de Ação de Pequim e
se sobre o trabalho importante de quatro dos resultados da vigésima terceira sessão
instituições distintas anteriores do siste- especial da Assembleia-Geral, em 2011.
E. DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES 215
ATIVIDADES SELECIONADAS
ATIVIDADE I: a terminologia legal; trabalhar diferentes
PARAFRASEANDO A CEDM perspetivas sobre direitos das mulheres;
debater instrumentos jurídicos que lidam
Parte I: Introdução com os direitos das mulheres.
Esta atividade procura melhorar a compre- Grupo-alvo: Jovens adultos e adultos
ensão da CEDM e é especialmente direcio- Dimensão do grupo: 20-25; pequenos gru-
nada a não juristas que não estão familia- pos de trabalho e debate com o grupo todo
rizados com a terminologia jurídica. Duração: aproximadamente 60 minutos
Material: Cópias da CEDM, papel e caneta
Parte II: Informação Geral Competências envolvidas: leitura e para-
Tipo de atividade: Exercício fraseamento da terminologia jurídica, co-
Metas e objetivos: Sensibilização sobre os municação, cooperação e análise de dife-
direitos das mulheres; familiarizar-se com rentes pontos de vista.
E. DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES 217
Parte III: Informação Específica sobre a intermédio dos homens? Quais são os
Atividade obstáculos à autonomia das mulheres?
Instruções: x O que diz a Constituição do seu país
Depois de fazer uma introdução à CEDM, sobre os direitos das mulheres? Existe
pedir aos participantes que se dividam em disparidade entre a realidade e a Cons-
grupos de 4 ou 5 pessoas. Cada grupo será tituição?
responsável por traduzir uma determinada x Tem conhecimento de algum processo
parte da CEDM para linguagem não jurídi- jurídico a decorrer atualmente a respei-
ca, linguagem corrente. É também possível to dos direitos humanos das mulheres?
entregar o mesmo artigo ou artigos a todos Qual é o assunto? Quais são os direitos
os grupos, o que torna o debate mais in- lesados?
teressante uma vez que diferentes pessoas Sugestões práticas:
poderão entender certas expressões de for- Trabalhar em pequenos grupos de quatro
ma diferente. ou cinco possibilita um debate mais inten-
Dar 30 minutos ao grupo para trabalhar sivo e permite aos participantes silencio-
e depois chamá-los para o plenário. sos ou tímidos uma melhor oportunidade
Cada grupo apresenta a sua “tradução” de se envolverem. Contudo, os resultados
ao grupo inteiro. Deixar tempo para o dos trabalhos de grupo devem ser sempre
debate e esclarecimento de questões. apresentados e debatidos na presença de
Depois, o grupo deve pensar na situa- todos de modo a garantir o mesmo nível
ção no seu país natal. O debate de todas de conhecimento a todos os participantes.
ou algumas das seguintes questões pode Outras sugestões:
ser útil na análise sobre o que pode ser A atividade pode ser realizada com qual-
modificado: quer documento jurídico de acordo com o
x A sua sociedade coloca os direitos das interesse dos participantes e os tópicos do
mulheres separados dos direitos huma- curso.
nos? Como é feita esta segregação: pela
lei? Pelo costume? Parte IV: Acompanhamento
x A segregação é direta? É um “facto da Um acompanhamento adequado pode ser
vida” sobre o qual ninguém fala? a organização de uma campanha para os
x A segregação afeta todas as mulheres? direitos das mulheres.
Se não, quais são as mulheres mais afe- Direitos relacionados/ outras áreas a ex-
tadas? plorar:
x Descreva exemplos particulares de se- Direitos humanos em geral, direitos das
gregação de género. minorias, não discriminação.
x Como respondem as mulheres à segre-
gação? ATIVIDADE II:
x Existem direitos humanos dos quais os O CAMINHO PARA A IGUALIA
homens gozam naturalmente enquanto
as mulheres têm de fazer um esforço Parte I: Introdução
especial para terem esses direitos reco- O caminho para a igualdade é longo e si-
nhecidos? nuoso...
x Existem aspetos da vida onde se espera Os participantes ajudam os viajantes a
que as mulheres devam agir através do encontrarem o seu caminho, por entre
218 II. MÓDULOS SOBRE QUESTÕES SELECIONADAS DE DIREITOS HUMANOS
abordar a forma como na realidade seria a prazo para aumentar a igualdade de gé-
Igualia e sobre os obstáculos: nero?
• As pessoas gostaram da atividade? De • Quais outros grupos são discriminados
que gostaram? na sua sociedade? Como se manifesta
• Qual das três perguntas foi a mais fácil de essa discriminação? Quais os direitos
debater? Qual foi a mais difícil? Porquê? humanos que estão a ser violados?
• Quais são as principais caraterísticas da x Como se podem empoderar os grupos
Igualia? desfavorecidos de forma a poderem re-
• Quais são os principais obstáculos que clamar os seus direitos?
impedem que a sociedade do presente
seja a Igualia ideal? Parte IV: Acompanhamento
• Se tivesse de classificar o seu país en- Considerar a política da sua escola, clube ou
tre todos os países do mundo, no que local de trabalho sobre a igualdade de oportu-
respeita à igualdade de oportunida- nidades em relação ao género e discutir como
des entre homens e mulheres, como o as políticas são implementadas e se são ne-
classificaria numa escala de 1 a 10? 1 é cessárias mudanças ou esforços para elevar a
muito desigual, 10 é a igualdade quase sua instituição ao estatuto da Igualia.
ideal. Direitos relacionados/ outras áreas a ex-
• O que precisa mudar, de forma a cons- plorar:
truir-se uma sociedade onde exista Direitos humanos em geral, direitos das
igualdade de género? minorias, não discriminação.
• Qual é o papel da educação para o em- (Fonte: Rui Gomes et al. (eds.). 2002.
poderamento e os direitos humanos? COMPASS. A manual on human rights
• Justificam-se as políticas de discrimina- education with young people.)
ção positiva enquanto medidas a curto
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