Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
escrito experimento
fotografia performance
michelle
mattiuzzi
merci beaucoup, blanco!
escrito experimento
fotografia performance 1
michelle mattiuzzi
Pode o homem branco calar? (Mombaça, 2016)
Definitivamente não sei onde me encaixo desencaixo reencaixo, pois tem mais de
uma sociedade criada por homens negros e, ainda assim, as mulheres negras são
subalternas a essa tal sociedade; meu sonho é que as próximas mulheres negras se
sintam confortáveis por existir. Realmente queria crer que isso pode mudar, mas
percebo que uma das saídas para pessoas negras que estão ocupando os espaços da
branquitude, o mesmo lugar que eu, é não perder a sensibilidade. Ainda não consigo
deixar de me identificar quando estou indo pra uma festinha normativa branca em
qualquer lugar no mundo e uma mulher negra me pede dinheiro na rua ou então
a mulher negra da festa está trabalhando na cozinha servindo a todos usando um
turbante luxuoso (como em Salvador, Bahia) — definitivamente não acredito que o
negro seja lindo por conseguir manter-se colonizado subalterno,realizando trabalhos
de subserviência. Sinto agredida dolorida e ao mesmo tempo triste reprimida,
quando só vejo gente que parece comigo fazendo os tais “serviços sujos”, e me recuso
a isso. Nesse caso estabeleço diálogo na arte da performance e com o agenciamento
de presença programo experiências na tentativa de reinscrever desorganizar o
estigma de mulher negra e a monstruosidade da representação do corpo negro
feminino numa metrópole colonial. Tenho o desejo de deixar claros os estigmas
escravocratas e estas palavras são um manifesto acerca da minha experiência. Não
estou de acordo com a representação medonha que foi imposta durante todos esses
anos a todas as mulheres negras.
“Nós, mulheres negras, fomos silenciadas, inviabilizadas, marginalizadas,
estupradas por essa sociedade civil chamada Brasil. A representatividade
num país onde 54% da população é negra não deveria nem ser discutida essa
porca representação.”
Paradoxal, não? Não tenho objetivo neste trabalho escrito, apenas escrevo
para pensar a ambivalência dos sentidos do meu corpo de mulher negra no
experimento em performance e nas suas diversas acepções, que são distintas
tanto no aspecto temporal, quanto em relação aos problemas os quais dizem
respeito às minhas experiências sociais entre os anos de 2010 a 2015. O que
significa lidar também com as divergências de pensamentos. Como representar
o que deveria permanecer irrepresentável, na lógica do homem branco
privilegiado? Quais as consequências da tentativa de enunciação do indizível,
no consenso do opressor, visto que o sujeito experimento da performance é uma 7
mulher negra? O que, afinal, é a “mulher negra” na arte contemporânea?
Com essa escrita me recoloco como sujeito e redireciono uma crítica ao olhar
para todas as imagens apresentadas nesse texto, a fim de tornar explícitos os
caminhos que percorri para chegar nesse escrito. É a partir dessas imagens que
posso me questionar e reposicionar as representações do meu corpo em ação,
aos termos (in)definidores da representação do corpo negro desde a colonização
e agora na arte da performance que por mim é nomeada. As fotografias são fios
de condução para a investigação sobre meu corpo que, nesse último momento,
me leva em direção aos trânsitos entre cidades e reflexões acerca de uma escrita
pessoal feminista sobre as experiências sociais que tive em Salvador, São Paulo e
Rio de Janeiro em performance.
No fundo, não consigo deixar de pensar: Mas vale mesmo a pena fazer da minha
imagem experiência de vida um conceito responsável por todas as questões que
põe em jogo o corpo negro, como um conceito primordial de vida fundador e
independente? Aguentaria a minha vida artística com todo este “peso”? Essas
dúvidas me possibilitam aproximar de outras linguagens, e o que faço afinal
nesse escrito é exibir meus pensamentos escritos a mão, organizando em
narrativa no intuito de buscar memórias que me permitam compreender-me
na minha própria existência experiência emergência escrita artística política
performance foda-se.
10
11
REFERÊNCIAS
GUEDES, Cintia (04 de Julho de 2016). Texto E se Hélio fosse hoje, como a
favela chega ao museu na Conferência Hélio Oiticica Para Além dos Mitos, Rio
de Janeiro.
Página 1
Marcelo Paixão,
Performance
Experimentando
o Vermelho em
Dilúvio - São Paulo,
Brasil 2016.
Página 2
Hirosuke Kitamura,
Performance “merci
beaucoup, blanco” - 13
Salvador, Brasil 2013.
Página 8
Alex Oliveira,
Performance “merci
beaucoup, blanco” -
Malmö, Suécia 2013.
Página 11
Hirosuke Kitamura,
Performance “merci
beaucoup,blanco” -
Salvador, Brasil 2013.
#Publicação comissionada pela #Publication commissioned by
Fundação Bienal de São Paulo Fundação Bienal de São Paulo on
em ocasião da 32a Bienal de São the occasion of the 32a Bienal of
Paulo - Incerteza Viva. São Paulo - Incerteza Viva.
oficina lugar de agência e afetos entre modos de fazer, aprender e cuidar
imaginação intervenção nos sistemas de (re-)produção e invenção de mundos
política implicação ética nas contradições e paradoxos das coletividades
FANPAGE OIP