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Fundamentos de Análise das Estruturas: Fotoelasticidade

D.B.Silvaa , M. Thomasa
a Universidade Federal do Pampa - Campus Alegrete

Resumo
A técnica de Fotoelasticidade é uma importante e eficiente ferramenta na determinação de tensões no inte-
rior de materiais fotoelásticos. Em um equipamento denominado polariscópio, há um feixe de luz polarizada
que atravessa o modelo fotoelástico, e após o modelo ser submetido a um carregamento qualquer, obtém-
se imagens coloridas de franjas que servem para encontrar as diferenças de tensões existentes no modelo.
Quando submetidos a esforços externos, esses materiais transparentes também apresentam a propriedade da
birrefringência temporária ou dupla refração, decorrente das alterações que ocorrem nos estados de polariza-
ções da luz que é transmitida através da sua estrutura. Com base nisso, o presente trabalho busca apresentar
uma breve revisão teórica sobre o método de análise experimental da fotoelasticidade, destacando a sua im-
portância no âmbito científico e tecnológico.
Palavras-chave: análise experimental, fotoelasticidade, campo completo, tensão/deformação

1. Introdução "elástico"às deformações e tensões existentes nos ob-


jetos elásticos em observação.
No que tange a análise de estruturas, estudar es-
tados de tensões e deformações e sua influência nos
diferentes componentes é de suma importância do 2. Objetivo
ponto de vista científico e tecnológico. Portanto, com Caracterizar o método experimental da fotoelas-
o passar dos anos diversas metodologias foram im- ticidade empregue na obtenção do campo completo
plementadas tendo este propósito, como a extenso- de tensões/deformações.
metria, a fotoelasticidade e o método de elementos
finitos.
3. Revisão Bibliográfica
Dentre estas, a fotoelasticidade destaca-se por ser
uma ferramenta experimental óptica que auxilia na A técnica da fotoelasticidade trabalha com base
investigação e no estabelecimento do campo de ten- na teoria ondulatória da luz, ou como também é cha-
sões e deformações de materiais transparentes - que mada, teoria eletromagnética de Maxwell. Por ser
apresentam mudança em seu comportamento óptico uma onda eletromagnética, a luz é composta por cam-
em razão de variações do estado de tensões ou defor- pos elétricos e magnéticos normais um ao outro e à
mações - e entrega excelentes resultados mesmo em direção de propagação, sendo ainda variáveis tanto
casos que envolvem geometria e/ou carga complexa no tempo como no espaço. A Figura 1 ilustra o es-
[7]. Ademais, tem como principal vantagem a rapi- quema de uma onda eletromagnética.
dez e simpleza de observação [2] e é o único método As ondas luminosas naturais ou não-polarizadas
capaz de gerar um diagnóstico de campo completo, (lâmpada incandescente, sol) são aquelas que irra-
isto é, apresentar os níveis de deformação e sua dis- diam em todas as direções partindo de uma fonte de
tribuição global. luz, ou em termos de estado ondulatório, aquelas cuja
Seu nome traduz exatamente seu mecanismo de vibração ditribui-se de maneira aleatória ao longo da
funcionamento, "foto"remete a relação com a luz, e direção de propagação (Figura 2).
Preprint submitted to Fundamentos de Análise Experimental 8 de dezembro de 2017
Figura 1: Esquema de uma onda eletromagnética Figura 3: Propagação da luz polarizada

Fonte: http://alunosonline.uol.com.br/quimica/luz-polarizada-nao-polarizada.html

Fonte:http://umaventuracomasaudeambiental.blogspot.com.br

Figura 4: Classificação da luz polarizada


Figura 2: Propagação da luz não-polarizada

Fonte: http://alunosonline.uol.com.br/quimica/luz-polarizada-nao-polarizada.html
Fonte: http://solphisics.blogspot.com.br/2016/01/polarizacao-de-ondas-luminosas.html

Por sua vez, a chamada luz polarizada se pro-


em polarizada. As principais são:
paga em um único plano (Figura 3), caso introduza-
se um polarizador ao sistema, apenas as vibrações • Polarização linear
que apresentam a mesma orientação que a propaga-
ção da onda serão transmitidas. Por isso, a luz pola- • Polarização por absorção seletiva
rizada apresenta vibração em apenas um plano. Em
• Polarização por reflexão
geral são empregues três tipos de luz polarizada, con-
forme apresentado pela Figura 4. • Reflexão por birrefrigência
• Elíptica: é a situação mais convencional de on-
Para uma maior compreensão acerca do tema é
das polarizadas, ocorre quando a vibração da
preciso conhecer um pouco sobre materiais birrefri-
onda eletromagnética forma uma imagem se-
gentes ou fotoelásticos.
melhante a uma elipse.
Os materiais fotoelásticos têm como principal ca-
• Circular: Atingida no momento que a ponta do racterística a propriedade da birrefringência ou dupla
vetor da onda luminosa traça uma hélice cir- refração, considerada a propriedade física mais im-
cular simultaneamente à propagação da luz. É portante associada à fotoelasticidade. Essa proprie-
realizada com o auxílio de um polariscópio cir- dade é temporária, e aparece quando os materiais são
cular. submetidos a esforços externos, que ocorrem quando
há alterações nos estados de polarização da luz que
• Plana: alcançada ao limitar-se a vibração da é transmitida através da sua estrutura. Para avaliar o
onda luminosa em um plano específico.Esse estado de tensões presente no interior desses mate-
efeito pode ser alcaçado utilizando-se um único riais, faz-se uso de técnicas de Fotoelasticidade que
item, que recebe o nome de polarizador plano, utilizam polariscópios fundamentados nas proprieda-
apto a dissipar qualquer elemento que apre- des da luz que é polarizada durante a sua operação.
sente vibração que divirja do plano de polari- De acordo com [1] o fenômeno da birrefringência
zação. temporária associa-se basicamente à elasticidade me-
Existem ainda diversos procedimentos que po- cânica do material, tendo a capacidade de alterar seu
dem ser empregues para transformar luz não-polarizada
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arranjo molecular. Esse efeito acaba não sendo pos- Figura 6: Franjas Isocromáticas e Isoclínicas
sível em materiais cristalinos, pois os mesmos apre-
sentam uma estrutura muito mais rígida.
Conforme [4] materiais birrefringentes apresen-
tam característica transparente e possuem a propri-
edade de dividir o vetor luminoso em duas compo-
Fonte: (Philips, 1998)
nentes ortogonais, transmitindo à elas diferentes ve-
locidades. A Figura 5 apresenta dois eixos óticos,
denominados eixo rápido e lento. No primeiro eixo Outro fator importante que deve ser levado em
tem-se uma transmissão de luz muito maior que no conta na análise de tensões com o uso da fotoelasti-
segundo eixo. cidade é a escolha do material adequado que será uti-
lizado para o revestimento ou para o modelo. Em [3]
Figura 5: Placa birrefrigente Fleury lembra que o primeiro material utilizado para
o este fim foi o vidro. Porém, devido à sua baixa sen-
sibilidade e maleabilidade ele foi sendo substituído
aos poucos por outros materiais. Dentre as princi-
pais propriedades que um material fotoelástico deva
possuir, pode-se destacar algumas:

• Transparência: permite uma classificação rá-


pida do material pela simples observação em
aplicações fotoelásticas em polariscópio de trans-
Fonte: (GOMES, 1984) missão;

Ao incidir uma luz polarizada plana em uma placa • Sensibilidade ótica: o material deve possuir
birrefringente, o vetor luminoso acaba causando um um elevado número de franjas isocromáticas,
ângulo β com o Eixo 1, denominado de eixo rápido, além de uma boa sensibilidade à deformação,
fazendo-se que haja a divisão de duas componentes que se traduz em um valor baixo do coeficiente
de acordo com os eixos da placa. Essas componen- de franja (f);
tes acabam propagando através da espessura h, emer-
gindo do outro lado da placa em instantes distintos, • Fluência: necessita-se que o material não apre-
devido à diferença de velocidade entre elas. sente características suscetíveis à fluência;
Segundo [6] quando há a ocorrência do fenômeno • Comportamento linear: espera-se que o mate-
de elasticidade, observa-se a manifestação de alter- rial apresente uma linearidade entre os estados
nância de franjas. Essas franjas se dividem em dois de tensão e deformação, ocorrendo a mesma
tipos: franjas isocromáticas, que são coloridas quando situação entre o estado de tensão e as proprie-
do uso da cor branca e que são pretas quando do uso dades óticas do material;
de luz monocromática, são constituídas por pontos
que possuem a mesma cor e representam pontos cuja • Rigidez: busca-se materiais que possuam um
intensidade de diferença das tensões principais é a elevado módulo de elasticidade para que o mo-
mesma, e franjas isoclínicas, compostas por pontos delo não apresente distorções e mantenha sua
em que as direções das tensões principais são as mes- forma constante;
mas (Figura 6).
A análise manual através das franjas pode ser uma • Sensibilidade às variações de temperatura: o
tarefa um pouco trabalhosa, entretanto, já existem material deve manter suas propriedades cons-
softwares que processam as imagens por toda exten- tantes, independentemente das variações de tem-
são do componente agilizando o processo. peratura que houver;

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• Compatibilidade de deformações: é de extrema xima confiabilidade e precisão em determinadas con-
importância que o material mantenha a ordem dições de ensaios aliados ao baixo custo. [3] apre-
de grandeza das deformações do modelo plás- senta algumas condições para a escolha desses mate-
tico e do protótipo. riais de revestimento fotoelástico:

Ainda que praticamente todos os materiais trans- • Método de aplicação do revestimento na super-
parentes exibam birrefringência, grande parte deles fície do ensaio;
não apresentam um grau de sensibilidade que seja su-
ficiente para sua aplicação em fotoelasticidade. As- • Sensibilidade;
sim, [4] lista os materiais mais adequados para este
• Efeito de Reforço;
fim:
• Deformação máxima.
• Bakelite BT-61-893: material que possui ex-
celentes propriedades mecânicas e óticas. É Com relação ao mecanismo de ensaio, pode-se
uma resina gliptálica obtida através da reação dizer que os polariscópios são equipamentos ópticos
da glicerina com anidrido ftálico; aplicados na análise de variações das características
ópticas do elemento quando este é submetido à uma
• Castolite: obtida através da moldagem entre
tensão. Existe em duas formas: plano e circular.
duas lâminas de vidro, a castolite é uma re-
Cada qual refere-se ao tipo de luz polarizada à qual
sina de poliéster, transparente e de sensibili-
se destina. Dividem-se ainda em polariscópios de
dade média;
transmissão, conforme ilustra a Figura 7 (referente
• Resina Columbiana (CR-39): se caracteriza por à compreensão de unidades transparentes de materi-
ser um material frágil e de difícil trabalhabi- ais fotoelásticos) e reflexão como apresentado pela
lidade. É composto por um carbono digligo- Figura 8 (modelo propriamente dito com camada de
allyco, podendo ser moldado sob formas de cobertura em componente fotoelástico).
placas, obtendo um ótimo acabamento super- No momento que a estrutura se deforma, essa
ficial juntamente com uma transparência per- camada superficial segue tal deformação, origindo
feita; uma série de franjas isocromáticas as quais podem
ser analisadas através do polariscópio e fornecer in-
• Resina Epóxi (Araldites): de fácil trabalhabili- dícios sobre a disposição das deformações sobre a
dade, possui excelentes propriedades mecâni- superfície do material em questão. Contanto que essa
cas e elevada sensibilidade ao efeito fotoelás- camada tenha uma espessura suficientemente dimi-
tico; nuta, admite-se que tanto a estrutura sob análise e a
camada superficial de revestimento sofrem a mesma
• Borracha de poliuretano: possui um baixo mó-
deformação sem nenhum tipo de desvio.
dulo de elasticidade e elevada sensibilidade (é
A fotoelasticidade pode ser útil nos seguintes ca-
cerca de cinquenta vezes mais sensível que as
sos:
resinas epóxi.
• Aferição de concentradores de tensão tanto em
Conforme apontado em [5], dentre os materiais
situações biaxiais como triaxiais.
citados, os que mais se aproximam de um material
perfeito para ser utilizado na fotoelasticidade são as • Análise qualitativa e quantitativa da distribui-
resinas epóxi, pois possuem uma alta sensibilidade ção da tensão, apontando as regiões mais soli-
ótica em conjunto com a deformação, podem ser fun- citadas,bem como a máxima tensão de cisalha-
didos em grandes espessuras e complicados mode- mento presente no plano e suas direções prin-
los podem ser fabricados através de usinagem (Fi- cipais.
gura [??]). Já para a seleção do revestimento fotoe-
lástico, busca-se utilizar materiais que forneçam má- • Estimar tensões residuais.
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Figura 7: Polariscópio de Transmissão Figura 9: Tensões principais a) simulação numérica placa de
alo; b) padrão de franjas placa PC; c) e d) imagens fotoelásticas
placa PC.

Fonte: (Fakhouri,2009)
Fonte: (Vieira Jr et al,2002)

Figura 8: Polariscópio de Reflexão


viável realizar a avaliação através do polariscópio de
transmissão. Esse processo se torna mais dificultoso
em razão do desvio que os raios luminosos sofrem
ao longo de seu caminho pelo material em análise.
Normalmente a técnica mais utilizada nesses caso é
o chamado streess freezing and slice cutting, o qual
fundamenta-se no comportamento de certo materi-
ais poliméricos quando sofrem aquecimento. Estes
materiais apresentam cadeias primárias ou secundá-
rias em difrentes faixas de temperatura, o que altera
o comportamento dos mesmos (Figura 10)

Figura 10: Tipos de ligações


Fonte: (Fleury,2001)

Em seu trabalho [8] Vieira Jr, Scotti e Rade com-


pararam as tensões principais em soldagens de topo
de placa de aço e polocarbonato através de simula-
ção numérica e da técnica de fotoelasticidade (iso-
cromáticas). A Figura 9 apresenta os resultados en-
contrados. Através dessas comparações, tais autores Fonte: (Fleury,2001)

puderam concluir que os resultados foram muito se-


melhantes, comprovando assim o bom desempenho
do emprego da técnica experimental da fotoelastici- 4. Conclusão
dade na aferição e análise de tensões residuais.
A aplicação da fotoelasticidade em modelos tri- Os conceitos apresentados no presente trabalham
dimensionais é um pouco mais complexa e demanda referem-se à fundamentação teórica a respeito da fo-
algumas técnicas especiais, uma vez que torna-se in- toelasticidade, sendo, portanto, imprescindíveis para

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uma melhor compreensão dos resultados provenien-
tes da análise experimental.
A metodologia se mostrou muito interessante, por
envolver mecanismos relativamente simples, ser uma
técnica não destrutiva e por oferecer uma visualiza-
ção de campo completo - demostrando ser uma ótima
alternativa em análises qualitativas e quantitativas-.
Entretanto, a compreensão do resultados fornecidos
pela mesma exige um certo grau de conhecimento e
experiência do operador, uma vez que envolve a in-
terpretação das franjas e sua correlação com as ten-
sões e deformações.
É importante destacar que um cuidado especial
deve ser tomado em relação ao material selecionado
para ser utilizado, este deve seguir as características
apresentadas ao longo do trabalho.

Referências
[1] M. A.; da Silva C. R.; Toffoli D. J. da Silva, S. Leal;
de Jesus and U.N. Camargo. Análise quantitativa de ten-
sões em amostras fotoelásticas por meio de fotoelastici-
dade. Revista Brasileira de Física Tecnológica Aplicada,
4(1), 2017.
[2] W. F Dally, J. W.; Riley. Experimental stress analysis.
1965.
[3] S.V. Fleury and A.P. ASSIS. Análise da distribuição de
tensões em descontinuidades de rocha utilizando a técnica
da fotoelasticidade. PhD thesis, Dissertação (Mestrado em
Geotecnia)-Universidade de Brasília, Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 147 f. Bra-
sília, DF, 2001.
[4] J.F. Silva Gomes. Análise experimental de tensões por fo-
toelasticidade. 1984.
[5] H.A. Gomide and P. Smith. Material de rápida obtenção
para fotoelasticidade tridimensional. 6o Congresso Brasi-
leiro de Ciências dos Materiais.
[6] P.G. Marting. Fotoelasticidade, primeiros passos. 2005.
[7] E.A. Patterson. Digital photoelasticity: principles, practice
and potential. Strain, 38(1):27–39, 2002.
[8] A. e Rade D.A. Vieira Jr, A.B. e Scotti. Avaliação inicial
da aplicação de fotoelasticidade e soldagem de plásticos no
estudo de tensões residuais em placas soldadas, 2002.

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