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ESTADO
Unitário
centralizado
A centralização política é essencial. Nenhuma nação pode existir sem ela. Nos
governos representativos obtem-se a unidade na legislação e na direção dos negócios
políticos pelo acordo das Câmaras e do Poder Executivo. Por meio do mecanismo
constitucional convergem os Poderes para se centralizarem em uma só vontade, em um
pensamento. Se esse acordo, essa unidade, essa centralização não existe, e não é
restabelecida pelos meios que a Constituição fornece, a máquina constitucional emperrada a
cada momento até que estala.
(p.348)
b
Sem a centralização não seria possível um sistema de comunicações que ligasse as diversas
partes do Império. Cada uma atenderia somente àquelas que lhe fossem especialmente
úteis. Sem a centralização não seria possível a uniformidade de impostos gerais e da sua
arrecadação; a admissão de todos os brasileiros aos empregos públicos; a uniformidade das
habitações necessárias para certos cargos e profissões; a uniformidade dos Códigos, das
jurisdições, das penas, e das garantias, a livre circulação das pessoas; e dos gêneros, e a
igualdade perante a lei. Em uma palavra, sem a centralização não haveria Império.
(p.355-356)
descentralizado
Nos países decentralizados porém, distingue-se entre administração geral e local. Somente
a administração geral é que se pode rigorosamente chamar instrumento do poder executivo
central.
(p.26)
A palavra - descentralização - tem dois sentidos que muito importa distinguir. Descentralizar
no primeiro sentido consiste em renunciar a que a ação do centro esteja toda concentrada
em um ponto, na Capital, por exemplo; é disseminá-la pelas Províncias e Municípios,
entregando-a aos Presidentes e outros agentes do Governo que o representem. Nesse caso,
por mais geral que seja descentralização, há sempre uma única vontade, embora essa
vontade se apresente em muitos lugares, isto é em todos aqueles nos quais se acha um
daqueles funcionários que assim representa o Poder central, e obra segundo as suas
instruções e espírito.
(p.349-350)
Pela segunda espécie de descentralização o Governo do Estado em lugar de entregar uma
parte da sua ação a seus agentes restitui-a à Sociedade. Em lugar de tratar dos negócios do
povo, convida-o a tratar por si mesmo deles. A Sociedade entra na confecção das leis, na
administração e na justiça, como entra entre nos por meio das Assembléias Legislativas
Geral e Provinciais, pelas Municipalidades pelo júri, etc. Quanto mais verdade houver na
formação dessas Corporações quanto maior independência e extensão tiver a sua ação,
maior e mais real será a descentralização, e mais serão multiplicados os centros de vida. A
França possui uma capital, a qual, por circunstâncias cuja exposição seria mui longa, é o
mais poderoso instrumento da sua centralização. As nossas Províncias não seguem do
mesmo modo o Rio de Janeiro, quase colocado em uma extremidade do Império, antes há
em algumas, tendência para olhá-lo com desconfiança e ciúme. Não se dá na França o
espírito de provincialismo essencialmente descentralizador que se dá entre nós.
(p.364)
A descentralização administrativa que trouxe o ato adicional era, pelas razões que acima
foram expostas, até certo ponto justificável. Descentralizando porém as atribuições que
passou para as Assembléias Provinciais, era indispensável fazê-lo de modo que cada um
dos Poderes Geral e Provincial se pudesse mover na sua órbita, sem encontrar no mesmo
terreno, e pôr-se em conflito com o outro. Era indispensável que essa descentralização fosse
meramente administrativa, e não pode deixar de ser única; nem é possível que hajam tantas
políticas quantas Assembléias Provinciais. Seria uma completa anarquia. O ato adicional
dera às Assembléias Provinciais a atribuição de legislar sobre a criação e supressão dos
empregos Municipais e Provinciais.
(p.372)
Não acumularei mais exemplos para provar a tendência anarquicamente descentralizadora
dessas épocas, mas não posso passar em silêncio o projeto de reforma da Constituição, tal
qual foi aprovado pela Câmara dos Deputados em outubro de 1831 e remetido para o
Senado. Esse projeto reduzia o Governo do Brasil a uma Monarquia Federativa, acabava o
Poder Moderador, tornava o Senado temporário, a Câmara dos Deputados bienal, nulificava
a prerrogativa da sanção, suprimia o Conselho de Estado, etc. Para evitar uma longa
exposição de tão importante documento, e porque é raro e pouco conhecido, junto-o no
Apêndice a este volume, bem como as emendas do Senado.
(p.378)
Que tivesse o Poder Provincial faculdade para legislar sobre a nomeação e demissão de
empregos provinciais e municipais relativos a objetos da competência das Assembléias
Provinciais, nada mais justo e regular, e é essa a única inteligência razoável que pode ter o
ato adicional. Entendeu-se porém que o poder Provincial podia legislar sobre a criação,
supressão e nomeação para empregos relativos a objetos da competência do Poder Geral,
ao passo que este não podia, e com razão, legislar e nomear para empregos relativos a
objetos da competência das Assembléias Provinciais! Tal era a descentralização anárquica e
desordenada que trouxe a inteligência, que a opinião democrática exagerada daqueles
tempos dava ao ato adicional. Cortava, cerceava, reduzia a nada a atribuição essencial e
constitucional, conferida ao Poder Executivo pelo art. 102, par. 4 da Constituição. A uma
centralização excessiva também, subversiva e desorganizadora, que entregava às facções
que se levantassem nas Províncias o poder Executivo central de mãos e pés atados!
(p.379)
Para que o sistema eletivo e descentralizador possa funcionar bem é preciso, primeiro que
tudo, que a lei seja, como na Inglaterra e nos Estados Unidos, extremamente minuciosa,
prática e previdente, que penetre, para assim dizer, no seio da administração que não só
prescreva regras, como também o modo de as aplicar, que defina tudo minuciosa e
rigorosamente.
(p.406)
Território
É sem dúvida muito conveniente uma nova divisão de províncias, que faça desaparecer,
quanto as circunstâncias permitirem, a imensa desigualdade que existe, pelo menos entre as
maiores e as mais pequenas; porém, devendo essa medida fazer parte da reorganização do
nosso sistema administrativo, só e destacada não remediaria o mal senão em parte. Não é
possível subdividir as províncias de modo que a ação do Presidente, independentemente de
intermediários seus, chegue eficaz a todos os pontos. Porquanto a nossa organização
constitucional e administrativa, pelo menos enquanto o império não estiver muito povoado,
não é compatível com pequenas circunscrições territoriais.
(p.51)
Essa organização e mui pesada e incompatível, em um país pouco povoado, com pequenas
circunscrições territoriais. Assim ainda que se faça uma nova divisão de províncias, nunca
poderá ser tal o seu território, que a ação administrativa do presidente possa chegar bem,
independentemente de agentes administrativos auxiliares, a todos os pontos.
(p.52)
Isto não tira que seja possível e muito conveniente, no desenvolvimento e reforma das
nossas instituições administrativa, ir dando, àquela, parte de self government que elas
encerram, mais alguma expansão temperada com ajustados corretivos, habituando assim o
nosso povo ao uso de uma liberdade prática, séria e tranqüila, preservado sempre o
elemento monárquico da Constituição, porque, por fim de contas, é para aqueles povos que
nela nasceram e foram criados, essa forma de governo, rodeada de garantias e instituições
livres, a que melhor pode assegurar uma liberdade sólida, tranqüila e duradoura.
(p.412)
ORGANIZAÇÃO DO ESTADO
Quando uma nação tem instituições administrativas conformes com os bons princípios, úteis,
protetoras, arraigadas nos hábitos da população, os novos governos, dada uma mudança
política, servem-se delas; apenas modificam uma ou outra base, um ou outro princípio, mas
não as destroem, nem podem destruir. Servem contudo de garantias. Quando o país não
tem essas instituições, ou as tem mal concebidas, mal assentadas, mal desenvolvidas, cada
mudança política traz completa mudança administrativa, e o arbítrio revolucionário não
encontra empecilho algum.
(p.27)
A circunstância, aliás inevitável, de se achar o poder administrativo, pelo menos o geral,
reunido ao político e governamental, as mesmas mãos, as do Poder Executivo, traz com
efeito o continuado perigo da invasão dos interesses políticos na administração. A tentação é
freqüente e freqüentemente os governos sacrificam considerações e vistas administrativas
importantes a conveniências pessoais e políticas passageiras. A administração trona-se o
vasto campo dos favores, e o meio de procurar e firmar apoio político, às vezes com grande
desmoralização.
(p.28)
Nos países que não possuem instituições semelhantes, completa e praticamente
desenvolvidas, cada mudança de ministério, e de administradores, como são os nossos
presidentes, traz uma inversão às vezes completa não só no pessoal administrativo, como no
modo de encarar e decidir as questões administrativas. O administrador que começava a
tomar pé nos negócios da província é mudado, leva consigo o que a custo aprendeu, e aí
vem outro, o qual, apenas concluídas as primeiras apalpadelas, é também mudado. Et sic de
coeteris. É assim que somos administrados! A cada mudança tudo fica suspenso, posto em
dúvida, para começar a ser examinado de novo, com grande desânimo, desespero, e
prejuízo das partes. Assim todos os grandes interesses a cargo da administração estão
sujeitos a uma constante instabilidade, e a administração torna-se, como tem sido entre nós,
uma verdadeira teia de Penelope.
(p.29)
(...) pode considerar-se como axioma, que a organização política, administrativa e judiciária
de uma país depende muito, e está na mais estreita relação como a sua divisão política,
administrativa e judiciária.
(p.44)
É portanto a antiga divisão das capitanias, divisão do tempo em que o Brasil era colônia, e
administrado pelos Capitães Generais, Ouvidores, Juizes de Fora, Provedores, etc., ainda a
principal base da nossa organização administrativa. A Província de Minas Gerais, com mais
de um milhão de habitantes, e de 15 mil léguas quadradas, a imensa província de mato
Grosso tem a mesma divisão e organização administrativa que a do Espírito Santo, a qual
pouco mais poderá ter de 49 mil almas, e de 820 léguas quadradas. Iguais desproporções
se dão entre a Província da Bahia, e as do Rio Grande do Norte e santa Catarina, as
discrepâncias serão ainda maiores se atendermos às rendas públicas de cada uma. Há
portanto desproporções enormíssimas, quanto à renda, e quanto aos meios de aumentar
esses elementos.
(p.46)
O excesso de poder, em sentido geral, é o fato de tomar a autoridade administrativa uma
decisão, ou praticar um ato excedente das atribuições marcadas pelas leis. Se a autoridade
invade um poder de natureza diferente, há usurpação de poder. Se perturba a ordem
estabelecida pela lei na divisão das atribuições entre os agentes do mesmo poder, há
incompetência. Se desnatura, sem invasão, os poderes que lhe são confiados, há excesso
de poder propriamente dito. Tudo porém constitui ilegalidade e excesso de poder, no sentido
geral.
(p.68)
Não tem faltado quem queira entregar a solução das questões contenciosas administrativas
ao poder judicial. Mas esse modo de proceder traria as seguintes conseqüências: 1) Violaria
o grande princípio da divisão dos poderes; 2) Faria intervir o poder judicial na administração;
3) Embaraçaria a cada passo a administração. 4) Manteria a sua responsabilidade
envolvendo a mesma administração com o poder judicial.
(p.81)
(...) Outras combinações, mais ou menos engenhosas, têm sido abandonadas apenas
nascidas, reconhecendo-se, que é impossível deixar de conceder à administração a
atribuição de decidir certas questões administrativas contenciosas e que o que cumpre é
rodear as suas decisões, de certas cautelas e garantias, que embaracem e evitem o abuso.
Pode-se restringir mais ou menos essa atribuição, reservar maior número de casos ao poder
judicial, mas não é possível entregar-lhe a administração. Demais na nossa organização
atual administração funciona com o contencioso administrativo. O sistema contrário exigiria
uma reforma radical nas nossas instituições.
(p.83-84)
Se, como temos visto, existe e é indispensável um contencioso administrativo; se não deve,
nem pode pertencer ao poder judicial; se é inseparável do poder administrativo, e portanto do
Executivo que o compreende; se é indispensável que as decisões contenciosas sejam
cercadas das garantias que oferecem tribunais, com certa forma de processo e recurso; é
irrecusável conseqüência que deve haver e há, em todos os países que vivem debaixo de
um governo regular, tribunais administrativos com maior ou menor desenvolvimento.
(p.107)
É este o grande defeito das nossas administrações. Têm grande luxo de pessoal. Têm
cabeças enormes, quase não têm braços e pernas. Compare-se o serviço interno de grande
parte das nossas repartições com o externo. Quais são os meios e auxiliares que têm fora?
Gasta-se muito papel, discute-se muito, teoricamente, e o resultado, que se vê e se apalpa, é
quase nenhum. Temos infelizmente grande tendência para o aparato. Uma grande parte
dos nossos regulamentos de secretarias, e outros são mais aparato que realidade, porque
não correspondem a essas repartições meios externos de ação suficiente. (p.119)
Poder Executivo
O Poder Executivo, como veremos, obra como Poder Executivo puro, político, ou
governamental, ou como Poder Administrativo, e daí a distinção entre Governo e
Administração. Como governo. O Poder Executivo aplica por si só e diretamente as leis de
ordem política. Como tal é o promulgador e o executor das leis, por meio de regulamentos e
providências gerais; é o encarregado e o depositário do pensamento político, e da direção
moral dos interesses gerais da Nação, e das suas relações com as outras.
(p.25)
O poder executivo puro, político ou governamental, isto é o governo, é exercido pelo chefe do
Poder Executivo e seus Ministros, direta e indiretamente. O poder administrativo, isto é, a
administração, tem por órgãos uma série de agentes responsáveis e amovíveis. Esta divisão
tende a determinar de uma modo claro e exato a natureza do Poder Executivo, o modo e
limites da sua ação.
(p.53)
Esse Poder não pode deixar de ser centralizado, e de ter porque é responsável, certa
largueza e liberdade de ação, para mover-se, contanto que se contenha nos seus limites
constitucionais, e dentro do círculo das leis. O exercício de suas atribuições, depende de
circunstâncias que não é sempre possível prever e fixar, de uma apreciação larga de grandes
interesses sociais, que não pode ser sujeita a regras minuciosas, nem a uma marcha
complicada e morosa, e á fieira de uma hierarquia de funcionários.
(p.54)
Assim, entre nós, o contencioso administrativo pode ser decidido pelo Poder Executivo puro,
e pelo discricionário e gracioso. A distinção entre o gracioso e contencioso fica por esse
modo sem alcance algum, e sujeita a um mero arbítrio. O nosso processo administrativo é
muito deficiente e perfunctório como veremos oportunamente.
(p.86)
Na monarquia portuguesa absoluta, à qual vivemos sujeitos até a independência, não era
conhecido o contencioso administrativo de hoje. Nem era necessário. Pela sua forma de
governo absorvia o Executivo em si todos os poderes, ou, para melhor dizer, havia um só.
Podia o Rei avocar as causas que pendiam perante juizes e tribunais judiciais, e prover como
entendesse conveniente. Nem qualquer autoridade ia ou podia ir de encontro ao que o
Governo julgasse de interesse público. Tinha este muitos meios para a fazer embicar no
caminho que convinha, e era tão forte que não podia ser, e não era contrariado. Eram os
juizes seus delegados e instrumentos e não havia divisão entre o poder judicial e
administrativo, que jaziam confundidos.
(p.92)
Como chefe do Poder Executivo, com ministros responsáveis, o Imperador acompanha,
discutindo, fazendo observações , cedendo ate certo ponto, movimento que as maiorias que
dominam nas Câmaras imprimem aos negócios, movimento que não deve contrariar,
principalmente quando é conveniente e justo, conforme a opinião nacional, e necessário para
que o Governo se mantenha, segundo as condições do sistema representativo. Deve então
deixar governar os Ministros naquilo que lhes compete e pelo que respondem. O Imperador
como Chefe fiscaliza, observa, dirige o Conselho, atendendo sempre a que os ministros são
responsáveis.
(p.268)
O que é certo é que o Poder Executivo, quer considerado como poder político, quer como
administrativo deve ter concentrada em si quanta força for indispensável para bem dirigir os
interesses comuns confiados à sua guarda e direção.
(p.348)
Poder Judiciário
É por isso que alguns publicistas e algumas constituições consideram o poder chamado
judicial como um ramo do Poder Executivo, embora o constituíssem independente deste.
Contudo, postas de parte as circunstâncias de ser o Poder Judicial também executor das
leis, e de serem os magistrados nomeados pelo Poder Executivo, é aquele distinto deste. A
nossa Constituição não considera o Poder Judicial como ramo do Executivo, mas como um
poder distinto, separado e independente. Arts. 10 e 151. Mas o Poder Administrativo faz parte
do Poder Executivo. Daí se origina a primordial diferença entre o Poder Judicial e o
administrativo, diferença que se deriva da Constituição; porquanto: O art. 9 da Constituição
estabelece que a divisão dos poderes é o princípio conservador dos direitos dos cidadãos, e
o mais seguro meio de fazer efetivas as garantias que a mesma Constituição oferece.
(p.32)
Esta separação entre a autoridade administrativa e a judicial não existe, ou dá-se mui parcial
e confusamente naqueles países cuja organização não admite a divisão dos poderes. E
entretanto a organização política a mais perfeita é aquela em que os poderes se acham
distintos e separados. Assim acontecia pela antiga organização portuguesa, à qual vivemos
sujeitos até e ainda depois da Independência, na parte que a legislação ulterior não tem
alterado. Incumbia a autoridades judiciárias a administração de muitos ramos, e a solução
de muitas questões de natureza contenciosa administrativa. Reunidos nas mãos do mesmo
poder não se discriminava o contencioso judiciário do administrativo. E ainda hoje como
teremos ocasião de observar, não estão esses dois tão diversos ramos prática e
completamente separados.
(p.33)
O poder judicial é instituído para terminar, por meio de sentença, os debates entre
particulares. Logo que a discussão se abre entre a administração como órgão da sociedade,
e um particular, por motivo de colisão entre o interesse geral e um direito privado que não
pertence à orem civil ou penal, cessa a competência do poder judicial. Acresce que o poder
judicial não está habilitado para bem apreciar razões de Estado, e de interesse público, que
devem dominar nos assuntos administrativos.
(p.82)
Mais um exemplo do espírito nivelador dos tempos que precederam e seguiram o 7 de abril,
e que somente se preocupava dos interesses e direitos do indivíduo, não dos da sociedade,
e que embelezado nas teorias sobre a independência do poder judicial, que aliás violava, não
via fora dele nem garantias nem justiça. Assuntos de natureza contenciosa administrativa
eram levados ao poder judicial, e este, até porque não tinha outras, os decidia segundo as
regras e doutrinas, pelas quais resolvia os casos ordinários, secundum acta et probata,
unicamente. Em lugar de reconhecer-se a impropriedade do poder judicial para decidir certas
questões, de sujeitá-las ao contencioso administrativo rodeado de certas garantias e
formalidades, mais sujeito à fiscalização das Câmaras, procurava-se o remédio na violação
flagrante da independência de outro poder !
(p.95)
Na verdade a mistura de atribuições administrativas e judiciárias no mesmo agente, tem
graves inconvenientes. Esta mistura, desde os tempos em que vivemos sujeitos à
Monarquia Portuguesa, tem se dado e ainda se dá entre nós e repugna à divisão dos
poderes.
(p.121)
O poder Judicial é um Poder independente. Faz obrigatórias as suas decisões pelas
sentenças, cuja força de obrigar não depende de mais ninguém. Declarou que tal objeto
pertence a A e não a B. B não pode mais dispor dele, e se o fizer o ato é nulo, ninguém o
respeita. Essa decisão daquele Poder independente, produz seus efeitos,
independentemente de acordo e execução por outro Poder. É decisão do único Poder
competente, sai dele completa e perfeita.
(p.289)
Portugal legou-nos com sua legislação, na época da Independência, a confusão do Poder
Administrativo com o Judicial, confusão própria de um governo absoluto, e portanto de uma
organização que não conhecia a divisão do Poderes. Por aquela legislação exerciam os
juizes muitas e importantes atribuições administrativas. O direito civil e privado, o criminal, o
comercial, o administrativo, e as jurisdições respectivas jaziam indiscriminadamente
envolvidas no avultado montão das Ordenações e leis extravagantes. Estavam as coisas de
modo que a administração não podia preencher a sua missão sem o auxílio do Poder
Judicial, então seu instrumento e subordinado.
(p.370 - 371)
É por isso que os povos que introduziram a eleição no seu maquinismo administrativo viram-
se obrigados a fazer grande uso das penas judiciais, como meio de administração, da qual
se torna portanto parte essencial o poder judicial. Somente este poder pode então servir de
intermédio entre o Poder Central e o Administrador de eleição popular e obrigar este à
obediência sem violar e aniquilar o direito dos eleitores.
(p.407)
O poder judicial não pode inspecionar e fiscalizar o administrativo, acompanhando-o em
todos seus atos. Nem nos Estados Unidos faz isso. É uma mola da máquina administrativa,
mas não é a máquina. Somente pode, mesmo nos Estados Unidos, conhecer de casos
especiais, quando lhe são sujeitos pela parte. Muitas vezes não a há.
(p.408)
Poder Moderador
Demais é esse um dos casos em que o Poder Moderador deve intervir, porque é da sua
missão não consentir que o partido que está no governo ponha tropeços invencíveis ao outro
para gover-
nar, quando as circunstâncias e as conveniências públicas o chamarem ao governo. A
sabedoria da Coroa tem compreendido perfeitamente entre nos essa necessidade
indeclinável do sistema representativo.
(p.162)
Quem o mostrou porém, quem o delineou, quem o criou realmente, e assim o proclamou o
Senador Alves Branco no Senado, foi o Sr. D. Pedro I, primeiramente no art. 98 da nossa
Constituição, depois no art. 71 da Carta Constitucional da Monarquia Portuguesa. São as
únicas constituições que conheço, que consagram um quarto poder, no qual reúnem todas as
atribuições marcada no art. 101 da Constituição, em outros países envolvidas no Executivo.
(p.255)
E para onde se fora tantas Constituições sem Poder moderador, excetuada a Inglesa?
Depois dela, a nossa, com seu Poder Moderador é a mais antiga das conhecidas.
(p.256)
Na maior parte das finadas Constituições, não são poucas, tem sido as atribuições neutras
ou moderadoras acumuladas no Poder Executivo, e é isso, na minha opinião, uma das
causas da sua pouca solidez e duração. “O vício de quase todas as Constituições, diz
Benjamim Constant, está em não haverem criado um poder neutro, e em terem colocado a
soma da autoridade, da qual devera ser revestido, em um dos poderes ativos (...) Quando
aquela soma de autoridade foi reunida ao Poder Executivo houve despotismo. Daí a
usurpação que resultou da ditadura em Roma.”
(p.260)
(...) o poder Moderador não tem por fim, nem tem nas suas atribuições meios, para constituir
nada de novo. Não é poder ativo. Somente tem por fim conservar, moderar a ação,
restabelecer o equilíbrio, manter a independência e harmonia dos mais poderes, o que não
poderia fazer se estivesse assemelhado, refundido e na dependência de um deles.
(p.271)
É a suprema inspeção sobre os Poderes Legislativo, Executivo e judicial, o alto direito que
tem a nação de examinar como os poderes por ela delegados são exercidos, e de manter a
sua independência, equilíbrio e harmonia; é essa suprema inspeção, esse alto direito que a
mesma nação, não o podendo exercer por si mesma, delegou privativamente os Imperador,
revestindo-o das atribuições do poder Moderador. (...) É mais o Poder Moderador um Poder
independente, e não poderia ser independente, se o exercício de suas atribuições
dependesse do assentimento do outro, ou dos agentes de outro. Ver-se-ia muitas vezes
impossibilitado para preencher o seu fim. É um poder essencialmente conservador, como já
vimos. (p.272)
E por que não têm os ministérios procurado dominar a Coroa? Por que a não podem
dominar? Porque a Constituição constituiu o Poder Moderador independente. Porque
constituiu-o não satélite dos Ministros, mas primeiro representante da Nação, e fez um ente
inteligente e livre. (p.308)
CIDADANIA
O art. 9 da Constituição estabelece que a divisão dos poderes é o princípio conservador dos
direitos dos cidadãos, e o mais seguro meio de fazer efetivas as garantias que a mesma
Constituição oferece.
(p.32)