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2. Antes de mais parece-nos claro que estamos num momento em que é preciso realçar as exigências do bem
comum, isto é, a prevalência do bem de toda a colectividade sobre interesses pessoais ou corporativos. A busca do
bem comum supõe lucidez de discernimento e generosidade de comportamentos. Essa salvaguarda do bem comum
sublinha a responsabilidade de todos, na consciência de que a harmonia da sociedade será irremediavelmente
comprometida pela defesa de interesses particularistas. As soluções encontradas e propostas têm de ser globais e
não particulares, privilegiando aquelas que não se limitam a resolver aspectos imediatos do problema, mas são
portadoras de solução a médio e longo prazo, como o são, por exemplo, o investimento na inovação tecnológica,
uma economia geradora de emprego, uma educação para a liberdade responsável, a análise aprofundada das
causas da pobreza e a responsabilização social. O contributo de todos para o desenvolvimento colectivo, faz de
cada cidadão protagonista das soluções, quer pagando os impostos justamente distribuídos, quer empenhando-se
criativa e solidariamente no implementar de soluções.
3. A presente situação leva-nos também, a reconsiderar o papel do Estado na solução dos problemas da sociedade.
A opinião pública reage espontaneamente na linha de exigir ao Estado a solução de todos os problemas. Ora não é
essa a função do Estado numa sociedade plural e democrática, que só progride com a iniciativa e a
responsabilidade de todos. O esforço a desenvolver será prolongado, requerendo o contributo dos partidos
políticos, parceiros sociais, empresas, instituições da sociedade civil e cidadãos. O Estado tem, como primeira
responsabilidade, administrar com rigor os bens públicos, constituídos pelo contributo de todos nós e deve fazê-lo
garantindo bens essenciais, dinamizando e regulando a iniciativa criativa de pessoas e grupos. Do mesmo modo
que a estatização radical da economia e dos serviços não é solução, também o não é a privatização de tudo. É
preciso discernir continuamente a complementaridade entre a função pública e a iniciativa privada, na certeza de
que um justo equilíbrio entre essas funções poderá ser portador de resultados positivos na busca de equilíbrios
económico-financeiros. Na sua função de gerir os bens públicos, o Estado deve exercer a autoridade democrática,
garantindo a justeza das opções e a moralidade na administração, elemento decisivo para a credibilidade do
Estado e a construção da justiça social.
5. Não haverá solução de médio e longo prazo se determinados valores, como a generosidade, a criatividade e a
responsabilidade do bem comum, não forem veiculados pelo sistema educativo. E este não pode ser monopólio do
Estado, mas tarefa de toda a comunidade, em que as famílias, as associações, as igrejas podem ter um papel
relevante. Uma educação radicalmente estatizada não serve uma comunidade plural, onde as responsabilidades e
iniciativas são partilhadas.
Um sistema educativo adaptado à sociedade que queremos ser, vencendo os problemas presentes em ordem a
uma harmonia futura, comunicará modelos de vida a aspirações justas na concepção de felicidade e de bem-estar,
que não dependem apenas de factores económicos. Sentimos que uma das causas dos problemas que atravessamos
são padrões de vida, desajustados do nosso estádio de desenvolvimento e pelos quais se pautam revindicações
consideradas justas. Começa a ser um lugar comum afirmar-se que o país está ou quer viver acima das suas
possibilidades. Um pouco mais de modéstia nos objectivos desejados ajudará a construir caminhos sólidos de
progresso, assentes na objectividade daquilo de que somos capazes. E a história mostra-nos que somos capazes de
muito.
6. E, finalmente, queremos deixar uma palavra de esperança. Análises catastróficas sobre o País e sobre a União
Europeia em nada ajudam a serenidade e a generosidade, essenciais para construir o futuro. Não tenhamos medo
dos momentos difíceis, pois eles constituem, tantas vezes, alicerce de um futuro melhor. Ele só pode ser o fruto
da competência e da generosidade.
Apelamos a todos os católicos para que promovam, dentro das possibilidades ao seu alcance, objectivos do bem
comum nacional e mobilizem as instituições em que se inserem para uma identificação operativa dos meios,
transparência de critérios, rigorosa aplicação na busca das soluções e permanente avaliação dos resultados. Em
particular, desafiamos as Obras sociais da Igreja para uma maior “fantasia da caridade” e para que redobrem os
seus esforços de solidariedade com os mais empobrecidos, designadamente proporcionando-lhes intervenção na
sociedade democrática que a todos cabe construir. Convocamos todos os católicos para dar realismo à esperança,
com o seu compromisso inovador, criativo, impulsionando formas de planeamento e gestão transparente,
participada, cooperante; aproveitando a oportunidade para aprendermos a viver numa cidadania mais esclarecida,
criteriosa, responsável e solidária.