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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão

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02/05/2013 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

RELATOR : MIN. LUIZ FUX


REDATORA DO : MIN. ROSA WEBER
ACÓRDÃO
RECTE.(S) : PRONOR PETROQUÍMICA S/A
ADV.(A/S) : ANDRÉ MACEDO DE OLIVEIRA
RECDO.(A/S) : COMISSÃO DE VALORES MOBILIARIOS - CVM
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL FEDERAL

EMENTA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL


ADMITIDA. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE
SEGURANÇA. PEDIDO DE DESISTÊNCIA DEDUZIDO APÓS
A PROLAÇÃO DE SENTENÇA. ADMISSIBILIDADE. “É lícito
ao impetrante desistir da ação de mandado de segurança,
independentemente de aquiescência da autoridade apontada
como coatora ou da entidade estatal interessada ou, ainda,
quando for o caso, dos litisconsortes passivos necessários” (MS
26.890-AgR/DF, Pleno, Ministro Celso de Mello, DJe de
23.10.2009), “a qualquer momento antes do término do
julgamento” (MS 24.584-AgR/DF, Pleno, Ministro Ricardo
Lewandowski, DJe de 20.6.2008), “mesmo após eventual
sentença concessiva do ‘writ’ constitucional, (…) não se
aplicando, em tal hipótese, a norma inscrita no art. 267, § 4º, do
CPC” (RE 255.837-AgR/PR, 2ª Turma, Ministro Celso de Mello,
DJe de 27.11.2009). Jurisprudência desta Suprema Corte
reiterada em repercussão geral (Tema 530 - Desistência em
mandado de segurança, sem aquiescência da parte contrária,
após prolação de sentença de mérito, ainda que favorável ao
impetrante). Recurso extraordinário provido.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os

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RE 669367 / RJ

Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a


Presidência do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Vice-Presidente),
na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por
maioria, em dar provimento ao recurso, vencidos os Ministros Luiz Fux
(Relator) e Marco Aurélio. Votou o Presidente. Redigirá o acórdão a
Ministra Rosa Weber. Ausentes, justificadamente, o Ministro Joaquim
Barbosa (Presidente), para participar da celebração do Dia Mundial da
Liberdade de Imprensa, na Corte Interamericana de Direitos Humanos,
em São José, Costa Rica, e o Ministro Teori Zavascki.
Brasília, 02 de maio de 2013.

Ministra Rosa Weber


Relatora

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Relatório

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RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

RELATOR : MIN. LUIZ FUX


REDATORA DO : MIN. ROSA WEBER
ACÓRDÃO
RECTE.(S) : PRONOR PETROQUÍMICA S/A
ADV.(A/S) : ANDRÉ MACEDO DE OLIVEIRA
RECDO.(A/S) : COMISSÃO DE VALORES MOBILIARIOS - CVM
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL FEDERAL

RE LAT Ó RI O

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR): Cuida-se de Recurso


Extraordinário, com espeque no art. 102, III, a, da Constituição, contra
acórdão do Superior Tribunal de Justiça assim ementado:

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL.


RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA.
DESISTÊNCIA APÓS PROFERIDA A SENTENÇA DE MÉRITO.
IMPOSSIBILIDADE.
1. A jurisprudência da Primeira Seção e de ambas as
Turmas que a compõem pacificou-se no sentido de inadmitir a
desistência do Mandado de Segurança após sentença de mérito,
ainda que favorável ao impetrante, sem anuência do impetrado.
2. Agravo Regimental não provido."

O Recurso Especial, provido pelo Superior Tribunal de Justiça,


impugnava decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, cuja
ementa ora se transcreve:

“PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL E


ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA.
DESISTÊNCIA DA IMPETRAÇÃO, APÓS A PROLAÇÃO DA
SENTENÇA. POSSIBILIDADE.

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1. Consoante jurisprudência pacificada no seio do E.


Supremo Tribunal Federal, o pedido de desistência do
mandado de segurança pode ser formulado a qualquer tempo,
independentemente da anuência da autoridade impetrada.
Precedentes do Pleno do E. STF.
2. Eventual ocorrência de má-fé processual, com a
propositura de ação diversa, buscando o mesmo bem da vida,
controvertido no mandamus, deverá ser apurada pela vez
primeira pelo MM. Juiz "a quo".
Agravo Interno improvido.”

Esta decisão julgou agravo interno da decisão do relator que


homologou pedido de desistência do mandado de segurança feito pela
Pronor Petroquímica S/A, ora recorrente e, naquela ocasião, apelada. Na
origem, o mandado de segurança discutia ato da Comissão de Valores
Mobiliários que determinou à ora recorrente o refazimento e republicação
das demonstrações financeiras de 31 de dezembro de 2000. A sentença de
primeiro grau determinou o “cancelamento da decisão proferida pelo
Colegiado da CVM, presidido pela autoridade coatora, autorizando a elaboração e
publicação de suas demonstrações financeiras, sem as provisões determinadas
pela autoridade administrativa impetrada, proibindo qualquer sancionamento à
empresa impetrante ou aos seus administradores”.

O recorrente sustenta, em síntese, que: (i) antes da desistência,


possuiria somente decisões favoráveis no processo, de modo que a parte
recorrida não experimentaria nenhum prejuízo com a extinção do
processo; (ii) a desistência do mandado de segurança poderia dar-se
unilateralmente e a qualquer tempo, pois constituiria faculdade da parte,
exercível em qualquer grau de jurisdição; (iii) o Superior Tribunal de
Justiça permitiu a desistência apresentada pela impetrante em outro
mandado de segurança, ajuizado também pela Pronor Petroquímica S/A e
com o idêntico intuito de desconstituir decisão da Comissão de Valores
Mobiliários que determinou a republicação de demonstrações financeiras,
com a única diferença de que as provisões impostas diziam respeito a IPI

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e CSL (REsp nº 930.952) – por esse motivo, a vedação à desistência do


mandado de segurança no presente processo violaria os princípios da
igualdade e da segurança jurídica (art. 5º, caput, CRFB).

Em contrarrazões, sustenta a Comissão de Valores Mobiliários que a


violação apontada, se existente, seria apenas reflexa, já que a
fundamentação do Recurso Extraordinário repousa na alegação de ofensa
aos incisos LV e LIV, bem como ao caput do art. 5º da Constituição.

É o relatório.

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RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

VOTO

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR): O presente Recurso


Extraordinário possui tema restrito e bem definido, qual seja, a
possibilidade ou não de desistência do mandado de segurança pelo
impetrante após a prolação de sentença de mérito. Melhor esclarecendo,
não se trata de desistência do recurso interposto. Questiona-se sobre a
viabilidade de desistência de todo o processo, obliterando as decisões de
mérito nele já prolatadas.

Desde logo, manifesto-me contrário à tese jurídica esposada pelo


recorrente. Uma vez proferida decisão definitiva no Mandado de
Segurança, é inviável o reconhecimento de “desistência da ação”
pleiteada pelo impetrante, porquanto o decisum de mérito tem
potencialidade para o alcance do status de coisa julgada.

Não se desconhece que algumas decisões desta Corte reconheceram


a possibilidade de o recorrente, unilateralmente, proceder a verdadeira
rescisória da decisão de mérito, no exercício de um pretenso direito
potestativo de desistência a qualquer tempo. Entretanto, o tema merece
maior reflexão.

Em primeiro lugar, ressalto que a quaestio iuris jamais foi debatida


com a profundidade devida pelo Supremo Tribunal Federal. Alguns
arestos deste Pretório Excelso, que albergaram a tese sustentada pelo ora
recorrente, apontam como precedente antiga decisão proferida no
julgamento do Mandado de Segurança nº 20.476 (Relator: Min. Néri da
Silveira, julgado em 18/12/1984), aplicando-o sem maiores
questionamentos. Ocorre que o precedente invocado não versou sobre a
desistência requerida após a prolação de decisão de mérito. Eis a ementa

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do aresto:

MANDADO DE SEGURANÇA. COLEGIO ELEITORAL


(ARTS. 74 E 75, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LIBERDADE
DE VOTO. PEDIDO DE DESISTENCIA, APÓS AS
INFORMAÇÕES. TRATANDO-SE DE MANDADO DE
SEGURANÇA PREVENTIVO, DEFERE-SE, DESDE LOGO, O
PEDIDO DE DESISTENCIA, SEM NECESSIDADE DE PREVIA
MANIFESTAÇÃO DE CONCORDANCIA DA AUTORIDADE
IMPETRADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM
JULGAMENTO DO MÉRITO (CPC, ART-267, VIII).

(MS 20476, Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA, Tribunal


Pleno, julgado em 18/12/1984, DJ 03-05-1985 PP-06330 EMENT
VOL-01376-01 PP-00068)

Analisando o inteiro teor do voto do relator, Min. Néri da Silveira,


percebe-se que, naquele caso, o pedido de desistência do Mandado de
Segurança ocorreu antes da prolação de qualquer tipo de decisão, seja
liminar, seja definitiva.

Apreciando outras decisões antigas da Corte, percebe-se que jamais


houve efetivo debate acerca dessa pretensa possibilidade, completamente
extravagante, de fazer desaparecer uma sentença do mundo jurídico por
ato de vontade do autor da demanda.

No RE nº 86.958 (Rel. Min. Décio Miranda, 2ª Turma, julg.


25/08/1978), longe de afirmar um suposto direito potestativo do
impetrante à desistência após a sentença, como pode sugerir a ementa,
reconheceu a Corte, nos termos do voto do relator, a “perda do objeto do
pedido”, que implicaria o “prejuízo da impetração”, em virtude do
cumprimento espontâneo, pela Administração, do quanto pleiteado no
mandado de segurança.

No RMS nº 2.649 (Rel. Min. Afranio Costa, 2ª Turma, julg.

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Voto - MIN. LUIZ FUX

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RE 669367 / RJ

17/06/1955), o inteiro teor do acórdão demonstra claramente que a Corte


reconheceu a desistência do recurso, não, como aqui se pretende, do
mandado de segurança, com efeitos revocatórios da sentença proferida. O
mesmo ocorreu no RMS nº 1.680 (Rel. Min. Nelson Hungria, 1ª Turma,
julg. 01/10/1953).

Essencial, para a adequada solução da controvérsia, diferenciar os


institutos da desistência e da renúncia. Deveras, a sentença que homologa
a desistência (art. 158, p. u., do CPC), porquanto decisão meramente
terminativa do processo, relega em aberto a legitimidade do ato da
administração, cuja higidez vem inspirada por interesse público.
Diversamente, a renúncia ao direito é o ato unilateral com que o autor
dispõe do direito subjetivo material que afirmara ter, importando a
extinção da própria relação de direito material que dava causa à execução
forçada, consubstanciando instituto bem mais amplo que a desistência da
ação. Esta última opera tão somente a extinção do processo sem resolução
do mérito, permanecendo íntegro o direito material, que poderá ser
objeto de nova demanda a posteriori. Afigura-se, assim, evidentemente
teratológico cogitar da extinção sem resolução do mérito em um processo
no qual já houve julgamento desse mérito, sendo isso precisamente o que
ocorre com a desistência do mandado de segurança após a sentença.

É preciso que este Plenário debata o tema com profundidade,


evitando que injustiças sejam realizadas em virtude de má-fé perpetrada
contra o Estado. Com efeito, aquele que figura no polo passivo da
impetração, uma vez proferida decisão de mérito que lhe favoreça, possui
o direito constitucional à imutabilidade de tal decisão acaso o impetrante
demonstre não ter interesse em impugná-la. Não vejo como poderia uma
construção jurisprudencial, sem qualquer base legal ou mesmo
doutrinária, invocando-se, singelamente, a natureza constitucional do
mandado de segurança, afetar o direito igualmente constitucional à coisa
julgada (art. 5º, XXXVI, CRFB). Nem se estranhe o fato de serem
reconhecidos direitos fundamentais ao Estado, tanto mais quando os

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Voto - MIN. LUIZ FUX

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RE 669367 / RJ

exemplos clássicos consistem precisamente nas garantias processuais,


como o acesso à justiça (art. 5º, XXXV) e o contraditório (art. 5º, LV). É a
posição, v. g., em sede doutrinária, do Min. Gilmar Mendes (Curso de
Direito Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 453).

Não se pode descurar do fato de que o processo jurisdicional é um


instrumento público de solução de controvérsias, sendo impossível que o
impetrante, ao seu alvedrio, decida sobre a subsistência da sentença de
mérito, ainda que esta tenha concedido a ordem. O Judiciário não age por
desfastio, nem se lhe pode impor a repetida análise de um mesmo caso.
Aliás, a vedação à reiteração de julgados é o fundamento basilar do
instituto da coisa julgada, conforme aponta autorizada doutrina (NIEVA
FENOLL, Jordi. La cosa juzgada: El fin de un mito. In: Jurisdicción y
proceso – estudios de ciencia jurisdiccional. Madrid: Marcial Pons, 2009).

A proibição de que a parte desista do mandado de segurança,


eliminando a sentença de mérito proferida, possui razões de ordem
pública, considerando a racionalidade da administração da justiça. Por
isso, pouco importa que apenas tenham sido proferidas no processo
decisões favoráveis ao impetrante. Um vez prolatada a sentença de
mérito, a parte apenas pode dispor dos recursos destinados a impugná-la,
mas não lhe assiste a faculdade de afastar a decisão por ato próprio.

Por essas razões, estou de acordo com o voto proferido pelo Min.
Marco Aurélio no RE 167263 ED-EDv, julgado pelo Tribunal Pleno em
09/09/2004, verbis:

Enfim, após a sentença definitiva, não se pode cogitar da


extinção do processo sem julgamento do mérito, isso tendo em
vista postura que a parte, depois da prolação, venha a adotar.
Cabe sim a renúncia, pelo vencedor, à execução, considerado
negócio jurídico que formalize.

No mesmo sentido, colho o seguinte julgado, unânime, da Segunda

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Turma desta Corte:

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. Processo.


Desistência independente de assentimento da parte contrária.
Inadmissibilidade. Feito já dotado de sentença de mérito,
desfavorável ao impetrante. Pendência de recurso.
Homologação negada. Provimento parcial ao agravo, apenas
para cognição do recurso. Não pode o impetrante, sem
assentimento da parte contrária, desistir de processo de
mandado de segurança, quando já tenha sobrevindo sentença
de mérito a ele desfavorável.

(AI 221462 AgR-AgR, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO,


Segunda Turma, julgado em 07/08/2007, DJe-087 DIVULG 23-
08-2007 PUBLIC 24-08-2007 DJ 24-08-2007 PP-00073 EMENT
VOL-02286-13 PP-02519 RTJ VOL-00202-03 PP-01226)

Há, ainda, um aspecto a considerar, relativo ao caso concreto. É que,


segundo alegado pela Pronor Petroquímica S/A, em outro processo
similar lhe foi deferida a desistência do mandado de segurança, mesmo
após a decisão de mérito. Sustenta a referida parte que, por força do
princípio da isonomia, faria jus a idêntica faculdade no presente processo.

Novamente, não assiste razão ao recorrente. A decisão que lhe


deferiu a desistência em caso similar não produz efeitos panprocessuais,
de modo que não vincula os órgãos judiciários a decidir da mesma forma
em outros processos. A pretensão sustentada nas razões do Recurso
Extraordinário equivale a entender que aquela decisão produziu uma
verdadeira coisa julgada da tese jurídica nela encampada, o que, por
óbvio, não se sustenta.

Ex positis, nego provimento ao Recurso Extraordinário.

É como voto.

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RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

DEBATE

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Senhor Presidente, o


eminente Relator está propondo a revisão da jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal, pelo menos em alguns precedentes que encontrei
sempre no sentido de se autorizar a desistência do mandado de
segurança a qualquer tempo.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Isso. Na verdade,


Ministra Rosa, só uma observação, para que não haja uma premissa de
que não seja verdadeira, quer dizer, uma premissa assentada.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: A Ministra ROSA


WEBER fere um ponto que me parece importante: o Plenário desta Corte,
em alguns casos, como no RE 165.712-ED/MG, Rel. Min. SIDNEY
SANCHES (em que houve desistência), entendeu que a desistência era
plenamente legítima, desde que ocorresse em momento anterior ao
julgamento do recurso extraordinário.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Mas isso,


Ministro Celso, significaria que Vossa Excelência faria uma modulação,
quer dizer, se a decisão de mérito for desfavorável, não pode.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Não, a situação a que


me refiro (desistência do mandado de segurança) nada tem a ver com a
questão da modulação dos efeitos da decisão.

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - O Tribunal tem


assentado a possibilidade.

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O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Nada impede que o


autor desista do “writ” constitucional, mesmo naqueles casos em que o
mandado de segurança lhe tenha sido concedido.

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Ele pode até não ter


mais interesse, não é, Ministro? Lembro-me de um caso em que - acho
que eu era ainda advogada - a parte desistiu, a impetrante, porque era
relativo a um concurso público. Ela passou em outro e desistiu desse.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Eu faria uma


indagação prática, porque isso foi o que levou a cessão de direito público
e o Superior Tribunal de Justiça a repensar essa jurisprudência. Fomos à
origem dessa jurisprudência, e essa decisão que Vossa Excelência cita do
Pleno certamente não é anterior à decisão do Ministro Néri da Silveira -
ela é de 84.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Não, o Ministro


NÉRI DA SILVEIRA é autor de decisão sobre a matéria proferida em
momento posterior a 1984 (RE 167.224-AgR/MG, julgado em 21/03/2000).

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Sim. Agora, aqui,


por exemplo, na Segunda Turma, isso foi julgado em 2007 pelo Ministro
Cezar Peluso, não me lembro da composição da Segunda Turma, mas
aqui há essa afirmação.
Então, o que, por exemplo, causava-nos perplexidade era o seguinte:
é que houve uma enxurrada de recursos especiais contra tutelas
antecipadas, e era preciso que houvesse recurso, realmente. Pois bem. A
parte obtinha o benefício, através da tutela antecipada - por exemplo, a
liberação de uma mercadoria -, e depois, então, ela desistia do mandado
de segurança. Isso nos pareceu um artifício contra o Poder Público.
E, por outro lado, ainda que a lei do mandado de segurança
determine a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil e do artigo

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267, a verdade é que, na gênese desse dispositivo, há um determinado


momento em que o Código diz: depois de decorrido o prazo, a resposta
tem que ter anuência do réu, mas desde que seja antes do saneamento,
porque, a partir dali, o processo é do Estado; o Estado tem interesse em
pacificar a ordem social e definir o litígio.
Então, isso é o que ocorre de ordinário no processo de cognição
comum. Agora, no processo do mandado de segurança, manda só aplicar
analogicamente esse dispositivo, que serviria perfeitamente. O que não
nos parece razoável é que se possa assentar a possibilidade de a parte
desistir do mandado de segurança, como regra geral, e isso possa ser
utilizado para obter benefícios contra o Poder Público. Então, essa é a
nossa preocupação. Eu, na verdade, não estou revisitando a
jurisprudência. Essa jurisprudência do Pleno, certamente, é anterior a
2007.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - Não, eu tenho uma, Ministro Fux...

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: É de 2003 ou de


2002...

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - Eu tenho uma de 2009, em que Vossa Excelência foi
Relator, que é justamente do Mandado de Segurança 26.890, em um
agravo regimental submetido ao Pleno, em que a ementa assenta, e vai até
mais longe, Vossa Excelência, na ementa, diz:

"É lícito ao impetrante desistir da ação de mandado de


segurança, independentemente de aquiescência da autoridade
apontada como coatora ou entidade estatal interessada ou, ainda,
quando for o caso, dos litisconsortes passivos necessários, mesmo que
já prestadas as informações ou produzido o parecer do Ministério
Público".

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Tenho outro da minha lavra, que é de 9/8/2007, também do Pleno...

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Aqui estamos em


sede de recurso extraordinário. Já tivemos sentença, apelação, e já tivemos
acórdão do Superior Tribunal de Justiça.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - É o mandado de segurança em que o ...

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Ninguém


desconhece, Senhor Presidente, que a desistência da ação de mandado de
segurança, com todas as consequências jurídicas que resultam desse ato
unilateral da parte impetrante, revela-se conduta processualmente lícita
(RTJ 88/290, Rel. Min. DÉCIO MIRANDA), podendo ocorrer – consoante
observa HELY LOPES MEIRELLES (“Mandado de Segurança e Ações
Constitucionais”, p. 132, item n. 20, 32ª ed., atualizada por Arnoldo Wald
e Gilmar Ferreira Mendes, 2009, Malheiros) – “a qualquer tempo,
independentemente de consentimento do impetrado” (grifei).

Esse saudoso e eminente publicista, ao versar o tema da desistência


do processo mandamental, assim justifica a ampla possibilidade jurídico-
-formal de a parte impetrante, mediante declaração unilateral firmada
por procurador investido de poderes especiais, desistir do “writ”
constitucional (“op. cit.”, p. 132):

“O mandado de segurança, visando unicamente à invalidação


de ato de autoridade, admite desistência a qualquer tempo,
independentemente de consentimento do impetrado. Realmente,
não se confundindo com as outras ações em que há direitos das
partes em confronto, o impetrante pode desistir da impetração, ou
porque se convenceu da legitimidade do ato impugnado, ou por
qualquer conveniência pessoal, que não precisa ser indicada nem
depende de aquiescência do impetrado. Portanto, não havendo
símile com as outras causas, não se aplica o disposto no § 4º

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do art. 267 do CPC para a extinção do processo por desistência.”


(grifei)

O Supremo Tribunal Federal, por isso mesmo – atento ao magistério


da doutrina (CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, “Manual do
Mandado de Segurança”, p. 138, 3ª ed., 1999, Renovar; FRANCISCO
ANTONIO DE OLIVEIRA, “Mandado de Segurança e Controle
Jurisdicional”, p. 177, item n. 7.19, 2ª ed., 1996, RT; J. M. OTHON
SIDOU, “Do Mandado de Segurança”, p. 383, item n. 222, 3ª ed., 1969,
RT; ALFREDO BUZAID, “Do Mandado de Segurança”, vol. I/235,
item n. 151, 1989, Saraiva) –, tem enfatizado não se aplicar, ao processo
de mandado de segurança, o que dispõe o art. 267, § 4º, do CPC,
acentuando, em consequência, em tema de desistência da ação
mandamental, ser absolutamente dispensável a prévia audiência da
autoridade apontada como coatora ou da entidade estatal interessada
(RTJ 114/552, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA – MS 22.129/DF, Rel. Min.
CELSO DE MELLO – RE 255.837-AgR/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO,
v.g.).

Impõe-se advertir, por necessário, que, ainda que sentenciada a causa


mandamental – e eventualmente denegado ou concedido o “writ”
constitucional –, mesmo assim revelar-se-á possível à parte impetrante
desistir da ação de mandado de segurança ou do recurso por ela
interposto, expondo-se, contudo, a todas as consequências jurídicas, de
caráter formal ou de ordem material, resultantes desse ato fundado em sua
declaração unilateral de vontade.

É por esse motivo que, ao julgar o RE 259.343/SP, Rel. Min. CELSO


DE MELLO, proferi decisão assim ementada:

“MANDADO DE SEGURANÇA. DESISTÊNCIA.


POSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE DO ART. 267, § 4º, DO CPC.
PREJUDICIALIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
INTERPOSTO PELA ENTIDADE ESTATAL.

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- É lícito, ao impetrante, desistir, a qualquer tempo, da ação de


mandado de segurança, independentemente de aquiescência da
autoridade apontada como coatora ou da entidade estatal interessada.
Doutrina. Precedentes (STF).
- A desistência da ação de mandado de segurança, quando
manifestada após a prolação da decisão concessiva do ‘writ’
constitucional, torna prejudicado o recurso extraordinário
eventualmente interposto pela parte contrária, em virtude da perda
superveniente de objeto.”

Essa decisão que venho de mencionar simplesmente reflete diretriz


jurisprudencial prevalecente no âmbito do Supremo Tribunal Federal,
que, por mais de uma vez, admitiu a possibilidade de desistência do
mandado de segurança – não obstante concedido pelas instâncias
judiciárias inferiores –, desde que formalizado o pedido antes do
julgamento do recurso extraordinário interposto pela entidade estatal
interessada (RE 144.972/RJ, Rel. Min. ILMAR GALVÃO):

“Direito Processual Civil.


Desistência da ação, antes do julgamento do R.E.
Embargos declaratórios para sua homologação.
Havendo uma das recorridas, ora embargante, antes mesmo
do julgamento do Recurso Extraordinário, desistido da impetração
do Mandado de Segurança, é de ser homologada essa desistência,
ficando, quanto a ela, prejudicado o R.E.
Embargos Declaratórios recebidos para tais fins, nos termos
do voto do Relator, subsistindo o acórdão embargado, quanto às
demais recorridas, não embargantes.”
(RE 165.712-ED/MG, Rel. Min. SYDNEY SANCHES –
grifei)

A colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao discutir


igual matéria, negou provimento a recurso de agravo interposto pela
União Federal, enfatizando, a propósito do tema ora em exame, que, mesmo
concedido o “writ” mandamental à parte impetrante, revelava-se lícito, a

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esta, desistir da ação de mandado de segurança, restando prejudicada,


em consequência, a apreciação do recurso extraordinário interposto pela
pessoa jurídica de direito público interessada, independentemente de
sua prévia aquiescência (RE 167.224-AgR/MG, Rel. Min. NÉRI DA
SILVEIRA).

Vê-se, portanto, que, além de possível, a desistência da ação de


mandado de segurança constitui prerrogativa de ordem processual que
pode ser livremente exercida pela parte impetrante, “sem dependência da
vontade da parte contrária ou da do julgador, e até contra elas, podendo ser
manifestada a qualquer tempo, mesmo após a sentença favorável” (SÉRGIO
FERRAZ, “Mandado de Segurança – Individual ou Coletivo – Aspectos
Polêmicos”, p. 37, 3ª ed., 1996, Malheiros – grifei).

É por isso que tenho a impressão de que a proposta formulada


pelo eminente Ministro LUIZ FUX encerra a intenção de alterar a
jurisprudência desta Corte, tal como observou a eminente Ministra ROSA
WEBER.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Há alguns aspectos


que precisam ser considerados.
O artigo 267 do Código de Processo Civil não versa, no caso, o
afastamento do mundo jurídico de pronunciamento judicial. Refere-se,
sim, à extinção do processo sem julgamento do mérito. Então pressupõe
que o mérito ainda não tenha sido ferido, ou seja, não tenha havido ainda
o julgamento do mérito. Quanto a isso, creio, não há a menor dúvida.
Tem-se, Presidente, no artigo, o § 4º – e aplica-se ao mandado de
segurança o Código de Processo Civil, no que for compatível com a
regência dessa impetração – a revelar, sem qualquer distinção, que – já
não cogito nem mais, como há na espécie, de ato unilateral a alcançar
decisão proferida, e até agora não compreendi, se bem que compreendi,
porque se quer desistir desse mandado de segurança, após a concessão da
ordem – "Depois de decorrido o prazo para resposta, o autor não poderá,

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sem o consentimento do réu, desistir da ação."


Já proclamamos que no mandado de segurança há a autoridade
coatora e a parte passiva, que deverá suportar as consequências do
pronunciamento judicial favorável ao impetrante.
Há mais, Presidente – e então a coisa se torna muita séria. Não estou
a cogitar de a parte, espontaneamente, implementar, sem contraditório,
verdadeira ação rescisória, e lograr a rescisão do que decidido – tem-se
que, concedida a ordem, há comunicações imediatas dessa mesma ordem.
A eficácia é imediata.
E na lei do mandado de segurança surge preceito a revelar óbice a
essa disponibilidade do ato judicial formalizado:

"Art. 19 - A sentença ou acórdão que denegar mandado de


segurança, sem decidir o mérito..." – quer dizer, se decidir o
mérito de forma contrária aos interesses do impetrante, não há
essa possibilidade que vem na cláusula final – "… não impedirá
que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os
respectivos efeitos patrimoniais."

Vejo o móvel desse pedido de desistência, ou seja, viabilizar a


propositura de ação, a nível ordinário, quando a lei do mandado de
segurança é categórica ao consignar que "A sentença ou acórdão que
denegar mandado de segurança, sem decidir o mérito" – é a condição
negativa imposta para questionar-se novamente a matéria, nas vias até
ordinárias. Com maior razão ocorre a impossibilidade, uma vez
apreciado o mérito.
Por isso, no caso, não se pode entender, distinguindo onde a ordem
jurídica não distingue, que, em se tratando de mandado de segurança, o
todo poderoso do processo é o impetrante que, mesmo contando com o
pronunciamento, implementando a ordem, pode vir e dizer,
simplesmente: "Olha, desisto da ação e peço a extinção do processo sem
julgamento do mérito", quando o mérito já foi julgado.

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O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: E se a decisão for


favorável à parte impetrante, não poderia ela desistir da ação de
mandado de segurança?

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Não. Mas, então,


é muito importante.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Ministro, nada surge


sem uma causa. Há um objetivo nessa desistência, sob pena de
assentarmos que a parte não tem interesse jurídico em requerer a
desistência.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: O art. 19 da


Lei nº 12.016/2009 é, na verdade, uma reprodução do que já constava do
art. 16 da Lei nº 1.533/51, valendo observar, ainda, que o Supremo
Tribunal Federal formulou enunciado sumular a respeito desse tema
(Súmula 304/STF), em ordem a deixar consignado que a decisão extintiva
de processo mandamental, sem resolução de mérito, por não fazer coisa
julgada em sentido material, não impedirá o impetrante de ajuizar ação
própria.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Questão da coisa


julgada.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Sim, pois, se a


decisão denegatória do mandado de segurança houvesse apreciado o
mérito, tal fato impediria o reexame da controvérsia nas vias ordinárias,
considerada a existência, em tal hipótese, da coisa julgada material.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Resolve o mérito,


faz coisa julgada!

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Claro...

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O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Vossa Excelência


percebeu a primeira parte do meu voto?

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Extinto o processo


mandamental, sem resolução de mérito, tornar-se-á aplicável o art. 19 da
Lei nº 12.016/2009, porque inexistente, em tal situação, a coisa julgada em
sentido material.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Percebeu a primeira


parte. Empolguei o artigo 267 do Código de Processo Civil. Está bem, é
apenas isso.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Deixei claro em meu


voto que a regra inscrita no § 4º do art. 267 do CPC não constitui
obstáculo legal à desistência, sempre possível, da ação de mandado de
segurança.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – O impetrante teria


brincado com o Judiciário!

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: O impetrante


meramente exerceu uma faculdade processual que é reconhecida pela
própria jurisprudência do Tribunal.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Vossa Excelência


me permite, Ministro Celso?

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Pois não.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Mas, Ministro, não


parti da premissa da existência da coisa julgada. Caso houvesse, não
estaríamos discutindo o tema.

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O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Certamente.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - É que Vossa


Excelência sempre traz lúcidos argumentos, e nós não conseguimos
vencer isso na cessão de Direito Público.
Quer dizer, como é que nós nos depararíamos com essa
possibilidade, ad eternum, da desistência do mandado de segurança, nas
hipóteses em que a decisão é contrária ao impetrante, num primeiro caso,
e aí, a Administração tem interesse em dizer: "Olha, esse meu ato, se vier
a ser atacado...

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Seria uma desistência


por mudança das circunstâncias.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Talvez o impetrante


assim se comportasse, por reconhecer a legitimidade do ato apontado
como coator.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Mas, aí, já é


conhecimento da legitimidade do ato. Isto é mérito. Desistência não é
mérito.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Certo, a desistência


não envolve qualquer exame do mérito da causa.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Agora, uma


outra questão mais difícil que nós nos deparamos é a seguinte: não se
podia evitar recurso especial e de agravo em liminar satisfativa de
antecipação de tutela.
Então, a parte obtinha, através da liminar, o bem que ela pretendia
(liberar uma mercadoria...), conseguia o bem da vida, e, depois, ela
desistia do mandado de segurança. Pelo plano da realidade prática, já

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havia satisfeito a sua pretensão com a simples liminar do mandado, cuja


desistência derruba a liminar também, mas o bem da vida já foi entregue.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - Eu tenho a impressão que o que deu substrato a essa
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que é vetusta, a meu ver, é a
seguinte: o mandado de segurança é um instrumento que foi criado em
favor do cidadão, contra o "arbítrio" do Estado .

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - É tipo uma ação


judicial.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - Então, não se trata, aí, a meu ver, com todo o respeito -
isto do ponto de vista constitucional, sob o aspecto, enfim, questão vista
da Carta Magna -, não se trata de proteger o Estado, ou um ato estatal,
um ato de um agente público, na verdade, então, aqui é o seguinte:
enquanto não transitado em julgado, a meu ver, o cidadão que impetrou
o mandado de segurança, em seu benefício, contra um ato que ele
entendeu abusivo, em tese, pelo menos segundo a jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal, ele pode desistir.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Pode não executar o


pronunciamento judicial.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - É, eu confesso


que tenho dificuldade de preconizar tese diversa.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - Aí, é claro que se agiu com litigância de má-fé, se
causou prejuízo, ele responderá pelas vias próprias.

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O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Vejam as


consequências jurídicas.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Eu ouço o


Colegiado.

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: O “improbus litigator”,


por transgredir o princípio da lealdade processual, expõe-se a sanções
resultantes de seu comportamento malicioso.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Eu, inclusive,


disse que nem levaria isso em conta, questão estritamente jurídica. Eu não
tenho, sinceramente, conforto intelectual de preconizar essa tese, mas
ouvirei o Plenário e adotarei aquilo que for a vontade do Colegiado.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - Vossa Excelência traz uma contribuição extremamente
substantiva à discussão, sobretudo como processualista eminente que é.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Ministro, apenas por


curiosidade, Vossa Excelência apanhou o móvel do pedido formulado?
Qual seria o objetivo?

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Eu procurei não


explorar; eu fui na questão unicamente jurídica porque a eminente
advogada esclareceu, da tribuna, que mudou o panorama, e o próprio
Ministério Público destaca o fato de ter...

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Em última análise,


não se quer ter pela frente um obstáculo à propositura de ação talvez com
largueza maior do que esse mandado de segurança. Daí a insistência em
que seja homologada a desistência sem julgamento do mérito, em que
pese deferida a ordem.

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RE 669367 / RJ

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - Então, vamos colher os votos. Agradeço as intervenções
dos eminentes Magistrados.

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Aditamento ao Voto

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02/05/2013 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

VOTO

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Senhor Presidente,


extremamente enriquecedor o debate. E, sem dúvida, os fundamentos
trazidos pelo eminente Ministro Fux provocam reflexão, mas, com relação
ao tema, tenho posição formada.
Confesso que sempre vislumbrei, conforme Vossa Excelência acaba
de destacar, o mandado de segurança, enquanto ação constitucional,
como uma ação que se funda num alegado direito líquido e certo frente a
um ato ilegal ou abusivo de autoridade. Não vejo lide em sentido
material, controvérsia, enquanto tal, talvez por ter uma visão ortodoxa do
mandado de segurança.
E, nessa medida, Senhor Presidente, penso que deve ser reafirmada a
jurisprudência desta Corte entendendo que a condicionante do artigo 267,
§ 4º, do Código de Processo Civil - que diz que se extingue o processo,
sem resolução do mérito, na hipótese de desistência da ação, desde que,
decorrido o prazo para a resposta, haja a anuência do réu -, no caso da
ação mandamental, não se justifica.
Com relação ao artigo 269 do mesmo Código de Processo Civil, no
seu inciso V, quando diz que se extingue o processo, com resolução do
mérito, na hipótese de renúncia do direito em que se funda a ação, com
todo o respeito, não consigo fazer a aplicação do preceito ao mandado de
segurança como a condicionar o exercício da desistência a essa renúncia
aventada pelo eminente Relator. Entendo que nada impede que, nas vias
ordinárias, desde que, por óbvio, não haja trânsito em julgado da decisão,
o direito possa ser discutido, e não necessariamente retirando-se o
embasamento do mandado de segurança.
Por isso, Senhor Presidente, também, da mesma forma, entendo que
eventual má-fé - o que aqui não se cogita, não é o caso, estamos só na
questão jurídica -, no uso dos instrumentos processuais, deve ser coibida

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Aditamento ao Voto

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RE 669367 / RJ

através do instrumental próprio. E vamos nos valer do próprio Código de


Processo Civil para esse efeito.
Então, reafirmo a jurisprudência da Casa. Entendo que a ação do
mandado de segurança comporta desistência pelo impetrante, a qualquer
tempo, independentemente de anuência da parte contrária.

O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Senhor


Presidente, apenas para corrigir um mal entendimento, o que eu disse foi
o seguinte: eu não condicionei a desistência à renúncia, até porque as
figuras não convivem juridicamente. Ou desiste ou renuncia. Eu quis
dizer que, depois da sentença de mérito no mandado de segurança, o que
pode haver é a renúncia ao direito em que se funda a ação. Foi isso que eu
disse.

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Então, na verdade, eu


complemento. Talvez eu não tenha explicitado, mas compreendi
perfeitamente a colocação do Ministro Fux.

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Voto - MIN. ROSA WEBER

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02/05/2013 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (Relatora Designada):


Contra o acórdão prolatado pelo Superior Tribunal de Justiça, maneja
recurso extraordinário, com base no art. 102, III, ‘a’, da Lei Maior, Pronor
Petroquímica S.A.
Na origem, trata-se de mandado de segurança originariamente
impetrado perante a Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro, em que
apontada como autoridade coatora o Presidente da Comissão de Valores
Imobiliários – CVM, diante da “exigência da republicação das
demonstrações financeiras consolidadas, relativas aos exercícios findos
em 31.12.2000 e 31.12.2001, no que se refere ao item ‘4.b’ da decisão
proferida no Processo CVM RJ 2001/04472 (Registro EXE/CGP
3305/2001)” (fl. 3), esta a exigir provisionamento de ‘contingência
passiva’, ou seja, mera possibilidade de despesa, conquanto pendente
processo administrativo a discutir o débito.
A inicial apontou violado princípio da proporcionalidade, pois o
excesso de conservadorismo contido na decisão implicaria diminuição do
patrimônio líquido da empresa e, em consequência, redução do valor a
ser distribuído a título de dividendos. Além disso, restaria violado o art.
2º, parágrafo único, inciso XIII, da Lei 9.784/99, porque nova interpretação
legal estaria sendo aplicada retroativamente.
Após o deferimento da liminar, o pedido foi julgado procedente (fls.
832-4 dos autos originais). Opostos embargos declaratórios pela CVM,
estes foram rejeitados. Em 31.8.2004, a impetrante requereu desistência,
pleiteando a extinção do feito, sem resolução de mérito (fls. 940 dos autos
originais), pedido homologado por decisão que citou jurisprudência e
doutrina favoráveis ao pleito.
A CVM interpôs agravo regimental dessa decisão (fls. 948-80 dos
autos originais), ao principal argumento de que, “inobstante seja pacífico
que o mandado de segurança admite desistência a qualquer tempo,
independentemente do consentimento do impetrado”, diante da
concessão da segurança, tal decisão teria transitado em julgado para a

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Voto - MIN. ROSA WEBER

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RE 669367 / RJ

impetrante.
O agravo regimental não foi provido, na esteira de jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal que “ por expressiva maioria vem professando
o cabimento da desistência do ‘mandamus’, a qualquer tempo, mesmo
nas instâncias extraordinárias, independentemente da anuência da parte
impetrada”.
Interpostos embargos declaratórios, foram estes rejeitados (fls. 1062-
3 dos autos originais).
A CVM interpôs recurso especial (fls. 1070-80), com base no art. 105,
III, ‘a’, da Constituição Federal, alegando, em resumo, que “a desistência
do writ, sem o consentimento da impetrada, (...) implica em violação ao
disposto no art. 267, § 4º, do CPC”.
O Ministro Herman Benjamin negou seguimento ao recurso especial,
por decisão monocrática (fls. 1715-6 dos autos originais), ao fundamento
de que “a tese recursal [estaria] em confronto com a jurisprudência
[daquela] Corte, no sentido de que, em Mandado de Segurança, o pedido
de desistência prescinde de anuência da parte contrária e pode ser
homologado a qualquer tempo, inclusive após a sentença de mérito”.
A CVM interpôs agravo (fls. 1123-7), provido por nova decisão
monocrática (fls. 1194-5 dos autos originais), diante de precedente da 1ª
Seção do Superior Tribunal de Justiça, o que ensejou a interposição de
outro agravo, desta vez pela impetrante (fls. 1198-1210), ao argumento de
que o citado precedente não teria analisado a questão com base no art.
267, § 4º, do CPC.
O Agravo regimental no agravo regimental no recurso especial nº
928.453/RJ foi julgado pela 1ª Seção do STJ (após afetação do processo a
este órgão, pela 2ª Turma, com o objetivo de unificar a jurisprudência das
Turmas de Direito Público) em 08.6.2011. A 1ª Seção negou provimento ao
recurso, com a seguinte ementa (fls. 1275 dos autos originais):

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL.


RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA.
DESISTÊNCIA APÓS PROFERIDA A SENTENÇA DE MÉRITO.
IMPOSSIBILIDADE.

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RE 669367 / RJ

1. A jurisprudência da Primeira Seção e de ambas as


Turmas que a compõem pacificou-se no sentido de inadmitir a
desistência do Mandado de Segurança após sentença de mérito,
ainda que favorável ao impetrante, sem anuência do impetrado.
2. Agravo Regimental não provido”.

O acórdão, relatado pelo Ministro Herman Benjamin, consignou,


basicamente, que “(...) uma vez entregue a tutela jurisdicional, não há
como transformá-la em julgado terminativo, sem exame de mérito, por
ato unilateral, como pretende a agravante, sob pena de se instalar o
desprestígio à Justiça e à segurança jurídica”.
A impetrante opôs embargos declaratórios, que foram rejeitados (fls.
1299-1302 dos autos originais).
O recurso extraordinário interposto pela impetrante veiculou as
seguintes teses: (i) violação do art. 5º, LIV e LV, da CF/88, por ausência de
prestação jurisdicional decorrente da rejeição aos embargos declaratórios
interpostos contra o acórdão recorrido; (ii) violação do art. 5º, ‘caput’, da
CF/88, especificamente quanto aos princípios da isonomia e segurança
jurídica, porque eram dois os mandados de segurança (distintos apenas
pela taxinomia dos impostos a serem provisionados) impetrados pela
empresa Pronor contra o mesmo ato praticado pela CVM, mas um deles
(REsp 930.952/RJ) transitou em julgado com decisão favorável à pretensão
de desistência da impetrante, ao passo que o outro, de nº 928.453/RJ, teve
destino diverso, motivando o presente recurso extraordinário.
Quanto ao mérito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
estaria consolidada no sentido de que “é facultado ao impetrante desistir
do mandado de segurança a qualquer tempo, independentemente de
anuência do impetrado” (fl. 1317 dos autos originais), e que tal pretensão
seria “exercício de direito potestativo seu, representando uma
manifestação unilateral de vontade” (fl. 1331 dos autos originais).
Distribuídos os autos ao Ministro Luiz Fux, este se manifestou pela
existência de repercussão geral sobre o tema.
O Ministério Público Federal, em parecer de lavra do
Subprocurador-Geral da República, Dr. Wagner de Castro Mathias Netto,

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opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 1366-9), nos termos da


seguinte ementa:

“Recurso extraordinário. Mandado de segurança.


Impossibilidade de desistência, mormente após a sentença de
mérito. Interesse público que não se submete à
discricionariedade do ente privado. Pelo conhecimento e
desprovimento do recurso”.

A repercussão geral da questão foi reconhecida pelo Plenário Virtual


em 16.3.2012 (Tema 530).
Na sessão plenária de 02.5.2013, o relator, Ministro Luiz Fux, negou
provimento ao recurso extraordinário.

Na mesma sessão, abri divergência vencedora, consoante


fundamentação a seguir.

Exponho, inicialmente, as linhas gerais dos entendimentos


favoráveis e contrários à pretensão, conforme ilustrados pelos julgados
desta Suprema Corte. A posição que rejeita o pedido de desistência se
sustenta, principalmente, no argumento de que não seria possível
permitir “que a parte, por ato de inteira disposição de vontade, revogue
ou cancele pronunciamento de mérito emitido pelo Poder Judiciário, para
o substituir por sentença terminativa, extintiva do processo, sem o efeito
de resolução das questões de fundo” (AI 221.462-AgR-AgR/SP, 2ª Turma,
Ministro Cezar Peluso, DJ de 24.8.2007), pois “a jurisdição não pode
assujeitar-se a esse risco, como se a autoridade e a eficácia das sentenças
judiciais ficassem na dependência absoluta da vontade das partes”.
A posição favorável, mais antiga e à qual me filio, se baseia,
especialmente, no argumento de que “não se aplica ao mandado de
segurança o disposto no art. 267, § 4º, do Código de Processo Civil. Como
ensina Hely Lopes Meirelles, ‘não se confundindo com as outras ações em
que há direitos das partes em confronto, o impetrante pode desistir da
impetração ou porque se convenceu da legitimidade do ato impugnado,

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ou por qualquer conveniência pessoal, que não precisa ser indicada nem
depende de aquiescência do impetrado.’” (MS 20.476-1/DF, Pleno,
Ministro Néri da Silveira, DJ de 03.5.85).
A renitência da controvérsia talvez resida no fato de que tais
posicionamentos partem de premissas inconciliáveis e normalmente não
destacadas com a mesma importância dada às conclusões por elas
autorizadas. Quando se diz que não seria possível desistir do mandado
de segurança a qualquer tempo (porque tal atitude representaria ofensa à
jurisdição), está latente nesse juízo a premissa de que o Código de
Processo Civil, como lei geral, supre toda e qualquer necessidade de
integração que a lei do mandado de segurança, como lei especial, possa
requisitar. Em outras palavras, existindo situação de dúvida em face de
questão processual não expressamente definida na lei do mandado de
segurança, tal resposta deveria ser buscada, necessariamente, no CPC. E
esse sistema dispõe que a sentença esgota a prestação jurisdicional (art.
463 do CPC) e que, depois de decorrido o prazo para a resposta, não se
autoriza mais o pedido de desistência unilateral por parte do autor.
Por outro lado, quando se afirma inaplicável, ao mandado de
segurança, o disposto no art. 267, § 4º, do Código de Processo Civil, parte-
se da premissa, igualmente não explicitada, de que a lei do mandado de
segurança pode ser integrada por uma interpretação originada de seus
próprios princípios especiais, não sendo necessário (ou conveniente) recorrer
ao diploma geral.
Não importam ao problema, portanto, apenas as conformações de
certos institutos jurídicos (sentença, desistência, renúncia etc.) ao
mandado de segurança; é preciso abarcar esses juízos que, segundo o
modo como estão construídos tais argumentos, seriam prévios à análise
da desistência propriamente dita.
Parto, assim, da percepção de que existem situações jurídicas que,
em tese, podem ser resolvidas tanto pela aplicação subsidiária do CPC
quanto pela construção de uma solução própria, a partir dos princípios
inerentes ao writ. Algumas dessas escolhas foram realizadas pelo
legislador e, nesses casos, tem-se um dado que, eventualmente, pode ser

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louvado ou criticado em sede doutrinária, mas que não pode ser negado
exatamente como aquilo que é – um dado. Assim, por mais que algum
estudioso do tema repute, v.g., absurda a vedação à condenação em
honorários, nenhum advogado ou juiz está autorizado a desconsiderar,
no plano infraconstitucional, o que dispõe o art. 25 da Lei 12.016/09, nesse
sentido. Poder-se-ia, apenas, questionar a ‘justiça’ do comando, o que
autoriza discussão vastíssima, mas de natureza e função secundárias, de
lege ferenda.
A maior parte dos possíveis problemas, contudo, não conta com
solução prévia ou não foi equacionada claramente pela lei, de forma que
escolhas sobre processos de integração passam a exercer influência direta
(conquanto às vezes velada) sobre as respostas dadas. Relembro, por
exemplo, ampla discussão que se formou em torno do artigo 20 da Lei
1.533/51, segundo o qual revogados “os dispositivos do Código de
Processo Civil sobre o assunto [o mandado de segurança, evidentemente]
e mais disposições em contrário”. Em torno dessa regra houve divisão
entre os defensores do CPC e os que advogavam pela especialidade,
conforme descreve Cássio Scarpinella Bueno (“Mandado de segurança.
Comentários às Leis 1.533/51, 4.348/64 e 5.021/66”. São Paulo: Saraiva, 5ª
edição, 2009, pp. 213-5):

“O que se verifica (...) – quer em doutrina quer em


jurisprudência – , é a existência de certa predisposição para
entender que este art. 20 da Lei n. 1.533/51 é capaz de
evidenciar que a legislação do mandado de segurança é auto-
suficiente e que afasta, por completo, o sistema do Código de
Processo Civil.
Daí ser corrente o entendimento de que a aplicabilidade
subsidiária do Código de Processo Civil ao mandado de
segurança só se dá nos pontos em que a Lei n. 1.533/51 foi
expressa nesse sentido. (...)
Essa forma de entender o dispositivo em comento,
todavia, não pode ser prestigiada. A aplicação subsidiária do
Código de Processo Civil ao mandado de segurança – como, de
resto, a todas as leis processuais civis extravagantes – é de rigor.

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Evidentemente, respeitar-se-ão as peculiaridades


procedimentais do mandado de segurança, até porque
decorrentes diretamente de sua previsão constitucional. Não
poderia a lei (nem mesmo o Código de Processo Civil)
minimizar um direito e garantia fundamental
constitucionalmente previsto e que, a bem da verdade, nem
sequer depende de lei para sua aplicação concreta (CF, art. 5º, §
1º). Não é essa, porém, a inspiração daqueles que pretendem
afastar o Código da Lei n. 1.533/51.
Sem exagero algum, tem perfeita aplicação a estes
comentários a segura lição de Eduardo Ribeiro: ‘A afirmativa de
que a Lei n. 1.533/51 especificou os dispositivos do Código de
Processo Civil aplicáveis, especificação esta exaustiva, não
resiste, data venia, à menor análise. Sem invocação daquele
Código não será sequer possível processar um mandado de
segurança. A Lei n. 1.533/51 não cogita, por exemplo, da
capacidade processual, dos procuradores, da competência, da
forma, tempo e lugar dos atos processuais, das nulidades, dos
requisitos da sentença, assim como de vários outros temas cuja
regulamentação é indispensável para que se possa fazer um
processo’ (Recursos em mandado de segurança (algumas
questões controvertidas), in Mandados de segurança e de injunção,
p. 280)”.

A parte final da citação, ao transcrever posicionamento do Ministro


Eduardo Ribeiro, comprova aquilo que já é sabido – as lacônicas leis do
mandado de segurança criam o problema de definir como complementá-
las. Isso é claro. Mas, para além de veicular a opinião do autor e da fonte
citada, a transcrição tem outros méritos: explicita, em perspectiva
temporal, a inerência do problema enfrentado; retrata a perplexidade
gerada pela alternância entre lacunas e remissões pontuais à utilização do
CPC, relativamente a alguns institutos selecionados (o que favorece a
respeitável ideia de que tais remissões seriam, portanto, exaustivas); e
exemplifica com precisão tanto a posição que confere subsidiariedade
plena ao CPC quanto, indiretamente, indica sua antítese.

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A transcrição sugere, portanto, uma antiga polarização. Proponho,


de início, abordar esse ponto em termos amplos. A primeira suposição, a
ser confirmada ou não, é a de que toda e qualquer imprevisão da lei
especial deveria ser automaticamente regulada pelo Código de Processo
Civil. Aplicada a regra nesse grau de generalidade, é enorme o risco de
desprezo a condicionantes que justificaram a criação e asseguram a
existência do writ em nosso ordenamento: celeridade, simplificação
procedimental, respeito ao vetor básico do instituto, que é a defesa do
cidadão contra a ilegalidade estatal etc. Sobre esses temas específicos,
discorrerei mais adiante; por enquanto, basta perquirir se estaria sempre
o CPC adequado a fornecer a melhor e única solução tanto para uma ação
ordinária qualquer quanto para uma ação autônoma de impugnação de
matriz constitucional e perfil único; ou, dito de outra forma, se ao
intérprete seria adequado reproduzir, incondicionalmente, opção adotada
com parcimônia pelo próprio legislador, como se depreende pela leitura
do art. 24 da Lei nº 12.016/2009.
Ao contrário, se tomada hipoteticamente por autônoma a lei do
mandado de segurança para que se construa, sempre e a partir dos
princípios inerentes a tal ação, respostas originais a todo e qualquer
impasse, surge obrigatório o questionamento acerca do risco de se
permitir à lei especial, com tal postura, a ‘refundação’ de cada um dos
institutos comuns do processo civil que menciona, no sentido de que
passariam a existir tantas ‘desistências’, tantos ‘reexames necessários’ ou
tantos ‘recursos ordinários’ quantas sejam as aplicações de tais verbetes,
espalhadas não só pela lei do mandado de segurança, mas também, por
razoável extrapolação, em toda legislação extravagante. Ter-se-ia, como
resultado potencial previsível, a ruptura total do vínculo com o diploma
geral, o Código de Processo Civil. Nesse sentido, o professor argentino
Ricardo Luis Lorenzetti, adaptando Wittgenstein ao criticar a
contemporânea explosão de microssistemas jurídicos nos ordenamentos,
afirma que “o Código” tem se tornado, em algumas circunstâncias, “o
centro velho da cidade, a que foram se agregando novos subúrbios, cada
qual com seus próprios centros e características de bairro. Poucos são os

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que visitam uns aos outros. Ao centro, apenas se vai de vez em quando a
contemplar relíquias históricas” (“Teoria da decisão judicial –
fundamentos de direito”. Tradução de Bruno Miragem, notas da tradução
de Claudia Lima Marques. São Paulo, RT, 2ª edição, 2010, p. 44).
O objetivo desse exercício é demonstrar a necessidade de se recusar
uma resposta genérica que prescinda dos dados concretos de cada
problema, não importa qual seja a posição adotada. A inviabilidade da
segunda suposição (pelo fechamento do sistema na lei do mandamus) é
mais evidente, mas outra conclusão não pode ser admitida também
quanto à proposta de aplicação irrestrita do CPC, pois a experiência
demonstra que deficiências legislativas existem em todos os diplomas,
inclusive naquele; se é estranho supor uma lei especial que contenha
absolutamente toda a disciplina processual de que necessite, da mesma
forma deve ser julgada a proposição segundo a qual nenhuma solução
estaria faltando ao nosso Código. Diante de um problema enfrentado em
mandado de segurança, é possível que o CPC não ofereça uma resposta
clara; nesse caso, ter-se-á uma revalidação do questionamento original,
num processo circular que tornará necessário decidir, novamente, se a
solução está nos princípios gerais de processo civil ou, ao contrário, numa
construção derivada das especificidades do writ.
É costume afirmar que soluções genéricas e prévias apresentam a
vantagem de afastar casuísmos; mas para isso, é necessário que se
reconheça, inicialmente, a identidade das múltiplas situações
subsumíveis. Agregar à discussão os processos de integração da lei
especial aclara a natureza do problema em seu aspecto mais amplo, mas
não é, em si, fator suficiente para estabelecer uma conclusão, porque as
bases materiais dos problemas versados podem variar grandemente, e de
forma decisiva. Em outras palavras, para a específica questão ‘x’, pode ser
melhor fazer uso do CPC; para a questão ‘y’, pode ser melhor procurar
uma solução interna.
O exame do caso, portanto, continua a ser primordial. Quando
Ministra do Tribunal Superior do Trabalho, tive oportunidade de
enfrentar problemas de interpretação sob essa perspectiva. Como é

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sabido, o direito do trabalho apresenta óbvia especialização (inclusive


constitucional), mas, ao mesmo tempo, se vê ligado ao direito comum por
regra expressa, consubstanciada no art. 8º, parágrafo único, da CLT,
segundo o qual ‘O direito comum será fonte subsidiária do direito do
trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios
fundamentais deste’. Em perspectiva estritamente processual existe o
mesmo liame, diante do que dispõem os arts. 769 (processo do trabalho) e
889 (execução trabalhista), ambos da CLT.
Conflitos interessantes surgem dessa peculiaridade. Cito dois
exemplos. Em 2010, relatei caso no qual as instâncias ordinárias
reconheceram prescrição intercorrente em processo trabalhista. O TST
deu provimento ao recurso de revista por violação do art. 7º, XXIX, da
CF/88. Assim me manifestei, na ocasião, em voto vencedor (TST-RR-
316041-79.1991.5.05.0014, DJ de 28.10.2010):

“A execução trabalhista é disciplinada pelo Capítulo V do


Título X da Consolidação das Leis do Trabalho que, no seu art.
889, determina a aplicação, naquilo que não contrariar as regras
contidas na própria CLT, dos preceitos que regem o processo
dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa
da Fazenda Pública Federal, os quais ora se encontram
dispostos na Lei 6.830/1980 – Lei de Execuções Fiscais. Esta
seria, em tese, a porta de entrada do instituto da prescrição
intercorrente no processo do trabalho (…).
A execução trabalhista nela compreendida, a teor do art.
878 da CLT, a liquidação prescinde de iniciativa do interessado,
uma vez que pode se desenvolver por impulso oficial do juiz,
exceção feita, por absoluta impossibilidade material, à
liquidação por artigos.
Não sendo este o caso, e sim de liquidação por cálculo,
diante da regra inserta no referido preceito consolidado não há
falar, uma vez iniciado o processo, em inércia da parte a
implicar a perda do direito à execução pela intercorrência de
prescrição.
Afigura-se inadmissível, inclusive em atenção à finalidade

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social que não só informa o direito material do trabalho como


também justifica a particularidade do direito processual
correspondente, que o juiz transfira à parte ônus que lhe cabe,
penalizando-a quando bastante à viabilização do natural
andamento do feito, em face dos instrumentos que lhe fornece a
legislação processual, tão-somente a sua própria atuação. Isso
porque é característica desta Justiça Especializada, a teor do art.
765 da CLT, a ampla liberdade dos juízos e tribunais na direção
e condução do processo, cabendo-lhes velar pelo célere
andamento das causas que lhe são submetidas, bem como
determinar qualquer diligência que se mostre necessária ao seu
esclarecimento.”

De outra forma, no julgamento do RR-4600-80.2008.5.13.0007, DJ de


19.12.2011, entendi aplicável o art. 475-Q do CPC às lides trabalhistas:

“O Tribunal Regional determinou a constituição de


capital, com fulcro no art. 475-Q do CPC (…).
Nas razões da revista, defende a reclamada que ‘não existe
omissão da legislação processual do trabalho, acerca da fase de
execução no processo trabalhista, pressuposto indeclinável para
que se possa aplicar subsidiariamente o direito processual
comum’. (...)
Não merece conhecimento a revista. (...) Entendo (…) que
inexiste impedimento à aplicação do disposto no art. 475-Q do
CPC no processo do trabalho, à evidência da omissão da CLT a
respeito da constituição de capital, como garantia ao
adimplemento de obrigações decorrentes de ato ilícito do
empregador, consistentes em prestações sucessivas, a par,
outrossim, da inexistência de qualquer incompatibilidade
daquela norma com os preceitos celetistas, em atenção ao
permissivo contido no artigo 769 da CLT, verbis:
‘Nos casos omissos, o direito processual comum será
fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto
naquilo em que for incompatível com as normas deste
Título’”.

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Ao iniciar as considerações sobre a hipótese em exame, fiz referência


ao fato de que os argumentos mais comumente reiterados, tanto a favor
como contrários à desistência no mandado de segurança, parecem tomar
como premissa uma decisão prévia e implícita a respeito da melhor forma
de integração para, a seguir, analisar o caso concreto, já predeterminado
o resultado a atingir. Em virtude das considerações supra, entendo,
porém, mais adequado inverter essa abordagem e partir dos aspectos
concretos de cada controvérsia para, em um segundo momento,
determinar a melhor forma de integração. Tomando os exemplos
extraídos da jurisprudência do TST, vê-se que estes analisaram (i) uma
situação processual específica, (ii) as relações entre leis (gerais e especiais)
e (iii) os princípios do direito do trabalho e do processo do trabalho e as
possibilidades de convergência entre estes e aquelas. Intuitivo, portanto,
que o critério de valoração está na especialidade e em suas
condicionantes, pois a dúvida surge por causa da lei especial, e não
apesar dela. Essa afirmação não representa uma resposta antecipada à
questão do melhor método de integração, como poderia parecer em uma
leitura açodada: como visto, desde que se parta do caso, é possível
concluir que a lei geral conferirá o acolhimento devido a uma justa
pretensão que não se encontra expressamente amparada pela legislação
específica, como ocorreu com a adoção, pela justiça especializada, do art.
475-Q do CPC nas lides relativas a acidentes do trabalho.
O mandado de segurança é ação autônoma de impugnação, possui
configuração especial e status especialíssimo, de índole constitucional.
Celso Agrícola Barbi chegou a dizer que ao “colocar na Constituição o
procedimento do Mandado de Segurança”, nosso Constituinte de 1934
“cometeu um grande erro técnico, mas foi um grande acerto político”
(“Mandado de segurança: fundamentos históricos e constitucionais”. In
“Mandado de Segurança”. Sérgio Ferraz (org.). Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris e Instituto dos Advogados Brasileiros, 1986, p. 77). Ao
dizê-lo, o professor tinha em mente as seguintes considerações (p. 72):

“Nós devemos lembrar que a luta contra os abusos do

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Poder Público é multimilenar. Não é uma luta nova. A certa


altura, nós poderíamos distinguir a luta contra os atos
excessivos do Poder Legislativo. Quer dizer, quando o Poder
Legislativo, através de leis, tirava os direitos que nós
consideramos inalienáveis do cidadão. Infelizmente, nem
sempre a lei contém os direitos. Isso foi objeto de grandes lutas
e acabou resultando numa grande conquista, que é o
constitucionalismo moderno, no qual o cidadão encontra
amparo contra os excessos do Legislativo. Mas também no
Executivo, mesmo quando passou a ser controlado, quando
entramos no Estado de Direito, segundo o qual a administração
está vinculada às leis e aos direitos, mesmo neste caso,
encontramos sempre as hipóteses de áreas em que o Executivo,
nem sempre por má fé, mas às vezes por ignorância quanto a
situações de fato, ou má interpretação da lei, acaba violando o
direito do cidadão, saindo, portanto, da lei. E até mesmo o
Judiciário, ao aplicar a lei, erra. Evidentemente temos, aqui,
recursos, muitas vezes suficientes, outras vezes não. Mas em
resumo, o que se observa é que todos os três poderes praticam,
com certa frequência, violações de direitos do cidadão. (...) Os
mais frequentes casos, contudo, são os excessos do Executivo e
aí temos o Mandado de Segurança como o mais perfeito
instrumento que o nosso Direito já construiu”.

Essas breves considerações históricas situam os reflexos da gênese


do mandado de segurança em sua disciplina. Nesse sentido, colho um
exemplo encontrado diretamente na Constituição Federal, no tocante à
delimitação das competências dos Tribunais Superiores, e incidente sobre
premissa básica do sistema processual civil, qual seja, a paridade de
armas. Trata-se, especificamente, do que dispõem os artigos 102, II, ‘a’ e
105, II, ‘b’, verbis:

“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal,


precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
(...) II - julgar, em recurso ordinário:
a) o "habeas-corpus", o mandado de segurança, o "habeas-

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data" e o mandado de injunção decididos em única instância


pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão;

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:


(...) II - julgar, em recurso ordinário:
(...)
b) os mandados de segurança decididos em única
instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais
dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando
denegatória a decisão”.

A respeito dessa peculiaridade, assim comenta Cássio Scarpinella


Bueno (Op. Cit., pp. 147-9):

“(...) o ordinário [é] recurso de fundamentação livre, isto é,


não vinculada. Por recurso de fundamentação livre deve-se
entender aquele que se presta a discutir qualquer tipo ou
espécie de vício ou de erro contido no julgamento. (...) O
recurso ordinário pode-se voltar, por exemplo, para a discussão
exclusiva da existência, ou não, de ‘direito líquido e certo’ em
favor do impetrante, que é (...) matéria substancialmente de fato.
(…) Como o recurso ordinário só cabe quando denegatória
a decisão do mandado de segurança, não há como deixar de
reconhecer que ele é recurso instituído em benefício do
impetrante. (...).
A previsão unilateral do recurso ordinário, isto é, só em
benefício do impetrante, não significa qualquer desequilíbrio na
igualdade das partes ou, mais amplamente, qualquer violação
ao princípio da isonomia. O mandado de segurança, nunca é
demais repetir, é medida judicial instituída contra os
desmandos do Poder Público ou entidade a ele equiparada
(exercício de função pública). Destarte, nada há de errado na
previsão de recurso de fundamentação livre e, por isto mesmo,
mais amplo, mais propício para o reexame da decisão recorrida,
somente para a parte intrinsecamente mais fraca da relação
processual, o impetrante”.

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Destaco que recursos especiais e extraordinários não permitem


‘(re)exame de provas’. Concedida a segurança, não poderá a pessoa
jurídica de direito público (ou quem lhe faça as vezes), ainda que
convencida de equívoco determinante sobre análise de fato, pretender,
com sucesso, a reversão do julgado por uma dessas vias recursais, com
base nesse argumento. Em sentido oposto, se a ordem não foi concedida
porque ausente ‘direito líquido e certo’, o impetrante pode interpor
recurso ordinário, assemelhado a uma apelação, sendo-lhe facultado
discutir fatos com profundidade, além do próprio direito vindicado.
Novamente citando Celso Agrícola Barbi (Op. cit., pp. 82-3):

“ (...) Justificação pra isto existia. E numerosos autores a


defenderam. Eu mesmo a defendi. Apesar de quebrarem
aparentemente o princípios da igualdade das partes, o
quebravam em favor do particular em geral e não em favor do
Poder Público. E nós sabemos que o particular merece mais
proteção do que o Poder Público, porque em geral a opressão
quando vem é do Poder Público, e não, do particular”.

Poder-se-ia argumentar que tal circunstância, devidamente resumida


no art. 18 da Lei 12.016/09 (‘Das decisões em mandado de segurança
proferidas em única instância pelos tribunais cabe recurso especial e
extraordinário, nos casos legalmente previstos, e recurso ordinário,
quando a ordem for denegada’), tem alguma contrapartida no art. 14, §
1º, da mesma Lei, pois ‘concedida a segurança, a sentença estará sujeita
obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição’. Abstraída a constatação
imediata acerca da diferença de tratamento entre decisões originárias de
primeiro e segundo grau, o reexame necessário é, inequivocamente, ao
menos em face daquelas, medida protetiva dos interesses da Fazenda
Pública, cabível também no mandamus.
Ainda aqui, porém, particularidades estão presentes. O art. 475 do
CPC, ao sujeitar certas sentenças ao duplo grau de jurisdição, delas retira
a eficácia até que eventualmente confirmadas pelo tribunal; já o art. 14, §

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3º, da Lei 12.016/09 permite a ‘execução provisória’ da sentença


concessiva da ordem (mais propriamente, a efetivação do comando
jurisdicional que determina a cessação da ilegalidade), ainda que sujeita a
duplo grau de jurisdição, ‘salvo nos casos em que for vedada a concessão
da medida liminar’, ou seja, quando esta tiver ‘por objeto a compensação
de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do
exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a
concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de
qualquer natureza’ (art. 7º, § 2º, da Lei 12.016/09). Acrescente-se o que
dispõe o art. 15 da Lei 12.016/09, ao permitir pedido de suspensão de
liminar ou sentença; esses pleitos só são cabíveis, ‘a requerimento de
pessoa jurídica de direito público interessada ou do Ministério Público’,
para ‘evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia
públicas’, do que se extrai não só a imediatidade dos efeitos do julgado
proferido em sede mandamental (sem o que não haveria razão em se
proporcionar um meio de impugnação próprio, consistente no pedido de
suspensão), quanto os limites estritos de cabimento dessa via processual
disponibilizada para levantar a eficácia imediata inerente à ordem.
Delinear as limitações incidentes sobre o reexame necessário em
mandado de segurança dá ensejo a que se introduzam outras
particularidades refletidas no próprio provimento mandamental. Com
apoio na clássica obra de Hely Lopes Meirelles (hoje englobada em edição
também assinada por Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes,
‘Mandado de segurança e ações constitucionais’, Malheiros, 34ª edição,
2012), é possível precisar que: (i) “a execução da sentença concessiva da
segurança é imediata, específica ou in natura, isto é, mediante o
cumprimento da providência determinada pelo juiz, sem a possibilidade
de ser substituída pela reparação pecuniária” (p. 116); (ii) as sentenças
concessivas da ordem “são sempre de natureza mandamental, que repele
o efeito suspensivo e protelatório de qualquer de seus recursos”,
enquanto que, ao contrário, “a decisão denegatória da segurança ou
cassatória da liminar produz efeito liberatório imediato quanto ao ato
impugnado, ficando o impetrado livre para praticá-lo ou prosseguir na

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sua efetivação desde o momento em que for proferida” (p. 120); e (iii) “a
coisa julgada pode resultar da sentença concessiva ou denegatória da
segurança, desde que a decisão haja apreciado o mérito da pretensão do
impetrante e afirmado a existência ou a inexistência do direito a ser
amparado. Não faz coisa julgada, quanto ao mérito do pedido, a decisão
que apenas denega a segurança por incerto ou ilíquido o direito
pleiteado, a que julga o impetrante carecedor do mandado e a que
indefere desde logo a inicial por não ser caso de segurança ou por falta de
requisitos processuais para a impetração ou pelo decurso do prazo para
impetração (art. 10 da Lei 12.016/2009)” (pp. 127-8).
Destaco, especialmente, o desenvolvimento a ser extraído do item
(ii), supra, no que tange ao chamado ‘efeito liberatório imediato quanto ao
ato impugnado’: ao desistir de um provimento jurisdicional favorável em
mandado de segurança, sujeita-se o impetrante à prevalência do ato
administrativo que, antes, buscou afastar, como se o writ jamais houvesse
sido impetrado; ressurge, integral, a autoexecutoriedade do ato
administrativo. Na esteira de Alfredo Buzaid, é necessário relembrar que
a “característica fundamental” do mandado de segurança consiste,
justamente, “na possibilidade de compelir a autoridade pública a praticar
ou deixar de praticar algum ato” (“Do mandado de segurança – Vol. I”.
São Paulo: Saraiva, 1989, p. 67), possibilidade da qual o impetrante, ao
desistir, abre mão. Não por acaso, em clássica obra sobre o tema, o
Ministro Castro Nunes afirmara que “mandado de segurança é,
materialmente, recurso administrativo, porque tem por objeto matéria
contenciosa administrativa: jurisdicionalmente, remédio judiciário. Em
uma palavra: contrôle judicial da administração, aplicação do princípio
anglo-americano dos writs da common law, cujas origens conhecidas estão
na Curia Regis e no seu sucedâneo, o King’s Bench, atestando uma
superintendência que mais tarde passou para os tribunais, sôbre os
funcionários da administração, destinada a corrigir-lhe os desmandos e
erros – ‘against the wrongful or erroneous exercise of administrative power’ –
derrogatória do princípio da separação dos podêres, em que se baseia o
dualismo jurisdicional do sistema francês” (“Do mandado de segurança e

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de outros meios de defesa contra atos do Poder Público”. Rio de Janeiro:


Forense, 6ª edição, 1961, p. 73).
A sentença do mandado de segurança remete, portanto, a uma
necessária atuação ou omissão administrativa anterior. Como disciplina o
art. 5º, I, da Lei 12.016/09, atualmente em vigor, ‘não se concederá
mandado de segurança quando se tratar de ato do qual caiba recurso
administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução’,
apesar de ser viável, em outras circunstâncias, a impetração de tipo
preventivo. Se a Administração não pode praticar o ato, não há interesse
de agir; se o writ é ‘remédio’, como se costuma dizer, é porque existe algo
ser combatido, o que evidencia uma relação de causalidade. O contexto
fático permissivo da impetração preventiva é esclarecedor: o ato ainda
não foi praticado, mas há concreta expectativa de que o seja – o que
equivale a dizer que o agir ou omitir não encontra óbice em quaisquer
impedimentos que não a própria oportunidade administrativa.
Administrativistas contemporâneos, como Marçal Justen Filho
(“Curso de direito administrativo”. São Paulo: RT, 9ª edição, 2013, p. 417),
definem autoexecutoriedade como “a possibilidade de a Administração
Pública obter a satisfação de um direito ou dirimir um litígio de que
participa sem a intervenção imediata do Poder Judiciário, produzindo os
atos materiais necessários a obter o bem da vida buscado”. A
Administração, portanto, pode perseguir interesses sponte sua, desde que
se atenha à lei. Desrespeitada esta, uma forma de insurgência, talvez a
mais nobre, é o mandado de segurança; não por outro motivo o art. 5º,
LXIX, da CF/88, menciona expressamente os termos ‘ilegalidade ou abuso
de poder’. Como ensina Castro Nunes:

“O que se resolve pelo mandado de segurança é relação de


direito público, definida pelo dever legal da autoridade e pelo
direito correlato de se lhe exigir o cumprimento dêsse dever.
(…) A defesa do direito se define, nas relações de direito
público, pela defesa contra a ilegalidade funcional do Poder
Público. É preciso não perder de vista êsse traço fundamental”
(Op. Cit., pp. 76-7).

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RE 669367 / RJ

Os cidadãos necessitam fazer uso do Judiciário quando litigam uns


com os outros, pois não possuem autorização para executar de pronto
(salvo raríssimas exceções) aquilo que consideram ser suas próprias
razões. No Poder Judiciário, portanto, a diversidade enorme de lides
instrumentalizadas pelo Código de Processo Civil tem guarida; a razão de
ser do art. 267, § 4º, do CPC, deriva dessa inafastabilidade e reside no
idêntico direito à tutela jurisdicional que o réu passa a ter, no processo
comum, a partir do momento em que integra o processo, em paridade de
armas. Trata-se de lição clássica e, por isso, cito E. D. Moniz de Aragão:

“A outorga ao autor do poder de desistir da ação e assim


encerrar o processo é fruto da concepção tradicional, que
enraíza no princípio dispositivo; ampara-se neste raciocínio: se
lhe é livre iniciá-lo, pode também pôr-lhe fim. O
reconhecimento ao réu do direito de ser ouvido a propósito da
desistência é, por sua vez, corolário do princípio da
bilateralidade do direito de ação (e da própria relação
processual); se é certo que somente o autor pode exercê-lo,
também é certo que o réu, chamado a juízo, adquire, por sua
vez, direito à composição jurisdicional da lide, o que
fundamenta a faculdade de exigir que o processo siga avante e
chegue ao fim. A primeira idéia decorre da vetusta tese
privatista, a segunda reflete o moderno espírito publicista.
(…) Em primeiro lugar avulta a razão de ser do preceito;
dado que espelha o princípio da bilateralidade do direito de
ação, é irrecusável que, ao exercê-lo, o autor cria para o réu o
direito de obter a prestação jurisdicional no próprio processo a
que fora convocado. Logo, a partir do momento em que
consumada a citação inicial deve extinguir-se para o autor a
faculdade de desistir da ação e encerrar o processo sem
anuência do réu” (“Comentários ao Código de Processo Civil –
vol. II”. Rio de Janeiro: Forense, 2005, pp. 452-3).

Para o sistema codificado, desistir unilateralmente da ação proposta

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RE 669367 / RJ

seria indício de uma tendência privatista do processo, já historicamente


superada, e de uma concepção, também vetusta, de interesses
assegurados por ações específicas, às quais aqueles corresponderiam
quando violados. É disso que se trata, quando se destaca o caráter
publicístico e abstrato do direito de ação, assim como da contrapartida
representada pelo interesse do réu – aspectos processuais autônomos que
são diversos do direito material vindicado. Acredito haver, portanto, uma
distância considerável entre as bases do art. 267, § 4º, do CPC e os
fundamentos clássicos do remédio constitucional. A menos que se diga
que o Estado, em sua função administrativa, teria passado a necessitar do
Poder Judiciário para executar as suas atividades, trazer para o mandado
de segurança a incidência daquela regra resulta em contrassenso, pois,
por definição, o mandado de segurança é instrumento de defesa do
cidadão contra ato de autoridade que, na sua gênese, independe de
autorização ou chancela judicial para produzir efeitos. O Estado não
necessita da tutela jurisdicional em mandado de segurança como um réu
qualquer (inclusive o Estado, eventualmente) dela necessita em uma ação
ordinária comum, nem mesmo para solucionar qualquer crise de certeza.
Vicente Greco Filho resume bem o ponto, ao tratar do sistema codificado:
“a razão que leva a lei a exigir o consentimento do réu é a de que este,
contestada a ação, tem direito a uma decisão sobre o mérito e de não
querer ficar sujeito à dúvida suscitada pelo autor quanto ao direito
discutido, podendo exigir que o processo vá até seu final com decisão
enfrentando a lide” (“Direito Processual Civil Brasileiro – vol. 2”. São
Paulo: Saraiva, 19ª edição, 2008, p. 73).
Essas diferenças, a meu ver, são significativas porque derivam de
peculiaridades inerentes ao mandamus; não existe writ sem que se tenha,
na base, um ato de autoridade pública (ou de quem lhe faça as vezes),
com as características que lhe são inerentes, e em face do qual o cidadão
se insurge por vislumbrar ilegalidade ou abuso de poder.
Adotado, portanto, o ponto de vista de que, em primeiro lugar,
devem ser estudados os contornos da questão controvertida e as
características inerentes às disciplinas legais para, somente então, concluir

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pela integração com base na lei geral ou em princípios próprios da


legislação especial, parece-me, com a devida vênia, mais acertada a
jurisprudência tradicional que aparta, nesse particular, a disciplina da
desistência no mandado de segurança do quanto dispõe o art. 267, § 4º,
do CPC.
Encerro minhas considerações com um pequeno, mas importante
adendo. As considerações precedentes se vinculam à abordagem que, a
meu ver, apresenta melhores condições de promover um diálogo (e,
consequentemente, alguma síntese) entre duas posições que,
historicamente, têm sido apresentadas sob o signo do antagonismo.
Evidentemente, não se trata da única abordagem possível. A respeito
dos demais argumentos favoráveis e contrários eventualmente
lembrados, existe um que possui densidade própria e que, estando ainda
relacionado com as considerações anteriores, merece ser destacado. Com
efeito, seria possível arguir que a prevalência da noção de jurisdição é
condição mesma de qualquer procedimento, não importando se geral ou
especial a lei processual; portanto, o primado da jurisdição (com o que
esta se manteria inalcançável por simples ato de disposição da parte) seria
uma premissa inerente à própria discussão sobre propostas de integração.
Creio, porém, que a crítica não procede, pois necessário distinguir
jurisdição e prestação jurisdicional. Aquela é poder; esta é modus operandi.
Sobre essa distinção, menciono Alexandre Freitas Câmara, pela
objetividade:

“É preciso ter claro que não se confunde a jurisdição com a


tutela jurisdicional. Esta é o resultado prático do exercício
daquela. Confundir a atividade (jurisdição) com o resultado
que ela produz (tutela jurisdicional), perdoe-se pela
comparação simplória, é como confundir o ato de fritar um ovo
com o próprio ovo frito. Não se confunde, evidentemente, uma
atividade com o resultado que ela produz. A tutela jurisdicional
não é a jurisdição, mas o efeito (ou conjunto de efeitos) que ela
produz na vida das pessoas” (“Breves considerações sobre
algumas ‘novidades’ da nova lei do mandado de segurança em

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matéria de mandado de segurança individual”. In: ‘Tutelas


diferenciadas como meio de incrementar a efetividade da
prestação jurisdicional’. Rio de Janeiro: GZ Editora,
Coordenadores Humberto Theodoro Júnior e Maira Terra
Lauar, 2010, p. 374).

Determinada sentença pode transitar em julgado e não ser


executada pelo vencedor; em termos práticos, ter-se-á atividade
jurisdicional que consumiu tempo e recursos para terminar frustrada
diante de ato de disposição do interessado. Mas o poder jurisdicional em
si nada sofre com isso. Não se diminui nem se altera, ou o perde o juiz
que proferiu essa sentença.
Não me parece oportuno, portanto, tratar da desistência no
mandado de segurança como se tal escolha, pelo impetrante,
representasse ofensa à jurisdição. Creio, assim, que a pertinência da
abordagem por mim escolhida se confirma: a controvérsia trata, apenas,
de modos de exercício da atividade jurisdicional em um procedimento
especial. Se há grande celeuma em torno do tema, talvez esse fato decorra
da importância inerente ao próprio mandado de segurança. Quero dizer
que nada é irrelevante quando se trata de uma ação autônoma de
impugnação prevista expressamente pela Constituição Federal. Mas isso
não quer dizer, porém, que todo e qualquer problema processual relativo
ao writ remeta, necessariamente, a algum princípio ou instituto jurídico
de alta densidade.
O mesmo argumento pode ser revisitado, ainda, desde que se objete
que uma sentença não executada ainda assim existe, ao contrário da que
é subtraída após a desistência. E, ao existir, tem potencial para transitar
em julgado, impossibilitando a rediscussão da controvérsia. Há algumas
linhas, listei três características da sentença de mandado de segurança, na
esteira das lições eternas de Hely Lopes Meirelles; discorri sobre o ‘efeito
liberatório imediato’ elencado no segundo item, e agora passo, de forma
mais ágil, ao item posterior.
Noto de início como, aqui, a discussão também se torna
instrumental: advoga-se pela manutenção da sentença não pelo que ela é,

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RE 669367 / RJ

mas pela importância de algo que dela decorre, eventualmente; pela


qualidade possível de um de seus efeitos. De qualquer modo, as
peculiaridades do mandado de segurança ainda assim se impõem, a meu
ver.
Esta Corte considera constitucional o prazo decadencial de cento e
vinte dias para a impetração. Ao desistir de uma sentença proferida em
mandado de segurança, o impetrante, de ordinário, desiste tanto do
remédio constitucional em perspectiva concreta (dado que um mandado
de segurança efetivamente foi impetrado) quanto, em termos latos, da
própria garantia, com todas as implicações daí geradas; para obter outro
provimento jurisdicional, terá que fazer uso das vias ordinárias. Vias
estas que não são, nem nunca foram, subsidiárias; elas sempre estiveram
à disposição do cidadão supostamente lesado. A rigor, portanto, o ‘caráter
dispositivo’ da utilização do writ é inerente ao nosso sistema. Impetra-o
quem quer; utiliza-o aquele que nisso prevê um benefício.
Em torno desse ponto, muito se discute a respeito de uma possível
manipulação do juízo de conveniência do impetrante, o que se daria com
a ‘eternização’ da controvérsia pela propositura de ação ordinária de
mesmo objeto. Com a devida vênia, parece-me que a constatação da má
intenção depende, em primeiro lugar, de que efetivamente passe a existir
um segundo processo, ordinário; e também de que, neste, seja possível
demonstrar a intenção contrária à boa litigância no direito. A meu ver, a
condição para que se discuta má-fé não reside no simples pedido de
desistência, mas na efetiva manipulação (se demonstrada), bem como na
prova de dano processual. É que na litigância temerária, a má-fé,
obviamente, não se presume; ao contrário, exige prova satisfatória, não
apenas de sua existência, mas da caracterização de dano processual, a ser
compensada pela condenação prevista no Código de Processo Civil (arts.
18 e 35). A par do elemento subjetivo, verificado no dolo e na culpa grave
do litigante, a configuração da litigância de má-fé pressupõe elemento
objetivo, consubstanciado no prejuízo causado à parte adversa. Por isso,
qualquer que seja o motivo, não vejo como pressupor a temeridade da
desistência da impetração, salvo se já estiverem comprovados, no

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RE 669367 / RJ

momento do pedido de desistência, os elementos subjetivo e objetivo


configuradores da litigância de má-fé. Excluída essa hipótese, o sistema
processual possuirá, no momento adequado, meios suficientes para coibir
a eventual má utilização de suas potencialidades.

Em conclusão, verificada a existência de repercussão geral incidente


sobre a controvérsia (Tema 530 - Desistência em mandado de segurança,
sem aquiescência da parte contrária, após prolação de sentença de mérito,
ainda que favorável ao impetrante), fixo as seguintes teses, com apoio na
jurisprudência tradicional desta Suprema Corte:

(i) “É lícito ao impetrante desistir da ação de mandado de


segurança, independentemente de aquiescência da autoridade
apontada como coatora ou da entidade estatal interessada ou,
ainda, quando for o caso, dos litisconsortes passivos
necessários” (MS 26.890-AgR/DF, Pleno, Ministro Celso de
Mello, DJe de 23.10.2009), (ii) “a qualquer momento antes do
término do julgamento” (MS 24.584-AgR/DF, Pleno, Ministro
Ricardo Lewandowski, DJe de 20.6.2008), (iii) “mesmo após
eventual sentença concessiva do ‘writ’ constitucional, (…) não
se aplicando, em tal hipótese, a norma inscrita no art. 267, § 4º,
do CPC” (RE 255.837-AgR/PR, 2ª Turma, Ministro Celso de
Mello, DJe de 27.11.2009).

Dou provimento ao recurso extraordinário para restabelecer o


acórdão homologatório da desistência proferido pelo Tribunal Regional
Federal da 2ª Região.
É o voto.

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Voto - MIN. DIAS TOFFOLI

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02/05/2013 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

VOTO

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:


Senhor Presidente, o mandado de segurança é um remédio
constitucional tal qual o habeas corpus, no qual ele tem origem. É uma
ação dada ao cidadão contra o Estado; é um remédio dado ao cidadão
contra o poder; é intrínseco à defesa da liberdade do cidadão; não é uma
via de mão dupla; ele não gera direito à autoridade pública coatora, ou à
entidade da qual aquela autoridade faça parte, ou na qual ela exerça as
suas funções. Pode ser objeto de desistência, a qualquer instante, da
minha óptica. Eu não vou aqui repetir os vários precedentes que já foram
citados nos debates.
Eu peço vênia ao Ministro Luiz Fux para acompanhar a divergência.

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Voto - MIN. CÁRMEN LÚCIA

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02/05/2013 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

TRIBUNAL PLENO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367
VOTO

A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Senhor Presidente,


também peço vênia ao Ministro Luiz Fux, mas também tenho posição no
sentido de que se pode desistir da ação de mandado de segurança, em
qualquer tempo, pela sua peculiar natureza constitucional de ser
instrumento posto à disposição do cidadão para se livrar de alguma
ilegalidade ou abuso de poder.
Portanto, neste caso, não gera, para a parte passiva, que é a entidade
a cujos quadros pertence essa autoridade tida como coatora, qualquer
tipo de agravo que decorreria dessa desistência. Então, exatamente em
razão do escopo constitucional da criação do mandado de segurança, não
vejo como aplicar entendimento contrário. Peço vênia ao Ministro Luiz
Fux para reafirmar a jurisprudência do Supremo.
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Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 53 de 55

02/05/2013 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

VOTO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES - Senhor Presidente,


pedindo vênia ao Ministro Luiz Fux e entendendo as razões por ele
trazidas para essa nova reflexão, eu também não vejo razão para, nesse
momento, proceder à revisão da jurisprudência, que já é realmente
bastante longeva - na verdade, estamos falando de coisas de muitas
décadas -, e considerando também a relevância do próprio mandado de
segurança.
Inicialmente, devo dizer que eu tinha ficado até um pouco inseguro,
uma vez que nós, aqui, precisamos buscar, muitas vezes, subsídios no
Direito ordinário, tendo em vista a disciplina, quer dizer, qual seria a
questão constitucional que estava em jogo. Mas, depois, claro, é evidente
que o que se está discutindo - e pelo que se percebe - é a própria natureza
institucional do mandado de segurança; é muito além da disciplina
processual.
De modo que, pedindo vênia e reconhecendo o brilho da construção
trazida por Sua Excelência, eu acompanho a divergência.

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Supremo Tribunal Federal
Voto - MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

Inteiro Teor do Acórdão - Página 54 de 55

02/05/2013 PLENÁRIO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367 RIO DE JANEIRO

VOTO

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI


(PRESIDENTE) - Eu também peço vênia ao eminente Relator, não apenas
pelas razões que já veiculei, mas também incorporando os argumentos
que foram apresentados pelos eminentes Pares, tendo em conta inclusive
um precedente meu, julgado neste Plenário, que é o Agravo Regimental
no Mandado de Segurança 24.584/DF, eu peço vênia para acompanhar a
divergência e dar provimento ao recurso.

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Supremo Tribunal Federal
Extrato de Ata - 02/05/2013

Inteiro Teor do Acórdão - Página 55 de 55

PLENÁRIO
EXTRATO DE ATA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 669.367


PROCED. : RIO DE JANEIRO
RELATOR : MIN. LUIZ FUX
REDATORA DO ACÓRDÃO : MIN. ROSA WEBER
RECTE.(S) : PRONOR PETROQUÍMICA S/A
ADV.(A/S) : ANDRÉ MACEDO DE OLIVEIRA
RECDO.(A/S) : COMISSÃO DE VALORES MOBILIARIOS - CVM
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL FEDERAL

Decisão: O Tribunal, por maioria, deu provimento ao recurso,


vencidos os Ministros Luiz Fux (Relator) e Marco Aurélio. Votou o
Presidente. Redigirá o acórdão a Ministra Rosa Weber. Ausentes,
justificadamente, o Ministro Joaquim Barbosa (Presidente), para
participar da celebração do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa,
na corte Interamericana de Direitos Humanos, em São José, Costa
Rica, e o Ministro Teori Zavascki. Falou pela recorrente a Dra.
Luciana Loureiro Terrinha. Presidiu o julgamento o Ministro
Ricardo Lewandowski (Vice-Presidente). Plenário, 02.05.2013.

Presidência do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Vice-


Presidente). Presentes à sessão os Senhores Ministros Celso de
Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Dias Toffoli,
Luiz Fux e Rosa Weber.

Procurador-Geral da República, Dr. Roberto Monteiro Gurgel


Santos.

p/ Luiz Tomimatsu
Assessor-Chefe do Plenário

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