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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DE CRIMES

AMBIENTAIS DA COMARCA DE FLORIANÓPOLIS – SC

Autos n…

APELANTE, brasileiro, pescador, inscrito no RG sob


o n.... expedido pela SSP/SC e CPF..., residente e
domiciliado na Rua..., Florianópolis – SC, vem, à
presença de Vossa Excelência, inconformado com a
r. sentença de fls... proferida nos autos da ação penal
movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO
DE SANTA CATARINA, interpor

RECURSO DE APELAÇÃO

com fundamento no art. 593, I, do Código de


Processo Penal, cujas razões serão apresentadas
diretamente na instância superior, de acordo com a
previsão do §4º do art. 600, do mesmo diploma.

Pede deferimento.

Florianópolis, 28 de setembro de 2020.

ADVOGADO
OAB/SC
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR DA CÂMARA CRIMINAL
DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Processo Crime Ambiental…

APELANTE, já qualificado nos autos da ação em que


lhe move o Ministério Público de Santa Catarina,
processo em epígrafe, inconformado com a r. sentença
que o condenou ao cumprimento da pena de 1 (um)
ano e 2 (dois) meses de detenção em regime aberto,
substituída por medidas restritivas de direto e ao
pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada dia no valor
de 1/30 do salário-mínimo vigente a época dos fatos,
por infração ao art. 34, caput, c/c art. 15, II, letra i,
todos da Lei 9605/98, por seu advogado, vem, à
presença de Vossa Excelência, apresentar as

RAZÕES DE APELAÇÃO CRIMINAL

com fundamento no artigo 600, § 4º, do Código de


Processo Penal brasileiro.

Pede deferimento.

Florianópolis, 05 de novembro de 2020.

ADVOGADO
OAB/SC
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
COLENDA CÂMARA
INCLITOS (AS) DESEMBARGADORES (AS)

Apelante...
Apelado: Ministério Público do Estado de Santa Catarina.
Processo...
Origem: Vara Criminal da Comarca de...

RAZÕES DE APELAÇÃO

1. DOS FATOS

O Apelante foi denunciado pelo representante do Ministério Público como


incurso no artigo art. 34, caput, c/c o art.15, II, "l", todos da Lei 9.605/98.

Relata a denúncia que em 25 de outubro de 2019, durante a noite, por volta


das 23h30min, o Apelante teria exercido atividade de pesca de camarão em período de defeso e
local proibido, conforme Instrução Normativa do IBAMA n. 21, de 7 de julho de 2009 e Portaria
do IBAMA n. 32/1998.

Oferecida a Denúncia e apresentada a Resposta à Acusação, fora designada a


audiência de instrução e julgamento para o dia 22/02/2020, oportunidade em que foram ouvidas
testemunhas da acusação e defesa, bem como o interrogatório do Apelante.

O representante do Ministério Público apresentou alegações finais pugnado


pela condenação. A defesa, ao revés, apresentou alegações finais pugnando pela absolvição do
Apelante por insuficiência de provas e ausência de dolo, com fundamento no art. 386, V ou VII
do CPP.

Contudo, após a audiência, sobreveio sentença condenatória em que se


aplicou a pena de 01 (um) ano e 2 (dois) meses de detenção em regime aberto, substituída por
medidas restritivas de direto e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada dia no valor de 1/30
do salário-mínimo vigente a época dos fatos, por infração ao art. 34, caput, c/c art. 15, II, letra i,
todos da Lei 9605/98.

No entanto, a r. sentença não observou as evidências do caso concreto, que,


no caso em tela, apontavam pela ausência de dolo, de modo que, a absolvição é medida que se
impõe, conforme passa a expor.
2. DO DIREITO

2.1. DA PESCA PROIBIDA DURANTE O DEFESO – ART. 34, CAPUT,


C/C ART. 15, II, LETRA I, TODOS DA LEI 9605/98

Assim dispõe os artigos supra mencionados:

Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados
por órgão competente:
Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas
cumulativamente.
Art. 15. São circunstâncias que agravam a pena, quando não constituem ou
qualificam o crime:
II - ter o agente cometido a infração:
i) à noite;

Como já alegado ao longo de todo o processo, não foram angariados


elementos suficientes a ensejar um decreto de cunho condenatório.

Isso porque, o Apelante foi abordado enquanto fazia a travessia no canal do


Fernandes em sua embarcação, no momento em que se dirigia à pesca de PEIXES, não
estando essa sob a proteção do defeso, e apesar de ter sido encontrado 03 unidades de
camarões no interior da embarcação, não foi visto pescando camarão e nem sequer com redes
que caracterizassem a pesca ilegal do crustáceo.

O relatório da polícia ambiental assim descreve:

Durante o patrulhamento, foi avistado o masculino deslocando-se de seu sarilho para


o interior da lagoa, oportunidade em que foi abordado e verificado que no interior de
sua embarcação haviam 03 (três) camarões frescos

No termo de apreensão, verifica-se que foram apreendidas a quantidade ínfima


de 03 unidades de camarão, bem como a embarcação do Apelante. Ora, sequer foram
apreendidos redes ou apetrechos de pesca que apontassem para a prática de pesca ilegal do
camarão.

Frise-se que o Apelante é pescador profissional, e depende da pesca para


prover sua família, sendo que durante o defeso do Camarão, o Apelante continuava com a pesca
de peixes (o que não é proibido no local).

Prova disso que, ao ser abordado pela Polícia Ambiental, o Apelante estava
com redes para pescar peixes, com a malha permitida por lei e por tal motivo não foram
apreendidas, sendo apreendido somente a embarcação e 03 crustáceos que sequer o Apelante
tinha conhecimento que ali se encontravam.

Além do mais, o acusado colaborou com a fiscalização, não ofereceu


resistência, apresentou os documentos solicitados, bem como franqueou o acesso livre dos
policiais na embarcação. Além disso, não se trata de Apelante reincidente em infrações
ambientais.

Ou seja, as alegações Ministério Público, não eram e não são capazes de


sustentar uma condenação, por uma simples razão. Não há provas suficientes à condenação.

Cumpre consignar, que no Direito Penal Brasileiro somente se sustenta uma


condenação com base em prova irrefutável da autoria delitiva, acaso não haja, o art. 386, VII, do
Código e Processo Penal, bem como o princípio in dubio pro reo, determina que o magistrado
absolva o acusado, sob pena de se arremessar ao cárcere injustamente.

2.2. AUSÊNCIA DE DOLO

A suposta autoria, por sua vez, teria sido atestada pelos depoimentos dos
policiais que flagraram o acusado com três camarões em sua embarcação, durante o período em
que sua pesca era proibida, assim como pela palavra do próprio Apelante, que admitiu estarem
os crustáceos ali.

Contudo, ao prestar depoimento em juízo, os policiais declararam que, na noite


dos fatos, após receberem ligações informando a ocorrência de pesca ilegal no Canal dos
Fernandes, realizaram patrulhamento no local e, ao abordarem o acusado, encontraram três
camarões em sua embarcação, em que pese fosse período de pesca proibida daquela espécie à
época.

Esclareceram, no entanto, que não presenciaram o acusado pescando


camarões e que tampouco havia qualquer petrecho para a pesca do crustáceo em seu barco
naquele momento. Elucidou, ainda, que a proibição era relativa apenas a camarões, não a
peixes. Relataram, contudo, que os crustáceos apreendidos estavam frescos e pertenciam à
espécie cuja pesca era defesa.

Assinalaram ainda, que o réu não levava petrechos para a pesca do crustáceo
consigo na ocasião e, ainda, que não o avistaram pescando os espécimes apreendidos.

O Apelante, por sua vez, aduziu, sob o crivo do contraditório que, naquela
data, havia jogado uma rede para pescar tainhota, na lagoa, durante a tarde, e que saiu para
retirá-la no período da noite. Contou que, quando os policiais o abordaram, levantaram o
assoalho de sua embarcação e, ali, encontraram os camarões.

Questionado sobre o porquê de ter declarado, na fase policial, que, por


necessidade, pescava durante o período defeso e que estava tarrafeando na data dos fatos,
respondeu que realmente o estava fazendo, mas para pescar tainhota. Esclareceu que,
frequentemente, os camarões acabam vindo misturados com os peixes na rede de pesca e disse
que, como era noite e, consequentemente, já estava escuro, não teria percebido a presença dos
crustáceos, motivo pelo qual não os dispensou.

Asseverou que, até os agentes revistarem seu barco, não sabia que os
camarões estavam ali. Explicou, ainda, que a rede de pesca de camarão é diferente da rede
usada para pescar peixes e contou que, na noite dos fatos, estava com a tarrafa própria para a
pesca de peixe, a qual, inclusive, deixou de ser apreendida pelos policiais, porquanto estava
dentro da malha permitida.

Observa-se que é inconteste o fato de que o acusado não contava com


qualquer equipamento destinado ao tipo de pesca proibido à época e que tampouco foi flagrado
praticando o ato de pescar os crustáceos, de modo que não há como afirmar que ele estivesse
realmente pescando camarões naquela noite.

A versão apresentada pelo Apelante, de que os camarões pudessem ter ficado


na rede junto com os peixes e que, por estar escuro, não percebeu que ali estivessem, em
momento algum foi refutada pelos policiais que o flagraram na posse dos crustáceos, nem há
qualquer elemento de prova que ateste a falsidade da afirmação.

Ademais, a ação tipificada no art. 34 da Lei n. 9.605/1998 é a de pescar o


espécime proibido – conduta comissiva, para a qual o dolo do acusado não está evidenciado e
que não admite a modalidade culposa. A omissão consistente em deixar de devolver o animal à
água, por outro lado, não é criminalizada pelo dispositivo mencionado.

É o que ensinam Luiz Flávio Gomes e Silvio Luiz Maciel:

Na prática, muitas vezes, o pescador sabe exatamente o que pescará ou que


apanhará quantidade muito superior à permitida ou espécimes de tamanhos não
permitidos. Tanto que adota antes todas as providências para burlar e fugir da
fiscalização. Nesses casos o crime estará consumado com o mero ato inequívoco
tendente a realizar a apanha ilegal dos espécimes aquáticos, ainda que não ocorra a
captura, não sendo possível a tentativa. Aqueles que fazem a pesca ilegal de
camarão, por exemplo, sabem, exatamente, que os petrechos por ele lançados nas
águas marítimas apanharão camarões grandes, mas também camarões muito
pequenos (de tamanhos inferiores aos permitidos) e que serão pescadas quantidades
muito superiores às permitidas. No mínimo atuam com dolo eventual. O mesmo se
diga quanto aos pescadores da Região Amazônica, que realizam a “pesca do
Pirarucu” e de outros espécimes proibidos e sabem exatamente que apanharão tais
peixes. Se, entretanto, o pescador, na justa intenção de realizar uma pesca permitida,
por acidente, apanha uma espécie que deva ser preservada, ou em tamanho inferior
ao permitido, não estará cometendo nenhuma infração, por ausência de dolo. E o fato
de não devolver o animal a água não configura o crime, já que o tipo não pune a
conduta omissiva de deixar de restituir o espécime à água. A conduta proibida é
pescar, e não, deixar de devolver à água o peixe já pescado.1

1
GOMES, Luiz Flávio; MACIEL, Silvio Luiz. Lei de Crimes Ambientais: comentários à Lei
9.605/1998. 2. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. p. 160.
Em caso análogo, a Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa
Catarinense decidiu, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento para
absolver o Apelante condenado pela suposta prática do crime previsto no art. 34, caput, da Lei n.
9.605/1998, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal. O aresto foi assim
amentado:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. PESCA EM PERÍODO PROIBIDO


(ART. 34, CAPUT, DA LEI N. 9.605/1998). SENTENÇA CONDENATÓRIA.
RECURSO DA DEFESA. ALMEJADA ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE
PROVAS. RÉU QUE, APESAR DE TER SIDO FLAGRADO COM TRÊS CAMARÕES,
NÃO PORTAVA EQUIPAMENTOS DESTINADOS À PESCA DO CRUSTÁCEO, MAS
SOMENTE À PESCA DE PEIXES. PERÍODO DEFESO APENAS QUANTO À
PESCA DE CAMARÃO. DOLO DE PESCAR A ESPÉCIE PROIBIDA NÃO
EVIDENCIADO. CONDUTA OMISSIVA DE DEIXAR DE DEVOLVER OS ANIMAIS À
ÁGUA QUE NÃO CONFIGURA O CRIME AMBIENTAL. ABSOLVIÇÃO QUE SE
IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Apelação Criminal n. 0000749-
24.2018.8.24.0040. Quinta Câmara Criminal. Relator Desembargador Antônio Zoldan
da Veiga. J. 23.07.2020.

Sendo assim, considerando que são insuficientes as provas de que o acusado


estivesse efetivamente pescando camarões, entende-se não estar comprovado o dolo em sua
conduta. Logo, porque o tipo penal não admite a forma culposa, deve sua atitude ser
considerada atípica.

Consequentemente, a absolvição do réu, nos termos do art. 386, VII, do


Código de Processo Penal, é medida que se requer.

2.3. DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Há de se destacar que a 2ª turma do STF, por maioria de votos, absolveu um


pescador de SC que havia sido condenado por crime contra o meio ambiente por pescar durante
o período de defeso, utilizando-se de rede de pesca fora das especificações do Ibama. Ele foi
flagrado com 12 camarões. Segundo o Supremo, é a primeira vez que a Turma aplica o princípio
da insignificância em crime ambiental.

O pescador, havia sido condenado a um ano e dois meses de detenção com


base no artigo 34, parágrafo único, inciso II, da lei 9.605/98. O relator do HC, ministro Ricardo
Lewandowski, que negou a concessão do HC, ficou vencido após a divergência aberta pelo
ministro Cezar Peluso e seguida pelo ministro Gilmar Mendes.

O ministro Peluso divergiu do relator, aplicando o princípio da insignificância ao


caso. Foi seguido pelo ministro Gilmar Mendes, que fez rápidas considerações sobre o princípio
da insignificância.

Precisamos desenvolver uma doutrina a propósito do princípio da insignificância, mas


aqui parece evidente a desproporcionalidade. Esta pode ter sido talvez uma situação
de típico crime famélico. É uma questão que desafia a Justiça Federal e também o
Ministério Público. É preciso encontrar outros meios de reprimir fls. 77 condutas como
a dos autos, em que não parece razoável que se imponha esse tipo de sanção penal.

O aresto foi assim ementado:

EMENTA: AÇÃO PENAL. Crime ambiental. Pescador flagrado com doze camarões e
rede de pesca, em desacordo com a Portaria 84/02, do IBAMA. Art. 34, parágrafo
único, II, da Lei nº 9.605/98. Rei furtivae de valor insignificante. Periculosidade não
considerável do agente. Crime de bagatela. Caracterização. Aplicação do princípio da
insignificância. Atipicidade reconhecida. Absolvição decretada. HC concedido para
esse fim. Voto vencido. Verificada a objetiva insignificância jurídica do ato tido por
delituoso, à luz das suas circunstâncias, deve o réu, em recurso ou habeas corpus,
ser absolvido por atipicidade do comportamento. (HC 112563, Relator(a): Min.
RICARDO LEWANDOWSKI, Relator(a) p/ Acórdão: Min. CEZAR PELUSO, Segunda
Turma, julgado em 21/08/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-241 DIVULG 07-12-
2012 PUBLIC 10-12-2012).

Portanto, concessa maxima venia, a absolvição é de rigor.

3. DOS PEDIDOS

Isto posto, requer seja o presente recurso de apelação CONHECIDO e o


PROVIDO, para reformar a sentença de primeiro grau e ABSOLVER o Apelante da
acusação/condenação de pesca proibida, com fundamento o art. 386, VII do Código de Processo
Penal.

Subsidiariamente, requer seja absolvido pelo princípio in dubio pro reo, eis que
é extrema a fragilidade probatória verificada nos autos, ou ainda, pela aplicação do princípio da
insignificância ao caso concreto.

Florianópolis, 05 de novembro de 2020.

ADVOGADO
OAB/SC

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